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De pé no portão em cima de um cavalo pardo e coberto por uma capa preta, Colin aguardava o retorno de suas companheiras. Elas haviam partido a dois dias com os cinquenta recrutas mais promissores, já estava quase na hora de retornarem.

Fuooon!

Um dos guardas no alto da torre tocou a trombeta, anunciando que algo estava se aproximando. Alunys e Leona despontaram da mata em cima de seus cavalos. Os habitantes do vilarejo vieram logo atrás. Alguns estavam em cima de cavalos, outros, empurravam carrinhos de mão com suas coisas dentro.

Todos os cinquenta recrutas haviam retornado vivos. Alguns portavam um olhar de desespero, outros, tinham um olhar mais maduro.

Para o bem ou para o mal, eles haviam amadurecido.

O sol havia acabado de nascer.

Apesar de alguns contratempos, foi uma viagem segura. Alunys parou seu cavalo ao lado do de Colin vendo o povo do vilarejo adentrar os portões do ducado.

— Correu tudo bem? — indagou Colin.

— Sim. Leona e eu mal interferimos. — Alunys apontou com o queixo para um garoto com aproximadamente dezesseis anos. Seu cabelo era louro e ia até seus ombros. Seus olhos eram de um azul vibrante. Vestia uma armadura de cota de malha e portava um semblante sério — Aquele é Falone, conseguiu matar um demônio de grau menor sozinho, além de matar, também sozinho, cerca de oito goblins. Tem um bom talento para esgrima, e os métodos de ensino de Leona tem sido bastante útil para os garotos. Eles ao menos sabem onde acertar para matar.

Ela apontou com o queixo para uma garota entre quinze e dezessete anos de cabelo e olhos escuros. Ela também trajava uma armadura de cota de malha, porém, diferente de Falone, o semblante dela era de uma pessoa assustada.

— Aquela é Lettini. Apesar de parecer fraca, conseguiu matar cinco goblins enquanto estava encurralada. Acredito que precise de um pouco mais de confiança em si, mas isso a gente irá construir ao longo do tempo.

Por fim, ela apontou para um homem adulto de olhar forte, cabelo castanho assim como seus olhos. Barba cerrada sem falhas e um porte físico avantajado em relação aos demais. Diferente dos outros dois, ele não estava com armadura, somente com uma camisa branca ensanguentada. Fumava um cigarro enquanto caminhava despretensioso com a espada tingida de sangue apoiada no ombro.

— Aquele é Dasken. Venceu dois demônios de nível médio sozinho e derrotou mais de quinze goblins. Pesquisei sobre ele e descobri que esse cara treinou para servir o duque, mas parou por causa da esposa doente que precisava de cuidados.

— O que aconteceu com a esposa dele? — indagou Colin.

— Faleceu no último inverno.

— Ele não tem mais ninguém?

— Um garoto de oito anos.

Colin assentiu.

— Com esse novo pessoal, temos um total de quantos ferreiros?

— Não sei com exatidão, mas creio que cerca de dez.

— Excelente! Diga para os ferreiros fabricarem armaduras escuras. Continue treinando o resto das pessoas, vocês estão fazendo um excelente trabalho. Cronius e Belani seguirão administrando o ducado, mas eles irão obedecer a você a partir de hoje.

Alunys ergueu as sobrancelhas.

— Não entendi, senhor…

— Irei me encontrar com Ayla. Assim que eu alcançar o território dela, deve levar mais dois dias até alcançar os portões do palácio onde ela reside. É provável que eu fique uma semana fora.

— U-Uma semana? — Alunys desviou o olhar — Não sei se consigo cuidar de tudo aqui por uma semana inteira…

— É claro que consegue. Você amadureceu bastante. Só pelo resultado dessa escolta deu para perceber que você é a pessoa certa para isso.

Colin não dizia isso da boca para fora, ele realmente acreditava em suas palavras, e Alunys sabia disso.

Ela abriu um sorriso de canto e assentiu.

— Pode contar comigo, senhor!

Colin retribuiu o sorriso.

— Levarei os três que mencionou.

— Tem certeza?

— Tenho. Será um ótimo aprendizado para eles. Cuide da família deles, está bem?

— Sim, senhor!

Colin balançou as rédeas do cavalo e se aproximou do pessoal.

— Falone, Lettini e Dasken. Peguem cavalos nos estábulos e provisões. Vocês irão comigo para o território de Ayla em uma missão. Vocês têm meia hora para arrumarem tudo.

— M-Meia hora? — indagou Lettini — Mas acabamos de voltar…

— Se quiser ficar, o problema é de vocês, mas estou oferecendo uma oportunidade de se fortalecerem ainda mais. Alunys me disse o que fizeram, então julguei que vocês merecem mais que escoltar civis.

Falone deu um passo à frente e fez uma reverência.

— Estarei pronto em meia hora, senhor.

Passou por seus companheiros e seguiu com o resto dos civis para dentro do ducado. Dasken nada disse, apenas tragou seu cigarro e deu as costas para Colin seguindo os passos de Falone.

Lettini olhou para os dois lados assustada e também se apressou.

— E-Eu já volto!


A pena foi molhada no tinteiro e escorregou pelo papel. Em cima da mesa havia diversos documentos e livros. Assim que terminou de assinar, Ayla apoiou o papel em cima de uma pilha com diversos outros.

Ayla tinha o cabelo branco ondulado preso em um coque elegante, com mechas próximas de suas orelhas. Seus olhos eram de um amarelo vibrante e pareciam bem sérios. Seus lábios eram rosados e levemente grossos, os deixando com o formato quase perfeito de lábios hipnotizantes. Seu nariz empinado a dava um ar arrogante, mais arrogante que o normal. O semblante dela era bem sério, apesar de ser uma bela mulher.

Ela trajava um vestido preto que cobria seu corpo do pescoço aos pés. Suas mãos também estavam cobertas por luvas pretas.

Após um suspiro, ela largou a pena e espaldeou na cadeira acolchoada, que estava mais para um belo trono.

— Não lembro de ter convocado você. — disse Ayla em um tom firme.

Na porta estava um homem de orelhas pontudas e longos cabelos castanhos portando uma armadura prateada. Fechou a porta atrás dele e caminhou até Ayla prestando continência.

— Perdão, senhora, mas o conselho pediu para que eu conversasse com a senhora.

— Aqueles velhos ainda questionam minha decisão? Tsc… Eu sabia que deveria ter dissolvido o conselho quando assumi o lugar de meu pai.

— Senhora, se o duque estiver realmente morto, e esse carniceiro Colin tiver o matado além de exterminar sua guarda, então ele é perigoso, tão perigoso quanto o pontífice e seus fiéis.

Ayla afastou uma mecha para trás de sua orelha e cruzou os braços empinando o nariz.

— Se eles tiverem o enviado para me convencer a mudar de ideia, então é melhor desistir.

— Mas senho-

— Basta ser racional, capitão. O carniceiro não está vindo declarar guerra, se o fizesse, seria destruído dentro dos nossos portões, ou acha que somos tão incompetentes quanto o duque para sermos todos derrotados em um único ataque?

— Não acho isso… senhora…

— Pois bem, vamos ouvir o carniceiro, saber quais as ambições dele e quem sabe nós não negociamos em termos vantajosos para nós? O pontífice vê o carniceiro como herdeiro ilegítimo das terras do duque, seria de uma estupidez sem precedentes enfrentar a mim e a igreja em simultâneo. Apenas se acalme, relaxe e espere o carniceiro chegar em alguns dias.

O capitão assentiu curvando o corpo.

— Sim, senhora. Irei me retirar.

Ayla também levava os avisos dos conselheiros em conta, aumentando a segurança em sua cidade e aconselhando seus guardas a dizerem para as pessoas não tumultuarem nos próximos dias.

Caso Colin surtasse, ela tinha um plano de contenção para pará-lo, mesmo que houvesse muitas baixas.

Após alisar a testa, ela pegou novamente a pena e tornou a assinar os documentos.


Colin e seus companheiros haviam deixado o ducado, seguindo despretensiosamente pelos vales verdes. Passaram por uma árvore de enforcados e ao lado de um campo onde havia acabado de acontecer uma batalha sangrenta.

Carniçais devoravam com ímpeto os mortos, ignorando aqueles quatro a cavalo. O clima fora das zonas seguras era o de perigo eminente. Era difícil caminhar por alguns quilômetros sem se deparar com um cadáver, e isso ficava pior a noite.

Passaram também ao lado de um rio, vendo uma alcateia com lobos gigantes bebendo água do outro lado da margem. A pelagem perto de sua boca estavam sujas de sangue, e seus olhos eram assustadores, típico de uma fera selvagem sedenta.

O mais interessante, foi que em quase meio-dia de viagem, não encontraram absolutamente ninguém, e ainda era a região do duque.

Uma região negligenciada para não gastar recursos, aumentando assim o contrato com mercenários para escoltas.

Caminhando por uma estrada de barro cercada por mata fechada dos dois lados, Colin parou o cavalo ao ouvir algo vindo de dentro da floresta.

— P-Por que paramos? — indagou Lettini apavorada.

Dasken desembainhou sua espada e Falone fez o mesmo.

— D-Droga! — Lettini pegou seu arco e puxou a corda até o limite mirando a flecha no mato.

— Esse é meu território, sabiam? — Um homem magrelo com trigo na boca deixou a floresta acompanhado de quase quinze homens que os cercaram. Todos trajavam armaduras de couro leve. Alguns apontavam balestras para os inimigos, outros sorriam segurando suas espadas enquanto os rodeavam.

— Olha só, Uyui — disse um dos mercenários — É o Colin ali, não é?

Uyui deu um passo à frente e abriu um largo sorriso.

— E não é que é ele mesmo! Hehehe O que faz aqui, carniceiro de merda? Não ficou sabendo que o duque está morto? Dê o fora do meu território ou pague a taxa de travessia. Cem moedas de ouro e você está livre.

Ninguém que fosse um nobre cheio de moedas tinha aquele valor, e ninguém inteligente o suficiente carregaria tantas moedas em tempos sombrios como aquele.

Colin assentiu.

— Esse território não é seu, é meu.

Uyui se preparou para avançar.

— Vai sonhando!

— Senhor! — disse Falone — Basta dar a ordem!

— Está aumentando o número de carniceiros, não é? Hehehe Sabe, sempre quis me vingar por roubar o meu emprego, você e suas subordinadas de merda!

Colin abriu um sorriso de canto.

— Eu não desejava o combate, mas se vocês insistem…

— Peguem eles!

— V-Vamos mesmo fazer isso? — Lettini olhou para seus companheiros apavorada.

Sting!

Falone rebateu uma das flechas e saltou do cavalo, indo para cima dos mercenários.

— Peguem o loirinho!

Dois deles avançaram em sua direção. Falone se esquivou de um golpe que vinha pelo flanco e usou seu conhecimento básico em magia para concentrar mana nos braços, rasgando o tórax de um dos mercenários junto a sua armadura de couro.

Outro homem veio por trás dele e, no momento que o carniceiro seria atingido, uma flecha transpassou olho direito do homem atrás dele. Falone encarou Lettini em cima do cavalo com uma cara de espanto.

Woosh!

Ela se esquivou de uma flecha no mais puro reflexo e imediatamente puxou a corda do arco, cravando a flecha na cabeça de outro mercenário.

Nem mesmo ela acreditou no que havia acabado de fazer.

Dasken ficou de frente para três mercenários e eles recuaram um passo. Dasken era um homem bastante intimidador.

— Acabem com ele!

Ting! Scrash!

Dasken rebateu uma espada de ferro, a destruindo no processo. Aproveitou que seu oponente estava atônito e avançou, arrancando sua cabeça e partindo para o próximo, o cortando na diagonal, fazendo suas tripas saírem. O último homem tentou fugir, mas Dasken o puxou pela gola da camisa, o jogou no chão e cravou a espada em sua garganta.

Falone era esguio, esquivava-se de flechas com facilidade e avançava rasgando os mercenários junto de suas armaduras, enquanto Lettini, mesmo com as mãos trêmulas, alvejava seus oponentes como uma exímia arqueira.

No fim, sobrou somente Uyui que viu seus companheiros serem todos mortos em menos de trinta segundos.

Ele largou a espada e ergueu as mãos em rendição.

— E-Eu me rendo! N-Não precisa me matar!

Colin ainda estava em cima do cavalo, observando tudo.

— V-Vamos lá, Colin, pelos velhos tem-

Crash!

Uma flecha atravessou seu olho e o corpo de Uyui desabou.

— A-Acabou? — Lettini ainda tremia como um cão assustado.

— Por enquanto. — Colin balançou as rédeas do cavalo e ele avançou. Seus companheiros vieram logo atrás.


Após o incidente, eles foram para dentro da floresta e fizeram seu acampamento improvisado antes de escurecer. Mataram alguns javalis e ficaram entorno da fogueira.

Todos estavam em silêncio, e isso foi quebrado por Colin.

— Vocês foram bem. Não pensei que uma semana de treinamento e uma expedição os deixaria tão habilidosos.

— É uma honra ouvir isso do senhor — disse Falone batendo o punho cerrado no peito — Senhora Leona e Alunys tem se esforçado bastante para nos lapidar, fico feliz que consigamos atender suas expectativas.

Lettini, a medrosa, abraçou seu arco e desviou o olhar.

— O-Obrigada, senhor…

— É verdade o que dizem sobre você? — Dasken assoprou fumaça do cigarro.

— Depende, do que exatamente está falando?

— Tudo. Você realmente conseguiu matar um bakurak, fez amizade com a terceira geração de vampiros e tinha o caso com uma Santa?

Colin ergueu uma das sobrancelhas.

— Santa?

— Sim. Cinco meses atrás, viajando pelas montanhas de Valéria, encontrei um grupo de refugiados. Eles eram um grupo bem estranho, mas eram inofensivos. Vi algumas pessoas ajoelhadas orando para o monólito de uma mulher. Pensei que fosse alguma representação de Tithorea, mas disseram que era Brighid, a Santa.

Colin ouvia Dasken em silêncio.

— Quando o duque estava no comando, ouvi que você estava procurando sua esposa, por isso pegou uma leva de trabalhos bem alta. Disseram que o nome dela era Brighid, então liguei um ponto a outro.

Após um suspiro, Colin assentiu.

— Isso é verdade. Brighid é minha esposa, ou era… e, sim, eu estava atrás dela durante meio ano, mas não cheguei nem perto de encontrá-la. Lembra onde fica localizado este vilarejo?

— Lembro, senhor.

— Devem ser refugiados de Ultan. Pode ter algum conhecido meu nesse lugar.

— S-Senhor… — chamou Lettini — O senhor estava lá, quando… Ultan caiu?

Colin fez que sim.

— Eu tinha uma guilda quando aconteceu. Estávamos fazendo uma prova especial onde o ganhador receberia certo privilégio no império, então deixamos a prova repentinamente, bem no meio de uma zona de guerra. Eu… — Colin engoliu o seco. Era a primeira vez que ele tocava neste assunto em quase meio ano — Perdi muita gente importante para mim nesse dia… Alunys e Leona foram as únicas que restaram.

Falone e Dasken estavam sérios, enquanto Lettini continuava horrorizada só de pensar no sofrimento que Colin estava passando.

— Senhor… — chamou Falone — É verdade que quer unificar o continente? Ouvi de alguns colegas, mas não sei a veracidade da notícia.

Colin assentiu.

— Sim. Sendo sincero, não fiz nada de relevante minha vida toda, então quero ao menos deixar um bom lugar para vocês viverem, criarem seus filhos e envelhecerem.

— P-Por quê? — indagou Lettini — Bom, o senhor vai estar arriscando sua vida pelos outros, a-além de que unificar o continente será b-bem difícil…

— Sei disso, por isso começaremos com o centro-leste, logo depois avançaremos gradualmente. — Ele olhou para cada um deles — Porém, será trabalhoso fazer isso sozinho. Quanto mais vocês se fortalecerem, mais fácil fica.

Falone cerrou o punho e bateu no peito mais uma vez.

— Conte comigo, senhor!

Dasken também bateu a mão no peito. Lettini seguiu seus dois companheiros e fez o mesmo.

— C-Conte comigo também, s-senhor Colin!

Colin estava aprendendo existirem coisas tão prazerosas quanto foder ou brigar. Ele estava começando a entender a dinâmica de poder, e o quão viciante era a sensação de ter influência sobre a vida das pessoas. O errante ao menos tinha o senso moral que herdou da mãe.

Diferente de Coen, Colin usaria a influência para extrair o melhor das pessoas que o cercavam, pois, seu objetivo era deixá-los fortes o bastante para se protegerem depois que ele morresse, algo que o próprio Colin acreditava estar próximo.

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Olá, eu sou Stuart Graciano!

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