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Num grande salão, iluminado por estranhas auréolas que cruzavam o ar, em tons de azul e verde, havia um grupo de vinte e quatro indivíduos. Cada um deles estavam sobre uma espécie de plataforma circular pequena, que brilhavam entre as mais variadas cores.

As plataformas, apesar de estarem dispersas em todas as direções, como se fosse algo completamente aleatório, na realidade flutuavam em diferentes alturas em um espaço circular, como se isto indicasse o status de cada um dos presentes ali.

Os indivíduos que ocupavam essas plataformas mantinham-se em posições retas e firmes, mas, ao mesmo tempo, dispunham de uma excêntrica nobreza, que era exalada de forma natural. 

Seus rostos finos, orelhas compridas, olhos claros e longos cabelos loiros, somados ao ambiente mágico, destacavam sua grande beleza. Estes eram os outrora governantes de Avalon, a raça que uma vez regeu a maior parte do continente, os Altos Elfos.

“Qual é a situação da guerra entre Humanos e Orcs?” Um Elfo, numa das plataformas mais altas, com uma voz firme e semblante sério, perguntou. Se não fossem as leves rugas nos cantos de seus olhos, seria difícil dizer se ele era jovem ou velho.

Um dos que estavam nas plataformas inferiores gesticulou, tocando a ponta de seus dedos da mão direita acima do peito esquerdo, lentamente abrindo seu outro braço em uma curva sinuosa e se inclinando levemente para a frente, como um sinal de saudação.

“Após serem invadidos e perderem quase metade do território da Zona Divergente, as Legiões Humanas, que pareciam apenas observar em silêncio, finalmente estão movendo o grosso de seus exércitos. Ao menos cinco dentre as Dez Grandes Legiões começaram a lançar ataques, além das diversas Legiões de médio e pequeno porte.”

Enquanto o relatório era dito, todos ouviram atentamente.

“Por qual motivo eles esperaram tanto?” Outro Elfo, não tão velho, questionou. “Se eles reagissem mais rápido, poderiam ter salvaguardado boa parte de suas cidades.” O homem falou, tentando entender a ação dos Humanos.

“Não é óbvio?” Um dos mais velhos respondeu, com alguma assertividade. “Por nossa causa. Eles nos temem mais do que os próprios Orcs. Além disso, seus conflitos internos também são um dos grandes fatores, nenhuma das Legiões pareciam querer assumir a vanguarda e dar vantagem as demais.”

Um longo silêncio permeou o local após essas palavras.

“Eles negligenciaram centenas de milhares de seu próprio povo por causa disso?” Um dos Elfos das mais baixas plataformas disse, com um rosto escuro. “A maldade dos Humanos é imensurável. Eles e os Orcs não são tão diferentes, são um bando de animais.”

“Não subestime a raça Humana, sua crueldade é sem igual, abaixo apenas dos Orcs e daqueles que vivem nas Montanhas de Fogo. Mesmo sendo tão fracos, sua inteligência, resiliência, números e métodos maliciosos os fizeram se apossar de uma abundância de terras.” disse o Elfo mais velho, com rugas nos olhos, sua expressão mostrava que ele estava rememorando um passado distante.

“Os Humanos ou os Orcs, nada disso importa, devemos voltar nossos olhos para além do deserto de Gash Kharn.” A voz aguda e poderosa de uma Elfa, vestida em armadura, soou, tomando conta do salão. “As Trevas observam a carnificina, esperando ansiosamente o momento para se banquetearem dos vivos. Obscuros, Carniceiros e até mesmo Lichs foram avistados sondando as Terras Divergentes. Há notícias, inclusive, de Criaturas das Trevas chegando aos Bosques Andon, algo que não aconteceu por décadas.”

As expressões de todos no grande salão mudaram após ouvir as palavras da mulher.

“Devemos intervir nessa guerra. Deixe que Homens e Orcs tremam perante os nossos Campeões!” Um Elfo, com cicatriz em um dos olhos, disse, suas palavras contendo bravura.

“Não, isso só irá piorar tudo, devemos buscar o diálogo.”

“Dialogar com Humanos e Orcs? Absurdo! Eles só destroem tudo em que tocam!”

“Isso pode ser verdade para os Orcs, mas alguns Humanos podem ser razoáveis. Contanto que haja interesse mútuo, podemos chegar a um acordo.”

Enquanto uma acalorada discussão ocorria entre aqueles das bases menores, uma Elfa, a da mais alta e brilhante plataforma e a única que estava sentada, em um trono, permanecendo em silêncio durante todo o tempo, levantou-se. Assim que o fez, todo o salão caiu em silêncio absoluto.

Seus longos cabelos caídos, que chegavam até os joelhos, eram traçados nas pontas. Sua pele era tão branca quanto as nuvens do céu, mas brilhavam em uma tonalidade amarela. Seus olhos eram dourados como ouro. Sua roupa, bordada em prata, destoava entre seus semelhantes.

“Por hora, devemos observar. Até que o momento chegue, todos os Conclaves devem aguardar.” disse. Sua voz soava tão calma que fazia mesmo os mais irritados sentirem toda a sua raiva se esvair e ser soprada para longe. “O que Dhoran, representante de Satara, pensa a respeito?”

Os olhos de todos se voltaram para uma das plataformas, a única de cor vermelha, indicando que ali estava alguém de fora. A mesma não estava nem tão alta ou baixa, mostrando que mesmo não sendo um deles, esta pessoa tinha o respeito dos Elfos, pois este era um representante dos Anões, seus maiores aliados desde os tempos antigos.

O homem, chamado Dhoran, tinha uma longa barba marrom, que ao contrário dos rumores não era bagunçada e desleixada, pelo contrário, era simétrica e bem cuidada. Sua altura não era mais que um metro e meio e sua roupa era feita de uma mistura de couro e metal.

“Seja qual for a decisão que vossa alteza Elena tomar, Satara, como representante de todos os Trovadores, irá apoiá-la.” disse, sua voz cheia de certeza e convicção, mas, ao mesmo tempo, continha alguns significados extensos.

Os Elfos presentes eram todos figuras importantes, líderes de cada um dos vinte e três Conclaves Élficos, mas mesmo eles ficaram admirados com as palavras de Dhoran.

A verdade é que por mais que os Anões fossem tidos como aliados incontestáveis dos Altos Elfos, sua relação não era tão boa como já foi um dia, principalmente após a Grande Guerra, na qual a decisão dos Elfos fez com que as várias raças da Aliança Lourea, incluindo os próprios Anões, sofressem pesadas perdas, com muitas destas sendo erradicadas como resultado.

Devido a esse ‘rancor’ do passado, os Anões eram divididos por opiniões em dois grupos: os Trovadores, conhecidos por sua magia, e os Marteladores, reconhecidos por sua forja. Com o primeiro mantendo uma relação amigável e respeitosa com os Altos Elfos, enquanto o segundo possuía uma relação muito mais morna, com leves indícios de aversão.

A Elfa, na mais alta plataforma, assentiu, aceitando de boa vontade o gesto de Dhoran. Com a decisão tomada, os ânimos dentro do salão diminuíram, mas isso só durou por um momento.

“Minha rainha, e quanto aos Exilados? Soube que eles fizeram um novo levante contra os Humanos. Devemos enviar alguém?” Um dos que estavam em uma das plataformas mais altas, disse.

Ouvindo a menção sobre os Exilados, todo o ambiente do salão mergulhou-se em tensão.

A Elfa, chamada Elena, balançou a cabeça em negação.

“Eles não mais ouvem o sangue de Elen, não há motivos para nos envolvermos. Que suas ações e as consequências delas sejam de sua própria responsabilidade.”

Com a decisão tomada, ninguém mais ousou dizer nada, então logo, uma a uma, as plataformas apagaram-se e as auréolas que brilhavam no topo do salão diminuíram. A única iluminação que restou em todo o ambiente era a da mais alta plataforma.

“Não resta muito tempo… Que as estrelas nos guiem.” disse, sentando-se no trono, então, lentamente seus olhos dourados fecharam-se, e assim, o último resquício de luz apagou-se, cobrindo o salão em escuridão.

Em um riacho, não muito longe de onde a Vila Rosina uma vez existiu, o Batalhão Zero estava acampado, reabastecendo sua água e descansando.

Após vasculharem a região por uma tarde inteira, Theodora retornou com o Terceiro e Quinto Pelotões, de mãos vazias. Havia rastros de Orcs por toda a área, mas eles não conseguiram encontrar um único deles.

Essa situação estranha deixou muitos do Batalhão inquietos. Normalmente, não importa onde eles fossem, sempre encontrariam alguns Orcs desgarrados.

Temendo que houvesse algo por trás disso, Fernando resolveu partir da vila o mais rápido possível, mas antes disso, ordenou que todos os corpos dos cidadãos de Rosina fossem retirados das estacas e devidamente cremados.

Ele não poderia fazer nada sobre as mortes que houveram, mas poderia ao menos dar-lhes um enterro adequado.

Vendo isso, os membros da Unidade de Logística, que já eram gratos ao jovem Tenente, sentiram-se ainda mais admirados com o rapaz. Mesmo alguns soldados mais experientes ficaram emocionados com o fato de seu comandante se preocupar com esse tipo de coisa. Outros teriam apenas ignorado os corpos e seguido em frente.

“Se nos apressarmos, devemos chegar ao ponto de encontro amanhã cedo.” Ilgner disse, enquanto apontava para uma posição no mapa em cima da mesa.

Ao redor, estavam Fernando, Theodora, Thom, Trayan, Archie, Noah, Kelly e Gabriel. Ou seja, apenas aqueles que eram Oficiais e acima.

Normalmente, devido ao seu hábito desde Vento Amarelo, Fernando sempre reunia toda a cadeia de comando em reuniões estratégicas, mas percebeu que esse tipo de ação mais atrapalhava do que ajudava, já que haviam simplesmente muitos Cabos, então optou por mudar a forma de agir, reunindo somente as pessoas nas mais altas posições.

Dessa forma, seria muito mais rápido decidir coisas simples, além disso, havia mais um motivo. 

Em Belai, ele havia recrutado muitas pessoas e não sabia quantas delas eram confiáveis ou não. Reduzindo a quantidade de informações importantes que chegavam até elas, os riscos de qualquer informação vital vazar diminuiria muito. Isso era algo que o estava incomodando, sempre ficando receoso toda vez que fazia reuniões no qual assuntos sigilosos eram comentados.

“Mesmo com os desvios, provavelmente seremos a primeira Tropa Exploratória a chegar ao ponto de encontro. Talvez devêssemos diminuir nossa velocidade, algo não me parece certo.” Trayan disse, referindo-se ao desaparecimento dos Orcs na região.

Noah e alguns outros concordaram com isso. Além dos poucos Orcs que Lance havia avistado, que foram capturados pelos Ciclopes, não tiveram mais nenhum contato com o inimigo. Era como se tivessem simplesmente evaporado.

“Eu discordo, quanto mais rápido pudermos chegar ao ponto de encontro, mais rápido poderemos garantir o perímetro para aqueles que vêm depois. Mesmo que seja arriscado, é o correto a se fazer.” Gabriel disse com firmeza. Mesmo que ele fosse alguém conservador e cauteloso na maior parte do tempo, não gostava de fugir de suas obrigações.

Fernando, que estava em silêncio, assentiu.

“Faremos isso então. Preparem-se para partir ao amanhecer.”

Quando a reunião acabou, cada um deles saiu da pequena tenda, restando apenas Theodora olhando para o rosto pensativo de Fernando, que continuava olhando para o mapa.

“Líder, você parece tenso, quer relaxar um pouco?” disse, com um leve sorriso malicioso ao mesmo tempo, em que pegava o braço de seu líder e aproximava seus lábios do rosto dele.

Vendo isso, Fernando sentiu um arrepio na espinha, então apressadamente puxou o braço, se afastando, enquanto olhava para a saída da tenda, por onde Thom havia acabado de sair. 

Somente ao ver que não havia ninguém é que ele soltou um suspiro de alívio. Não queria que o rapaz visse a Medusa tão próxima dele e entendesse as coisas de forma errada.

Theodora riu de forma brincalhona ao ver seu líder fugindo dela tão assustado.

“Eu não mordo… a menos que você peça.” disse, rindo.

O jovem Tenente revirou os olhos. Mesmo que a mulher raramente cruzasse a linha na frente dos soldados, ainda mantinha-se falando bobagens o tempo todo.

A Subtenente foi em direção à saída, mas antes de sair, olhou para o jovem uma última vez, então, virou o rosto com seu sorriso diminuindo.

Após sair, seus olhos voltaram-se em direção ao Primeiro Pelotão.

“Hah!” Karol gritou, enquanto perfurava com sua lança para frente. Ela estava sem armadura, apenas vestindo uma blusa preta justa para cobrir a parte superior do corpo.

Do outro lado, Anane girou sua lança, desviando o ataque entrante, então fincou-a no chão, numa postura reta.

Vendo isso, A Cabo, que estava pronta para atacar novamente, parou seus passos. Essa era a postura que o homem tomava quando desejava encerrar o treinamento.

“Obrigada pela ajuda, Anane.” disse, enxugando o suor de sua testa.

“É uma honra que este possa servir a senhora.”

“Tenho algumas dúvidas sobre esse último movimento, poderia me explicar?” disse, lembrando-se da forma que o homem desviou seu ataque.

“Anane pede desculpas, mas terei que me retirar.” falou, curvando-se e indo embora. 

Vendo o velho homem apenas saindo assim, de forma tão repentina, Karol achou estranho, mas não o questionou, então guardou sua arma.

“A mulher da lança é tão trabalhadora, que orgulho.” Uma voz feminina soou, não muito longe, atrás dela, enquanto som de palmas soaram.

Quando ouviu aquela voz, Karol finalmente entendeu porque Anane havia saído daquela forma.

“O que você gostaria, Subtenente Theodora?” falou, de forma calma, mas não muito receptiva, encarando a mulher.

A Medusa não se importou com isso. Em todo o Batalhão, ela sempre era tratada das formas mais variadas, mas na maioria das vezes as pessoas não eram muito agradáveis em relação a ela, principalmente devido aos seus treinos e exigências rigorosas.

Como a mão direita de Fernando, sentiu que deveria cobrir as fraquezas de seu líder, sendo uma delas a falta de rigor dele perante alguns assuntos. Se as pessoas fossem permitidas a agir como quisessem, a qualidade geral do Batalhão cairia. Ela não se importava em ser a carrasco que todos odiavam, contanto que isso fosse benéfico para a pessoa a quem jurou lealdade.

“Nada, eu apenas gosto de te ver toda suadinha assim, principalmente quando está sem armadura.” falou, de forma brincalhona enquanto se aproximava. “Seus seios balançam de uma forma tão atraente quando se move com essa lança.” continuou, olhando fixamente o busto da Cabo.

Karol não reagiu minimamente às provocações enquanto continuava a olhar a Medusa nos olhos. Devido ao tempo em que esteve sob a asa de Theodora, servindo sobre seu Esquadrão, já havia se acostumado há muito tempo ao seu jeito.

“O que você realmente quer, Subtenente?” disse, com olhos confrontantes.

O sorriso de Theodora lentamente diminuiu, andando até a sua frente e parando a poucos passos dela, então aproximou-se de seu rosto, olhando em seus olhos, seus lábios quase tocando os de Karol.

Vendo isso, a Cabo quase recuou, mas no fim manteve-se parada, pois sabia que quando lidava com a mulher à sua frente, não deveria perder sua postura.

Sem dizer uma palavra sequer, a Medusa continuou olhando-a em silêncio, então, sem qualquer aviso, suas duas mãos subiram, apertando os seios da Cabo.

“O-o quê?!” Karol gritou, recuando apressadamente.

Ela finalmente ficou louca de vez? perguntou-se, cobrindo seu busto com as duas mãos.

Theodora não disse nada, apenas mantendo suas mãos no alto, movendo as pontas dos seus dedos de forma pensativa.

“São maiores que os meus…” falou, decepcionada.

“S-sua!” A Cabo resmungou com seu rosto ficando vermelho, tirando sua lança.

Mas ao contrário de suas expectativas, Theodora não reagiu no mínimo, pelo contrário, apenas a olhou de forma calma.

“Eu ouvi falar que você e o Fernando discutiram mais cedo.” A mulher comentou, ainda com a mesma expressão. Devido a sua posição e sua forma de liderar, pouca coisa acontecia no Batalhão sem que ela ficasse sabendo.

Ouvindo isso, Karol franziu a testa. Ela, já irritada com a ação da mulher, ficou ainda mais brava com suas palavras.

“Não se envolva nos assuntos entre mim e meu marido!” disse, de forma séria. Mesmo que ela tolerasse algumas brincadeiras e provocações, havia um limite.

Theodora não respondeu imediatamente, mas virou-se, preparando-se para sair.

“Ele a escolheu como mulher e como parceira, seu dever é ajudá-lo a lidar com o peso em suas costas e não colocar ainda mais fardo.” falou, sua voz ficando fria enquanto olhava para a Cabo. “Não me decepcione, Karol. Se machucar o Fernando, eu garanto que ele não será o único a sentir dor.” Após dizer isso, afastou-se.

Karol ficou parada, com uma expressão complicada ao ouvir aquilo. Ela sabia que por mais estranha que Theodora fosse, a mulher era extremamente leal a Fernando e se preocupava com ele tanto quanto ela própria.

Lembrando-se do passado, quando jurou apoiá-lo e sempre estar ao seu lado, não conseguia se sentir bem com a situação tensa entre ela e seu marido.

Além disso, a expressão que viu Fernando fazer mais cedo, mesmo que tenha durado apenas um momento, ao olhar a foto que o Sargento Damon mostrou, a fazia ter certeza que havia algo de errado.

Com uma expressão conflituosa, que durou alguns segundos, ela finalmente se decidiu.

“Eu já sei o que preciso fazer, não preciso que me diga isso.” resmungou consigo mesma, como se estivesse irritada, mas seu semblante era muito menos tenso que antes, então saiu, guardando sua arma.

Ao longe, encostada em uma árvore, sobre a sombra, Theodora sorriu.

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