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Capítulo 17 – A capital.

Depois de uma noite de festa, Colin e suas companheiras pegaram algumas provisões, uma carroça e jogaram a cabeça enorme do Bakurak dentro, cobrindo-se com uma lona.

Sem perder mais tempo, eles partiram rumo a capital.

Brighid, que era sempre tão tagarela, ficou em silêncio e cabisbaixa enquanto estava sentada no ombro de Safira. Para Colin, aquilo era um alívio, mas Safira achou estranho aquele clima.

Seguiram pela estrada sem enfrentar adversidades.

Colin matou um lobo ou outro, mas não viram nenhum bandido.

O motivo era que aquela era uma estrada usada frequentemente por guarnições do império de Ultan. Eles cruzavam com algumas diligências e comerciantes em geral.

Quem escoltava as diligências não eram soldados, mas estudantes. 

A maioria era engomadinho, encarando Colin e suas companheiras com um semblante sisudo. Seus olhos se concentravam principalmente na Fada.

Fadas eram bem raras no continente, e como consequência, elas valiam bastante no mercado negro. Colin pensou que seria melhor evitar as estradas. Ele era um novato no uso de magia assim como Safira, e pra piorar, Brighid não podia ferir humanos para os proteger.

— Vamos fazer um desvio! — Colin puxou as rédeas do cavalo entrando na floresta.

— O que aconteceu? — indagou Safira.

— A gente chama atenção demais. Esse pessoal da capital deve saber usar magia melhor que a gente. Não posso arriscar entrar em uma briga com eles. 

— É por minha culpa, não é? — indagou a fada de maneira ríspida.

Não era inteiramente culpa dela, mas ela tinha a maior parcela de culpa nisso. Vendo que ela estava incomodada, Colin resolveu não responder aquela pergunta.

Emburrada, Brighid fez beicinho e cruzou os braços virando o rosto.

Ela não precisou de muito para chegar as próprias conclusões.

— Devemos levar um pouco mais de tempo para chegar à capital daqui — disse Colin. — Ainda mais porque passaremos por um terreno irregular levando a cabeça de um Bakurak. É provável que animais selvagens sejam atraídos pelo sangue. Estejam preparadas. 

Sentindo-se culpada por eles terem que contornar um trajeto inteiro, Brighid suspirou e bateu asas, saindo do ombro de Safira.

— Esperem um pouco, já volto!

— Onde você vai? — indagou Colin.

— Não saiam daqui!

A Fada alçou voo e desapareceu no topo das árvores.

Colin e Safira cruzaram olhares, mas não passou disso. Apesar de Safira querer se aproximar de Colin, ele era tão fechado que se tornava alguém impossível de se aproximar sem pensar que a própria estaria incomodando.

Os pássaros entoavam seus cânticos animados enquanto a luz do sol filtrava pelas folhagens, iluminando parcialmente a carroça.

Colin observava atentamente ao redor, notando esquilos saltitando de galho em galho e espécies de aves desconhecidas, além de algumas que reconhecia de seu mundo.

Essa tranquilidade lhe trazia à mente lembranças de sua infância, das vezes em que acampava com o pai para caçar nas montanhas. No entanto, essas memórias eram agridoces, já que seu pai não era o mais carinhoso ou gentil dos pais.

Brighid voltou estampando um sorriso no rosto.

— Por aqui! — ela apontou para o Leste. — Rápido!

— Onde está nos levando?

— Não tenho tempo para explicar, vêm!

Safira e Colin deram de ombros e a seguiram. O caminho não tinha muitos obstáculos, e à medida que adentravam mais a fundo na floresta, notaram dezenas de árvores quebradas e sentiram um cheiro forte de algo apodrecendo.

Não precisavam chegar mais perto para notarem um ogro dormindo em meio a um amontoado enorme de folhas secas.

Ele tinha por volta de três metros, seu corpo era corpulento, chegando facilmente aos quinhentos quilos. Com pele amarelada, orelhas pontudas, dentes pontiagudos e uma tanga feita de pele tapando as genitais, o ogro deu um longo arroto e coçou a pança.

— Colin! — Brighid se aproximou dele. — Se eu pegar um pouco da baba daquele ogro, posso fazer um ritual para me disfarçar!

Colin ergueu as sobrancelhas sem entender nada.

— Ritual? Do que está falando?

O ogro bocejou e cheirou o ar duas vezes, abrindo os olhos em seguida.

— Comida! — ele sentou-se, coçando a pança mais uma vez. — Sinto cheiro de comida!

Ele se ergueu e apanhou o tacape feito do tronco de uma árvore.

— Quem ser ocês? — ele olhou para a cabeça de Bakurak na carroça e sentiu o cheiro de carne, lambendo os beiços. — Brog aquilo querer! Entregue para Brog!

— Espera! — urrou Colin sem sucesso.

Brog partiu para cima de Colin e cingiu o tacape acima de sua cabeça, descendo com tudo.

Bam! Crack!

Brighid fez uma barreira e bloqueou aquele ataque, quebrando o tacape do ogro que caminhou trôpego para trás e caiu de bunda no chão.

— Ei, Fada! — chamou Colin. — Você não pode lutar com humanos, mas pode lutar com aquilo, não pode?

Ela apoiou o indicador frente aos lábios pensativa.

— Está querendo que eu o mate?

— Lógico!

Ela cruzou os braços e fez que sim.

— É melhor que você o mate, Colinzinho, vai ser melhor para você subir de nível em sua árvore.

Após coçar a nuca, Colin desceu do cavalo e puxou sua adaga da cintura.

— Tsc! É melhor que esse seu disfarce funcione, me ouviu?

O ogro se levantou furioso e foi correndo na direção de Colin. A sorte de Colin, era que seu oponente era lento.

Vush!

Colin passou debaixo das pernas do ogro e com a adaga cortou o tendão de seu calcanhar direito. O ogro deu mais dois passos antes de cair de cara no chão.

Bam!

Nem mesmo ele acreditou quando executou um corte tão limpo e preciso. O ogro urrou e se remoeu no chão de dor. Ele virou-se de barriga para cima e se arrastou para trás usando as mãos.

— P-Poupe o Brog, senhor Elfo!

Colin não deu ouvidos e partiu em disparada na direção do Ogro que ergueu as mãos frente ao rosto para se defender, mas suas mãos foram arrancadas pela adaga de Colin.

Crash!

— Aaaaaaa! — urrou o Ogro.

Colin girou a adaga na palma da mão e a apertou pelo cabo, cravando-a na testa do Ogro, que bateu com as costas no chão em um baque.

Bam!

— Aí está, pegue quanta baba quiser — Colin limpou o sangue da lâmina na borda da camisa e a devolveu a bainha.

Saltou de cima da pança do ogro e caminhou direto para o cavalo.

Safira ainda não havia se acostumado com a frieza de Colin, ao contrário da fada que já havia presenciado coisa pior.

Batendo as asas, Brighid foi até o ogro e adentrou aquela boca mau cheirosa.

Um brilho esverdeado emanou de dentro da boca do ogro, Brighid saiu lá de dentro em seguida.

— Tudo pronto! — exclamou ela. — Agora preciso de um pouco de Funcho, batata-doce, rabanetes e cenoura!

— Vai fazer o que com isso, uma sopa?

Ela fez que não com o indicador.

— Você vai ver, Colinzinho!

Ele deu de ombros.

— Vamos arrumar isso na capital. Viaje escondida, fada, olharei ao redor para ver se acho algo de valor.

— Humpf!

Brighid foi até Safira e se escondeu dentro de sua camisa. Safira sentiu um pouco de cócegas e Brighid colocou a cabeça para fora da gola dela.

Mesmo após adentrar a boca fétida do ogro, Brighid continuava com o mesmo aroma de rosas de sempre.

— Não precisa se preocupar, Colinzinho, aquele ogro não tinha nada de valor — disse a fada. — Ogros não costumam dormir fora de seus covis. Quando o fazem, é porque eles ainda não encontraram um. Você não encontrará nada valioso por perto, tenho certeza.

Colin fez muxoxo e virou as rédeas, saindo da floresta e pegando a estrada. Ele pensou em cortar a cabeça do ogro e levá-la consigo, mas achou melhor não. Brighid disse que Bakuraks eram raros, então ele deduziu que aquilo lhe renderia um bom dinheiro.


Mesmo com a fada escondida, eles continuaram atraindo olhares, mas eram apenas curiosos que não paravam de encarar aquela coisa enorme escondida por lonas. Quanto mais perto chegavam da capital, mais evidente ficavam os seus muros altos.

A capital era tão grande que não se encontrava o fim somente olhando para os lados. Por ser um forte ponto comercial, os guardas mantinham a cidade aberta a qualquer um que quisesse fazer negócios, mas um tributo devia ser pago aos guardas para adentrar.

Os guardas não ficaram tão surpresos com a cabeça do Bakurak, já que viram coisas mais monstruosas passarem por aqueles portões. Porém, aquilo não significava que trazer a cabeça de um monstro daquele era comum.

Colin ganhou, sim, seus cinco minutos de fama.

Usou as poucas moedas que tinha ao pilhar daquele esquadrão destruído por forças da capital para pagar a taxa de entrada.

Aquelas armaduras negras ainda deixavam Colin nervoso e Safira assustada, mas ambos tinham que conter seus sentimentos.

Mesmo para simples guardas, aqueles homens transmitiam um ar claro de perigo.

Depois de Colin dar a eles tudo que tinham nos bolsos, aqueles homens o deixaram passar. Assim que cruzaram o enorme portão de ferro, tanto Safira quanto Colin ficaram perdidos naquele mar de pessoas transitando de um lado para o outro.

Haviam tavernas com títulos chamativos, lojas de roupas, comerciantes de pele de animal, de armas, artefatos mágicos e joias.

Desde que chegou, Colin não viu nada como aquilo.

Ele sentiu-se dentro de uma história medieval, com diversas raças diferentes cercando o lugar. Seus olhos avistaram os infames Orcs, tão grandes e fortes quanto ele se lembrava dos filmes e jogos. Ele viu homens-fera, elfos, anões e até mesmo duendes.

Conforme andava, viu vendedores anunciarem ovos de Grinfos para domesticação, ovos de basilisco e ovos de serpentes gigantes. Alguns vendedores os chamavam para mostrar seus produtos.

Não era só animais e artefatos que estavam à venda. Haviam mulheres na porta de bordéis abordando tanto homens quanto mulheres para conhecerem o estabelecimento.

Também havia comércio de escravos em plena luz do dia.

— Garoto! — chamou um homem careca e musculoso. — Você parece ter algo interessante aí, por que não me deixa dar uma olhada?

Ele vestia-se como um bárbaro e suas roupas eram coloridas. Em volta do seu pescoço estava um colar repleto de dentes de diferentes tipos de animais.

— Nunca te vi por aqui, é de onde? Brambéria? Valéria ou do país dos Elfos Negros?

Colin o encarou de cima a baixo com o cenho franzido.

— É um mercador de feras?

O homem deu de ombros.

— Pensei que estivesse óbvio, hehe — ele aproximou-se da cabeça do Bakurak e jogou parte da lona que o cobria de lado. Após alguns segundos apoiou a mão no queixo. — Você pegou um dos grandes, mesmo que seja só um filhote. Você que matou?

— Eu e minha companheira.

O careca alisou o queixo encarando Safira e Colin de cima a baixo.

“O garoto tem um físico bom para um Elfo Negro. Árvore da Pujança, talvez? No entanto, a garota é magrinha, parece que vai quebrar de tão frágil. Bem, meu trabalho não é julgar meus clientes.”

 — Você quer quanto na cabeça do Bakurak?

Colin não tinha noção do preço de mercado daquilo, nem a noção da moeda local.

— Não sei… — disse ele. — Quanto acha que essa belezinha vale?

O careca alisou o queixo.

— 500 peças de ouro. Se tivesse o corpo todo eu lhe daria três mil — ele alisou o pelo quase metálico da fera. — O pelo ainda pode ser derretido para fazer armaduras — ele abriu a boca da criatura. — Os dentes estão bons também, dá para fazer algumas espadas boas com eles.

Colin assentiu e desceu do cavalo. Tirou a adaga da cintura, abriu a boca da criatura e a enfiou naquela gengiva, rasgando um dos caninos até a raiz. Balançou o dente da criatura até arrancá-lo, repetindo todo processo com o outro canino.

Assim que terminou, Colin ficou frente ao mercador.

— E agora, o quanto quer por ele?

O careca abriu um sorriso de canto.

“O garoto é novo nesse negócio. Ele não sabia que Bakurak são criaturas raras. Bem, não me importo desde que ele continue trazendo mais carcaças de animais raros para mim.”

—  Manterei o meu preço — disse o careca. — Em troca, você deve me trazer mais carcaças de animais, porém, somente para mim, entendeu?

Colin deu de ombros.

— Tudo bem. É melhor que não tente passar a perna em mim, careca.

Hehehe, você é do tipo selvagem, né? Fique tranquilo, garoto, não construí minha reputação mentindo para meus clientes. Espere aqui por um momento, buscarei as moedas.

Colin ficou esperando, enquanto as pessoas o encaravam, assim como encaravam Safira. Havia muitos estudantes entorno, e muitos deles já leram sobre Bakuraks em livros didáticos e sabiam muito bem o quão assustadores eram.

Ver uma daquelas criaturas abatida era algo que os fascinou.

— Aqui está!

O mercador apoiou o saco no balcão e ele fez um tilintar agudo. Colin abriu o saco e apanhou uma moeda de ouro. Nela estava estampado o imperador de Ultan portando sua enorme coroa ornada.

Aquele saco de moedas era bastante pesado. Colin o amarrou em um dos alfanges do cavalo e desprendeu a carroça, deixando a cabeça do Bakurak para trás.

Ele subiu no cavalo assumindo as rédeas.

Deu a mão a Safira que se sentou atrás dele.

— Garoto! Qual seu nome?

— Colin.

— Colin, o assassino do Bakurak, foi um prazer fazer negócios com você!

Sem dizer nada, Colin virou as rédeas do cavalo e trotou para longe daquela multidão. Em breve anoiteceria e Colin precisaria de um lugar para pernoitar.

A capital era imensa, nem andando por ela o dia todo Colin conseguiria a explorar por completo.

Cidades tão grandes também eram repletas de crimes, e Colin cresceu em lugares assim.

Ele viu uma estalagem com o nome de “Estalagem do Anão Caolho”.

A entrada não era muito receptiva, mas Colin queria gastar o menos possível.

Ele amarrou as rédeas do cavalo nos troncos do lado de fora, bem em frente a uma manjedoura, adentrando a estalagem.

A recepção era rústica, com estante e bancos de madeira mais ao fundo. Em cima da cadeira, fumando cachimbo enquanto lia um livro, estava o anão caolho.

Seu olho esquerdo era coberto por um tapa olho e sua boca se escondia atrás daquela barba ruiva volumosa.

— Ótimo! Outro Elfo Negro, parece uma infestação.

Colin não se importou em ser hostilizado, ele já estava se acostumando com aquele tipo de hospitalidade.

— Quero seu melhor quarto.

— Melhor quarto… você tem dinheiro pra pagar?

Enfiando as mãos nos bolsos, Colin retirou uma moeda de ouro e jogou no balcão. O anão arregalou o único olho que tinha e fechou o livro o apoiando na bancada.

— Meu Senhor Elfo! Bem-vindo a estalagem do anão caolho! Irei apresentar meu melhor quarto ao senhor, prefere que seja com uma cama ou duas? — ele olhou para Safira. — Se o senhor não se importar, há uma cama aconchegante no segundo andar, você e sua companheira vão adorar — O anão abaixou o tom de voz — Garanto que ela não fará barulho algum, hehehe.

— Duas camas! — respondeu Colin rispidamente.

— Claro, claro, me sigam!

O tratamento havia mudado completamente, mas Colin não se importou.

Ele e Safira subiram dois lances de escadas e se depararam com o melhor quarto da estalagem. Havia duas camas grandes, mesa de cabeceira, espelho enorme, sofá, estante para livros e até mesmo uma sacada mais ao fundo.

— Se precisar de alguma coisa me chame, está bem? Estarei lá em baixo.

Colin assentiu com a cabeça e o anão se retirou fechando a porta.

Safira se sentou na cama e passou a mão nos lençóis sentindo a maciez. Ela tirou os sapatos e se jogou na cama abrindo os braços.

— Minha nossa, uma cama de verdade!

Brighid saiu da gola da camisa de Safira e espreguiçou-se.

— Nossa! Estamos ricos, Colinzinho?

— Ainda não — ele retirou a corda com as presas do Bakurak das costas e as colocou no chão, empurrando com os pés para debaixo da cama. — Durmam um pouco, amanhã será um dia longo.

Brighid se jogou na outra cama e deu um longo suspiro.

— Aí não, fada, essa cama é minha.

— Olha o tamanho dela, cabe nos dois perfeitamente.

— Sai.

Brighid franziu o cenho e foi voando para a cama de Safira.

— Seu grosso!

Foi a vez de Colin se sentar na cama e senti-la.

Por um instante ele recordou-se de casa. Sentiu saudades dos doces, de passar tempo vendo animes ou lendo histórias em quadrinhos, sentiu saudades até mesmo dos jogos online e dos amigos virtuais. Ele se desfez daquelas memórias com um sorriso e retirou os sapatos. Não havia porque se apegar ao passado, já que nada daquilo importa mais.

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Olá, eu sou Stuart Graciano!

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