— Luiz, você realmente entendeu? — perguntou Ana, lançando um olhar afiado na direção do homem enquanto caminhavam vagarosamente pela floresta. As folhas secas farfalhavam sob os pés do grupo, e a luz do sol filtrava-se entre as árvores, criando sombras dançantes no chão.
Luiz, cuja expressão permanecia tranquila por trás da máscara escura, assentiu.
— Sim, sim. Vou acompanhar os emissários para as cidades menores, e se as negociações ficarem complicadas… posso dar uma “ajuda” — ele repetiu as palavras com de forma levemente zombeteira, mas o tom em sua voz indicava que estava completamente consciente da importância da tarefa.
Ana parou de andar por um momento, girando o corpo levemente para encará-lo.
— E o que mais?
Luiz suspirou, como se estivesse cansado daquela revisão constante.
— Nas cidades grandes, nada de truques mentais. Não queremos despertar suspeitas ou, pior, uma guerra. Não agora. Não enquanto estamos apenas começando a nos fortalecer e bla, bla, bla.
Ana acenou com a cabeça, satisfeita.
— Certo, é isso. Não se esqueça.
O grupo continuou sua caminhada pela floresta, movendo-se com uma estranha combinação de urgência e calma. Ana olhou para os emissários escolhidos, os mais carismáticos que conseguiram encontrar entre os mascarados. Não era uma seleção fácil, mas o grupo formado parecia adequado para a tarefa.
— Lembrem-se — Ana disse, dirigindo-se ao restante do grupo. — O foco deve ser negociar qualquer tecnologia médica ou de pesquisa que conseguirem. Tudo o que puderem encontrar. Os recursos que encontramos nas ruínas não foram suficientes, e precisamos de mais para alcançar nossos objetivos. E além disso… — ela parou por um momento, como se estivesse refletindo sobre suas próximas palavras. — Espalhem a notícia de que um novo reino está surgindo. Não exagerem, só precisam saber que estamos aqui.
Ela lançou um último olhar a Luiz.
— E, pela última vez…
— Usem suas máscaras o tempo todo. Não quero que nossas identidades humanas sejam reveladas. Deixem que pensem que somos amaldiçoados. Isso nos dá uma vantagem estratégica — completou Luiz, interrompendo a mercenária, quase como se estivesse recitando uma lição ouvida dezenas de vezes.
— Exatamente. Que eles temam o que não conhecem — respondeu Ana, satisfeita com a resposta.
Finalmente, chegaram a uma clareira em meio ao bosque, onde a luz do sol penetrava mais forte, iluminando o círculo de arbustos ao redor. Era o ponto onde se despediriam antes de cada um seguir seu caminho.
— Vocês sabem o que fazer. Cuidem-se e voltem com boas notícias.
Os emissários fizeram reverências curtas antes de seguirem. Luiz foi o último a partir, dando um aceno de adeus para Ana, que permaneceu imóvel, observando até que ele sumisse de vista.
Quando o silêncio da floresta voltou a dominá-los, Ana se virou para sua outra companhia, a conselheira cuja máscara de ave de rapina combinava muito bem com o ambiente.
— Emily, agora é sua vez.
Na noite anterior, Ana havia passado horas analisando os mapas que ela lhe fornecera. Embora fossem bem detalhados, estavam muito aquém do que ela queria. Como Emily era a responsável pelo território, Ana decidiu que, ao invés de simplesmente apontar os erros, ela demonstraria pessoalmente as informações necessárias.
— Esses terrenos aqui, por exemplo, têm um potencial estratégico claro, mas os mapas não destacam isso — disse Ana, apontando para uma pequena elevação que poderia ser usada como um ponto de defesa natural. — E ali, aquele solo é fértil, mas perto demais do que parece ser uma mina de sal. Essas coisas precisam ser devidamente catalogadas.
A estátua parecia tímida, mas ouvia atentamente cada palavra de sua rainha, absorvendo cada detalhe enquanto anotava mentalmente as instruções. Ana continuou a caminhar, descrevendo os recursos naturais, solos que poderiam ser usados para agricultura, diversos tipos de planta, fontes de água e até mesmo locais que poderiam esconder minas valiosas.
— Refazer esses mapas não é apenas uma questão de precisão, mas de entender o que está em jogo. Precisamos saber onde cada coisa está localizada, qual o melhor uso para cada área e, principalmente, como defender isso — Ana afirmou com uma seriedade que Emily raramente havia visto nela.
— Entendido, minha senhora. Vou começar agora mesmo — respondeu Emily acenando para um pequeno grupo de mascarados que a seguia. Ela passou as instruções rapidamente, e os mascarados se curvaram levemente para Ana antes de se espalharem pela área, prontos para identificar cada detalhe visando adequar-se ao novo padrão exigido.
— Ana. Esse é meu nome, não minha senhora — murmurou a mercenária, segurando levemente o braço da conselheira que se preparava para partir. — Não me faça ficar repetindo a mesma coisa mil vezes…
— Certo… Ana…
— Ótimo. Agora, pode ir.
Vendo a figura adentrar na mata com eficiência, Ana ficou sozinha por um momento. Estava satisfeita com a prontidão deles, mas sua mente não parava. Obter os recursos de um reino inteiro poderia tornar sua vida tranquila de estudos muito mais simples, então não via a hora de terminar tudo, se irritando por saber que não havia como acelerar ainda mais.
Enquanto divagava sobre o futuro e caminhava em direção a um ponto elevado para ter uma visão melhor do território, algo no chão chamou sua atenção. Era um inseto peculiar, brigando ferozmente com uma vespa. O inseto não parecia ter muita chance na luta, mas algo nele prendeu o olhar de Ana. Ela nunca havia visto uma espécie como aquela. Ficou observando por um instante, intrigada pela batalha desigual.
— Que criatura estranha… — murmurou, inclinando-se para examinar o pequeno ser. Suas cores eram vibrantes, com um tom avermelhado que brilhava mesmo na luz difusa da manhã.
Sem pensar muito, decidiu intervir. Com um pisão firme, esmagou a vespa que o ameaçava, libertando-o de sua predadora. Curiosa, ela cuidadosamente pegou o inseto em um dedo, observando suas características com mais atenção. A aparência dele era bizarra, possuindo características incomuns e perturbadoras. Ainda assim, Ana sentiu uma estranha força emanando daquele pequeno ser, uma energia latente que não condizia com seu tamanho.
— É incrível que existam criaturas assim no mundo abaixo dos meus pés — murmurou para si mesma, intrigada pela natureza única do inseto.
A rainha se permitiu um momento de contemplação. A criatura parecia um pequeno sobrevivente de um mundo vasto e desconhecido, um mundo que existia oculto pela terra e pelas raízes profundas. Algo que existe tão próximo e, ao mesmo tempo, tão distante de sua percepção.
Ela ergueu o olhar para o céu, onde as nuvens pintavam traços efêmeros no azul, movendo-se preguiçosamente como pensamentos que se dissipam.
— Será que Deus me vê assim? Apenas mais um inseto lutando por significado em um mundo vasto e indiferente? — sussurrou, com uma estranha solidão na voz. Havia algo de assombroso na ideia de que, assim como ela acabara de decidir o destino do uma vida, suas próprias ações poderiam ser apenas uma nota em uma melodia mais ampla, tocada por mãos invisíveis e distantes.
Ela suspirou, voltando sua atenção novamente para sua realidade. Por um momento, o pequeno ser em seu dedo pareceu encará-la de volta, como se estivesse agradecido por ter sido salvo. Havia uma conexão silenciosa entre eles, um entendimento mútuo de que ambos, de alguma forma, davam tudo de si para ir além das correntes de seus próprios mundos. Decidida a dar-lhe uma chance de sobrevivência, Ana ergueu-o até o topo de uma árvore próxima, colocando-o em um grande galho.
— Você é forte, um verdadeiro guerreiro — comentou ela, com certo respeito para seu companheiro inesperado.
Por um momento, observou o inseto se adaptar ao novo ambiente, agarrando-se à madeira de forma cambaleante, como se soubesse que aquela era sua única oportunidade. Satisfeita, ela se endireitou e voltou seu olhar para o horizonte. Se uma criatura tão pequena podia sobreviver em um mundo tão hostil, Ana estava mais convencida do que nunca de que ela também podia. Com isso em mente, ela continuou seu caminho, seus pensamentos já retornando às batalhas que a aguardavam.
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