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Capítulo 29 – O Juramento

Finalmente estavam partindo. Os sessenta homens da guarda marchavam em duas fileiras compridas. À sua frente iam Maria e Alvar. Três carroças puxadas por cavalos fechavam a comitiva, levando suprimentos e armamentos para a tropa. Se o tempo não atrapalhasse, levaria cerca de vinte dias até que chegassem ao seu destino.

A maior preocupação era serem atacados no caminho, apesar de isso ser bastante improvável, já que os invasores estavam, em tese, bem mais ao norte. Assim que estivessem próximos da cidade de Lancastre, fariam um desvio e seguiriam até o castelo de Gama, acrescentando meio dia à viagem, para ficar de prontidão em caso de um ataque.

Maria tinha se despedido da rainha no dia anterior. Não queria ter feito isso, mas Catarina a obrigou. Ela parecia bastante perturbada por deixar seu refúgio, mas concordou que estaria segura na propriedade de Aragão, um velho escudeiro que tinha servido ao seu pai. A rainha confiava nele, e seu castelo ficava em um local bastante inacessível, próximo a um penhasco, além de contar com uma guarda de trinta homens. Mesmo assim, compartilhou sua preocupação com Maria:

— Eu não gosto nada da ideia de sair daqui.

— Estará segura, Majestade.

— Eu sei, mas eu estou acostumada com este lugar. Tenho conforto, tenho meus amigos, minhas festas…

— É só por um tempo. Se tudo der certo estaremos de volta em breve.

— Boa sorte, Maria. E proteja nosso reino.

— Pode contar com isso, Majestade.

— E escute os conselhos de Alvar. Ele sabe tudo sobre combates.

— Certamente, Majestade.

Essa última parte tinha sido difícil de pronunciar, mas Maria o fez mesmo assim, lutando para parecer obediente. A última coisa que queria era criar algum tipo de problema e atrapalhar os planos de guerra.

A sensação de ansiedade e medo, tão familiar em seus dias na infantaria do exército, ainda não tinha se manifestado. É claro que ainda estavam muito próximos da capital, e as paisagens eram ainda pacíficas e bucólicas. Apreciava o fato de que estava mais uma vez longe do castelo, na estrada. Passavam por vilarejos, fazendas, vinícolas e outras propriedades diversas, cada uma com seu charme e suas histórias. Aquilo lhe dava uma sensação de liberdade, que há muito não sentia.

Maria também gostava muito de passar as noites nos acampamentos. Apesar do clima frio, estavam bem equipados. Todos tinham grossos casacos de pele para protegê-los contra o vento. Havia comida e bebida em quantidade adequada, assim como medicamentos para as mais diversas doenças.

Cada grupo de quatro soldados compartilhava uma mesma barraca. Ficava um pouco apertado, mas produzia uma proteção mais do que adequada contra o clima. Maria e Alvar tinham, cada um, sua própria barraca, que era idêntica às outras. Ela não gostava muito, pois ficar sozinha em uma barraca para quatro pessoas não ajudava a se esquentar.

A parte que ela mais gostava eram as conversas e jogos após o jantar. Reunidos ao redor de uma fogueira ou espremidos em uma barraca, eles costumavam jogar por cerca de uma hora antes de dormir. Jogavam cartas ou dados, principalmente, e a maioria gostava de apostar. Maria não era de arriscar seu suado dinheiro, mas como os valores eram baixos, acabava aceitando. Assim podia se divertir junto com os demais.

Alvar também parecia estar com o espírito elevado. Ele ria e brincava com todo mundo. Em resposta, todos também brincavam com ele, rindo juntos, fazendo piadas ou comentários animados sobre as batalhas que travariam em breve. Alvar era extremamente articulado e simpático, e a isso se devia grande parte de sua enorme popularidade entre os homens.

O conde quase sempre puxava um grupo de soldados à frente para conversar, revisando o planejamento e analisando possibilidades de desdobramentos da guerra. Maria normalmente ficava quieta, andando um pouco atrás deles. Os homens pareciam pouco interessados em ouvir a opinião dela, que por sua vez não fazia questão alguma de se envolver nas conversas. Na verdade, o que ela queria era ouvir algo que denunciasse as verdadeiras intenções de Alvar, mas os dias se passavam sem que ela conseguisse descobrir nada.

Em muitas dessas ocasiões, era Martim quem acompanhava Alvar à frente do pelotão, junto do soldado truculento que tinha disputado contra ele a final do torneio, do qual Maria não se lembrava o nome. Eles conversavam animadamente, e o conde parecia realmente se interessar pelo que Martim tinha a dizer. Ela sentia que eles tinham se aproximado bastante desde sua ausência. Nesses momentos, Maria se afastava.

Os soldados, em geral, estavam bastante animados também. Eles conversavam sobre os mais variados assuntos. O principal, como sempre, eram as mulheres. Eles viviam falando sobre com quais tinham dormido, quais estavam interessadas neles e quais os desprezavam. Incrivelmente, cada soldado gabava-se de ter uma contagem pessoal altíssima de namoradas, ao mesmo tempo que tiravam sarro dos outros por não terem nenhuma. A matemática do grupo não fechava, mas eles simplesmente ignoravam a lógica.

Eles também estavam preocupados com a missão. Alguns eram jovens e nunca tinham experimentado uma batalha real antes. Os mais velhos davam-lhes conselhos e dicas de como sobreviver e ajudar o pelotão a vencer. Em uma dessas conversas, Maria se intrometeu:

— Sobreviver é o mais importante em uma batalha. Deve ser a sua prioridade. E se puderem salvar a vida de um irmão, melhor ainda.

Ouviu um riso debochado ao seu lado. Era Alvar, que estava ouvindo a conversa.

— Algum problema? — ela perguntou.

— Não me parece muito apropriado ficar ensinando covardia aos soldados.

Maria cerrou os dentes. Seu primeiro instinto foi o de se afastar para evitar uma briga, mas acalmou-se e conseguiu responder:

— E eu estou ensinando covardia, por acaso?

— Acabou de dizer aos soldados que eles devem sobreviver primeiro. Entendo então que a missão vem em segundo lugar?

— Diga-me, conde Alvar, como um soldado morto poderia cumprir sua missão?

— E um soldado com a bunda plantada na retaguarda, pode?

Alguns soldados riram. Maria respondeu:

— Eu nunca disse que devem ficar na retaguarda. Disse que devem priorizar a sua sobrevivência. Não achei que precisaria repetir algo tão óbvio como a necessidade de se cumprir a missão.

Alvar ficou quieto por um instante, depois disse:

— Capitã, já que estamos discutindo filosofia, diga-me, que soldado é mais valoroso? Um que sacrifica sua vida mas consegue cumprir um objetivo que lhe foi dado? Ou um que deixa o objetivo escapar mas permanece vivo?

— Depende do objetivo, é claro.

— Não cabe a um soldado decidir isso, mas tudo bem. Suponha que o objetivo fosse acabar com a guerra, então?

— Neste caso, acho que o sacrifício valeria a pena. Mas se a guerra continua, a vida de um soldado tem mais valor.

Alvar ficou quieto. Os soldados também não diziam mais nada, ansiosos pela continuação da conversa entre seus dois líderes. Maria disse:

— Posso fazer uma pergunta também?

— É claro.

— Qual comandante é mais valoroso? Um que sacrifica a vida de seus homens para cumprir um objetivo ou um que desiste do objetivo para salvar a vida deles?

— Ora, é a mesma pergunta. Depende do objetivo.

— Você tinha dito que não cabe a um soldado decidir isso, não?

— Mas agora estamos falando do comandante.

— Exato, por isso a pergunta é diferente.

— Mas a resposta é a mesma. Ainda que eu discorde um pouco do grau, vai depender do objetivo. Se for para terminar uma guerra, por exemplo, o sacrifício valeria a pena, você mesma disse.

— Está falando do sacrifício do comandante? Ou dos comandados?

Alvar pareceu incomodado. Disse:

— O que está querendo fazer, hein? Insinuar que eu não me importo com a vida dos meus homens?

— Achei que estávamos apenas discutindo filosofia. Não quis ofendê-lo, conde Alvar.

— Eu não me ofendi.

Mas ele parecia ofendido. Fechou a cara e ficou em silêncio por alguns segundos. Depois aproximou-se de Maria e disse, baixinho:

— Você se acha tão esperta…

Ela não disse nada em resposta. Alvar apressou o passo e se afastou.


A viagem seguiu bastante tranquila, mas isso estava prestes a mudar. Quando estavam chegando perto de seu destino, um soldado montado em um cavalo despontou no horizonte. Ao avistá-lo, ainda sem saberem se era amigo ou inimigo, Maria e Alvar se destacaram para recebê-lo. Quando chegou perto, ele disse:

— Saudações, comandante! E senhora. — Acenou com a cabeça ao olhar para Maria.

Antes que ela pudesse corrigi-lo, Alvar se adiantou:

— Não sou o comandante, soldado. Esta é a capitã Maria, da guarda da rainha. — Ao ouvir isso, o soldado a cumprimentou mais uma vez.

— Qual seu nome, soldado, e que novidades você traz? — perguntou Maria.

— Meu nome é Gonçalo, capitã. E as notícias não são boas. A guerra chegou a Lancastre!

— Oh, não! — disse Alvar. — Podemos ver suas ordens, soldado Gonçalo?

— Sinto muito, mas não houve tempo para preparar um documento oficial. Eu venho a pedido pessoal do próprio general Fernão. Ele precisa de ajuda imediatamente!

— Tudo bem, que se danem os documentos! — disse Alvar, agitado. — Precisamos acelerar a marcha!

Maria olhou para ele. Havia algo estranho naquele soldado. Ele usava as vestes oficiais do exército: uma armadura leve, porém robusta, e um colete por cima. Seu cavalo também tinha uma marcação especial no couro, feita com um ferro de brasa oficial. O soldado tinha de fato vindo do Sul, que era onde ficava a cidade de Lancastre. Exceto pela ausência dos papéis oficiais, o que era incomum, tudo parecia estar em ordem, mas seu instinto ainda lhe dizia para desconfiar.

— Capitã? — disse Alvar, preocupado. — Estamos perdendo tempo!

Maria não disse nada. Ficou estudando o rosto do mensageiro à sua frente, em busca de algum sinal. Nesse momento, o conde puxou-a pelo braço e disse, em seu ouvido:

— O que está fazendo? Por que não estamos nos movendo?

Ela se desvencilhou de seu aperto, afastando-se dele. Disse:

— Não sei o que está planejando, mas nossas ordens são para ir até o castelo de Gama. Este homem não é um mensageiro!

— Meu Deus, como você é cabeça-dura!

Ele deu alguns passos para trás e gritou em direção à tropa:

— Soldados! Atenção!

Imediatamente, os sessenta soldados se organizaram à sua frente, formando um quadrado. Quando estavam todos em suas posições, Alvar disse:

— Homens! Acabamos de receber a triste notícia de que Lancastre está sendo atacada!

Os soldados começaram a conversar uns com os outros. Alvar continuou:

— Mas a nossa capitã quer abandonar a cidade à própria sorte. Quer deixar nossos irmãos sozinhos, em uma batalha perigosa. Uma batalha que poderemos ajudar a terminar rapidamente, se partirmos agora!

Muitas cabeças se mexeram em confirmação, e muitas vozes gritaram frases de apoio. Maria levantou sua voz e disse:

— Nós temos nossas ordens, precisamos ir a Gama! O mensageiro que acabou de chegar não tem ordens oficiais!

— Ora, faça-me o favor! — Alvar a interrompeu. — Não lhe dêem ouvidos! O exército está clamando por nossa ajuda, mas se depender de Maria, só vamos partir quando tivermos a porra de um documento! Quem vem comigo, AGORA?

A maioria dos soldados começou a falar mais alto, levantando as mãos e gritando frases de reclamação. Desesperada, Maria gritou:

— Não, me escutem! Eu sou sua líder, e não Alvar! Nós precisamos…

Mas os soldados não a escutavam mais. Começaram a sair de sua formação, dirigindo-se ao Sul, que era a direção de Lancastre. Alvar sorria para Maria, enquanto colocava a mão no ombro dos homens que passavam perto dele. Ela sentiu uma pontada no peito quando Martim passou por ali e recebeu um leve tapa nas costas à medida que se afastava, sem olhar para trás. Sua garganta se apertou e ela teve que engolir o nó que começava a se formar quando ouviu Alvar dizendo:

— Martim, faça os homens ficarem em formação e esperem por mim.

Martim não disse nada, apenas continuou caminhando, com a cabeça baixa. Alvar se aproximou de Maria e disse, bem baixinho, para que somente ela pudesse ouvir:

— Acho que os homens já tomaram sua decisão.

Maria não podia acreditar. Eles estavam mesmo seguindo as ordens de Alvar. Ninguém olhava para ela. Lembrou-se da batalha na sala do trono, quando os soldados cogitavam entregar a rainha a Bento e os demais conspiradores. A mesma sensação de indignação e desespero tomou conta de si, mas desta vez ela não tinha nenhum plano secreto ou trunfo para convencer os soldados a repensar sua decisão.

— Eu vou até Gama — Maria disse, com os dentes cerrados e apertando os punhos. — Nem que seja sozinha. E assim que estiver lá, vou denunciá-lo ao comando do exército.

— Pode ir — ele respondeu.

Nesse momento, os olhos de Alvar brilharam. Sua respiração fez uma pausa breve, e ele pareceu estranhamente excitado. Molhou os lábios com a língua e se virou, afastando-se, sem dizer mais nada.

Maria ficou ali parada por alguns instantes. O que estava acontecendo? Alvar tinha conseguido levar os guardas para o Sul, mas não parecia preocupado que Maria fosse até Gama, onde era esperada e poderia denunciá-lo.

Maria era esperada.

É isso!

Alvar tinha planejado tudo, desde o início. Ele não pretendia simplesmente desmoralizar Maria, fazendo os soldados seguirem outro líder ao invés dela.

Ele queria matá-la.

Lembrou-se da reunião na sala do trono, e da forma como Alvar convenceu a todos — com a involuntária ajuda de Maria, como bem lembrou na ocasião — a utilizar o castelo de Gama como ponto de apoio. Possivelmente havia uma tocaia esperando por ela em Gama, ou no meio do caminho.

Como eu não percebi isso antes?

O tempo todo que Alvar gastou tentando ganhar a confiança dos soldados, o fez pensando em um momento como este. Bastaria criar um motivo para a tropa se dividir, e os soldados o seguiriam. E ele planejou tudo. Sem documentos oficiais, ele sabia que Maria insistiria em cumprir suas ordens originais sozinha, ou com alguns poucos soldados teimosos o suficiente para permanecerem fiéis a ela. Aparentemente, nem isso ela teria. Pela forma como toda a tropa se movia, todos já tinham decidido seguir Alvar.

Ela estava sozinha.

Maria não sabia o que fazer. Poderia tentar lembrá-los mais uma vez que era ela a sua líder, e não Alvar, mas não adiantaria muita coisa. Sabia que a lealdade de um soldado não pode ser obtida à força. Ela já tinha perdido essa disputa.

Poderia voltar atrás e ir com a tropa para Lancastre, mas essa opção não a agradava. Se o mensageiro estivesse mentindo, como provavelmente estava, ainda que Alvar estivesse errado, era ela a capitã, e seria responsabilizada por descumprir suas ordens sem um documento oficial. Teria que provar que tudo foi armado por Alvar, o que duvidava ser possível. E ele certamente diria mentiras para complicar ainda mais a situação. Ele diria que Gonçalo era um espião enviado pelo inimigo, o que tornaria o aparente erro de julgamento de Maria ainda mais grave. Ou, na remota hipótese de o mensageiro estar dizendo a verdade, ela seria a capitã que não quis mobilizar sua tropa em auxílio aos seus irmãos do exército, e seria desmoralizada para sempre. Em qualquer cenário, seria destituída de seu posto, talvez castigada ou encarcerada. Poderia tentar fugir, mas aí seria considerada uma desertora. Se fosse capturada, seria executada.

Alvar colocou-a em uma situação sem saída. A provocação do conde, feita dias atrás, ressurgiu em sua mente. “Você se acha tão esperta” — ele disse. E era verdade. Ela se achava esperta. No entanto, foi enganada com maestria pelo dissimulado homem que agora se afastava junto com os soldados.

Maria tinha que tomar uma decisão. A razão não mais lhe serviria, pois Alvar dominou-a completamente. Foi com base no instinto que gritou:

— Homens da guarda real!

Aos poucos, todos os soldados pararam de caminhar e viraram-se para ela. Maria caminhou em sua direção e se aproximou. Levantou sua mão, exibiu a cicatriz que criou no dia de sua nomeação e disse, na voz mais confiante que conseguia projetar:

— Eu lhes fiz um juramento. Prometi não ficar ao seu lado, nem na sua retaguarda. Eu prometi que estaria sempre à sua frente, para receber primeiro os golpes mais duros, as flechas mais afiadas e ser a primeira a quebrar os escudos de nossos inimigos. Eu fiz esse juramento sem exigir nada em troca, pois este é o MEU fardo!

Fez uma pausa. Os homens a olhavam com atenção. Alvar também a olhava, curioso. Ela continuou:

— Sei que em seu juramento vocês não juraram seguir a mim, mas sim proteger o reino. E eu sei que ir para Lancastre parece ser o melhor para o reino, mas acreditem em mim, não há inimigos em Lancastre. Os inimigos estão lá. — Apontou para o Leste, na direção do castelo de Gama. — E é lá que me encontrarão, lutando!

Fez uma pausa e respirou fundo, antes de concluir:

— Eu preciso de vocês, pois eu não consigo vencer esta batalha sozinha. Isto não é uma ordem, e sim um pedido. Venham e lutem ao meu lado.

Alvar deu um riso curto e debochado, antes de se virar de costas e retomar sua marcha para o Sul. Os soldados ficaram parados por um tempo. Alguns olhavam para baixo, envergonhados. Outros não tinham expressão alguma no rosto. Aos poucos, eles começaram a se virar na direção de Alvar, sem dizer uma palavra. Tinha acabado. Sua última esperança era conseguir trazer os homens de volta para seu lado, mas falhou.

Maria suspirou e deixou seus ombros caírem, desanimada.

Lembrou-se de tudo que tinha passado até aquele momento. Todos os sacrifícios foram em vão. Aceitou ser a capitã da guarda, mesmo sabendo que viveria sob intensa pressão. Lembrou-se de todas as lutas que lutou, as negociações, as intrigas e os assédios que sofreu. Seu esforço de nada valeu. Não havia mais esperança para ela. Não retornaria ao seu posto. Não retornaria ao castelo. E também não retornaria viva de seu próximo destino.

Virou-se e caminhou na direção leste, até deixar toda a tropa para trás. Estava agora absolutamente sozinha. Parou e ficou admirando a vista.

No horizonte, erguiam-se as formas retas do castelo de Gama. Era pequeno, bem menor do que o da capital. Parecia tão distante, mas ao mesmo tempo tão perto. As distâncias são pequenas quando se caminha em direção à morte.

Quantos homens Alvar colocou ali? Vinte? Trinta? Quarenta? Aposto em um número médio, talvez trinta.

Posso invadir durante a noite e atacá-los um a um, enquanto dormem.

Quantos eu conseguiria matar antes de cair?

Ou talvez eu tente encontrar a guarda do castelo. Estão presos? Posso tentar libertá-los, e…

— Eu vou lutar ao seu lado. — Ouviu uma voz vinda de trás. Virou-se para olhar.

Perdeu o fôlego imediatamente. Suas pernas tremeram e por um momento ela achou que fosse cair de joelhos no chão. A figura alta de Martim estava parada ali, a poucos metros de distância.

Ele tirou uma faca de seu bolso, ergueu a mão direita e fez um corte na palma, pintando a lâmina com um vermelho vivo.

— Eu juro ficar do seu lado e dividir com você os golpes mais duros, as flechas mais afiadas, e junto a você quebrar os escudos dos nossos inimigos.

Antes que tivesse qualquer outra reação, outra figura se aproximou. Um soldado alto e magro, com os cabelos muito claros e os olhos azuis, quase transparentes, disse:

— Eu também vou lutar ao seu lado, capitã — era Ricardo. Ele também usou uma faca para fazer um corte em sua mão, e repetiu o juramento:

— Eu juro ficar do seu lado e dividir com você os golpes mais duros, as flechas mais afiadas, e junto a você quebrar os escudos dos nossos inimigos.

Impedida por um enorme nó na garganta, Maria não conseguia dizer nada. Apenas olhava enquanto mais soldados se aproximavam.

— Romena vai me matar. — Era Tomás. — Se bem que se ela soubesse que eu abandonei você, ela também iria me matar. Então não tenho muita escolha, também vou. Juro tudo isso aí que eles falaram. — Repetiu o corte em sua mão.

Outros soldados apareceram e repetiram o gesto e o juramento. Carlos, Marcel, Antenor, Ulimar, Paulo. Maria contou cerca de trinta soldados, metade da guarda. Dez deles, ela se lembrou, estiveram com ela na batalha na sala do trono.

Com a voz embargada pela emoção, ela disse:

— Obrigada por acreditarem em mim. E por lutar ao meu lado.

— Você ainda é nossa capitã — disse Martim.

— E conde Alvar? — ela perguntou. — Por que não o seguiram?

— No dia em que ele atravessar uma parede de homens e sair vivo do outro lado, talvez eu o siga — disse Carlos.

— Estamos com você — disse Martim.

Maria olhava para o rosto de cada um daqueles homens, sentindo uma enorme gratidão. Eles estavam arriscando-se por ela. Jurou a si mesma que dali em diante faria de tudo para ficar do lado deles.

Olhou para Martim. Ele sorria e a olhava de um jeito como há muito não fazia. Mas havia uma sombra de tristeza naquele sorriso.

— Mas, querida capitã… — disse Ricardo, enquanto amarrava uma atadura na mão. — Que uma coisa fique clara… nós temos uma condição. Ainda tem um assunto pendente entre nós.

— Ora, ora, soldado — ela disse, colocando as mãos nos quadris e exibindo um sorriso desafiador no rosto. — Pois diga qual é.

— Nós ainda não fechamos aquela aposta.

Ela respondeu:

— Por mim, já está fechada.

— E os termos?

— Nós decidimos depois que vencermos a batalha.

Sob o olhar e sorrisos de todos, Maria apertou a mão de Ricardo. Depois pegaram suas coisas e começaram a marchar para o leste.

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Olá, eu sou Daniel.Lucredio!

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