— Erika, por que você disse para atrapalhar eles?
O questionamento era esperado por parte da criança, cuja mente não estava desenvolvida o bastante para entender o raciocínio de seu colega de corpo. Devido a também os segredos quanto ao miasma e a energia demoníaca ter se alastrado por todo canto, a entidade queria comprar tempo o bastante para desenvolver um filtro para absorver o miasma. Ele também não sabia da força do inimigo, então queria esperar o máximo para se revelarem e analisar suas capacidades, assim teria o momento derradeiro para se aproveitar.
No entanto, também temia que essa demora os deixaria mais fortes. Milea era um demônio, e por meio dela entendeu que essas criaturas se alimentavam da vitalidade do outro, o que era só uma forma de se referir ao estado puro de energia produzido pelos corpos de criaturas vivas. Possivelmente era um tipo de fetiche ou prazer comum nessa espécie querer consumir seres com grandes reservas, por isso que não comiam mato igual vacas pastando, já que possivelmente um dia inteiro comendo grama daria o equivalente a um humano completo.
Er’Ika apenas não fazia o mesmo porque precisava cuidar de Liane, devendo usar os melhores artifícios para aprimorar seu corpo enquanto fosse sua casa. Era por tal motivo que forçava hortaliças pela sua garganta e sempre comprava carne, independente se fosse caro. Após descobrir como a energia de outros seres, especialmente os demônios, podiam amplificar o poder inato em si, acabou que sua linha de raciocínio se assemelhou muito àqueles monstros.
Pequenino, é para evitar que eles morram no processo. Memorizou aquelas coisas no livro?
— Fala sobre as palavras? Sim, mas isso parece besteira. Você faz melhor.
Hehehehe, de fato faço. Só quero que repita para aprendermos a usá-los sem a necessidade da fala. Quanto maior o nosso leque, melhor, e quando precisar manter o perfil baixo, basta recitá-las.
— Entendi. — O garoto se ergueu, olhando para o buraco no quarto em que estava e apontando seu dedo para lá. — Oh, fogo, incendeie e queime!
Uma pequena labareda saiu da ponta do dedo e voou em linha reta, dispersando-se no ambiente em seguida. Era muito fraquinha, nada se comparado ao raio elétrico que vinham praticando, mas poderia ser efeito colateral da constância das conjurações. Magias gastavam energia, fato, e para repor a energia era necessário comida calórica para o corpo realizar o processo de transformação.
A reserva de Liane já estava muito baixa, então ambos controlaram bastante os caminhos através da conjuração do feitiço de forma que o garoto não tivesse um colapso. O propósito primordial era para Er’Ika registrar os efeitos das palavras, os caminhos pela corrente sanguínea e seus comportamentos para mais tarde tornarem mais eficientes.
Os livros deixados falavam também sobre assuntos como elementos, no entanto, a entidade jogou tudo isso para escanteio ao reparar como era absolutamente ridículo. Havia um tipo de imenso painel dizendo sobre elementos mágicos, sendo eles: água, fogo, vento, terra, relâmpago, som, e muitos outros que não se esforçaram para decorar por serem perdas de tempo.
Er’Ika desde que viu aquela atrocidade se enfureceu pelos humanos criarem uma concepção tosca. Para ele, era mais do que óbvio que tais coisas não existiam, no final era tudo energia virando alguma coisa específica; relâmpago era energia se convertendo em eletricidade, fogo era térmica, vento, água, som e terra era cinética, e todas as demais variações se encaixavam de uma forma nessa classificação.
Não acredito que esses idiotas sobreviveram até então. Parecem escrever contos de fada dentro dos seus livros que eram para carregar conhecimentos! Minha nossa, a cada dia, sinto mais vontade de destruí-los por completo!
Liane sentiu uma pequena flutuação em sua mente, essa sensação normalmente significava que Er’Ika estava irritado. Era normal acontecer repentinamente, mas se repetiu tantas vezes nas últimas horas ao ponto de preocupá-lo.
— Erika, fiz algo de errado?
O que? Não, não, está tudo indo de acordo.
— Por que você tá com raiva, então?
Eu com raiva? Ora, pequenino, eu não estou com raiva de nada…
“Mentira.” O garotinho já sabia o quão comum era esconder seus pensamentos, e por isso não pressionou mais, voltando sua atenção para algumas coisas no material emprestado por Ludio. Ele ia abrir a boca para falar mais, no entanto, uma silhueta no buraco da parede o interrompeu.
Ela voltou depressa, curioso.
Milea adentrou mais o quarto, ajoelhando-se próxima a criança e mantendo a cabeça baixa. Er’Ika se materializou na sombra atrás de Liane, crescendo em tamanho e dando a ilusão de que o menino era o verdadeiro demônio entre os dois. As dezenas de olhos vermelhos se projetaram para fora, todos voltados para a mulher, e quando as bocas apareceram, ele a interrogou com uma voz distorcida:
— Por que retornou tão cedo?
— Haviam presenças muito fortes naquele local — desculpou-se, prostrando mais o corpo. — Fiquei com medo de morrer, então os prendi lá e feri um pouco os membros antes de ir embora. Não tive coragem de enfrentar o que estivesse sendo invocado ou quem fossem seus seguidores, mestre.
Er’Ika ponderou quanto às palavras. Seu radar não captava uma presença forte, então se o que estivesse falando fosse verdade, significava que a pessoa que escolheram guerrear era muito mais perigosa do que acreditava. No entanto, as expressões dos olhos e bocas indicaram o pleno desapontamento.
— Você voltou com o rabo entre as pernas por medo? Você, que ousou me desafiar quando me encontrou, preferiu ficar na minha frente de mãos vazias do que continuar atrapalhando os aventureiros quando minhas ordens eram claras?
O demônio permaneceu quieto, apenas para Liane, quase que completamente insensível à conversa, deu passos à frente. Aquilo fez Milea estremecer, pois mesmo não tendo contato com o receptáculo, devia considerá-lo como subordinado importante de seu mestre e alguém superior a si mesmo.
— Se quer meu perdão… — disse Er’Ika, ficando ao lado do rosto do garoto —, me dê a sua energia demoníaca, tudo o que puder.
Ela engoliu seco. Isso era um pedido estranho, mas não impossível. Pontinhos roxos saíram de sua pele em direção ao garoto, ao ponto de suor frio cair do rosto. O que não esperava era o quão perto Liane ficaria, ponto a mão em seu ombro. Uma pressão assombrou seu corpo, e as palavras da entidade, o seu mestre, com aquela aparência monstruosa de sombra, lhe deixou congelada.
— Eu disse tudo, sem exceção.
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