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Capítulo 61 – A Voz Daquilo Que Me Pertence

Eu nunca senti aquela espada exibir tal comportamento, nem mesmo durante os quinhentos anos que passei no abismo.

Empunhei, com muito esforço, aquela lâmina enferrujada. Ondas vibratórias surgiam em sua ponta e percorriam seu corpo até chegar em minhas mãos e continuarem até meu coração.

Cada vez que uma onda chegava até mim, a próxima era mais forte. O processo continuou se intensificando até que nossa conexão se estreitou.

‘Olá, mestre criador.’ Uma voz antiga e feminina ecoou pela minha mente. Meus instintos não reagiram com isso.

Levei um susto, eu não esperava que minha lâmina tivesse qualquer tipo de consciência, nem fazia a mínima ideia do motivo de só me mostrar isso naquele momento. 

“O que é você?” Indaguei ao examinar a voz e a espada em si. Meu tom carregava preocupação, mas principalmente, curiosidade.

‘Sou Caedes, sua maior criação.’ Revelou, despertando meu total interesse. ‘Vejo que seu maior medo se concretizou.’

‘Do que está falando?’ Perguntei, confuso. ‘Qual era meu maior medo?’

‘Você temia que falhasse no final e fosse apagado da existência.’ Revelou com um tom de melancolia. ‘Me desculpe. Eu não pude me equiparar à força Deles, te decepcionei com minha fraqueza. Não consegui ser digna do esforço que colocou em mim quando me criou.’

“Espera um pouco. Eu não me lembro de absolutamente nada de antes de quinhentos anos atrás, nem lembro de criar você. Vai ter que falar desde o começo.” Declarei.

‘Claro. Você previu que pudesse perder as memórias no abismo e me preparou para te lembrar de quem era caso se libertasse.’ 

“Você tá falando que eu sabia que seria aprisionado naquele lugar?!” Questionei, completamente perplexo. 

‘Sim, mestre. Seu nome é Sirius A-’ A voz de repente parou. ‘Por favor… Não…’ Reclamou desesperadamente.

“O que aconteceu?” Perguntei, preocupado. Eu queria obter respostas logo.

‘Essa ferrugem… Ela foi um castigo direto dos deuses… Ela me manteve em um estado de sono profundo até agora, além de me impedir de usar meu verdadeiro poder e consumir minhas memórias.’

‘Eu apenas lembro de um título… Um título que seu nome carregava.’ Revelou, me fazendo engolir seco.

A Nona Encarnação’ No momento que ouvi isso, senti uma parte de mim retornar depois de eras. Arfei como um cachorro cansado ao colocar minha mão no peito e lutar para respirar.

Uma peça de um grande quebra-cabeça finalmente se juntou a mim.

“Nona Encarnação… O que isso significa?” Indaguei com meu coração pulsando violentamente, mas não obtive respostas.

“Você falou sobre seu verdadeiro poder, o que ele é?” Continuei perguntando.

‘Eu não consigo lembrar. Você precisa remover minha ferrugem antes, mestre.’ Falou, me decepcionando.

“E como eu faço isso?” Não parei de fazer perguntas. 

‘Eu também não sei. Essa ferrugem é divina, não sei o que no mundo poderia afetá-la.’

‘Merda, toda vez que consigo obter alguma coisa, é apenas um fragmento da verdade.’ Reclamei mentalmente.

‘Peço perdão por isso.’ Caedes se desculpou, me mostrando que conseguia ler minha mente.

‘Mas eu sinto uma sensação estranha com essa energia flutuante, mestre.’ De repente falou, me deixando curioso.

“Que sensação?” Indaguei, encarando a lâmina enferrujada.

‘Fome.’

‘Eu não lembro exatamente do meu poder, mas ainda lembro do significado que o mestre me imbuiu quando me criou.’

‘Você me criou com o propósito de devorar tudo. O oceano, a terra, o mundo, até mesmo a alma de um deus. Ainda me é familiar a ambição e determinação em seu rosto, capazes de criar um sentimento que me deu a gula necessária para devorar a própria realidade.’

‘Acho que consigo devorar a energia prismática.’

Meus olhos se iluminaram com sua explicação. “Como você sabe o nome dessa energia?” Finalmente perguntei, antes de pensar nos usos imediatos de Caedes.

‘No momento que nossa conexão se reformou, eu vi todas suas memórias, menos as que perdeu. Tentei me aprofundar nas memórias de quando você começou a se esquecer de quem era, mas algum tipo de barreira me impediu.’

“Barreira… Inclusive, por que você só está falando comigo agora?” Perguntei.

‘Não sei te responder isso, mestre. Eu acordei um tempo atrás, mas na completa escuridão. Fiquei dias esperando por seu aperto, mas apenas vi pessoas estranhas me tocando e tentando me estudar.’

‘Você é o único no mundo digno de me empunhar.’ Caedes declarou orgulhosamente.

“Está bem. Com o tempo acharemos uma forma de retirar essa ferrugem, até lá você vai tentar me ajudar com esse negócio de devorar a mana.” Falei ao controlar um fio vermelho para perto de Caedes.

A mesma assentiu e um pressentimento ruim surgiu dentro de mim.

Cenas de uma cratera profunda, talvez até mesmo infinita, passaram pela minha mente. Um buraco onde até mesmo tudo que existe não seria capaz de preenchê-lo completamente.

Um vazio oposto a tudo que existe. Aquela era Caedes, e eu de alguma forma fui aquele que criou tal ser assustador.

Uma aura com as mesmas características se intensificou ao redor da lâmina e tentou puxar o fio. Mantive o fio na mesma posição, mas seu brilho curvou para baixo, antes de se desprender.

Foi como se o fio prismático tivesse uma pele e Caedes estivesse arrancando-a, deixando apenas uma textura cinza e lisa.

Já o brilho arrancado, simplesmente deixou de existir, como se tivesse entrado naquele buraco infinito.

A mana pura era extremamente interessante. Eu conseguia imbuí-la com qualquer elemento, como se ela carecesse por um significado.

Não sabia o que fazer com ela naquele momento. Tentei absorver em meu núcleo, mas não consegui. Foi como se ele não aceitasse algo assim, sem significado ou poder.

Simplesmente deixei Caedes devorar o resto do fio. Nada mudou em seu interior, mas nossa conexão era tão profunda que eu percebi seus sentimentos felizes ao finalmente devorar algo.

Naquele momento saí da biblioteca e do quartel, antes de voltar para a casa de Roger. Fazia um tempo que eu não conversava com o homem e eu tinha algumas perguntas.

Entretanto, antes disso tudo, tentei procurar uma bainha que Caedes coubesse, afinal ela era maior que a maioria das espadas bastardas do mesmo tipo.

Procurei por vários minutos, mas não achei. Só me restou carregar a espada na mão o tempo inteiro.

Entrei na casa de Roger e o encontrei, pela primeira vez, treinando seu controle mágico no sofá. Fios azuis se reuniam ao seu redor e tomavam inúmeras formas conforme ele controlava vários fios ao mesmo tempo.

Me aproximei em silêncio e notei várias garrafas vazias no chão e no sofá. Me impressionei ao perceber que seu controle mágico se aproximava do de Hark, pois figuras autônomas de gelo surgiam e voavam ao seu redor.

Roger podia ser um bêbado que eu nunca vi treinar, mas se mostrou um mago de respeito. Fiquei curioso em vê-lo lutando, mas logo afastei esses pensamentos.

‘Este homem fede.’ Caedes reclamou na minha mente.

‘Como você consegue sentir o cheiro?’ Indaguei na minha cabeça, sabendo que ela conseguiria entender.

‘Compartilho dos seus sentidos.’ Revelou. ‘Sua visão, olfato, audição e tato, até mesmo escuto esses instintos irritantes falando sem parar, mestre.’

‘Vai ter que se acostumar.’ Declarei ao começar meu treino, imitando Roger. Comparei os nossos resultados e novamente percebi a distância entre mim e um mago experiente.

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