Muitas pessoas vieram cumprimentar-me, conversar e bajular em geral. A dizer o quão comovente foi meu discurso, que o que eu disse ressoou com os seus corações. Entretanto, ninguém se atreveu a perguntar o porquê de eu estar no púlpito e não Lucius.
Parece até que esqueceram o que este evento era para ser hoje. Ou talvez não se esqueceram, mas fingem esquecer.
Minha família que terá o verdadeiro trabalho. Além de também cumprimentar e tentar explicar o inexplicável, eles terão que realizar todos os imbróglios relacionados ao evento desdito.
Apesar de tudo o que eu fiz, não é tão simples assim para afirmar que eu sou justamente o próximo patriarca dos Conflagratus, precisa-se de apoio necessário por isso. É por isso que a Princesa estar aqui é algo tão importante, ela corrobora para a validade do evento.
E eu continuo a cumprimentá-los, até que aparece, finalmente, em minha frente a figura premiada da noite que eu há pouco falava.
— Au… relius, não é? — uma garota de cabelos negros perfeitos inicia a conversa comigo.
Quando tal figura chega ao recinto, todos as outras pessoas que há pouco me rodeavam se dispersam. Puro sinal de respeito é demonstrado.
— Vossa Alteza, que bom vê-la — imediatamente pego a sua mão e a beijo como sinal de cortesia.
Ela não reage. Apenas se venteia com seu leque ao observar o que acontece.
— Gostaria de conversar contigo em privado, podemos? Prometo que não tomarei muito de teu tempo — Vossa Alteza, a primeira e única princesa do Império, Constantina me pergunta.
— Seria um prazer — digo enquanto demonstro o caminho para a sala dos fundos onde eu me encontrava anteriormente.
Enquanto passamos pelo corredor, a princesa comenta:
— Tem cheiro de sangue aqui — com a mão no nariz ela diz.
Cheiro de sangue…
— Tem cheiro da vitória, Vossa Alteza — eu a respondo.
— Vitória, é? — sem entender, ela dá uma leve risada.
Abro a porta da sala, ela entra e eu entro antes do fechar da porta. A cá estamos, ambos, sozinhos.
— Senta-te, por favor, Vossa Alteza — eu digo.
Ela olha para a sala, como se estivesse a investigar o recinto, e escolhe a cadeira mais pomposa que consegue encontrar. Eu sento de frente a ela em resposta.
— Aurelius Conflagratus Avitus: o mais novo patriarca dos Conflagratus, meus parabéns. Devo dizer que teu discurso foi realmente quente! — a princesa realiza uma piada, eu rio por educação.
— Obrigado… Obrigado, Vossa Alteza, foi necessário. Fico feliz que tenhas gostado.
— Eu vi algumas mulheres enlouquecidas por terem seus vestidos queimados e seus cabelos ateados em fogo, foi hilário! Hilário! — ela ri graciosamente.
— Mas se isso tivesse acontecido comigo… — ela abre seu leque e o coloca na frente inferior da sua face, a voz dela toma um tom irritado.
— Eu nunca faria isso com alguém da casa real, Vossa Alteza.
Eu fiz questão de colocar as pessoas importantesno meio, afinal.
— Que bom, Senhor Conflagratus. Por sinal, é tão estranho chamá-lo assim. Pelo o que eu sabia seria outro alguém que seria o novo senhor dos Conflagratus…
— O que aconteceu? — sem nenhuma vergonha a princesa me pergunta diretamente.
Ela foi a única a perguntar-me isso, ainda mais desprovida deste jeito desprovido dalgum indicio de timidez ou desaire. Mulheres nobres são realmente incríveis.
— É algo… delicado? Triste? Delicado e triste? Aconteceu algo inacreditável e detestável — eu tento explicar.
— Com o…? — ela espera por mim a fim de completar a frase.
— Lucius, meu irmão.
— Sim, sim, essa cousa aí — a princesa gesticula com o seu indicador direito.
— Bem, eu imaginava que algo devia ter acontecido. E se tu não queres falar sobre, não sou eu que irei atormentá-lo com isso — a jogar seus cabelos para o lado, ela diz — Sou uma mulher sensível e empática! — e com um sorriso em rosto ela completa a frase.
— Agora, diga-me uma cousa: tu és noivado? — novamente, sem vergonha alguma ela me pergunta. Desta vez um assunto totalmente diferente.
Eu olho para ela sem entender o que ela acabou de dizer, mas ela só mantém o próprio leque a cobrir a cara.
— Sim, Vossa Alteza. Estou noivo duma garota gentil.
— É? Que pena, eu ainda não tenho ninguém e tu me despertaste interesse — a princesa responde com uma leve decepção.
Diferentemente das baixas casas nobres, as mulheres das altas casas podem ter o luxo de escolher casar com quem elas querem ou até mesmo não se casar.
Por quê? Porque ceder a tua filha para um casamento tem como objetivo receber o dote e aproximar-se de casas da alta nobreza. Quando tu não tens necessidade deste dote, e já és da alta nobreza, o conubium só se torna algo prejudicial, espalhar o teu sangue e até mesmo posses para outras pessoas.
E já no caso específico da casa real, a Domus Primus, mesmo que se casem, as mulheres sequer são passadas entre uma casa para outra. Elas continuam a ser Primus invariavelmente a quem elas se casam. Obviamente, sequer existe um dote nesse caso.
Nenhuma das minhas irmãs está em estado de noivados, nenhuma das minhas irmãs sequer interagem romanticamente com homens de outras Domus. Não há necessidade para nós que isso aconteça.
— As pessoas deste mundo são tão chatas, não são? Aurelius. Em circunstâncias normais esse evento de hoje também seria chato.
— Era por isso que não querias vir? Vossa Alteza — eu pergunto a tentar receber novas informações.
— Também — sem nenhum problema ou vontade de negar a verdade, a princesa confirma.
— Apimentar as cousas com um evento nacional… — eu toco no assunto suavemente.
— Sim. Seria interessante isso — novamente: sem fardo aparente ela confirma o meu pensamento.
— Mas… tu não achas que aquela tua cartinha foi muito mais apimentada do que isso? — a princesa se levanta de seu assento e se aproxima de mim.
— Eu poderia apaixonar-me se tu me mostrasses cousas como aquela sempre… — ela sussurra no pé do meu ouvido.
Eu sinto um arrepio em meu corpo por um instante, mas imediatamente a afasto de mim. Eu não tenho problemas com o sexo feminino, mas… isso foi estranho.
— Apenas fiz o necessário, Princesa.
— «Apenas o necessário», huh? Imagino. Se isso é o que para ti é «necessário», pergunto-me quais outras surpresas tu irás reservar-me!
— E sei que tu queres saber sobre, em minha benevolência, então, contar-te-ei. Por tua sorte a cartinha amorosa só caiu em minhas mãos, ninguém mais leu. E eu estou a sentir-me gentil, bem generosa, irei tratar de facilitar as cousas para ti — ela diz a rir.
— Agradeço de coração, Vossa Alteza.
«Facilitar as cousas para ti». Um dos meus objetivos ao enviar aquela carta era com que ela burlasse com a própria autoridade toda a burocracia do pedido para alguém tornar-se um patriarca.
Claro, se ela não quisesse cooperar eu ainda teria formas de realizar esse objetivo, mas nada melhor do que ter a própria Princesa do seu Império ao seu lado.
— Enfim, conversei o que eu gostaria de conversar contigo por hoje. Boa sorte ao ser o novo patriarca dos Conflagratus, espero encontrar-te em breve.
A princesa diz sua despedida e realiza uma bela pose de cortesia para mim. Imediatamente eu me levanto de meu lugar e abro a porta para ela sair.
Após isso eu fico sozinho na sala, sozinhos com meus pensamentos.
— Ela é… muito assanhada não? Não tem restrição alguma, máscara qualquer — eu reflito só.
— Será que…
Ela agiu assim comigo porque eu mostrei a minha verdadeira face a ela? Não posso deixar de pensar nisso.
Pensamentos e pensamentos…