O inverno chegou com tudo naquele dia. A neve caia diariamente, deixando uma paisagem branca e melancólica, mas era bela e sua própria forma.
As pessoas agasalhadas durante o dia ainda faziam suas atividades normais, sem se importar muito com o frio avassalador.
Comparado a um dia de verão, que parecia ter uma atmosfera mais feliz, um dia de inverno parecia mais frio comparado a ele.
Mas isso só se aplicava durante o dia, pois a noite era igual para ambos.
Quando a noite caia e a lua não podia ser vista no céu devido às nuvens que o cobriam, o terror se instaurava no ambiente de tal forma que um passeio por cima da neve parecia uma volta em um mundo desconhecido, o qual podia guardar coisas que a mente humana não pudesse compreender.
Mas, para ele, aquela era a melhor parte. O horário que o caos podia ser implantado sutilmente na vida das pessoas.
Era muito antes dos portadores dominarem as noites. Uma época em que as organizações estavam envolvidas em um conflito incessante.
Natal de 2008. Em algum lugar perto do monte Zao.
O vento gelado soprava sobre aquele gigantesco tapete de neve, um local desabitado. Dentre os outros dias de inverno, esse era onde as nevascas estavam em seu ápice.
As pegadas de duas figuras ficavam marcadas no chão, mas eram rapidamente cobertas devido a forte ventania.
“Ei, sensei, para onde estamos indo?” Agasalhado e com luvas grossas em suas mãos, um garotinho perguntou.
“Hum? Bem, nós vamos visitar um lugar muito especial. Você vai entender quando chegarmos lá.”
O garoto fez um rosto confuso.
“Mas não tem nada aqui… e é muito frio.”
“Ryu, o que eu te disse sobre fazer perguntas desnecessárias?” O homem falou com um sorriso. Ele não parecia ter mais de 20 anos.
“Me desculpa…”
“Tudo bem. Mas não se preocupe. O que vamos fazer vai ser tão esplêndido que vai marcar a história.”
Algum tempo depois, eles já podiam ver os inúmeros monstros de neve que decoravam aquela paisagem completamente branca. Ryuu os olhou com admiração. Seus olhos brilharam por um momento.
“Você gostou? Pois prepare-se. O que vem a seguir é muito melhor.”
O homem se afastou sob os olhos curiosos do garoto e quando estava a uma distância razoável, parou.
“Yang-sensei, o que você vai fazer?”
“Eu? Nada. Só vou esperar. Fique parado aí. Se algo acontecer, use tudo o que eu te ensinei.” E em voz baixa, abafada pela nevasca, ele disse: “Embora eu não vá deixar algo sair de controle.”
Um som de percussão de repente ecoou acima do som do vento. Era um som calmo e que fazia lembrança nostálgicas de qualquer um vir à tona, como sinos de natal.
Por outro lado, era um evento macabro, já que não havia nada que pudesse reproduzir aquele som naquele local solitário.
Yang sorriu. Parecia que o que ele esperava começou mais cedo do que pensou.
Os sinos ficaram mais altos. Ryuu olhou ao redor, assustado.
“Está tudo bem. Veja e aprenda, Ryuu.”
Com toda a nevasca, a visibilidade era muito baixa, mas entre todo aquele horizonte branco, uma sombra gigante e olhos vermelhos surgiram. Um rugido ecoou. Como se o vento falasse.
“Aí está você… o monstro criado pela má vontade dos portadores e pelos inúmeros sentimentos negativos da humanidade, Frosty.”
Ryuu deu passo para trás, seus olhos arregalados. Ele sentia arrepios por todo o seu corpo que o implorava para fugir. Mas ao olhar para Yang, que se mantinha inabalável, ele decidiu permanecer ali.
Ele sabia o quão forte a pessoa que o criou era.
O garoto encarou Frosty. Não dava para ver sua aparência, mas ele parecia ter mais de três metros de altura, seu corpo coberto por pêlos. Além disso, só conseguia sentir sua presença aterrorizante. Seus rugidos agitavam o ambiente, deixando a nevasca mais e mais poderosa, que podia até arrastar o garoto, o qual foi obrigado a ajustar seu centro de gravidade e cobrir o rosto com os braços.
Mesmo diante dele, Yang não dava um passo para trás e seu sorriso não saia do rosto.
“Datas comemorativas são cheias de sentimentos… E o natal é o palco perfeito para lembranças ruins e sentimentos amargos. Isso tudo reunido deu origem a essa aberração.”
Foi quando Frosty se aproximou ao perceber a presença dos dois humanos.
Sua cabeça era semelhante a de um coelho, assim como suas orelhas, olhos vermelhos profundos e apavorantes, sua boca cheia de presas afiadas e sujas, a qual já tinha tragado a centenas ou milhares de alvos. Seus pêlos brancos como a neve pareciam uma majestosa barba por todo e seu corpo e rosto, suas mãos possuíam quatro dedos, dos quais garras afiadíssimas cresciam e suas pernas lembravam patas de lobos.
A criatura encarou Yang fixamente, como se o analisasse antes de matá-lo. No segundo seguinte, estendeu seus braços longos e bateu palmas, com Yang no meio de suas mãos.
Outra forte ventania foi gerada com esse gesto e a neve criou uma cortina branca, que fez Yang desaparecer da visão de Ryuu.
“Yang-sensei!”, ele gritou, mas sua voz não conseguia sobrepor o som do vento.
Frosty afastou as mãos para ver sua presa esmagada entre seus dedos, mas não foi assim que aconteceu. Yang estava lá, ileso. O monstro rugiu outra vez e tentou abocanhá-lo, mas o homem segurou seu focinho e apertou, evitando que ele escapasse.
“Você é até forte. Mas não o suficiente pra mim.” Em seus olhos, a psicopatia. Em seu sorriso a maldade e tudo o que a humanidade poderia fazer de horrível. Frosty encarou aqueles olhos roxos que pareciam brilhar.
Frosty sentiu medo. Ele percebeu que era tarde demais, mas ainda rugiu fortemente na esperança de se libertar, e lançou suas garras contra o homem, mas duas barreiras roxas translúcidas o impediram e Yang riu com toda a sua alma.
“Que patético. E pensar que você causa tanto medo nas pessoas. Ryuu. Veja bem quem é o mais forte aqui.”
Yang largou o focinho da criatura e simplesmente sumiu de onde estava, aparecendo em segundos perto dos olhos de Frosty. Ele balançou sua mão horizontalmente e os olhos de Frosty foram cortados.
Ele urrou de dor e agonia enquanto se afastava.
“Nível 1: Dominante.” Uma espada brilhante nas mãos de Yang foi manejada veemente e um dragão de luz, que tinha o triplo do tamanho de Frosty, caiu sobre ele o pressionando contra o chão.
Um calor imenso foi gerado no impacto e a neve ao redor deles derreteu completamente, junto a uma explosão que fez a nevasca parar por alguns segundos em uma grande área em torno deles.
Vários segundos de silêncio vieram em seguida. Logo, o som da nevasca retomou sua posição e começou a preencher o espaço criado com neve.
Ryuu estava sem palavras. Ele observou atentamente toda a luta e apenas confirmou o que ele sempre pensou ser: o verdadeiro monstro ali era Yang.
