— Ufa! Ufa! Ufa!
Zernen e eu suspiramos de alívio e cansaço enquanto estávamos encostados numa parede que fazia parte de um caminho estreito e escuro.
— Agora me explica o que está acontecendo, Jarves? Você parece saber muito daqueles três, sendo que acabou de conhecer eles.
— Esqueceu da minha visão do futuro?
A desculpa que sempre me salvava de tudo. Qualquer coisa que revelasse sem querer, eu poderia contar muito bem com essa desculpa que nunca falhava.
— Ah, é mesmo! E então, o que você viu dessa vez?
— O que você precisa saber é que aqueles gêmeos possuem um poder chamado “Harmonia musical”, é um tipo de habilidade que lhes permite fazer tudo que desejam dentro de uma certa música.
— Tudo, tudo mesmo?
Ele arregalou os olhos, pasmado.
— Dentro de uma certa música. Por exemplo, se eles souberem a música que controla o vento, eles podem tocar ela.
— Oh, entendi! — Ele sorriu, mas depois me olhou com uma expressão confusa enquanto balançava a cabeça ligeiramente, colocando o dedo na testa. — Mas espera, vento tem música?
— É complicado até para mim explicar isso, mas não temos tempo para isso. Eu sei que eles vão aparecer já, já, então quero que me escute com atenção.
Zernen balançou a cabeça prontamente.
Expliquei a ele duas coisas fundamentais que ele deveria saber sobre os gêmeos musicais, para que não pudéssemos ser derrotados facilmente.
A primeira era que, quando você usasse um tampão de ouvidos e a música não chegasse na sua cabeça, eles não podiam manipular seu corpo e mente, ou seja, te obrigar a fazer algo. Já na segunda, o arroto era uma arma praticamente letal contra eles.
Ainda bem que o autor havia colocado esses limitadores para que Meredith e os outros pudessem derrotá-los no primeiro encontro que tiveram, se não, a gente estaria em perigo.
E por falar em perigo, os nossos visitantes chegaram…
Dessa vez, estavam flutuando no ar enquanto nos observamos como se fôssemos meros mortais.
— Não adianta fugir — Mu disse, pousando seus olhos gélidos enquanto tinha os dedos postos naquela guitarra de piano, preparado para a tocar a qualquer momento.
— Parece que eles não têm noção do quão poderoso somos — acrescentou Cal, balançando a vareta do violino no vento.
— Então mostremos a eles o significado de poder!
Com um sorriso sádico, Zi elevou sua gaita aos lábios.
Quando eles iam tocar seus instrumentos ao mesmo tempo, ordenei que Zernen arrotasse o mais alto possível, mas parece que não adiantou…
— Essa técnica de novo? — Mu emitiu, seguido do seu irmão Cal, que movia a vareta com majestade.
— Não vai funcionar.
— Porque nós usamos tampões de orelhas — Zi sorriu, elevando a Gaita as suas orelhas, que continham um algodão que se misturava com a cor de seus cabelos entre suas muitas madeixas.
Bem que eu sabia.
— Agora… — Cal moveu a vareta as cordas do violino.
— Vamos… — Mu gesticulava os dedos para as teclas e Zi finalizava, passando a gaita em seus lábios.
— A isso!
A propósito, outro detalhe sobre os gêmeos é que eles intercalavam nas falas, gerando uma sincronia. Um vício de nascença que eles sempre tiveram. Era como se a mente deles fosse a mesma. Mas, com a habilidade que eles tinham, não me espantaria se eles lessem a mente um do outro.
— Que coincidência, nós também!
Quando ouviram isso da boca de Zernen, desistiram de tocar a música que queriam tocar e mudaram a posição das mãos para outra parte de seus instrumentos.
— Prepare-se, Zernen!
— Já nasci pronto!
Como eles não podiam usar nenhum ataque que incluía manipular corpo e mente, então só restava nós se esquivarmos dos ataques externos que eles lançariam.
Quando tocaram sua música, um pedaço de pedra saiu da parede e se interligou a outra parte da parede, quase nos esmagando, se não tivéssemos reagido a tempo.
Mas não parou por aí, outros pedaços de pedras vieram até nós com muita velocidade enquanto corríamos para sair daquele beco. Muitas vezes tínhamos que nos agachar e saltar enquanto nos aproximávamos mais e mais do fim do beco, mas quando estávamos perto da saída, uma parede grande se pôs diante de nós como num passe de mágica, selando nossa opção de saída.
Zernen até tentou usar seu soco invisível, mas não resultou, ela era forte demais, sequer uma racha havia surgido.
— Parece que é o fim da linha para vocês — quando Cal emitiu isso, vagamos por instantes nossos olhos a procura de uma possível solução e, por coincidência, ela estava bem a nossa frente. Aquelas pedras interligadas haviam formado uma ponte entreaberta, nossos inimigos haviam criado uma chance de fuga sem querer.
Eu e o Zernen trocamos olhares e sorrisos triunfantes.
— Tá pensando no que estou pensando?
— Vamos a isso!
Corremos para aquelas pedras e saltamos por cima delas, enquanto desapareciam uma por uma ao som da música que eles criavam com os seus instrumentos.
— Zernen, você pode me arremessar?
— Já estava demorando para perguntar! Vem!
Zernen, que estava um pouco adiante, juntou ambas as mãos enquanto eu corria, saltando para o alto. Peguei impulso das suas mãos e saltei mais alto ainda. No meio do processo, Zernen saltou e pegou no meu pé.
Estávamos quase chegando ao topo, quando o telhado de cimento, suficiente para cobrir aquele todo beco, ficou diante de nós, tornando todo o lugar tão escuro que eu mal conseguia identificar direito os meus membros.
“Só pode ser brincadeira…”
— Transferência de mana!
Senti meu corpo ficando mais energizado com a mana que saía do corpo do Zernen, o que me fez destruir aquela parede com um soco.
Peguei em uma das partes do buraco que havia aberto naquele telhado e saltei para cima, puxando Zernen comigo.
Os gêmeos que voavam ao alto sorriam maliciosamente.
— Caramba… — Zi deu um sorriso.
— Olha como eles são… — Cal continuou, movendo sua varinha.
— Insistentes demais. — Finalizou Mu com uma expressão carrancuda.
Começamos a correr, pulando de edifício em edifício enquanto eles nos seguiam voando em pleno céu estrelado.
Ao som de sua música, espinhos surgiram no telhado dos edifícios. A sorte é que nossa reação foi rápida. Saltamos daquele edifício para baixo, mas no processo, um vento impetuoso acelerou nossa queda naquela altura de sete metros enquanto eles nos observavam com expressões que ilustravam satisfação.
“Droga… Desse jeito… “
— Explosãoooo!
A menos de poucos centímetros de virar carne moída, Zernen soltou uma pequena explosão das costas que nos arremessou para cima, indo de encontro a eles.
Mas para o nosso azar, eles tocaram uma melodia que gerou espinhos que desciam como breves chuviscos enquanto nossos corpos executavam movimento retrógrado ao chão, puxados pela força da gravidade.
Arregalei os olhos, meu coração acelerou. Nem havia tempo para pensar ou fazer qualquer coisa. Nos restava apenas aceitar o nosso fim…
“Nem acredito que vai terminar assim… Eu ainda tinha muita coisa por fazer… Realmente, um final horrível dentro de um final horrível.”
Fechei os olhos, despejando lágrimas em meio a um sorriso triste, enquanto Zernen esticava um dos braços com os olhos arregalados, numa tentativa inútil de usar suas habilidades, mas sua mana já o havia abandonado…
— Desaparecer!
Um raio de luz…
De repente, aqueles espinhos sumiram e nos vimos segurados por um tecido vermelho que amorteceu nossa queda.
Apesar de que no final o tecido rasgou e caímos, mas com os ossos e o corpo conservado. Ufa! Nunca fiquei tão feliz de ver essas duas como estava agora.
— Caramba, se vocês não tivessem chegado a tempo, teríamos perdido as botas! — Zernen levantou-se com os olhos cintilantes enquanto cerrava os punhos, nem pareceria o mesmo desesperado de há pouco.
— É batido as botas, Zernen — murmurei enquanto esfregava meus olhos com um sorriso.
— Não é a mesma coisa? Hahahaha!
Ele riu enquanto coçava a cabeça.
— Pessoal, estou feliz em ver vocês!
Sorri, tentando abraçá-las, mas elas estranhamente deram um passo para trás, o que me fez me cheirar para ver se era algo comigo.
— Eu também, que bom que chegamos a tempo — Theresa respondeu com um sorriso.
— Fracamente, tinha que ser vocês a nos darem trabalho. — Frida suspirou de decepção, colocando a mão na testa.
— Se estão aqui, então quer dizer que derr… Já agora, quem é aquele lá encostado na parede?
Só agora que eu tinha percebido o cara lá amarrado encostado na parede. Mas antes que Theresa e Frida pudessem me responder, nossa atenção foi atraída por aqueles gêmeos que desciam em direção a nós.
— Acho que pode esperar, agora temos um perigo eminente para nos preocuparmos.
Cerrei os punhos, mordendo os lábios enquanto franzia as sobrancelhas.
Nesta altura, Meredith encarava de joelhos dobrados o homem a sua frente, que formavam uma barreira esférica de unhas ao redor dos dois com uma de suas mãos esticada.
— Fique aqui, princesa, eu irei cuidar de tudo.
— Sem formalidades. E eu ainda posso lutar, isso não é nada. Esse oponente, quero ser seu eu mesma a tirar a cabeça dele!
Meredith cerrou os punhos na alça da espada.
— Se puder sair, venha.
Enquanto Fred caminhava, um papel acabou caindo do seu bolso, pousando nas coxas de Meredith
A barreira esférica de unhas se fechou, trazendo escuridão enquanto ela observava aquele papel fixamente.
— E, agora, vejamos o que faço contigo…
Fred sorriu, encarando Gar severamente.
— Entendi, então você sobreviveu contra os meus subordinados, mesmo eles tendo uma poção que lhes permite subir de nível.
— Nem tiveram chance de usar.
Fred riu, gesticulando uma das mãos.
— Os enganei, omitindo meu verdadeiro nível para dar um golpe sorrateiro depois.
— Hum, entendo. Eles foram muito burros, como esperado de subordinados.
— Como se você fosse o inteligente aqui.
— O suficiente para te matar!
Em um instante, Fred olhou para trás, visualizando a sombra de uma silhueta com dois olhos em chamas, que o arremessou até uma parede com um chute na sua coluna.
— Você é rápido, gostei.
Com um sorriso largo, Fred travou com a ajuda de suas unhas que se posicionaram nas suas costas, mas tomou um soco na barriga que o arremessou de uma vez por todas contra o edifício enquanto ele despejava saliva no processo.
Seu corpo colidiu, formando uma cratera e uma grande poeira.
— É só isso que você tem a dar? Vamos, levante!
— Com você, eu posso lutar a sério!
Quando Fred levantou, tomou outro soco na barriga e dois no rosto, dando início a uma série de socos contra sua cara enquanto ele estava encostado contra a parede.
Mas no meio de tanta dor, ele continuou sorrindo, o que levou com que Gar estranhasse.
— Não é bom se aproximar de mais do seu oponente…
Unhas que saíram dos pés do Fred atacaram as pernas de Gar, o fazendo recuar.
— Tá, eu admito, você é mais forte que eu neste momento.
— Acha que, dizendo isso, eu te pouparei do sofrimento?
— Nunca vi uma pessoa tão prepotente e arrogante como você, sério.
— E nunca mais verá! Queime!
Quando Gar cerrou os punhos, uma chama tomou conta das vestes de Fred, o fazendo gritar de agonia enquanto tentava apagar aquelas chamas desesperadamente.
— Agora, vou cuidar…
Assim que Gar virou, sentiu um grande soco na nuca que o arremessou para um dos edifícios.
Ele travou antes mesmo de colidir contra a parede, enfrentando Fred com os olhos severos.
— Como você…
— Não viu o brasão de fogo nas minhas vestes, não é por enfeite não…
— Entendo, então você também pode usar chamas.
— Quem dera, mas eu só posso usar elas como combustível para tornar minhas unhas mais fortes ao mesmo tempo, em que sou imune.
— Interessante… — Um sorriso largo formou-se em seus lábios enquanto estalava seu pescoço dolorido. — Parece que uma escória como você valerá a pena destruir!
— Tenho de agradecê-lo por me deixar mais forte.
— O que você…
Imediatamente, Gar se viu rodeado de milhares de unhas, inclusive as que formavam uma esfera ao redor da Meredith haviam se desfeito e agora giravam numa velocidade avassaladora.
— Eu tenho minha armadura, hahahaha! Isso não vai resultar!
O corpo de Gar foi imediatamente revisto de escamas, mas ele arregalou os olhos e ficou confuso quando viu que as unhas que giravam ao seu redor começaram a retornar ao dono.
— Ué?
— Morraaaaaa!
Quando Gar olhou para trás, viu uma espada colidir contra sua escama, o arremessando subitamente.
— Você ainda insiste nisso?
Gar rangeu os dentes, observando aquela ruiva com olhos azuis estreitos enquanto veias rebentavam seu rosto a medida que empunha mais força na sua espada.
— Magia de peso, tornar leve como papel!
— O quê?
Gar viu suas escamas começarem a voar, se espalhando como penas ao vento.
— Sua magia não era aumentar o peso das coisas, como…
Gar vislumbrava, de olhos arregalados, a lâmina daquela espada atravessar seu abdômen e sair por suas costas. O sangue que ele expeliu da boca saltou para o rosto enfurecido daquela princesa enquanto ele caia no chão.
— Isso não te interessa, agora morra!
Meredith montou no abdômen dele rapidamente e moveu a espada sem nem hesitar contra seu peito.
No entanto, seu golpe não foi concluído…
Um buraco negro, tão grande que facilmente poderia engolir um daqueles edifícios inteiros, não fosse a distância, se abriu, provocando espanto na princesa.
— O que é isso?
Com um sorriso, em meio aos dentes tingidos de sangue, Gar emitiu.
— Agora é o fim para vocês! Se acharam espertos, não é? Agora já era!
— Princesa, segure minhas mãos!
Fred tentou alcançar Meredith, mas era impossível dado a distância que os separava enquanto caíam naquele profundo abismo.