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Capítulo 100: Uma visão do amanhã.

Dahlia se olhou no espelho do banheiro e não reconheceu a pessoa do outro lado, uma mulher a encarava com seus olhos azuis que pareciam cristais, longos cabelos loiros caiam sobre seus ombros. Aquela não era uma visão tão bonita quanto parecia, a pele pálida de quem não tem uma alimentação saudável há meses, as olheiras de uma pessoa que passou a semana entre sonos mal dormidos, fios secos e cada vez mais quebradiços.

A nobre mineira riu, parece que foi no dia anterior que era uma criança alegre cheia de uma energia sem limites correndo de um lado a outro da mansão ao lado de seu amigo jardineiro. Quando se tornou aquela imagem da exaustão que era refletida? Tantas responsabilidades, tanto a se fazer e perigo a se enfrentar?

Os olhos vagaram para baixo, sua armadura feita sob medida abraçava perfeitamente seu corpo, não muito grossa e pesada permitindo alguma agilidade, ainda assim era quase inquebrável. Oh, as maravilhas da liga de Angra, o metal mais resistente do mundo, disponível apenas no Continente Vermelho. Seu único problema era a cor, de alguma forma as coisas dela sempre acabavam sendo azuis apesar de sua cor preferida ser vermelha.

Ela pegou um objeto em cima do gabinete do espelho, um longo pedaço de tecido vermelho vibrante. Um sorriso enfeitou seu rosto enquanto colocava o cachecol em seus ombros e o deixava cair sobre o peito. Caxias passou por seus pensamentos, esperava que ele estivesse bem onde estava.

Um trovão ribombou no céu, uma lembrança do momento e do que viria a acontecer. Com passos decididos, saiu daquele banheiro pequeno. Do lado da porta, já no corredor estreito, havia uma lança maior que a mulher, uma haste de madeira escura como a noite que terminava em uma ponta prateada que parecia emanar calor. Dahlia passou seus dedos pelas ranhuras do cabo como quem faz carinho na cabeça de um velho amigo.

Segurou a arma com um aperto firme e a levou consigo ao sair da pequena cabana, parou na varanda do lugar e primeiro olhou o horizonte. As nuvens negras estavam mais próximas, apenas mais alguns minutos até que chegassem até eles junto do perigo. Seus olhos foram para a vila, um lugar tão pequeno com vinte a sessenta casas simples de madeira, uma aldeia completamente deserta, ou quase levando em conta todas as cinco guerreiras lá.

O clima nublado era excentricamente apropriado ao momento, nublado e cinzento, frio e triste, muito semelhante ao que suas memórias tinham sobre a cidade de São Paulo. Deixando de lado a visão triste, deu sua atenção à mulher sentada na escada da varanda com um semblante de coragem. Poderia chamá-la de amazona, o que tecnicamente estaria errado, a própria Lady já conheceu as reais amazonas, todavia aquela guerreira estava muito próximo do que era esperado de uma.

Quase atingindo os dois metros de altura, uma constituição notavelmente forte mesmo escondida sobre a pele de urso que usava como capa. Os volumosos cabelos ruivos caiam como uma moita, bagunçados e naturais. Suas feições eram duras, algumas cicatrizes enfeitando sua bochecha direita. Seu rosto tinha a mesma rigidez que uma estátua de granito teria mostrado, não era o que convencionalmente seria chamado de bonito, mas para Dahlia ela era linda.

Os olhos azuis da ruiva responderam seu olhar e uma mensagem silenciosa foi passada entre as duas, aquele era o momento. A mulher se levantou e se posicionou à esquerda da loira, a capa de pele balançando por uns segundos possibilitando uma visão do martelo que a outra mantinha em sua cintura. Juntas caminharam pela estrada deserta, o mal prenúncio das nuvens negras sendo o principal foco de sua atenção.

O que não as impediu de notar outra das pessoas que lutariam junto a elas, a mulher morena encarava o céu monótono, seus lábios finos e rachados se movendo em uma oração silenciosa. Seu casaco dourado parecia volumoso, provavelmente aos vários artefatos enfiados em todos os bolsos internos escondidos. Dahlia sempre achou engraçado como se encher de tantas coisas causava um efeito não intencional de fazer os seios pequenos dela parecerem maiores.

Os olhos da nobre vagaram para baixo, na cintura uma bolsa amarrada ao seu cinto, em suas pernas vestia o que um dia foi uma calça de couro, até que cortou a peça da roupa na altura dos joelhos. Isso permitiu uma visão da grossa perna direita pálida dela, coxas bonitas, mas que não ressoavam com o outro lado uma vez que onde deveria haver um membro esquerdo comum, ela possuía uma perna mecânica de prata com todas as suas molas e engrenagens que sempre confundia a mineira.

As mãos da mulher juntas em sua reza, seguravam o cajado de madeira maior que seu corpo. Na ponta do objeto, seis pequenos chocalhos dourados ressoavam a cada movimento. Quando a ruiva e a loira a alcançaram, a morena desceu seus olhos do céu e as encarou, a mesma mensagem sendo passada a ela e dessa forma tomou seu lugar à esquerda da amazona.

As três deram passos decididos sobre a estrada de terra batida, seus rostos decididos, os olhos nas nuvens negras ainda mais próximas. Aquela massa colossal de fumaça era tanta que seu volume cobria toda extensão de terra pela qual avançava como um mal presságio sombrio, consumindo tudo pelo qual passava com sua escuridão insaciável.

Dahlia parou em frente a pequena ferraria de portas e janelas fechadas, o som de metal sendo martelado podia ser enxergado do exterior, fumaça clara saindo de uma chaminé no topo do telhado. A mineira em passadas largas chegou às portas duplas da varanda e abriu com um empurrão pacifico esperando encontrar as duas que aguardavam lá.

Imediatamente sua pele foi beijada pelas rajadas de ar quente e seus olhos sendo atacados pelo interior tremulando em laranja com o calor da forja. Aquele interior era sem dúvida mais confortável que o exterior frio e cruel, mas ela era acostumada às baixas temperaturas e tragicamente não existia tempo para conforto.

A ferreira parou seu martelar, uma espada queimando em vermelho sendo largada em sua bigorna. Era pequena, sua altura chegando pouco acima do abdômen da brasileira, mas apesar da estatura, seu corpo não era o de uma criança, afinal era quase uma adulta. A anã se virou para a porta permitindo uma visão de seu rosto sujo de fuligem. Uma face brilhante, um nariz pequeno e arrebitado, olhos ametistas grandes e poderosos, tudo acompanhado de uma boca pequena.

Seu cabelo preto e volumoso era uma confusão de cachos, o coque bagunçado no topo da sua cabeça chegava a ser comicamente grande. Uma de suas orelhas longas pontudas tinha um brinco adorável da cabeça de uma serpente, uma lembrança triste. O rosto da garota era bonito e fazia Dahlia pensar em seu velho mundo, entendeu há anos que aquele continente parecia uma versão fantástica da América Latina, todavia as feições da ferreira tinham um quê de latino europeu.

O que chegava a ser quase paradoxal porque ela era terrivelmente parecida com o seu pai, mas o pai era a face esculpida do mestico latino. Muito mais próximo da irmã da anã sentada em uma cadeira frente a uma mesa pequena.

Visivelmente, muito distante de ser uma anã ela mesmo, ultrapassando os dois metros de altura que a faziam uma jovem enorme. Sua pele era a de uma mulata clara, sua constituição forte, mas claramente sem muito treinamento colocado nela. Era reconhecivelmente linda com proporções muito chamativas, curvas de um quadril largo, seios grandes chamativos e pernas salientes. Era uma pintura de pinceladas leves do que se espalhou pelo mundo como a aparência sexy das mulheres latinas. 

A loira encarou o rosto da jovem grande que respondeu com um olhar firme. Seu rosto era estranhamente comum e calmante, lábios normais e um nariz médio, bochechas magras e a face como um todo simples.Talvez o mais especial em suas feições fossem seus olhos verdes selvagens, uma floresta vivia em cada um deles e coincidia perfeitamente com sua função enquanto druida.

Os cabelos ruivos escuro dela eram extensos e caiam sobre seus ombros, de cada lado de seu crânio brotava um chifre de cervo pequeno em sentido horizontal. Qualquer que fosse sua espécie, não era de conhecimento da mineira e pouco a importava, quanto menos soubesse daquela canalha melhor seria.

A giganta se levantou, seu vestido tomara que caia negro descia até sua cintura onde os lados terminaram deixando um extensão do tecido no meio de suas pernas cair até suas coxas. Era uma vestimenta com muitos graus de inadequação para um confronto, o que não significa que as roupas da anã eram mais adequadas. Embora um macacão de couro acabasse por ser mais útil entre aquele frio do que um vestido.

As armas foram melhores escolhidas, a mulata tirou de trás da mesa um cetro e apesar do objeto de madeira com uma pedra verde de aparência simples da druida não ser chamativo e pouco merecer uma segunda olhada, Dahlia sabia que era um arma enganadora. A irmã menor por sua parte investiu no poder de fogo e considerando as lutadoras lá fora, um apoio de longa distância era mais que bem vindo.

Ela com passos intensos, se dirigiu até um baú deixado em um canto da ferraria, um que a nobre sabia pertencer a própria anã. Tirou dele algo que a garota nunca soube o nome em seu antigo mundo, era um daqueles cintos de couro dos caubóis com vários espaços onde munição era guardada, a peça terminava em um coldre onde um revólver repousava e foi logo colocada na cintura da ferreira.

Como se fosse insuficiente, tirou outro do cinto e o colocou em diagonal a partir de seu ombro direito. Fazendo jus à reputação que sua raça mantinha de ter uma paixão pela arte do atiramento tão intensa quanto a pólvora que costumam usar, do baú retirou um aljava que equipou em suas costas e com ela um besta que prendeu a cintura.

O bastante? Não para aquela garota e sua próxima arma deixou a mineira com seu queixo no chão, era uma metralhadora, uma thompson, uma maldita tommy gun em um mundo mágico de fantasia. Um modelo muito primitivo, um pouco menor do que deveria e ainda sem mira ou a coronha de madeira elegante, mas aquele tambor de panela pelo qual a arma foi lembrada em seu mundo era inconfundível. 

Perguntar era desnecessário, a loira conhecia muito bem o nome do bastardo que construiu aquilo, o mesmo responsável da primeira arma de repetição daquele mundo e do revólver que a anã também carregava. Qualquer coisa a ser dita em voz alta sobre aquele instrumento sombrio deveria ser adiada.

“U-uuuuuuuuu.” era o distinto som do apito de uma máquina movida a vapor, foi também o sinal de que o momento temido bateu a porta. 

As três saíram da pequena ferraria e se juntaram às outras duas que tinham seus olhos voltados para a entrada da vila onde um caminho de terra seguia até um morro onde a aberração de ferro cessou sua marcha. Um assobio de espanto deixou os lábios da que melhor entendia mecânica entre todos elas e nenhuma poderia julgar a anã visto suas pŕoprias faces impressionadas.

Era colossal, quatro rodas de cada lado, uma ordem que começava com uma maior, menor, maior e menor. Tendo como medida sua própria altura, Tundria imaginou que a roda da frente possui cinco metros, com a última tendo o dobro. Entre cada lado, uma carroceria de metal com aspecto bronze de aparência simples. Todavia, a guerreira, a druida e a ferreira sabiam que escondido dentro daquela caixa de metal existia um sistema complexo de canos, válvulas e engrenagens transportando o calor que movia a estrutura. 

Como uma crista, uma redoma se erguia sobre a região acima das rodas da frente, um canhão pairava ameaçador saído daquela estrutura mecânica. Atrás dele estava o que se assemelhava a uma fortaleza mecânica onde residiam os inimigos que enfrentariam, saindo dela duas chaminés sujas que cuspiam ao céu suas torrentes de fumaça escura que permaneciam pelo caminho tal qual nuvens negras.

Aquilo não era uma máquina, era um desvairamento sobre rodas, uma loucura, uma aberração. Era um monstro cuja pele foi forjada em ferro e cobre, seu coração fumegante era uma caldeira de temperatura insuportável, vapor corria em seus canos a semelhança de sangue em veias pulsantes, as engrenagens rangiam tal como articulações movendo os apêndices de um esqueleto e a fumaça subia como uma visão para o exterior da escuridão contida em seu interior.

Era o inimigo que elas esperavam e ele fez seu movimento antes que reagissem, Dahlia só pode ouvir o estrondo alto que assemelhava-se a um trovão vindo do disparo daquele cano apontado para as mulheres…

Então a criança acordou, sua respiração sem fôlego e suor guardando seus fios loiros a testa. Os olhos azuis dela correram pelas paredes de seu quarto escuro na mansão do Gran Duque, seu coração pulsando em ritmo de cavalgada e só uma pergunta em sua mente.

O que aquele sonho significava?

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Olá, eu sou MK Hungria!

Eis aqui, o capitulo 100 oficial (tecnicamente o 104) da história e por isso ele é especial, um leve vislumbre do que o futuro nos aguarda.

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