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Dois dias antes, Cidade de Aethenil, Costa do Reino do Sul.

O sol nascia ao leste, em direção às montanhas, e iluminava paralelamente os rostos dos cavaleiros. A luz refletia em seus olhos, e a forte claridade os deixava cegos, eles eram obrigados a levantar suas mãos e cobrir o rosto. Montados em seus cavalos, avançavam pela estrada de terra perpendicular à costa, onde as ondas do Grande Oceano batiam contra a areia da praia.

Era um grupo pequeno, composto por três batedores enviados para averiguar uma estranha formação de navios observada a distância. Do alto de um penhasco costeiro, observaram a flotilha invasora, em seus grandes cascos de metal e ferro e as chaminés que emitiam uma fumaça negra.

Pela primeira vez em seis mil anos, os humanos eram avistados novamente.

O líder elfo, Celador, sentia o nervosismo e o medo, suas mãos tremiam enquanto ele se segurava no animal. Era extrema urgência avisar o prefeito e por consequente, alertar toda a capital. A cidade apareceu a distância, ainda com a luz das lanternas noturnas ligadas.

A cidade era murada com uma muralha de pedra, construída há muitos anos e já desgastada. Aethenil estava em uma zona considerada segura, longe dos atritos de fronteira do leste, entre os orcs e os goblins. Segurança e proteção não eram algos considerados prioridade. A guarda local era composta por um pequeno número de soldados, que apenas patrulhava e cuidava de alguns assuntos domésticos.

Não havia uma forma segura da cidade se proteger. 

Os grandes portões de madeira de mogno foram abertos e os cavaleiros entraram na cidade, observados pelos poucos cidadãos acordados em um horário tão cedo. O prefeito os esperava na varanda da prefeitura, os olhos pregados de sono, tamanha era sua preocupação.

— Humanos? — questionou ele ao ver Celador, e desceu a escadaria de mármore para o grande pátio.

— Humanos… — Celador desceu do cavalo, abatido. — Destruíram seu próprio continente e agora devem querer o nosso.

— Quantos são? Como são? — 

— Um exército inteiro, nós contamos um pouco mais de uma centena de navios e uma dúzia de embarcações estranhas com chaminés cuja fumaça negra se destaca no horizonte. — Celador falava e o prefeito preocupa-se mais. — Não são navios comuns, seus grandes cascos feitos de metal, desprovidos das velas tradicionais e utilizam grandes esferas como olhos por todo o convés.

— Preparem uma coruja mensageira e enviem uma mensagem a capital, agora! — ordenou o prefeito. — Celador, como capitão da guarda da cidade, o incumbirei de ser o responsável para organizar uma defesa. Faça tudo o que puder, se necessário iremos impor a lei marcial, mas em hipótese alguma podemos deixar nossa bela cidade cair. Reúna o máximo de soldados que puder, e convoque qualquer civil capaz de empunhar uma arma.

Celador confirmou com a cabeça, já com a ideia em sua mente. Durante a conversa que tinha com o prefeito, um burburinho havia começado na cidade, três homens estranhos estavam sentados em uma pedra na frente da cidade.

Um dos guardas correu até o capitão e deu o alerta:

— Capitão… Eles… Eles estão no portão… — gaguejou o elfo.

— Quantos? — Celador encarou-o preocupado.

— São três, eles estão trajados de forma estranha. Eu não posso descrevê-los da maneira correta… O senhor precisa ir lá.

— Mas são humanos? — interrompeu o prefeito.

— Não sei, não são como nós.

Celador soltou uma pequena risada. Os elfos são muito característicos, com sua elegância esbelta, cabelos e olhos em tonalidades claras, além das orelhas pontiagudas que os destacam. Mas os humanos, ah, os humanos, nós somos diversos e singulares, cada indivíduo possui suas próprias virtudes, habilidades e vantagens únicas.

— Embaixadores, vão exigir nossa rendição — comentou o prefeito.

— Prefeito Ayduin, o senhor deve falar com eles, vou reunir todos e iremos montar uma alguma linha de defesa, talvez uma linha de barricadas na prefeitura até os reforços da capital chegar. 

— Boa ideia, Celador, vou tentar comprar tempo. — Ayduin sorriu, um pouco mais confiante. — Vamos soldado, me mostre onde estão os forasteiros.


Os três homens estavam sentados em uma grande pedra que ficava na beira da estrada que levava ao portão da cidade. Enquanto um deles girava com maestria uma pequena lâmina gêmea de arremesso, os outros dois mantinham-se imóveis, seus olhares fixos nos guardas elfos estacionados no topo da muralha.

— Eles são desprezíveis — expressou o homem no centro do grupo, sua voz rouca podia ser sentida com uma profunda aura de imponência e ameaça.

Ele vestia uma camisa púrpura por debaixo do casaco e uniforme preto. Seu chapéu stetson marrom disfarçava sua calvície, com poucos fios de cabelo branco restantes nas laterais da cabeça. Sua respiração era mantida por dois pequenos tubos ligados em seu nariz, até a sua costa. Ele segurava seu revólver na mão, apesar de possuir um coldre na cintura.

— Fique calmo, Xerife, amanhã será o grande dia, apenas aproveite o momento. — Sorriu um deles, o mais jovem entre todos.

Ele tinha a aparência de um adolescente rebelde, e emanava uma vibe descolada, mas, ao mesmo tempo, fora de sintonia. Seu cabelo tingido de roxo e o uniforme coberto de adesivos contribuíam para essa imagem. Além disso, dois circuitos de LED azul enfeitavam as mangas de seu casaco.

O terceiro indivíduo empunhava e girava as lâminas gêmeas, e entre os três, ele era o membro mais estereotipado dos membros do exército de libertação. Vestia-se com simplicidade, usando apenas seu uniforme negro, sem adições chamativas. Seu rosto estava parcialmente oculto por uma bandana preta, enquanto seus olhos permaneciam cobertos por uma viseira escura. Seus cabelos castanhos escuros tinham um corte médio, o penteado dele era bem agradável à vista.

— Eles estão apontando os arcos para nós? — O jovem olhou para os guardas que se posicionavam ao longo da muralha.

— Estão. — respondeu Xerife. — Levantem-se, quero dar o fora o mais rápido possível daqui, o cheiro deles é pior do que imaginei.

Assim que o prefeito apareceu sobre as muralhas, os três homens o encararam. Aquele simples olhar já inspirou temor em todos. Ayduin respirou fundo, tomando coragem para falar:

— Quem são vocês? O que os humanos querem?

— Elfos, povo da cidade de Aethenil, chega o dia de regozijo. — A voz de Xerife era misturada com ódio e orgulho, orgulho por representar seu mestre e ódio por ter que se dirigir sua palavra a seres tão desprezíveis quanto os elfos. — Erobern, legítimo governante de Testfeld retornou para trazer a glória, a paz e a prosperidade para todos os povos. Rendam-se agora e poupem o banho de sangue.

— Erobern? — Ayduin ficou mudo.

— Sim, Erobern, nosso senhor e governante. Nosso libertador, aquele que traz glória e conquista em seu caminho. Destruindo seus oponentes e protegendo seus aliados. Somos apenas mensageiros, trazendo nossa declaração de guerra e aguardando sua resposta.

— Quais são os termos?

— Rendição incondicional, livre passagem e alojamento para nossas tropas, uma taxa anual de cinquenta por cento de suas colheitas para sustentar os soldados imperiais. Proibição do uso não autorizado de magia e fim da adoração aos deuses.

— Isso é um absurdo! — gritou Ayduin.

— São termos razoáveis, Vossa Excelência. — Xerife levantou a cabeça para poder ver melhor o rosto do prefeito no alto da muralha. — São termos que deixam Vossa Excelência e o seu povo vivo.

— Irei reunir o conselho da cidade, esperem nossa resposta.

— Receio que não haverá tempo para isso, Vossa Excelência. Sua resposta deve ser simplesmente sim ou não. Em caso afirmativo, convocaremos nossas tropas para ocupar a cidade. Em caso negativo, não há nada mais a ser feito; a guerra será inevitável e começará amanhã.

Ayduin ficou em silêncio. Xerife o encarou de forma séria e concluiu:

— Então é isso… Amanhã voltaremos, desembarcaremos nas praias e Aethenil irá se tornar um montão de ruínas manchadas de vermelho. Que Erobern tenha piedade de vossas almas, pois eu não terei.

Os três homens viraram as costas para a cidade e seguiram pela estrada para longe dali.

— É pior do que eu imaginava… — sussurrou Ayduin. — Avise à capital para convocar toda a guarda real, mobilizar as formações de dragões, qualquer coisa…

— O senhor está bem? — perguntou um dos guardas.

— Como poderia estar bem, sabendo que amanhã estaremos condenados… O Rei precisa ser informado, o mundo precisa saber. Erobern voltou…

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