Aconteceu exatamente como eu havia visto na série; o tão aguardado momento em que o herói principal salvou a Meredith!
É claro que eu não poderia perder essa cena, por isso segui a carruagem da Meredith bem de longe e também… Porque eu estava preocupado com ela.
As intervenções que fiz poderiam ter desencadeado outra linha temporal em que a Meredith não era salva pelo herói e, consequentemente, morresse.
E isso eu jamais poderia deixar acontecer.
— Inimigos!? — o herói questionou, apontando a espada para nós dois ( Eu e o meu parceiro de negócios), enquanto segurava sua donzela.
— Não, viemos em paz — eu disse, enquanto levantava os dois braços. Ele baixou a espada, suspirando de alívio.
— Bem, então posso presumir que conhecem essa mulher?
— Sim. — Balançamos a cabeça positivamente.
— Menos mal — ele disse, a carregando em seus braços enquanto vinha até nós. — Então podem ficar com ela, enquanto eu levo aquele homem para as garras da justiça. — Ele entregou a Meredith aos meus braços e eu o olhei estranhamente.
Não era assim que devia acontecer.
Na história, ele colocou todos na carruagem e levou a Meredith para uma pousada mais próxima e, depois, saiu para entregar o mordomo para os soldados.
Após isso, ele ficou com ela um pouco na pousada até ela melhorar e, por fim, foi embora, mas tendo antes plantado uma semente de amor no coração da Meredith.
E lá, num futuro não tão distante, eles se encontrarão e é aí que começará o desenvolvimento amoroso.
— Ei, você não deveria levá-la a uma pousada mais próxima e cuidar dela?
— Vocês não são os amigos dela?
— É… Somos… Mas…
— Então? — Ele pegou o mordomo e o colocou sobre os seus ombros. — Cuidem dela como bons amigos que são! — Ele caminhou, passando por nós.
“Hã? Isso não deveria estar acontecendo.”
— E, ah!
Ele virou, nossos olhos se cruzaram.
— Caso ela precise falar com ele, diga que o deixei sob a custódia da prisão mais próxima dessa cidade.
— Espera. Nós podemos levar ele para prisão enquanto você leva ela para uma pousada.
— Hã?— Ele ergueu uma das suas sobrancelhas. — Como podem confiar a vossa amiga a um estranho? Vocês são mesmo amigos dela?
— Ele tem razão, Jarves! Que ideia é essa?! Ela é a mulher do nosso sócio, não podemos deixá-la nas mãos de qualquer um.
“Não é qualquer um, é o herói principal da história!”
“É o futuro par romântico da Meredith!”
— Bom, vejo vocês um dia desses. — Ele seguiu caminhando por aquele beco, desaparecendo da nossa visão.
É… Parece que eu não deveria ter aparecido mesmo, acabei mudando um pouco a história.
Mas nada estava perdido!
Eu só precisava contar para Meredith algumas verdades sobre o herói e, depois, procurar o herói para visitá-la na pousada.”
“Isso Jarves, vai dar certo!”
Comecei a rir.
— Do que está rindo, Jarves?
— Você não vai entender, Zernen. Você não vai entender. — Fomos para a carruagem. Zernen ficou como cocheiro enquanto eu ficava com a Meredith no banco de trás.
Ela era tão linda quando dormia; seu rosto era tão macio e seu cabelo ruivo tão sedoso.
Quem diria que eu teria um momento como esse com a minha personagem favorita?
Soltei um sorriso, voltando os meus olhos para janela enquanto o Zernen manejava a carruagem para fora daquele beco. A carruagem percorreu algumas ruas da cidade, estacionando numa das pousadas mais próximas desse distrito.
Carreguei a Meredith em meus braços e comecei a caminhar em direção a pousada. Era basicamente uma construção réis-do-chão primeiro andar; com vasos sobre as janelas.
Que nostalgia. Era exatamente a mesma pousada que o herói havia trazido a Meredith.
Empurrei a porta, contemplando algumas pessoas sentadas em suas mesas; comendo, enquanto uma serva com avental servia vinho de mesa em mesa. Alguns dos olhos voltaram-se para nós, mas eu segui caminhando até aquela mulher de óculos de grau no balcão.
Seus olhos negros deixaram o papel que segurava e foram direcionados a mim.
— Por favor! É uma emergência! Vocês têm um quarto disponível?! — Eu não aguentava mais carregar a Meredith, ” que mulher pesada.”
— Tem sim… Mas…
— Aonde por favor?!!!
— Primeiro, precisa executar o pagamento.
— Você não está vendo que é uma emergência?!
— Desculpa, é que mês passado tivemos um caso semelhante. Um homem que carregava uma mulher nos seus braços do mesmo jeito que você está fazendo, dormiu em nossos quartos, aproveitou-se das nossas comidas e não pagou.
“Caramba, eles devem ter ficado traumatizados. Mas isso não importa, não tenho nada a ver com isso! Eu não aguento mais carregá-la…”
— A senhorita não vê que eu estou sofrendo? Cadê o mínimo de amor ao próximo?!
— Foram essas palavras que o homem disse.
“É sério isso?”
Olhei para os lados e ninguém estava disposto a pagar a conta para mim. Se eu soubesse que isso ia acontecer, teria levado algum dinheiro comigo.
— Eai, Jarves… — Zernen se aproximava com um sorriso enquanto carregava uma sacola. — Olha só o que eu encontrei! Estamos ricos!
— Moça, ele vai pagar. Pode ser? Agora me indica o quarto!
— Certo. Certo — Ela assentiu, meneando a cabeça. — Calim, vem aqui!
Um grandão com a cara rechonchuda e com barba por fazer, saiu por detrás de uma cortina castanha.
— Chamou, chefe?
Sua voz grossa ressoou pelos meus ouvidos.
— Leve esse homem ao quarto número 4.
— Tá bom, chefe!
“Que cara assustador” , mas ele nos levou para o quarto número quatro que ficava lá encima enquanto o Zernen pagava a nossa estadia.
— Aqui é o vosso quarto. — Ele abriu a porta e eu entrei, correndo em direção a cama. Com os braços dolorido, deixei cair a Meredith naquela superfície macia.
” Céus, o que essa mulher come?”
Suspirei, ajeitando-a na cama e cobrindo-a com o tecido castanho.
“Fracamente, esse trabalho é do herói. Ele é quem devia fazer isso, não eu.”
— E agora… — Sentei em uma das cadeiras de madeira, suspirando levemente.
“Pelo que eu sei, a Meredith vai demorar algum tempo para acordar e é esse tempo que o herói usou para comprar algumas poções de curas que renovem rapidamente as toxinas que Meredith inalou.”
“Mas tudo bem deixá-la sozinha, não é?”
“Acho que não tem problema.”
Me levantei da cadeira e segui andando em direção à porta, contemplando por último a Meredith. Agora precisava achar o Zernen, ele estava demorando demais… Já devia estar aqui.
“Pelo menos vou usar o dinheiro que ele encontrou para comprar as poções de cura para a Meredith.”
Desci os degraus da escada e quando coloquei os meus pés nos réis-do-chão me deparei com aquela visão… Aquele idiota estava gastando o dinheiro para compra das poções de cura da Meredith com comida. Haviam muitos pratos de carne e bebida sobre a sua mesa.
— Seu louco! O que você está fazendo?! — gritei, correndo em direção à sua mesa. Ele com um sorriso, me ofereceu um pedaço de carne:
— Aqui! Vamos comer!
— Me passe o dinheiro agora! — Exigi, colocando as duas mãos sobre a mesa.
— O quê? É meu. Eu é que encontrei!
— É para comprar poções de cura para a Meredith!
— Ah, por que não disse logo? — Ele retirou um saco de moeda de ouro do seu bolso, colocando sobre a mesa. — Se é para a noiva da nossa fonte de renda mensal, tá tudo bem, não é? Afinal, sempre podemos pedir para ele repor os gastos!
— O quão visionário você ficou? — Soltei um sorriso torto, pegando aquela sacola de moedas. — Bem, eu volto já. Depois que acabar de comer, vá controlar a Meredith!
— Pode deixar!
Ele balançou a cabeça positivamente, trincando aquela carne e eu suspirei, caminhando para fora da pousada.
“Francamente, quando eu ganhei responsabilidade? “
Ah, suspirei. Aquelas palavras do meu pai atingiram o meu coração novamente:
” Filho, você pensa que cuidar dessa família é fácil? Um dia você ganhará responsabilidade.”
” Não me jogue pragas, pai!”
Foi o que respondi, mas agora as palavras dele estavam se cumprindo na minha vida. Isso tudo só porque o herói abriu mão do seu trabalho de cuidar da heroína.
“Certo, Jarves. Depois que você cuidar da Meredith, não haverá mais responsabilidades, será só… Espera um pouco, ah… Não…”
Acabei de lembrar que, depois disso, a Meredith tende de voltar para o seu distrito para descobrir aquela traição. Poderíamos pular logo essa parte, era um dos momentos da trama que mais me fazia chorar. Dói só de lembrar.
Balancei a cabeça negativamente, buscando me livrar daqueles pensamentos.
Pronto, finalmente cheguei à loja que o herói veio comprar as poções mágicas, que por sinal, era onde ele conheceu uma das melhores usuárias de magia de cura que esse reino tinha.
Entrei na loja, experimentando aquela doce fragrância emanada pelas plantas espalhadas por todo aquele espaço; parecia mais uma floricultura. Depois, direcionei os meus olhos as prateleiras repletas de potes com ervas e líquidos em diferente cores enquanto caminhava ao balcão.
— Seja bem-vindo à farmácia Zerth do distrito de Hellen — disse a moça do balcão. Trajava um jaleco que cobria suas vestes interiores. Seus cabelos azuis repousavam sobre os seus ombros. — O que deseja?
— Desejo poções de cura para uma amiga minha.
— O que ela tem?
— Ela foi atingida por um gás tóxico.
— Engraçado que um homem passou daqui há pouco tempo e disse que precisava de uma poção de cura para uma amiga que foi atingida por um gás tóxico.
“Wow! Então ele passou daqui?”
Um sorriso preencheu os meus lábios.
“Ah, que alívio. Agora, ele vai visitá-la e cuidar dela. Agora sim, herói! Gostei!”
— É a mesma pessoa?
— Sim.
— Ainda vai querer?
— Não. Para quê gastar dinheiro à toa, né?
Comecei a rir. Pelo menos, o herói me fez poupar algumas moedinhas de ouro.
— É sempre bom prevenir do que remediar.
— Como assim?
— O seu amigo pode, por descuido, ser assaltado, deixar cair a poção e entre muitas outras coisas que podem acontecer no caminho.
— É impossível.
“Afinal, o destino dele é cuidar de Meredith.”
— Não subestime o destino.
— Obrigado pelo aviso. — Dei as costas a ela. — Agora estou indo.
— Espera!!
Virei.
— Por favor! — Ela juntou as mãos em oração. — Compre pelo menos uma coisa na minha loja, se não ela vai cair em falência! Ultimamente as compras têm diminuído bastante, porque muitos dos aventureiros não saem mais em aventuras por conta da crise financeira enfrentada pelas guildas.
“Parece que a ruína desse reino é inevitável, ele irá despencar antes mesmo que os monstros possam invadi-lo.”
— Sabe, eu também preciso do dinheiro.
— Você ia comprar a poção, não ia? Então…
Ela ficou insistindo com aquela carinha mansinha que só ela sabia fazer. Então, não tive escolha se não comprar a tal poção de cura e algumas ervas que ela me obrigou a comprar com o seu papo furado.
— Volte sempre!
Fechei a porta da loja, partindo em direção à pousada.
” Não acredito que caí no papo furado da Theresa! “
“Mas bem… Como ela disse, é melhor prevenir do que remediar.”
Ao chegar na pousada, a recepcionista me cumprimentou com um sorriso colgate enquanto balançava a mão ligeiramente.
Fiquei com medo, “o que será que deu nela?”
“Bem, não importa.”
“Agora tenho que correr para ver a tão aguardada cena do herói segurando as mãos da Meredith enquanto ele passa a mão sobre sua cabeça…. “
“O quê!?”
— Cadê o herói?!
— Herói? — questionou Zernen, balançando a cadeira que ele sentava contra a parede.
— Aquele rapaz que salvou a Meredith! Ele deveria estar aqui!
— Hummm… Aquele rapaz. Hum! Ele esteve aqui, me entregou umas poções de cura, desejou melhoras e foi embora!
— Mas o que esse herói tem na cabeça? Ele deveria estar aqui, cuidando da Meredith!
— Hã? Não estou gostando da maneira como você fala, Jarves. — Ele parou de balançar a cadeira, me olhando severamente.
— Hã?
— É que você fala como se aquele rapaz fosse o marido dela.
“Agora ele me pegou.”
— Não, é que… — suspirei. — Deixa para lá. Eu estou ficando louco.
— Depois ti passo um remédio muito bom para a cabeça, funciona que é uma beleza!
— Não quero.
Ele começou a rir. Meredith despertou do seu sono profundo, meneando a sua cabeça levemente.
Corri imediatamente para o pé da cama.
— Eu… Onde eu estou? Foi tudo um sonho?
— Não — respondi, atraindo os seus olhos azuis.
— Mendigo? Por que você está aqui? Cadê aquele cavalheiro que me salvou? — Ela colocou a mão sobre a testa, lágrimas começaram a fluir dos seus olhos. — Tá tudo tão confuso…
Me doía ver a Meredith sofrendo assim, ela não merecia passar por isso tudo.
— O que eu fiz para merecer isso?
“Nada, minha Meredith.”
“O autor cruel é que escreveu um enredo assim, que te machucasse.”
— Pensando bem, por que o mordomo queria assassinar a noiva da nossa renda mensal? — questionou Zernen. — Ele não estava recebendo bem?
Mas antes que eu pudesse respondê-lo, a minha atenção foi atraída pela voz da Meredith.
— Você aqui, não pode ser uma simples coincidência, não é? — Os olhos azuis da Meredith ficaram severos. — Você sabia de tudo isso, não sabia?
“Para de montar as peças, Meredith, que assim vai dar trabalho arranjar desculpas.”
— Quem é você?!
“Droga, o que eu falo?”