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Nos próximos dez minutos, as bases da visão de mundo de Sunny foram abaladas até o âmago. Kai o inundou com um turbilhão de perguntas… todas elas sem relação alguma com algo minimamente importante!

O que interessava ao belo Adormecido eram coisas estranhas, como os tipos de sapatos que estavam na moda, qual celebridade usava o quê em alguma cerimônia de premiação pomposa, quem teve algum escândalo e qual era o escândalo, qual era a última dança popular, e assim por diante.

Ele era infinitamente curioso sobre esse tipo de bobagem e absolutamente indiferente a todos os segredos sombrios de Sunny.

Isso era quase insultante.

Pior ainda, Sunny se sentiu um completo idiota por não conseguir dar uma única resposta. O que ele sabia sobre moda e alta cultura? Nada!

Depois de um tempo, o entusiasmo de Kai diminuiu. Olhando para Sunny com um rosto comicamente desanimado, ele suspirou e fez uma última pergunta gentilmente:

“Sunny, me diga a verdade… você era um hikikomori no mundo real também?”

Sunny piscou.

‘Do que esse idiota está falando?’

“Um hiki… um o quê?”

Kai limpou a garganta e ofereceu a ele um sorriso de desculpas.

“Ah, você sabe… um recluso? Alguém que se fecha em casa? Alguém que vive debaixo de uma pedra?”

Sunny encarou o jovem lindo, sentindo que o mundo parou de fazer sentido desde que se conheceram.

“Do que você está falando? Por que eu viveria debaixo de uma pedra? Você congelaria até a morte! Eu morei em um contêiner de carga uma vez, mas pelo menos tinha quatro paredes e um teto…”

Kai suspirou mais uma vez e se virou.

“Entendi. Bem, desculpa incomodá-lo. É que estou preso neste lugar há uns dois anos e meio, e a vida aqui é tão monótona.”

Seu belo perfil irradiava melancolia e tristeza, como se Kai estivesse lamentando algo sério, em vez de uma completa tolice.

‘Dois anos e meio… esse idiota sobreviveu aqui por dois anos e meio?’

Sunny ficou surpreso ao ouvir isso. Kai parecia um cara legal, mas não exatamente alguém bem adaptado ao pesadelo impiedoso da Costa Esquecida. Talvez ele tivesse subestimado o Adormecido encantador… ou talvez houvesse outra razão, muito mais simples.

Sunny franziu a testa.

Havia um grupo de pessoas que tendia a viver aqui por mais tempo. De repente desconfiado, ele perguntou em tom frio:

“Você faz parte da gangue do Gunlaug?”

Kai olhou para ele com surpresa.

Depois, ele riu.

“Deuses, não! Se há algo que eu realmente desprezo, são valentões como ele. Prefiro morrer a me tornar um dos capangas do Gunlaug. Além disso, aquele homem não tem estilo. Aquela armadura dele é a coisa mais horrenda que eu já vi!”

No entanto, após dizer isso, subitamente ficou quieto e acrescentou, depois de alguns segundos, com uma voz abatida:

“Mas eu aceito trabalhos dos tenentes dele de vez em quando. É por isso que ele tolera minha existência, então eu realmente não tenho escolha.”

Sunny hesitou por um instante, mas decidiu acreditar. Ele realmente não parecia um dos capangas de Gunlaug. Além disso, se fosse um deles, nenhuma pessoa sã teria ousado sequestrá-lo e aprisioná-lo. Os membros da gangue do Gunlaug eram praticamente intocáveis.

O que significava que Kai era, de fato, muito mais capaz do que Sunny imaginava.

‘Interessante.’

Percebendo que os soluços assustadores da besta Caída haviam se afastado o suficiente, ele mudou sua perspectiva para a sombra e se certificou de que a terrível criatura já estava bem longe.

Levantando-se, Sunny dispensou a garrafa de vidro e disse:

“Estamos seguros agora. Hora de seguir em frente.”

Uma vez que estavam prontos para partir, ele chamou a sombra de volta e se preparou para dar o primeiro passo. No entanto, Sunny parou de repente e olhou para o belo jovem arqueiro com hesitação.

“Ei, Kai. Posso te fazer uma pergunta também?”

O Adormecido mais velho sorriu, com honestidade e ânimo estampados em seu rosto.

“Claro!”

Sunny ficou em silêncio por alguns segundos, e então disse com uma voz estranha:

“Essa armadura sua… você a usa porque é a melhor que conseguiu ou porque fica bonita?”

Kai olhou para ele confuso. Levantando uma sobrancelha requintada, ele disse:

“Não entendi a pergunta. Faz alguma diferença?”

Sunny fechou os olhos, suspirou e se virou.

“Deixa pra lá. Vamos.”

Enquanto o sol se levantava no horizonte, eles iam mais fundo na cidade, se aproximando lentamente de seu centro.


O castelo ficava em uma colina alta no meio da cidade amaldiçoada. Era grandioso e magnífico, com dezenas de torres se erguendo no ar, cada uma sustentada por uma série de arcos e colunas elaboradas. Gárgulas grotescas encaravam as ruínas de baixo das beiradas.

A estrada que levava ao castelo era tão impressionante quanto o próprio castelo. Era estreita e fortemente fortificada, circundando a colina de tal maneira que permitia aos defensores do castelo lançar flechas incessantemente sobre qualquer possível atacante.

No final da estrada, uma escadaria grandiosa levava aos portões do castelo. Em frente a ela, houve uma vez uma vasta plataforma de pedra, destinada a servir como local de encontro para os soldados, caso o inimigo conseguisse romper todas as linhas de defesa, exceto a última.

Agora, a plataforma se transformara em um assentamento improvisado, com pequenos edifícios maltrapilhos feitos de pedra, madeira e tudo o que os habitantes dessa favela conseguissem colocar as mãos, espalhados caoticamente aqui e ali, formando grupos desorganizados e vielas estreitas.

Este lugar não parecia a periferia onde Sunny crescera, mas tinha o mesmo ar inconfundível de miséria, medo e desespero.

Ao se aproximarem do assentamento externo, vários Adormecidos cumprimentaram Kai com sorrisos amigáveis.

“Ei, Noite! Que bom ver você, cara. Onde você esteve ultimamente?”

Kai sorriu envergonhado.

“Ah, você sabe. Voando por aí. E você, amigo?”

Enquanto o jovem encantador trocava saudações com seu conhecido, Sunny olhou cautelosamente ao redor.

O lugar havia mudado imperceptivelmente desde a última vez que esteve aqui. O assentamento em si parecia quase o mesmo, com apenas alguns edifícios mudando de forma ligeiramente. As pessoas, no entanto… de alguma forma pareciam mais energizadas e confiantes, como se o medo constante da morte e da fome não fosse tão opressivo.

No entanto, havia uma estranha sensação de tensão no ar.

‘Acho que ela também esteve ocupada nesses três meses.’

Finalmente conseguindo encerrar a conversa, Kai virou-se para ele e sorriu desculpando-se.

“Desculpe por isso.”

Sunny franziu a testa.

“Por que eles te chamam de Noite?”

O jovem encantador encarou-o, depois limpou a garganta e disse, com um tom um pouco estranho em sua voz.

“Ah, você realmente não sabe. Bem… é um apelido. Vento da Noite, é assim que sou conhecido nesta região.”

‘Que apelido estúpido’, pensou Sunny, e decidiu resolver as coisas o mais rápido possível.

Ele mal podia esperar para sair deste lugar deprimente.

“Bem, já que estamos aqui, é hora de cumprir sua promessa.”

Kai assentiu.

“Claro. O que você precisa que eu faça?”

Sunny olhou em volta, certificando-se de que ninguém pudesse ouvi-los, e disse:

“É simples. Entre no castelo e descubra quem está vendendo Memórias e qual é o preço. Depois volte e me informe.”

Seu companheiro piscou algumas vezes, claramente surpreso, e então deu de ombros.

“Sem problemas. Mas vai demorar um pouco. Se você quer a melhor informação possível, é claro.”

Sunny fez uma careta.

“Faça como achar melhor. Estarei te esperando naquela viela ali.”

Kai olhou para ele pela última vez, sorriu e se afastou.

Sentindo-se nervoso e tenso, Sunny caminhou até uma viela isolada e encostou-se na parede. Tentou se tornar o mais pequeno e imperceptível possível.

Estar ali fazia sua pele arrepiar. Talvez sua decisão de voltar tenha sido um erro, afinal. Talvez devesse simplesmente virar as costas e ir embora.

No entanto, ele não fez isso. Lá no fundo, sabia que tinha que aproveitar esta oportunidade para reunir o máximo de Memórias possível, para que sua Sombra se tornasse mais forte o mais rápido possível.

Talvez nunca mais teria essa oportunidade.

O tempo passava lentamente. Uma hora se passou, e depois outra. Kai certamente estava demorando para reunir as informações que Sunny havia pedido.

No entanto, nada de ruim aconteceu. Ainda.

Sunny estava quase começando a acreditar que estava nervoso à toa, mas então, é claro, a coisa que ele mais temia se tornou realidade.

Uma voz calma e dolorosamente familiar ressoou de algum lugar atrás dele.

“Oi, Sunny.”

Ele congelou, sentindo-se como uma besta presa em uma armadilha, e então se virou lentamente. Uma expressão estranha e complicada apareceu em seu rosto.

Forçando um sorriso, Sunny lambeu os lábios de repente secos e disse:

“… Oi, Nephis. Há quanto tempo.”

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