Um brilho verde intenso caiu sob todos ali presentes.
— Maculados sejam vós, hereges de meu rei.
— Até seu linguajar é meio antigo… — murmurou Isak.
— Quem usa “maculado” hoje em dia? — zombou Jess.
Diante aos murmúrios oprimidos abaixo de seus pés, o homem no trono ergueu-se. Descendo alguns degraus iluminados parcialmente, ele bateu palmas para que todas as chamas acendessem. Do chão ao topo, tochas iluminavam a sala do trono, revelando uma imensidão ainda maior do que os agentes esperavam. Todavia, ainda que tudo estivesse iluminado, a figura ainda se escondia no resto de sombras que existiam.
— A qual rei segue? — Embora não citasse a quem perguntou, todos sabiam que era para Bastien. Afinal, dentre todos do grupo, sua presença já indicava quem era o líder.
— Hades — retrucou Bastien, sem perder sua postura e coragem.
— Um seguidor do deus imaginário… Espero que os convidados de honra de meu pai sejam de fato honrados. Mostrem-me o motivo pelo qual lutam, e sejam fortes para resistir.
Isak resmungou pela imponência do homem. Quebrando qualquer cerimônia, aquele ser saltou para o centro do grupo, ficando na frente de Jess e nas costas de um dos defensores. Para os agentes, foi apenas um leve vulto que tocou no chão e desaparecera no mesmo instante.
De seu calcanhar, onde uma vinha servia de atadura, esta mesma vinha ricocheteou contra o rosto de Jess como um chicote. No entanto, um dos defensores soube reagir e se moveu em direção a Jess, conjurando um escudo azul de pura energia em mãos e protegendo sua companheira. O som do chicote ecoou pelo saguão, ao mesmo tempo que os agentes se espalharam para recuar do recuo.
— Desgraçado! — exclamou Isak. — Não tens coragem de atacar frente a frente?!
— Não provoca… — Bastien tentou reprimir, porém, já era tarde demais.
Uma mão pequena, do tamanho de uma criança provavelmente, se encontrou com o abdômen de Isak e amassou sua armadura de aço, fragmentando um dos melhores metais do mundo apenas com sua força bruta. Isak foi jogado contra uma parede como resultado, mal conseguindo respirar e cuspindo sangue no chão, pois a placa de metal esmagava seu estômago.
Posteriormente, por detrás de Bastien, o ser revelou sua face. O corpo assemelha-se ao de uma criança, tanto em altura quanto em formato. Sua pele, no entanto, era feita da própria madeira da árvore-da-vida ao qual servia de castelo; os pés portavam rachaduras que se estendem pelo corpo como cicatrizes. Vestia uma calça verde indo até o joelho e uma saia feita das folhas de uma palmeira, árvore que pode ser encontrada ao extremo daquele bosque.
Os cabelos verdes e áridos não eram tão longos mas longe de ser curtos onde, atrás da orelha, surgia um chifre que se estendia como um galho. Suas escleras cinzas apoiavam os olhos verdes, cujos emitiam mana naturalmente. A expressão presunçosa e confiante incomodou a Bastien, pois apenas pelos olhos, era notório o quão superior ele se achava.
Agindo depressa, o Emissário saltou contra Bastien, visando chutar o líder dos agentes na cabeça. No entanto, os dois defensores surgiram para defender seu líder com seus escudos de energia. O impacto do chute foi reduzido, porém, ainda teve resultados o suficiente para afundar as pernas de um dos defensores no chão. Vendo a necessidade, o Emissário recuou.
Após pisar no chão novamente, Jess surgiu de repente com sua espada, preparada para parti-lo ao meio. Convicta de seus ataques, Jess efetuou seu primeiro corte; em vão, pois o Emissário desviou facilmente. Contudo, ela não pensou em desistir.
Conjurando círculos de energia pelo espaço, Jess materializou a própria mana em lâminas novamente. Enquanto ela avançava e efetuava cortes visando partir o Emissário, suas lâminas flutuavam pelo ar buscando acertá-lo.
Mas, para a tristeza e inferioridade dos agentes, o Emissário estava tratando a mais ágil deles — ficando abaixo apenas de Bastien — como uma criança atacando sem direção e objetivo. Subestimada a cada movimento, a cada passo, a cada deslize… Sua prepotência afetou a mente de Jess por um segundo.
Ao perceber que sua adversária tinha uma mentalidade extremamente egoísta e fraca, o Emissário decidiu matá-la por vez: sua própria mão se moldou numa lâmina afiada e maleável, cujo potencial de ataque estava nítido apenas por sua aparência única.
Uma faísca, acompanhada pelo som do choque entre metais, iluminou mais que as próprias tochas.
— Não durma — disse Bastien, segurando o ataque do Emissário e expulsando-o para trás. — Vamos juntos daqui.
Jess assentiu e, no mesmo segundo, os dois arrancaram contra o Emissário. Só por estar na companhia de Bastien, o humor da agente tinha alterado completamente. Surpreendentemente, todos os círculos de energia e lâminas de Jess se tornaram em braços transparentes, empunhando lâminas finas e flutuando rumo ao Emissário. Empunhando uma lança, um dos braços atirou a arma como um projétil contra o inimigo.
Em contrapartida, o Emissário apenas desviou exibidamente da lança.
No que o Emissário desviou, uma criatura brutamonte o agarrou pelo tronco e arrastou-o pelo chão. Quando a criatura, por fim, soltou o Emissário, Bastien surgiu em sua frente, empunhando seus dois punhais.
Os dois entraram em um combate direto e curto, onde o Emissário demonstrou socos ágeis e precisos, típico de um artista marcial experiente. Do outro lado, Bastien visava cortá-lo com suas armas, mas a pele daquele ser era dura demais para seus simples punhais. Agarrando os pulsos de Bastien, o Emissário chutou o estômago do agente e o arremessou para longe.
A criatura brutamonte tentou atacar novamente, desta vez pelas costas, mas o Emissário pressentiu e, ainda assim, não mexeu um músculo sequer. Invés dele, uma estaca criada do chão atingiu a besta, suspendendo-a no ar e o matando no mesmo instante.
“Patético…” pensou o Emissário.
Ele acompanhou os agentes se unirem novamente, onde todos se juntaram a Bastien e alguns ajudando Isak.
— Força, isso é o que meus convidados terão que te entregar. — disse uma voz grossa e com um tom de sabedoria. A mente do Emissário, confusa e entediada, mesclava o passado com o presente. — Você é naturalmente poderoso, então, eles terão que lhe entregar apenas isso em retorno. Como gratidão a minha piedade.
A única maneira de esquentar o sangue de um ser absolutamente forte é…
— Através de uma luta entre a vida e a morte. Esse é seu objetivo de vida.
“Isso é inacreditável…” resmungou mentalmente. “Mais de sete incursões convidadas pelo meu pai, mas nenhuma chegou a me desafiar verdadeiramente… Estou à mercê desses galhos podres há décadas, sem ver a luz do sol, para eles me entregarem essa demonstração patética e hilária?”
O Emissário ficou cabisbaixo, encarando apenas o chão enquanto dissipava sua aura.
— Decepcionante… — Ele cerrou seus punhos, consecutivamente, piscou os olhos e encarou o ar à sua esquerda esboçando curiosidade. — Quê?
Bastien o encarou ao longe, segurando o próprio estômago enquanto sangrava pela boca.
— Ele está delirando…
— Sim, claro, meu pai… — respondeu. Em seguida, encarou os agentes. — Sorte… Vocês têm sorte. O que pai manda, o filho executa.
O Emissário estalou os dedos.
— Sabem do que um Emissário é capaz?
Isak engoliu em seco.
— Recebemos dons e, destes dons, criamos nossas peculiaridades. Dons deixados pelo filho do anjo…
Quando o Emissário começou a gesticular os dedos, todos entraram em postura de luta. Os agentes sabiam que, embora não estivesse usando energia, o impacto do que ele tramava era evidente. Os dois defensores tomaram a frente com seus escudos, protegendo a todos que se preparavam para atacar.
— Eu recebi o dom da natureza, o Emissário rei do quarto elemento… Zethíer, o gerador da vida.
Sem esperar o momento esnobe do Emissário chegar ao fim, um dos conjuradores agiu. Criando um projetil de energia, que logo atirou contra Zethíer, onde quase acertou sua testa. Contudo, antes que o feitiço o atingisse, o Emissário se moveu rapidamente para o lado dos agentes e agarrou o tal conjurador pela garganta.
— No entanto… Quem traz a vida, também a tira.
Pondo força em sua mão, Zethíer esmagou a garganta do agente como se fosse uma lata de alumínio. Rapidamente, os agentes novamente recuaram graças ao movimento veloz do Emissário. Todos menos Bastien, que avançara contra seu inimigo empunhando sua espada principal.
Arrancando contra Zethíer, Bastien visou decapitá-lo num corte limpo e seco, mas o Emissário desviou inclinando suas costas para trás. Por fim, apenas alguns fios de cabelos foram ao ar.
— Huh… — suspirou Zethíer, feliz.
Sem o deixar pensar, Bastien retornou para atacá-lo em cortes pensados; visando acertar seus principais pontos de chakra. Afinal, não importava a qual raça Zethíer pertencesse, seus chakras estariam no mesmo local que na anatomia humana.
— Uma espada encantada, cuja habilidade é cortar o cordão de prata… — disse Zethíer.
Bastien, por um mísero instante, pensou em como Zethíer poderia saber o encantamento daquela lâmina. No entanto, ele quis acreditar que, por Zethíer ser um ser considerado superior, seu terceiro olho deveria estar totalmente aguçado.
— A lâmina de Thanatos! — exclamou Zethíer, desviando de Bastien e se esgueirando para às costas do agente.
Contudo, Bastien previu aquele movimento e retornou para trás deslizando sua espada pelo ar. Como defesa, Zethíer suspendeu um pilar de terra para bloquear o corte. Pelo simples choque, Bastien dizimou o pilar e utilizou dos destroços como projéteis contra o Emissário.
Um pedaço de terra, consideravelmente grande, despencou para cima de Zethíer. Utilizando os dois braços para segurar o bloco, todo seu corpo se manteve aberto para Bastien se aproveitar; movendo-se para a esquerda, o agente golpeou Zethíer na costela e o lançou para longe.
— Sor Jack… — chamou Jess. — Não vai fazer nada?
— Ainda não…
Jack mantinha as mãos no chão, esbanjando atributo gelo enquanto se preparava para lançar um feitiço em Zethíer.
— Vamos, Bastien. Você…!
Zethíer já havia notado o movimento precipitado de Jack; o Emissário apenas riu da situação deplorável dos humanos. Sem pestanejar, uma serpente colossal apresentou-se nas costas de Jack, forçando o desviante a trocar o alvo de seu feitiço repentinamente.
Deslizando a mão pelo chão, Jack suspendeu uma névoa gélida pelo ar e congelou a besta viva. Embora imóvel, Jess notou uma armadilha; um brilho amarelo escapava por debaixo do gelo.
— Sor Jack!
Jess agiu antecipadamente, conjurando uma das mãos de energia e levando Jack para longe. Antes que saíssem do alcance, a serpente explodiu, causando um tremor na árvore-da-vida e acertando alguns agentes. Jack e Jess caíram na escadaria rumo ao trono, enquanto outros foram lançados para lados diferentes.
— Perdão, mas brinco com você mais tarde — disse Zethíer, olhando de canto para Bastien.
Antes de mais nada, um vulto veloz agarrou Bastien pela costela e o arrastou para fora do saguão, saindo pelo portão principal e caindo em meio a floresta. Com um único mover de braços, os portões se fecharam.
O Emissário vasculhou o local, vendo quais eram os sobreviventes. Ainda restavam cinco agentes; além dos dois defensores, somente Isak, Jack e Jess estavam de pé. Visto que o último conjurador morreu pelas mãos de Zethíer e dois estão fora de combate (Bastien e Sara), não havia muitas peças para o Emissário brincar.
Zethíer caminhou sem rumo por alguns segundos, já que todos estavam notoriamente fracos, nenhum deles poderiam lhe entregar algo grandioso. Jess estava acordada por pouco, enquanto Jack estava realmente inconsciente, o que apagou qualquer interesse do Emissário. No entanto, os únicos que chamaram sua atenção foram os que ainda conseguiam se manter de pé naquela ocasião; Isak acompanhado pelos defensores.
Após tanto retroceder, Isak conseguiu retirar sua armadura amassada, tal qual estava o sufocando graças ao golpe de Zethíer. Em contrapartida, agora ele estava simplesmente sem proteção. É claro, tendo apenas os defensores como seus escudos.
“Meu soco ignorou aquele pedaço de lata e o acertou diretamente. Pensei que ele estava com dificuldades, mas se recuperou bastante rápido…”
Uma leve ventania correu entre os dois; Zethíer encarou Isak de longe, separados por alguns metros e ofuscados por uma nuvem de fumaça. Seus olhares eram completamente destoantes, mas ainda mantinham uma certa grandeza.
— Você foi quem sobrou, berrão — disse Zethíer.
Isak rangeu os dentes e cerrou os punhos, onde, ainda que tivesse em mente sua derrota iminente, sua honra não o deixava desistir. Não agora, após perder literalmente todos os membros de seu grupo, aquilo, de certa forma, iria ficar em sua mente. Uma agonia sem pretendentes. Se fosse para morrer, ele deveria morrer naquele local sem oportunidade para sair do domínio.
— Sir Ziziel… — murmurou Isak, formando a base de combate; pondo uma perna atrás e outra na frente, preparando seus punhos. — Não irei desapontá-lo.
Novamente, os dois se encararam ao longe, porém, enquanto Zethíer encarava seu adversário com desdém, Isak o olhou com admiração e confiança.
O ambiente se preparou para o combate.