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neko lua
Capítulo 020 – Fuja como um medroso! ‎ ‎ ‎

Phellege passou com maestria a sua adaga curvada com um golpe rápido no torso do primeiro inimigo, o aço brilhou ao cortar o ar, atingiu o goblin em cheio.

— Está bem? — indagava o inventor.

— Sim… Tentando. — O necromante estava um pouco mais adiante, para impedir que atingissem seu amigo, que estava apenas com uma besta.

Os dois estavam nisso há um tempo, a princípio tentaram assustar os adversários, mas a tribo monstruosa continuou avançando, os aventureiros de Sihêon permaneceram cercados, obrigados à peleja.

Ainda muito assustados, eles tentavam refletir os golpes conforme estava dentro das suas capacidades, o clangor das armas ecoava naquele bosque apertado, enquanto soava como uma harmonia maldita somada aos gritos agudos dos goblins e o som dos suspirar dos dois em desespero enquanto desferiam seus ataques.

— Eles não falecem! — brandia o necromante.

— Ah, perecem, mas são tantos que está sendo inútil! — O relicário segurava firme em sua besta, puxara uma correia de tripa e couro, lotada de virotes para a sua besta. De alguma forma, ele conseguiu acoplar ela em sua besta.

— Precisamos ver uma forma de fugir, Aldmond!

— Não sei como! Eles se movem mil vezes melhor que nós nesse maldito bosque, merda! — O inventor tentou agir, mas o som de saraivadas contra a dupla o distraiu.

Flechas de madeira eram disparadas por alguns goblins mais atrás, com seus arcos pequenos e gastos, feitos grosseiramente. Cada disparo passava sob as cabeças dos aventureiros com um zumbido fino, como um vento frio. O relicário e o necromante abaixavam-se constantemente, suados do esforço.

— Droga, até isso para se preocupar, agora! — Phellege sacou outra adaga da cinta e arremessou contra um dos goblins arqueiros, acertando em sua testa.

O chão escorregava, as raízes dificultavam qualquer movimentação, cada passo dos aventureiros gerava um risco que os mantinham mais quietos, tolice, seus inimigos moviam-se livremente e pareciam caçoar desta precaução.

A mira das criaturas era péssima, assim como sua força física. O membro do Mausoléu conseguia facilmente aparar alguns golpes usando apenas o mínimo de técnica, tal qual o aluno do Laboratório que pouco precisava-se movimentar para não ser atingido pelas flechas pequenas.

Um dos goblins brandiu um machado de aparência bem tosca, correra gritando, tentando atingir o necromante, que esquivou precisamente. O machado de segunda mão afundou na árvore assim que o monstro errou o aventureiro, fazendo farpas voarem para o lado oposto onde a arma havia sido fincada. Phellege o finalizou brevemente.

O necromante não parecia ser inexperiente, deslizava entre os adversários com a sua adaga cintilante, esquivando-se de lanças improvisadas e ceifando as almas verdes, cortando suas gargantas sem descanso.

— Incrível, cara! — Aldmond sorriu com força, era a centelha da esperança ressurgindo.

Das sombras crepusculares, um dos goblins surgiu atirando-se contra o inventor, forçando-o a recuar enquanto mais criaturas apareciam de todos os lados.

— Inútil, precisamos bolar um plano. — apontou o necromante.

— Não vamos ter espaço hábil para afastar essas criaturas malditas e fugir para o outro lado, precisamos de uma distração! — reforçara Aldmond.

— Distração? — O homem da morte estava dividido entre encarar aqueles que precisava derrubar com a adaga e os que estavam prestes a atingir o cientista ao seu lado, por fim fitou seu amigo, pois sentiu que ele estava para explicar algo que sua curiosidade gritava para compreender.

— Sim, olhe para isso!

Faíscas dançavam na escuridão, o choque das armas tilintava veemente. O jovem engenheiro derruba mais dois com seus virotes.

— São estúpidos! Seus instintos são primitivos, se conseguirmos chamar a atenção deles ou assustá-los, vai ser fácil! — concluiu o homem com a besta.

Aldmond apertara o gatilho repetidas vezes, pelo menos três virotes foram atirados em uma velocidade absurda em linha reta, cravando em gargantas, ombros e testas dos pequenos verdes que caíram sem muita resistência. Outro goblin, que portava uma clava torta, avançou com uma selvageria palpável contra o senhor das engenhocas, acreditando que nenhum outro virote poderia ser disparado novamente.

O relicário então sorriu, ao conseguir disparar uma rajada certeira, perfurando o peito da criatura antes de ser alcançado. Havia uma quantia de munições já encaixadas em sua besta adaptada. Ele e Solomúrius passaram semanas tentando fazer isto. Conforme os disparos eram acionados pelo gatilho, algumas lacunas preenchiam novamente os espaços para o próximo tiro, uma engenhoca que combinava diversas peças móveis que puxavam a correia. O barulho era ensurdecedor.

— E como aspira chamar a atenção de tantos inimigos assim de uma vez? Qual a ideia? — O necromante ansiava uma estratégia que esclarecesse a situação para ambos.

— No meu bolso tem um aparato, uma relíquia, uma esfera feita de madeira… — Aldmond é atrapalhado por um goblin que salta em sua cabeça, tentando furá-lo com uma adaga podre. O relicário arranca a criatura do seu rosto, assim que caído, o alvo verde é saraivado até a morte. Então, ele retomou de onde parou, ofegante:

— Feita de madeira com algumas lascas de pedra e pederneiras, dentro há uma mistura de óleos e destilados, não causaria uma explosão, mas faria um rastro de fogo tão forte e alto, que se não afugentar, distrai bem!

Não era bem o que o homem dos trajes negros esperava escutar, ele pareceu relutante enquanto o discurso era dito.

O cansaço pesava com força os braços de Phellege, ele olhava para trás, o caminho que havia feito com seu amigo e olhava para frente, fitando aquela imensa horda. Ele continuava lutando, por mais que a sensação que atingia seu coração dissesse com todas as letras que a batalha estava rumando para uma situação na qual seria impossível vencer.

— Vai ter que ser isso… Relicário. — consentiu o necromante.

Um pique formado por ossos quase atinge a perna de Aldmond, com destreza ele consegue se jogar para o lado, encostando a sua besta na testa do goblin que rosnou desapontado por errar, então perecera.

Uma adaga de serra atingiu o braço de Phellege que soltou um rosnar de dor, virou-se enfurecido procurando o autor do golpe, obstinava-se até que encontrou o goblin abaixo da sua visão, rindo enquanto lambia o sangue necromante que caia da adaga.

— Ah, seu filho da puta! — Ele sentiu o golpe, teu sangue jorrou.

Contra-atacou com uma precisão letal, retirando a vida inimiga.

— Você está bem? — Aldmond se tocou de que estava sempre perguntando isso, ele estava completamente absorvido na preocupação que estava tendo para com o seu parceiro de aventura.

Ele sentia uma culpa gigantesca, o fato de ter sido ele quem convidou o necromante para uma situação catastrófica dessas servia como peso da batalha junto do remorso.

— Relaxa, isso não foi nada… Foca! — Phellege havia reparado, não queria que o relicário perdesse a precisão dos seus golpes por um problema como esse.

O ar pesado do bosque intensificou o sentimento de estarem sendo sufocados, principalmente quando o cheiro acre do sangue passou a subir suas narinas. Nem sabiam dizer quem havia sangrado tanto para canalizar tanto odor pelo campo de batalha: eles ou os inimigos.

Com um tiro primoroso da sua besta, o engenheiro conseguira fazer um dos goblins cair, mas outros dois surgiram rapidamente e tomaram o seu lugar, avançavam com uma voracidade assustadora, tudo parecia perdido, a quantia era incontável.

De um lado, as risadas cruéis dos seres esverdeados e pequenos, combatendo com a respiração ofegante dos dois rapazes. Estavam trêmulos, defrontavam a sua perdição.

A penumbra eterna impedia os dois de ver claramente os ataques que os perseguiam, isso obrigava suas defesas se basearem apenas em instinto e sorte.

Uma lâmina enferrujada seguiu o escuro e parou apenas quando o estômago de Phellege foi atingido. O som da carne sendo cortada, somado ao grito de dor do necromante, aumentou o caos da batalha.

O sangue do membro do Mausoléu tingiu a relva.

Acabou.

O companheiro de Aldmond entendeu que não sairia dali, encarou seu amigo, percebendo o que precisava ser feito, finalmente.

— Phellege! — O grito do relicário foi tão alto e esganiçado, devido ao vislumbre mórbido.

— Corre… Corre…

Os olhos do inventor encheram-se d’água enquanto ele precisava continuar lutando, passou a se movimentar mais, mesmo que tropeçasse vez ou outra nas raízes.

O inventor batia a sua atenção no rosto do homem do mausoléu a cada minuto, esperando que ele reagisse. Ao invés disso, viu o homem dos cabelos raspados cair sobre os joelhos.

— Corre…

O sangue chorava com um calor que abraçava o corpo de Phellege que começara a esfriar.

As correias de tripas foram esvaziadas com descontrole, nem todos os tiros que o relicário disparava acabavam em algum alvo. Os goblins perceberam o desespero vindo do homem de cabelos escuros, mas não conseguiam se aproximar devido aos virotes.

— Corre…

O aluno do Gambiarra derrubava diversos adversários, gritando como se estivesse no meio de uma numerosa tropa no campo de batalha de uma guerra sangrenta. O fogo do olhar do relicário o esquentava com uma fúria incontrolável.

— Corre…

O sangue escorria e derramava junto do seu antigo dono, uma separação fúnebre e decadente. O inventor estava vidrado em seu expurgo, mas acabou se assustando ao visualizar a face de Phellege que se virou rapidamente para encará-lo. Este olhar dele tinha um fervor que, por fim, impulsionara seu amigo da taverna.

Aldmond correu.


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