Com as palmas das mãos unidas e os olhos fechados, Colin mergulhou em profunda concentração. Sussurros suaves escapavam de seus lábios, enquanto ele tecia cuidadosamente as palavras de um feitiço ancestral.
Uma energia pulsante emanava dele, dançando pelo ar em formas intricadas e luminosas. O brilho mágico preenchia a sala, criando uma atmosfera quase etérea.
À medida que o feitiço avançava, cada palavra pronunciada por Colin era como um elo em uma cadeia, liberando correntes de energia mágica que fluíam através de suas mãos.
A sala aos poucos se desvanecia, cedendo lugar a um cenário de beleza surpreendente.
Diante de Colin, se estendia um vasto campo verdejante, banhado pela luz dourada do sol e acariciado por uma brisa suave que fazia as folhas das árvores tremularem.
Colin sorria com satisfação ao contemplar sua criação.
Era um plano simulado, uma dimensão paralela meticulosamente construída por sua habilidade mágica. Cada detalhe, desde a grama balançando ao vento até o brilho do sol no horizonte, era uma manifestação precisa de sua imaginação e domínio sobre a magia, colocando-o no patamar dos grandes usuários de magia do continente.
A criação de uma dimensão simulada era algo a ser elogiado, já que era uma tarefa extremamente complexa de ser executada. Apenas verdadeiros gênios conseguiam um feito como esse.
Colin estava encantado com a perfeição daquele lugar, o fruto de sua magia e habilidade.
Com o sol brilhando na posição ideal, aquecendo gentilmente a atmosfera, Colin respirou profundamente o ar fresco que acariciava sua pele.
O perfume suave e adocicado das flores envolvia o ambiente, criando uma sensação de serenidade. Com os pés descalços, ele caminhou pelo campo, apreciando a suavidade e frescor da grama sob seus pés enquanto seus olhos percorriam a extensão de sua criação com admiração.
O plano simulado se estendia além do alcance da vista, revelando majestosas montanhas ao longe e rios serpenteantes que fluíam em harmonia.
Por um momento, Colin parou e olhou para trás, maravilhado com a grandiosidade de sua concepção. No entanto, o espaço ao seu redor começou a se fragmentar, rachando em partículas microscópicas que se desvaneceram diante de seus olhos.
Num piscar de olhos, Colin e seus companheiros foram transportados de volta ao quarto original, deixando para trás o esplendor da realidade simulada.
— Ótimo! — Jane pulou em seus braços, dando nele um abraço apertado. — Finalmente você conseguiu, Colinzinho!
Ele olhou para a palma de sua mão.
— Sim… fiquei mais forte.
Jane foi para as costas dele, o abraçando por trás e ficando na ponta dos dedos.
— Pronto para usar todo potencial da sua espada? — disse no ouvido dele. — Depois disso, você conseguirá se tornar Monarca da Pujança!
Ele a encarou por cima dos ombros.
— E como faço isso? — indagou.
Jane foi para frente dele, passando os braços por seus ombros.
— Isso é fácil, Colinzinho, primeiro a gente precisa encontrar um local sagrado e meditar por horas! — Ela aproximou seus lábios próximos aos dele. — E então você estará a um passo de alcançar o seu “raio vermelho”.
— É isso? — indagou entediado. — Mais meditação?
— Eu queria que fosse tão fácil. — Valagorn deu um passo à frente. — Meditação é só uma parte do processo. Você precisa alcançar a vibração correta para alcançar o Plano Astral.
— Plano Astral? — indagou Colin surpreso.
O Elfo assentiu.
— É lá que a espada foi forjada, já que é o único lugar onde é possível ver as raízes da grande árvore. O que você usa da Claymore é apenas um fragmento, uma parte de sua mana que está no artefato. É no plano Astral que a Claymore verdadeira realmente está. Aquele é um lugar extremamente perigoso, senhor Colin, então esteja preparado de corpo e alma.
— Me leva! Me leva! — Leona ergueu os braços.
— Será bom para vocês três irem, Jane e eu ficaremos aqui tomando conta das coisas em sua ausência.
— O quê? — disse Colin indignado. — Está prestes a rolar uma guerra contra os oito países e a minha esposa está grávida, não posso simplesmente ir para algum lugar assim.
— Colinzinho — disse Jane com um sorriso sedutor. — Não é como se você cuidasse das mulheres que engravida, hihi! E não se preocupe, Valagorn e eu damos conta de uma guerrinha entre humanos. Já recuperamos parte de nossos poderes, deve ser o suficiente.
Colin sentiu um nó na garganta e engoliu em seco.
Uma viagem ao plano astral não era como as outras experiências pelas quais ele havia passado quando foi guiado por Brighid em suas explorações por diferentes planos dimensionais.
Desta vez, não se tratava apenas de outro reino ou um abismo sombrio. Era uma realidade completamente distinta, um universo paralelo com suas próprias leis e ordens cósmicas.
— Tem mais alguma coisa com que eu deva me preocupar?
— Saqueadores etéreos — disse Jane contando nos dedos. — Aranha interplanar, kuo-toas, bruxas da noite, pesadelos, Elfos fantasmas, Githyanki e claro, súcubos!
Colin deu um suspiro e coçou a nuca.
— Nunca é fácil, não é?
— Bom, esses monstros são o de menos — disse Valagorn. — O plano astral é como qualquer outro plano, há criaturas vivendo nele, monstros incrivelmente poderosos e até mesmo Deuses mortos.
— Espera! — exclamou Colin. — Como assim? Deuses podem morrer?
Valagorn assentiu.
— O cosmos é velho, garoto, muito velho. Milhares de civilizações já nasceram e caíram, assim como milhares de Deuses já foram adorados algum dia e caíram no esquecimento. Muitos não estão mortos, apenas os chamam assim porque ninguém mais se lembra deles.
— Então quer dizer que adorar um Deus o deixa poderoso? — Ele apoiou a mão no queixo. — Os cultistas do norte adoravam Drez’gan… o quão forte ele deve ser?
— Eu não sei. Não há muitos seres capazes de se tornarem Deuses.
Após cruzar os braços, Colin assentiu.
— Então a gente vai até o plano astral encontrar a verdadeira Claymore e depois o quê? Fazer um acordo?
— Isso é com você. Claymore é um ser criado com fragmento da grande árvore, um ser que transpassa o senso comum. Você terá que convencê-la a se submeter a você, e isso deve ser trabalhoso, talvez seja impossível. As chances de morrerem no plano astral são enormes, então se eu fosse você, me despediria da sua esposa e filhos.
Colin engoliu em seco novamente. Valagorn era um homem sério, aquelas palavras o deixaram com medo e empolgado ao mesmo tempo.
— Perfeito! Um desafio de verdade! Encontrem logo esse lugar para meditarmos e irmos ao plano astral, eu tirarei uma folga dos treinos até lá.
Sem dizer mais nada, Colin saiu da sala com um sorriso no rosto e em seguida Leona e Heilee fizeram o mesmo.
— E então — disse Jane à Valagorn. — O que achou do nosso menino?
Valagorn pensou por alguns segundos. — No começo, achei que ele era sortudo, alguém com uma boa linhagem que deu sorte, mas não é só isso. Colin é como ele é, porque ele sempre escolhe o caminho mais curto e mais difícil. Sua tríade do verão, principalmente a Árvore da Pujança, é um fator crucial em seu desenvolvimento. Bom, tem que ele sempre foi treinado por pessoas que contribuíram muito nessa evolução, assim como todos os seus oponentes.
Suspirando, Valagorn abriu um sorriso de canto.
— Depois de tudo isso, é fácil dizer que o garoto é um gênio ou coisa assim, mas o conhecendo melhor, não é isso. Colin não sabe fazer nada excepcional ou criou alguma técnica revolucionária. Suas experiências extremas e regulares de quase morte o potencializaram, um preço a ser pago pelo caminho curto e espinhoso que escolheu. Não sei tudo o que o garoto já passou, mas suas experiências o colocaram no mesmo nível dos gênios. Nada disso seria possível sem uma mente excepcional, uma mente resiliente que faça seu corpo e sua vontade inabaláveis, mas também, uma mente com um toque único de insanidade… me pergunto, o que move o garoto?
— Hum… — grunhiu Jane fazendo o número três com os dedos. — Eu diria família, amigos e o prazer de uma luta.
Valagorn deu de ombros.
— Você acha? Nunca pensei que ele se preocupasse tanto assim com a família.
— Talvez não no começo, mas agora é diferente. — Ela abriu um sorriso de canto. — Bom, com a notícia de que metade das pessoas com quem se importa vão morrer se ele morrer, o fez começar a se dedicar de verdade. — O sorriso dela alargou-se ainda mais. — Pelo menos agora o garoto não vai jogar sua vida fora em uma luta qualquer, ele vai pensar, ser cauteloso e prudente.
— E você acha isso bom?
— Não é? O garoto se recusava a cair mesmo sem ter um motivo aparentemente sólido. Agora que tem, nosso menino se tornará invencível. Mesmo se precisar ser extremo, ele não perderá.
Valagorn ergueu uma das sobrancelhas.
— Tem tanta fé no garoto assim? Um ser como você?
— É lógico, não coloquei minha vida nas mãos do garoto de maneira leviana. Sei muito bem onde estou me metendo.
O Elfo franziu o cenho.
— Você sabia sobre Heilee? Sobre a conexão das nossas almas?
Jane abriu um sorriso provocante.
— Era um palpite, mas eu estava certa no fim. Devia me agradecer, dei um motivo certo para o nosso menino não morrer, apostei minha vida nisso.
Valagorn deu as costas.
— Você é louca.
Ela deu de ombros. — Em um mundo como esse, os loucos são os que sobrevivem no fim.
No caminho para seu quarto, Colin estava pensativo.
Ele não sabia quanto tempo a viagem poderia durar, e havia muitas questões a serem resolvidas.
Ayla estava no quarto conversando com os pequenos Gerrard e Bill. Colin abriu a porta sem fazer barulho e ficou ali, os observando.
— A senhora leu para a gente sobre a era dos vampiros — disse Bill empolgado. — E qual veio depois?
Ayla viu que Colin estava na porta e abriu um sorriso de canto.
— Essa é uma boa pergunta, Bill, A era dos vampiros acabou no ano de 75 PQV, que significa Pós-Queda do Véu. Sem um poder superior, com a destruição da cidadela dos Elfos da Floresta, da cidadela dos Elfos Negros e com o assassinato dos reis do continente, tudo ficou uma bagunça. Novos reinos começaram a se formar, mas outros começaram a cair tão rápido quanto se erguiam, essa ficou conhecida como a Era das trevas!
Gerrard levantou a mão.
— Foi aí que Caliman foi criada, né?
Ela assentiu com um sorriso.
— Correto! Os Elfos Negros pensaram que foram os Elfos da Floresta que enviaram Tiamat a sua cidadela, então resolveram atacá-los, destruindo o que restou deles e não pararam por aí, arrasando centenas de vilarejos humanos. Eles foram muito cruéis, e para fugir deles, as moças que sobraram acabaram se lançando a sorte no deserto. Graças aos Deuses elas conseguiram sobreviver.
— Em que ano foi isso? — indagou Bill.
— 120 PQV. Em 400 PQV foi o fim da Era das trevas e o início da Era da Magia. Mesmo com vários reinos e com guerras por conquista acontecendo, a magia e o uso dela começou a ser disseminado por todo continente e além dele. Os reinos queriam que todos seus soldados fossem habilidosos no uso da mana, então qualquer pessoa passou a estudar magia, até mesmo crianças.
Aqueles dois continuavam com os olhos brilhando ouvindo tudo atentamente.
— Não houve tantas guerras na Era da magia, mas ela não durou tanto tempo, tendo o seu fim em 616 PQV. Com vários reinos fortes, também houveram aqueles se se destacaram entre os demais. Foi então que no ano de 617 PQV que começou a Era dos heróis. Tiveram muitos nomes famosos como o de Kerie Leerstrom, a vagante dos Ermos que conseguiu expulsar a Horda de Morbash, o esticador de couro, das montanhas que séculos depois vieram a se tornar Ultan.
Bill levantou a mão.
— O que é uma horda?
— Uma tribo de nômades, na maioria das vezes se escutar o nome horda, pode ter certeza que os orcs estão por trás delas. O confronto das forças de Kerie contra as de Morbash ficou conhecida como: O Cerco dos Titãs, que aconteceu em 638 PQV.
A expressão das crianças era impagável, e Ayla estava gostando de vê-las, aquele semblante de curiosidade a atiçava a contar mais.
— 638 também foi o ano em que o rei dos Elfos Negros assumiu, o poderoso Milveg Ostreth, também conhecido como Milveg, o inigualável!
Gerrard levantou a mão.
— Por que ele está há tanto tempo como rei?
— O país dos Elfos negros é fechado, então não sabemos muito sobre eles, mas boatos dizem que havia muitas facções brigando por poder naquele país, e Milveg unificou todas elas. Também dizem que ele é o maior usuário de magia vivo!
— Nossa… — aqueles dois deixaram escapar.
— E também foi a Era onde o mundo conheceu o primeiro Monarca arcano do céu, Thorun, o navegador. Dizem as lendas que ele viajou para o extremo sul em seu barco e encontrou um continente chamado Erokorg, lar de bestas feras! — Ayla dava ênfase em sua fala, deixando tudo mais épico. — Bestas feras se parecem com pandorianos, mas eles são maiores, mais fortes, mais bestiais. No ano de 986 PQV, Thorun acabou com as bestas feras. Os homens presentes naquela batalha relataram a marinheiros que raios do tamanho de montanhas brotaram dos céus e devastaram aquelas terras, queimando florestas inteiras, secando rios e remodelando todo o ecossistema daquele continente!
As crianças arrepiaram ao ouvir aquilo, e olharam uma para a outras extremamente empolgadas, olhando novamente para Ayla.
— E por fim, o último dos grandes heróis foi Ultan. Ele foi o rei que mais conquistou terras em toda história desde a queda do véu, nem os vampiros conseguiram algo assim. Ele conseguiu fazer o poderoso grupo de lótus trabalhar para ele e comandou as guildas mais poderosas do continente. Ultan era tão influente, que sua queda mudou tudo novamente, encerrando também a grande Era dos heróis.
Pela primeira vez as crianças estavam tendo ciência do quão poderoso era Ultan. Uma prova disso, foi que Caídos, vampiros e facções do norte tiveram que unir forças para acabar com o poderoso imperador, e mesmo assim, o grandioso império de Ultan não fora completamente dizimado.
Mesmo em ruínas, ele ainda vive.
— E agora — disse Bill. — Em que Era estamos?
— Alguns estão chamando de Era da Ascensão. Dizem que essa é a Era onde pode acontecer o despertar de seres divinos e semidivinos. A primeira esposa do papai, senhorita Brighid, ela é conhecida como uma Santa, mas alguns até a chamam de Deusa. O papai também é visto como um herói lendário, e o principal influente por moldar o destino dos reinos! Se ficarem fortes e estudarem bastante, as pessoas podem ouvir histórias sobre vocês também.
— Sério?!
— Sim, agora vão tomar banho e se arrumar para deitar, preciso conversar com o papai.
Eles olharam para a porta e viram Colin de braços cruzados esperando toda a história terminar.
— Papai! — Correram até ele, dando-lhe abraços.
Colin afagou o cabelo de ambos.
— Ouviram a mamãe, vão logo tomar banho e dormir.
Eles assentiram com entusiasmo, deixando o quarto apressadamente enquanto suas mentes se enchiam de imaginação e empolgação.
Colin caminhou calmamente até a cadeira onde as crianças estavam sentadas, tomando seu lugar de frente para Ayla.
Seus olhos se fixaram no vestido branco que ela usava, que abraçava delicadamente sua forma e realçava sua barriga, revelando o avanço de sua gravidez.
O tecido bordado adicionava um toque de elegância ao visual, destacando ainda mais a beleza de Ayla.
— Herói lendário? — Ele espaldeou na cadeira. — Não precisa de tanto.
Ayla deu de ombros.
— Só estou dizendo a verdade, mas e o treinamento, como foi?
— Consegui criar um plano simulado.
Ela ergueu as sobrancelhas.
— Nossa, tão rápido?! Meus parabéns!
— Obrigado, mas outro treinamento vai iniciar. Leona, Heilee e eu iremos até o Plano Astral para fazer um acordo com Claymore e liberar todo seu poder, e eu posso acabar morto nisso, mas esse não é o problema maior.
— Um problema maior do que colocar sua vida em jogo?
Colin soltou um longo suspiro enquanto olhava para Ayla. Com um gesto lento, ele ergueu o braço, expondo o pulso onde a marca do casamento estava visível.
— Quando nos casamos, fragmentos da sua alma foram gravados em mim e fragmentos da minha alma foram gravadas em você. — Ele abaixou o braço. — Quando fiz o contrato com Heilee, todos os meus contratos se fortaleceram, com fragmentos da minha alma indo para todos vocês, nos conectando, nos fortalecendo. Isso é bom, todos evoluiremos juntos, mas, por outro lado, isso deixa a alma de vocês dependente da minha. — Colin coçou a nuca. — Resumindo, se eu morrer, você, Brighid, Leona e os outros também morrerão.
Ayla ficou em silêncio por alguns segundos e desviou o olhar.
— Então essa força que eu estava sentindo crescer dentro de mim é coisa sua… — Seus belos olhos amarelos entristeceram por um instante. — Não me importo de morrer com você, meu único problema seria as crianças e o nosso filho… — Ela forçou um sorriso. — Mas parece que é normal as coisas darem errado quando tudo começa a dar certo…
Um suspiro trêmulo e pesado escapou dos lábios de Colin, ecoando no silêncio tenso que pairava no ar. Seus olhos evitavam o olhar de Ayla, desviando-se para qualquer ponto distante, buscando refúgio em outro lugar que não fosse confrontar a realidade diante deles.
Sua expressão estava marcada por uma mistura de culpa e angústia, enquanto seus dentes se afundavam no lábio inferior em um gesto nervoso e reflexivo.
Durante todo o tempo em que estiveram juntos, Ayla foi um pilar de lealdade e silêncio, suportando o peso das decisões e ações de Colin sem questioná-lo.
Ela nunca levantara a voz em reprovação ou se atreveu a desafiar suas vontades. Colin, por sua vez, tratava-a com uma indiferença quase cruel, ignorando seus sentimentos e desconsiderando seus anseios.
No entanto, naquele momento, o olhar de Ayla carregava uma profunda dor e tristeza, revelando as feridas emocionais que ela havia suportado em silêncio.
Era um eco silencioso e contundente das consequências de sua própria mesquinhez, uma lembrança dolorosa de que suas ações tinham o poder de afetar não apenas a vida deles, mas também de tantas outras pessoas que dependiam de sua liderança e responsabilidade.
A possível morte de Ayla transcendia a perda de uma vida individual para se tornar uma sentença de morte para toda a linhagem real.
Se ela desaparecesse, seria o fim de uma linhagem que representava a história e a identidade de todo um reino. Essa tragédia não se limitaria apenas a ela, mas alcançaria cada herdeiro e descendente, cada criança que Colin trouxe consigo, cada criança que, aos poucos, a chamavam de mãe.
As crianças inocentes, frutos dessa linhagem, estariam expostas aos olhos cruéis de conspiradores implacáveis, que ansiavam pela extinção completa da família real.
Seriam apagadas da existência como se nunca tivessem nascido, privadas de seu direito à vida e ao legado que carregavam. Essa desolação, se concretizada, transformaria a cidade em um antro de corrupção, um refúgio sombrio para a criminalidade, onde o caos reinaria, talvez em níveis inimagináveis.
No entanto, as consequências iam além da mera ruína de Runyra. A morte de Brighid, possível única esperança de vencer o Abismo, significaria a aniquilação da única oportunidade de derrotar Drez’gan e seus implacáveis apóstolos.
O avanço do Deus Morto aproximava-se perigosamente, exigindo desesperadamente a ajuda da Santa de Valéria para conter sua destruição iminente.
A morte de Colin, nesse contexto crucial, abalaria não só todo o continente, mas todo aquele plano. Ele havia se tornado um símbolo, uma força inabalável que estabelecera sua presença como uma lenda viva, capaz de realizar feitos extraordinários.
Para muitos, a sua ausência representaria a perda de um farol de esperança e coragem, deixando um vazio indescritível em um mundo mergulhado em trevas.
Seu nome estava intrinsecamente ligado a Runyra, entrelaçado com o destino da rainha e com o legado da Santa. Sua marca já estava gravada nos anais da história, porém, esse não era o fim que ele almejava, nem para si, nem para as pessoas que amava e tudo aquilo que estava construindo.
Entre as sombras ameaçadoras dos inimigos autoproclamados como reis, Caídos e até mesmo Deuses, havia um objetivo que se destacava em meio ao turbilhão de desafios que assolavam Colin: seu próprio pai.
Em uma cruzada pessoal, ele estava decidido a confrontar esse vínculo sanguíneo, a resolver todas as pendências que os envolviam em um provável confronto titânico.
Nada poderia desviá-lo desse caminho. Colin não estava disposto a sucumbir antes de enfrentar seu pai de frente, antes de dar um desfecho definitivo a esse conflito que perdurava há tanto tempo.
— Ayla! — Sua voz grossa e séria chamara sua atenção. — Eu não vou morrer antes de encerrar esse ciclo, antes de deixar nossos filhos crescidos, antes de deixar esse reino andar com suas próprias pernas. — Com o punho cerrado, ele bateu no peito. — Sobrevivi ao abismo, a um Bakurak, a queda de Ultan, não vou morrer no plano astral, enfrentando um Deus ou um Rei poderoso. Tenha isso em mente, Ayla, nada pode me matar.
As palavras dele carregavam uma convicção que atingiu Ayla com uma força brutal, ecoando em sua mente e coração.
Seus olhos brilhavam com uma intensidade cativante enquanto ele falava, e ela, capturada pela sinceridade de suas palavras, assentiu, acreditando fervorosamente em cada sílaba que escapava de seus lábios.
Colin ergueu-se.
— Desculpe dizer isso, mas preciso deixar a questão com os nobres e os oito países na sua mão. Eu não queria sobrecarregar você, mas não sei quanto tempo essa missão durará.
Ela assentiu.
— Tudo bem, pode deixar comigo.
— Obrigado. — Ele enfiou as mãos nos bolsos e deu as costas.
As pessoas confiam nele, e só conheciam sua versão superficial de Rei, mas ela conhecia a versão de Pai, Rei, Guerreiro e marido, por isso, Ayla confiava nele tanto quanto Brighid, quase como se seu marido fosse uma entidade.
O coração de Ayla acelerou e seu rosto se aqueceu com uma mistura de emoções. A ideia de que Colin pudesse ser um escolhido, um dos heróis destinados a testemunhar a Ascensão, atravessou sua mente como uma centelha de esperança.
Desviando o olhar, Ayla afastou uma mecha de cabelo para trás da orelha, seu gesto era um reflexo do turbilhão de pensamentos que invadia sua mente.
Ela começou a tecer planos em sua mente, vislumbrando uma estratégia para lidar com os nobres e os oito países que haviam tomado Ultan. Havia algum tempo que ela vinha nutrindo essa ideia, um plano cuidadosamente arquitetado que poderia mudar o curso de toda história.