Combo 23/50
A poderosa caçadora encarou a Santa de Pedra, sua mão pairando no ar, pronta para agarrar o cabo da lança. Seus lindos olhos castanhos estavam cheios de tensão e antecipação sombria.
O contraste entre aquela pose feroz e o fato de ela ainda estar confortavelmente enrolada em um cobertor era tão engraçado que Sunny não conseguiu deixar de rir.
“Nossa, relaxa. Você nunca viu um Eco antes?”
Effie piscou.
“Essa coisa… é sua? Espera, você tem um Eco?!”
Ele assentiu e gesticulou para a Santa de Pedra.
“Sim, eu tenho. Conheça a Santa. Ela não é uma beleza?”
A caçadora olhou para a criatura taciturna e então franziu o cenho com indignação.
“Seu sortudo bastardo! Você sabia que eu nem sequer senti o cheiro de um Eco depois de três anos neste fosso? Como ousa pegar um antes de mim, hein?”
Sunny riu.
“Na verdade, esse é meu segundo Eco. O primeiro foi morto no Labirinto.”
Effie olhou para ele por um longo tempo, então balançou a cabeça com uma expressão de total desânimo. Finalmente, ela se virou para a Sombra e a estudou.
“Espera… ela é o que eu penso que ela é?”
Sunny assentiu.
“Sim.”
A caçadora levantou-se da cama e, deixando o cobertor para trás, caminhou descalça ao redor da Santa de Pedra. Ela a estudou de todos os ângulos e então disse:
“Como diabos você conseguiu matar uma dessas coisas e sobreviver?”
Sunny, que involuntariamente se viu estudando Effie de todos os ângulos, piscou algumas vezes e deu de ombros.
“Na verdade, eles foram eliminados por um grupo de Caídos. Foi um confronto épico, para dizer o mínimo. Eu só cheguei lá a tempo de acabar com um. E aqui estamos.”
Effie olhou para a Sombra com admiração.
“De que classe ela é?”
Sunny sorriu.
“Monstro Desperto. Mas eu a vi matar duas Bestas Caídas, então… Eu diria que ela é uma elite entre seus pares. De qualquer forma, você pode ver como não é impossível caçar três monstros em uma noite com ela ao meu lado. Eu os estudei com antecedência, é claro. É por isso que fomos tão rápidos em lidar com eles.”
A caçadora cruzou os braços, pensou um pouco e então lançou um olhar estranho para Sunny.
“Por que você está me mostrando ela? Com o quão paranóico você é, eu esperaria que você mantivesse tal tesouro escondido.”
Ele se levantou, demorou-se um momento e então disse:
“Com o que planejei, mostrá-la a você é uma espécie de requisito.”
Effie ficou em silêncio e então lhe deu um sorriso travesso.
“Ah. Desculpe desapontá-lo. Não me entenda mal, estou pronta para todos os tipos de diversão. Mas, Sunny… Criaturas do Pesadelo é onde eu traço o limite.”
Ele franziu a testa, sem entender muito bem o que ela estava falando. Então, seus olhos se arregalaram.
“O quê?! Você… que tipo de degenerado você é?! Treinamento! Eu queria usá-la para treinamento!”
A caçadora indisciplinada piscou inocentemente.
“Treinamento? Sunny, não há nada de errado em ser um pouco inexperiente, na sua idade. Na verdade, é bem charmoso! Você não precisa recorrer a esse tipo de coisa, sabia…”
“Inexperiente?! Quem você está chamando de inexperiente?! Eu sou bem experiente! Espera… Droga. Do que estamos falando?!”
Morrendo de rir, Effie deixou Sunny fumegando de indignação e caminhou até a cozinha improvisada enquanto balançava a cabeça. Logo, o cheiro tentador de carne assada encheu o ar.
‘… Eu vou matá-la. Devo matá-la? Vai ser pura legítima defesa, de qualquer forma. Uma semana disso será a minha morte.’
Com um suspiro, ele tentou muito se acalmar. Quando seus pensamentos retornaram à cadência habitual, Sunny ficou em pé na frente da Santa de Pedra e exalou lentamente.
Era hora de aprender.
***
No caminho de volta para a catedral, Sunny tomou uma decisão difícil.
Ele decidiu não aprimorar seu corpo com o poder da sombra durante sua prática com a Santa de Pedra.
Mesmo sabendo que isso lhe traria muita dor no futuro, ele estava inflexível sobre sua escolha. Havia várias razões pelas quais ele queria enfrentar seu monstro de estimação com sua própria habilidade física e nada mais.
A primeira e mais simples razão era que Sunny sabia que a sombra nem sempre estaria lá quando ele precisasse. Assim como durante a batalha contra o Mensageiro da Torre, quando ele estava fora explorando, circunstâncias nas quais ele teria que confiar apenas em sua própria destreza estavam fadadas a acontecer.
Sem mencionar que foram seus próprios reflexos, e não a sombra, que o salvaram de ser cortado ao meio pelo Cavaleiro Negro.
A segunda razão era menos evidente. Tinha a ver com a hierarquia de poder existente na Cidade das Trevas. No topo, estavam os Caídos. Abaixo deles, aquelas criaturas que estavam meramente Despertas. E bem no fundo, os Adormecidos.
Qualquer luta que um humano pudesse enfrentar naquele lugar amaldiçoado seria contra uma força avassaladora. Com o tempo, Sunny se ajustou a essa realidade e conseguiu, hoje em dia, enfrentar as classes mais baixas das abominações Despertas em termos quase iguais… com a ajuda da sombra. Ele ainda estava mais fraco, mas não tanto.
No entanto, no fundo ele sabia que, mais cedo ou mais tarde, seria forçado a lutar contra inimigos Caídos. E ele também tinha quase certeza de que teria que cruzar espadas com humanos que tinham saturado seus núcleos até a borda com essência de alma, e eram, portanto, muito mais fortes do que ele.
Por essa razão, sua experiência caçando monstros que não eram muito mais fortes do que seu eu aprimorado era, na verdade, um impedimento. Isso entorpeceu sua vantagem e o fez esquecer o que realmente significava lutar contra um inimigo que estava léguas acima dele — o conhecimento e a mentalidade que ele precisava desesperadamente reter para ter uma chance de sobreviver no futuro.
Ele teve que se manter humilde.
E, por fim, havia uma verdade que ele havia aprendido durante esses seis meses na Costa Esquecida, e era que nada era mais benéfico para o crescimento de alguém do que lutar contra um oponente superior — especialmente se essa luta terminasse em sua derrota. Uma derrota ensinava a uma pessoa mais do que uma dúzia de vitórias contra inimigos mais fracos.
O problema era que, naquele lugar amaldiçoado, qualquer derrota significava morte. Então Sunny na verdade tinha pouca experiência em perder para alguém. Do começo ao fim, ele provou a derrota apenas três vezes: uma vez em uma batalha contra o Centurião de Carapaça, uma vez quando enfrentou Nephis sob os galhos da Árvore da Alma, e uma vez nesta mesma catedral, quando a espada do Cavaleiro Negro cortou seu estômago.
Cada uma dessas derrotas lhe ensinou mais do que qualquer outra coisa.
…Então, ter a oportunidade de lutar com um monstro que era muito mais poderoso que ele, e ainda assim não tinha desejo de matá-lo, era uma oportunidade extremamente rara e preciosa.
Foi por isso que Sunny se preparou e deixou a sombra descansar no chão enquanto enfrentava a Santa de Pedra.
Respirando fundo, ele invocou o Fragmento da Meia Noite, assumiu uma postura defensiva e olhou a ameaçadora cavaleira de pedra diretamente nos olhos.
“Ataque-me.”
Sem perder um segundo sequer, ela fez exatamente o que lhe foi dito.
‘Oh… droga!’
