Selecione o tipo de erro abaixo

Capítulo 39: Devaneios

O monstro deixou a floresta num rompante capaz de causar tremor. Ver aquilo de perto deixou Colin, Samantha, Wiben e Kurth sem reação alguma. O mais intrigante era que aquele demônio parecia não querer parar por nada.

Colin não havia pensado num plano.

Tudo havia acontecido rápido demais. Sua mente estava bagunçada, perdida na forma grotesca da criatura. A única coisa que conseguiu pensar foi em fugir, até que ao fixar o olhar e usar a análise, abriu-se uma janela de status incomum.


Categoria: Demônio Nomadorir.
Nível: 50
Nome: Dhaed Sombrio.
 
Descrição: Ser do quinto nível do abismo, suas habilidades incluem esticar partes do corpo e aumentar seu tamanho a cada restrição liberada.
 
Missão especial iniciada.
Objetivo da missão: Banir o Dhaed sombrio
 
Recompensa ao bani-lo:
 +11 de força
+ 11 de Agilidade.
+ 100 pontos na Árvore primária.
+ 200 pontos na Árvore secundária.
+ 800 pontos de mana.

 
Bônus especial de árvore caso o monstro seja banido em 5 minutos ou menos:
Habilidades secundárias ganham um aumento bônus de 20% ao serem usadas.

 Bônus especial passivo:


Sua mana reduz 1 ponto a cada 3 segundos no uso constante de habilidades primárias.

“Tenho que banir essa coisa? Mas como?”

Distraído, Colin olhou para frente, vendo o demônio cada vez mais perto.

— Saiam da estrada! — ele gritou, fazendo os companheiros voltarem a si.

Todos eles saltaram para longe, e o monstro passou por eles, ignorando-os completamente. Colin notou que a criatura seguia as carruagens com afinco.

Pensou imediatamente nos aldeões, Alunys e os gêmeos.

“Espera, não somos o alvo?”

Faíscas celestes contornavam seu corpo, então, ele avançou como um raio para frente do demônio. Batendo a palma da mão no chão, correntes feitas de raios saíram de um círculo mágico avançando em direção a criatura.

As correntes se entrelaçaram em seus braços, pernas, pescoço e a criatura caiu rolando, como se fosse um pedregulho enorme rolando morro a baixo.

A criatura se contorcia, mas sem sucesso. As dezenas de corpos entrelaçados no abdômen do demônio começaram a borbulhar como se fossem explodir.

Colin saltou para trás, e os corpos não estouraram, mas começaram a derreter.

A criatura ficou quieta por um instante e, segundos depois, começou a ficar ainda maior, seus braços ganharam músculos, as pernas ficaram enormes e o pelo cresceu exponencialmente.

Aquele monstro parecia ter mais de quinze metros de altura, e a forma dela deixava tudo ainda mais aterrorizante.

Colin arregalou os olhos quando duas flechas cravaram no crânio da criatura, mas ela pareceu não sentir nada. Olhando para trás da criatura, Colin viu Samantha segurar um arco e estalar os dedos em seguida.

Ouviu-se duas enormes explosões, jogando Colin para ainda mais longe.

Boom! Boom!

— Vocês estão bem? — perguntou Samantha apontando o arco para a criatura.

Colin estava agachado a alguns metros de distância do demônio. Suas roupas e seu cabelo sacudiam bastante devido à onda de choque das explosões.

— Estou bem! — berrou ele — Se prepare, o demônio não foi derrotado com isso!

— Eu sei, se afaste!

Faíscas celestes envolveram Colin e ele foi rapidamente para próximo de seus companheiros. Samantha cerrou os olhos, suspirou e lançou uma saraivada de flechas em direção a criatura. Sua mão era ligeira, indo para a aljava em suas costas, apanhando a flecha, colocando-a no arco e puxando a corda até o limite.

Ela fez isso pelo menos 15 vezes em cerca de 10 segundos, acabando com as flechas da aljava.

Após lançar as flechas, Samantha estalou os dedos e uma explosão sequencial tomou conta do enorme corpo da criatura.

Boom! Boom! Boom!

A onda de choque foi forte o suficiente para arrancar arvores, causar um pequeno tremor e quase lançar Colin e seus companheiros para longe.

Era como se estivessem sob uma grande tempestade, lutando contra o vendaval.

Segundos depois, o vento cessou, os tremores pararam e não se ouviu nada além do barulho de pedras caindo.

— Acabou? — indagou Kurth encarando a nuvem de poeira logo a frente.

Usando a análise, Colin enxergou o traço de mana sinistro da criatura. Mesmo parada, ela parecia intacta.

— Cuidado!

Woosh! 

Um braço enorme se esticou como borracha deixando a fumaça e indo em direção a Samantha, mas ela conseguiu esquivar-se a tempo.

A criatura cravou as enormes unhas na terra e seu corpo que parecia uma montanha deixou a fumaça rapidamente. Colin e seus companheiros foram para o mais longe que conseguiram antes de a criatura cair no chão num estrondo ensurdecedor.

Estrondo!

A criatura estava diferente de antes.

Inúmeros braços saiam de suas costas, o pescoço dela parecia mais alongado, assim como seus chifres. Aquela coisa havia ganho olhos avermelhados com pupilas negras que giravam em todas as direções.

Todos estavam parados, esperando a criatura se mexer.

“Como vou banir isso? Se isso precisará ser banido, então precisará de um ritual, mas não sei nenhum. Sem contar que precisaremos de tempo para segurar a criatura aqui. Kurth tem muito poder destrutivo, mas depois dessa saraivada de flechas, não acredito que o canhão galick vá adiantar de muito.”

Colin olhou seus companheiros, um por um.

“Kurth é um pouco inútil no mano a mano, Wiben é ágil, mas pelo que vi até agora, ele não é o mais adequado para lutar contra a criatura. Talvez Samantha e eu possamos dar um jeito nisso, segurar a criatura até o ritual ser concluído.”

— Wiben! — chamou Colin — Conhece rituais de banimento?

Wiben ergueu uma das sobrancelhas. Ele conhecia, mas pelas diversas formas que a criatura assumiu, provavelmente era um demônio com restrições e, banir criaturas assim levaria pelo menos cinco minutos de encantamento interruptos.

— Conheço, mas isso pode levar muito tempo!

— Kurth, o ajude com o círculo mágico de banimento, e Samantha — Ela encarou Colin nos olhos — Eu e você vamos segurar o demônio. Consegue fazer isso?

Ela fez que sim, enfiou a mão no bolso e retirou duas moedas. Jogou uma moeda em direção a Colin e ainda no ar, um círculo mágico a envolveu, transformando a moeda na espada montante do bandido que eles haviam matado na noite passada.

— Use isso! — disse ela — A gente pode ter uma vantagem com a ante magia. Sei que espadas longas não são o seu estilo, mas você é o único aqui com força suficiente para empunhar uma espada como essa.

Colin retirou a pedra de ante magia do bolso e colocou no espaço vazio do cabo da espada.

— Colin! — aquela foi a primeira vez que Wiben o chamou pelo nome — Deixo Samantha com você, se algo acontecer com ela, eu te mato!

Colin abriu um sorriso de canto e Wiben se retirou junto a Kurth para dentro da floresta.

A criatura esticou o braço em direção a Wiben, mas Colin foi mais rápido. Num movimento rápido e preciso, Colin arrancou o braço enorme da criatura sem muita dificuldade. Mesmo para uma espada longa, ela não era pesada.

Colin conseguia se movimentar com excelência.

Rugido!

Outra mão nasceu na criatura e ela avançou em direção a Colin após outro ensurdecedor rugido. Com aquele amontoado de braços, o demônio tentou aplicar alguns socos em Colin, mas ele era rápido, tão rápido quanto um raio.

Sem dificuldade ele cortou diversos braços da criatura e desviou de outra leva de golpes.

Os braços arrancados se regeneravam em uma velocidade surpreendente, e mesmo para um ser tão pequeno em relação ao demônio, Colin estava se virando bem.

Samantha observava aquela luta surreal se desenrolar na sua frente. Ela jogou a outra moeda que segurava na aljava, e a moeda se transformou em dezenas de flechas. Saltando para trás, ela observava a luta, atenta ao momento correto para atacar.

[Prisão de raios]

Correntes celestes haviam saído debaixo da criatura, passando por seu pescoço, braços e pernas a prendendo, porém, Colin sabia que a criatura se soltaria em breve, então, saltou em direção ao demônio, e com um movimento rápido, cravou a espada na jugular da criatura. Após isso, retirou sua espada e pulou para longe enquanto seu corpo era envolvido por faíscas celestes.

Samantha puxou a corda do arco o máximo que conseguiu. Levantando o polegar, dois círculos mágicos se formaram frente a haste da flecha. Ela soltou a corda do arco, e após passar pelos círculos mágicos, o projétil ganhou três vezes mais velocidade.

Tendo a ciência que ela acertaria o alvo, Samantha estalou os dedos, e a flecha foi transmutada em uma lança, cravando, assim, na jugular exposta da criatura.

O demônio pareceu não sentir nada.

Estalando os dedos mais uma vez, a lança explodiu, destruindo a cabeça do demônio num estrondo agonizante.

 Kaboom!

A fumaça se dissipava devagar e os dois ficaram observando a cabeça da criatura se reconstituir. Após reconstituir o crânio e as cordas vocais, a criatura berrou.

Roaaaar!

Um grito assustador capaz de alcançar cidades inteiras a quilômetros de distância. Era como se uma multidão agonizasse em um lamento coletivo.

Samantha e Colin taparam os ouvidos.

Sentiram como se a cabeça deles fosse explodir. O grito fora tão poderoso, que trouxe uma nuvem de poeira, nublando sua visão.

A criatura parou de gritar e não se ouviu mais nada.

Samantha olhou para Colin apavorada e ele mantinha o semblante tenso.

— Colin… o que foi isso?!

— Eu não sei, mas ach-

Bam!

Uma mão enorme saiu da poeira e socou Colin brutalmente.

O braço do demônio se esticou pela mata fechada, varrendo Colin contra rochas, árvores, morros e tudo que estivesse em seu caminho.

Samantha ponderou atacar o enorme braço ao seu lado, mas espinhos enormes tomaram conta daquele braço de repente, perfurando seu abdômen, sua perna e um pouco acima de seu ombro. Ela conseguiu se desvencilhar rapidamente, mas seus ferimentos começaram a sangrar sem parar. Sentindo uma pontada no abdômen, ela parou de se mover e apoiou um dos joelhos no chão.

Cof! Cof!

Sangue deixou seus lábios agressivamente. O buraco em seu abdômen era bastante sério, se não fosse tratado logo, ela poderia morrer.

A criatura recuou os espinhos do braço, mas outro braço foi na direção de Samantha, atingindo seu corpo com tudo.

Scrash!

Samantha fora arremessada floresta adentro feito uma boneca de pano. Bateu as costas agressivamente em uma árvore de tronco grosso e caiu desmaiada.

A criatura recuou seus dois enormes braços e sua abóbada dentária exibia um sorriso diabólico. A cada segundo, Samantha sangrava mais, sem contar que ele havia fraturado diversos ossos e perfurado importantes órgãos internos.

Colin ainda estava consciente, porém, estava enterrado em uma rocha. De seus lábios gotejava sangue, suas roupas estavam aos frangalhos e suas escoriações estavam prestes a se transformar em feridas que o fariam sangrar até a morte.

Bastou um golpe bem-dado para quase o derrotar. Seu corpo ardia, e sua raiva também. Ele não deixou de se sentir culpado quando viu Samantha ao longe completamente nocauteada. Se ele não fosse um usuário da pujança, estaria certamente morto.

O mais frustrante, era que havia se passado somente um minuto desde o início da luta. Sua estratégia e de Samantha era perfeita, mas ele somente conseguia, pois ambos trabalhavam bem em equipe.

Com ela fora do combate, Colin não tinha muitas opções.

Aquela era uma luta diferente de seus combates habituais. Ele não estava sequer no nível de seu oponente, mas sua prioridade agora seria manter Samantha viva, mas ele não sabia se ela conseguiria aguentar mais alguns segundos, quiçá quatro minutos.

Suspirando, pegou o cabo de sua espada e se desvencilhou da enorme rocha. Seu plano inicial foi o de segurar a criatura por estar ciente da diferença de poder, mas ele não tinha escolha a não ser lutar para matar, e, na verdade, ele preferia assim.

Sua melhor estratégia seria usar a velocidade e poder destrutivo, mas sua mana iria descer rápido demais.

— Você está sorrindo, demônio maldito?! — Colin apoiou a espada no ombro e estalou o pescoço após cuspir sangue — Vamos ver por quanto tempo consegue manter esse sorriso horroroso.

O rosto de um homem em prantos se formou na barriga do demônio, mas, ao mesmo tempo, em que parecia desesperado, parecia, também, feliz.

— Porque está se opondo a mim? — perguntou o rosto em um tom lamuriante.

Aquilo foi uma surpresa, Colin não esperava que aquela coisa conseguisse falar.

Colin começou a caminhar para perto da criatura.

— Você feriu uma companheira minha, acredito ser motivo o suficiente.

— Então você vai morrer junto dessa companheira, errante maldito.

“Errante?”

— Do que me chamou?

— Não pensei que encontraria algum de vocês neste plano, pensei que tivessem sido extintos pouco depois do véu cair. Bem, você vai se juntar ao resto deles no esquecimento em breve.

“Essa história de véu de novo”.

Colin empunhou a espada que era quase do seu tamanho, aguardando o demônio fazer algum movimento.

O rosto do demônio se desfez e ele avançou em direção a Colin, mas antes que pudesse realizar quaisquer movimentos, Colin envolveu seu corpo com boa parte de sua mana e passou pelo demônio arrancando seus dois braços frontais.

A criatura caiu de cara no chão e rolou floresta adentro, destruindo árvores e tudo que se colocá-se contra aquele corpo montanhoso.

Os braços da criatura cresceram novamente e ela recuou num salto. O rosto se formou novamente no abdômen do demônio e seu tom de voz parecia um lamento.

— Ante magia?! Isso explica porque consegue me cortar tão fácil. É algo bem baixo e podre, se aplica bem a seres como vocês, errantes malditos!

A fim de ganhar tempo, Colin decidiu tentar prolongar o papo.

— Porque está aqui, demônio? Está atrás de mim?

— De você? O que eu iria querer com um errante tão fraco? Pensando bem, imagine quantas legiões de demônios estariam interessadas na cabeça de um errante, você está acabado! Avisarei a todos que você está vivo, seu desgraçado miserável!

Colin deu mais alguns passos, e a criatura recuou num salto.

— Está com medo de mim, demônio? — zombou Colin — Os demônios que virão atrás de mim são covardes como você?

— Medo de você? Nunca! A ante magia que é o problema!

Os olhos do demônio pousaram sobre o braço direito de Colin, avistando a tatuagem. Sentindo um calafrio na espinha, o demônio saltou para mais longe ainda.

“De todos os errantes que encontrei nesses últimos séculos, por que um fracote como ele tem a marca dele?”

— Se não vier até mim… — Colin flexionou os joelhos — Então vou até você!

Como um flash de raio celeste, Colin perfurou o crânio da cabeça falante e cravou ainda mais fundo sua espada. Girando a lâmina, ele cortou o demônio de baixo para cima, esguichando sangue para todo lado.

— Errante maldito! — berrou a criatura cambaleando para trás.

Erguendo o enorme braço, a criatura tentou esmagar Colin, mas seu braço voou longe antes que pudesse tocá-lo.

Mana celeste começou a cercar o corpo de Colin e ele se moveu rapidamente, circulando a criatura, arrancando pernas, braços, chifres, cabeça e tudo em seu caminho.

Zush, Zush, Zush!


A criatura começou a se juntar novamente.

— Seu maldit-

Colin cravou a espada na boca da cabeça falante que surgiu nas costas do demônio.

— Não quero mais ouvir sua voz irritante! — Colin saltou para longe.

— Aaaaaa!

A criatura começou a ficar maior, quase com o dobro de tamanho da última transformação. Agora, havia dezenas de braços em suas costas, seus chifres pareciam ainda maiores, sem falar de seus membros musculosos. Antes, a criatura corria de quatro, agora, ela conseguia se erguer em duas patas.

— Última restrição liberada! — disse a criatura em um tom de voz diferente. Era um tom grave e gutural, como se um verdadeiro demônio começasse a falar. — Você está morto, errante!

— Fiuuu! — Colin assoviou, apoiando a espada no ombro — Você tá bem grande! É impressionante o que você precisa fazer para chegar no meu nível.

— No seu nível? — O demônio se irritou — Estou há universos acima de você, seu rato!

Colin abriu um sorriso de canto.

— Não é o que nossa luta diz.

Colin tentava não demonstrar fraqueza perante ao inimigo, mas a verdade é que ele estava apavorado.

Sua mana estava perto do fim e a mana do demônio pareceu dobrar de tamanho. Colin não tinha muita esperança de sair daquela batalha vivo, mas ele não fugiria. Qualquer segundo que ele ganhasse seria precioso para que seus companheiros escapassem, afinal, ele tinha esse senso de responsabilidade.

Samantha estava nocauteada e a beira da morte e levaria alguns minutos para que o ritual estivesse completo.

As pessoas contavam com ele.

Morrer pelos outros, seria algo que seu antigo eu nunca faria, mas suas relações recentes haviam mudado sua forma de agir, de pensar, haviam mudado seu coração. Os garotos eram jovens e aquele não era o mundo dele.

Colin não passava de um intruso naquele lugar.

Lentamente colocava esta ideia na cabeça, de que iria morrer em breve. Aceitar a morte só deixava tudo mais fácil, mas ele lutaria até o limite para segurar a criatura ali.

“E aqui estou eu, me sacrificando por um bando de pessoas que nem conheço, por isso sempre odiei heróis. Eles vivem pelos outros, mas no fim acabam morrendo sozinhos. Ainda falta dois minutos, não conseguirei segurá-lo por mais trinta segundos. Que se dane, vou com tudo.”

Dezenas de braços nas costas da criatura se esticaram, indo em direção a Colin.

Ele ergueu a espada na altura do pescoço e em movimentos rápidos cortou diversos daqueles braços, desviando de outros em meio aquela chuva de golpes devastadores.

Colin se movia tão rápido a ponto de parecer imperceptível, mas gastava mana demais ao se mover daquela forma. A criatura parecia ter uma reserva de mana quase infinita, enquanto Colin perdia ainda mais mana a cada segundo.

O tempo que estava a seu favor, logo se tornaria seu inimigo.

O coração de Colin bombeava o mais rápido possível, seus músculos pareciam que a qualquer momento se rasgariam e sua cabeça doía tanto quanto levar uma martelada na nuca. Em meio a batalha, Colin teve devaneios, pensando em uma vida que ele poderia ter vivido caso sua morte não fosse certa.

“Acredito que estou satisfeito com meu curto período nesse mundo. Conheci pessoas legais, e outras nem tanto. Pensando bem… talvez eu tivesse sim um sonho… conheci Safira, Stedd, o pessoal e principalmente Brighid. Não parei para pensar muito nisso, mas será que eu seria feliz junto dela? Talvez se a gente morasse no interior, tivesse um cachorro, um ou dois filhos… Se fosse menina acredito que se chamaria Amanda, se fosse menino… bem, julgo ser melhor deixar para mãe nesse caso, e nada de Colin Júnior, é um péssimo nome.”

Colin estava começando a sentir falta de ar, e seus órgãos doíam tanto que pareciam se revirar dentro dele. Ele não tinha mais tanto tempo sobrando.

“Suponho ser melhor assim, Brighid é maravilhosa, talvez fosse bem mais do que eu mereça. Na verdade, não sei se merecia nada dessas coisas boas que aconteceram comigo nesses últimos dias. Merda… estou com medo de morrer… mas estou conformado. Pessoas como eu, não nasceram para ter um final feliz. Pelo menos estou grato. Quem diria que esse monte de maluco que conheci tornariam o meu sonho de infância realidade, me fizeram esquecer o quão triste pode ser a solidão.”

A intensa rajada de golpes continuava, e os braços arrancados eram arremessados para trás de Colin, como se fossem pedaços de prédios caindo entorno da floresta.

Parecia que um batalhão inteiro estava lutando bem ali.

Abrindo os olhos, Samantha viu ao longe que Colin estava começando a perder o ritmo. Até mesmo o corpo de um usuário da pujança havia limites, e Colin estava começando a alcançá-los. O nariz dele estava começando a sangrar, assim como seus lábios e seus olhos, mas mesmo que seus golpes ficassem mais lentos e seu corpo suplicasse por um descanso, Colin parecia não querer ceder.

Ele não poderia parar, ele precisava ganhar o máximo de tempo possível para que seus companheiros realizassem o ritual e salvassem a todos.

“Esse cara… está lutando contra aquilo sozinho? Ele é surreal…”

Após tossir sangue, Samantha cerrou os dentes ao fazer força para se sentar e escorar na árvore atrás dela. Apoiou a ponta dos dedos no abdômen que ardia como se estivessem enfiando ali ferro em brasa.

Tossiu sangue mais uma vez e sua visão começou a ficar turva. Suas mãos estavam trêmulas, mas ela conseguiu enfiar as mãos no bolso da calça, mas gemia devido à dor.

Retirou duas moedas e as colocou ao seu lado. Logo depois, ainda sentindo uma dor lacerante no ombro, esticou o braço sobre as moedas, transformando-as em duas aljavas cheias de flechas.

As dezenas de flechas se fundiram a uma única.

[Transmutação silenciosa]

Esforçando-se, ela retirou outra moeda, desta vez de madeira, transformando-a em um arco. Com as mãos trêmulas, pegou o arco. Tentou pegar a flecha, mas ela escorregou por seus dedos ensanguentados.

“Vamos lá, Samantha, Colin está arriscando a vida dele, você tem que ajudá-lo, é agora ou nunca!”

Suspirando, ela pegou a flecha mais firmemente. Ergueu o braço e esticou a corda do arco.

Haviam dezenas de árvores a sua frente, sem contar que suas mãos não a respondiam muito bem, além de sua visão embaçada. As rajadas de vento que vinha das enormes mãos do demônio caindo entorno da floresta seriam um problema no trajeto do projétil.

Tentando manter o controle de seu corpo, Samantha mirou para cima, contando com que seu disparo atingisse a criatura. Puxou a corda do arco até seu limite e se concentrou.

“Vamos lá, Samantha, acerte essa!”

Depois de mais um suspiro, ela começou a usar o que tinha lhe sobrado de mana na análise, a fim de calcular com perfeição a trajetória da flecha.

Então disparou.

A flecha foi para cima, tão alto que se não utilizasse a análise ela teria a perdido de vista.

Caindo num zunido, Samantha esperou com que sua flecha estivesse a uma altura considerável, tanto para atingir a criatura em cheio quanto para que Colin conseguisse escapar em segurança.

Então, quando seu disparo estava prestes a atingir o demônio, Samantha estalou o dedo.

Aquelas flechas se transformaram em dezenas, depois centenas e logo depois milhares. Parecia que um exército estava atacando.

O peito de Colin ardia. Ele se concentrava ao máximo para não engasgar com o próprio sangue. Sua visão estava começando a escurecer, e ele estava começando a desistir.

Foi quando um brilho no céu chamou sua atenção e ele reagiu a tempo assim que botou os olhos nas flechas se multiplicando.

Cortou o braço da criatura uma última vez e desapareceu num piscar de olhos. Sabia que se fosse atingido por aquilo, não sobraria nada dele. A criatura ficou sem entender nada. Foi quando ela olhou para cima e viu milhares de flechas vindo em sua direção.

Seu corpo era grande demais, praticamente se tornava um alvo fácil. O demônio ponderou escapar, mas foi tarde demais.

 Boom! Boom! Boom!

Um intenso bombardeio se iniciou, fazendo o chão tremer como terremoto. Aquilo não parou, durou por quase um minuto inteiro.

O que sobrou daquilo foram diversas crateras espalhadas pela estrada e parte da floresta. O demônio permanecia imóvel, cheio de buracos. Da criatura escorria um rio de sangue, então ela gritou, ainda mais alto que da última vez.

 Aaaaaa!

Antes que pudesse fazer algo, um círculo se formou debaixo dela e mãos demoníacas a puxaram para dentro do círculo.

Lutando contra aquilo, o demônio tentava escapar, mas era inútil. O demônio pousou os olhos sobre um Colin cansado, ofegante e acabado.

— Meus irmãos! — berrou o demônio — Eles vão caçar você, errante maldito, aberração, praga, verme miserável!

Colin reuniu ar em seus pulmões e exibiu um sorriso convencido.

— E você disse que estava a universos acima de mim. Que piada.

— Malditooo!

O demônio estava banido.

 Você subiu de nível!

 Você subiu de nível!

 Missão concluída!

 Missão bônus concluído!

 Todas as recompensas foram adicionadas a sua árvore!


Sentando-se no chão, Colin sentiu uma pontada forte no coração e golfou sangue. Sua situação não estava boa. Suas mãos tremiam e ele mal conseguia ficar de pé.

Wiben e Kurth deixaram a floresta depois de alguns minutos, e se assustaram com o cenário desolador que os cercava. Parecia que uma guerra havia acontecido bem ali. Wiben olhou em volta, viu Colin sentado ao longe, e logo viu depois Samantha encostada em uma árvore.

— Kurth! — chamou Wiben — Vá ajudar Colin, verei como Samantha está.

— Certo!

Ao se aproximar de Colin, Kurth se assustou com seu estado. Era a primeira vez que ele o via ema situação tão exasperante. Ele não fazia ideia de como Colin ainda continuava consciente.

— Senhor Colin! O senhor está…

— Não se preocupe comigo, me ajude a levantar.

— C-Certo!

Passando o braço de Colin por seu ombro, Kurth o ajudou a se levantar e caminharam para onde Wiben estava.

Desesperado, Wiben tentava imaginar em como pararia o sangramento de Samantha. Ela havia perdido sangue demais, e os batimentos do seu coração estavam começando a ficar lentos. Ele aproximou a orelha para próximo dos lábios dela, percebendo a respiração fraca, quase se extinguindo.

— Ela está bem? — perguntou Colin se aproximando junto a Kurth.

Wiben se levantou rapidamente e segurou Colin pelo colarinho. Seu rosto transbordava raiva.

— Era para você protegê-la! Agora ela está morrendo, por culpa sua!

Colin ficou em silêncio.

— Não vai dizer nada?!

— Não tenho nada a dizer para você…

Cerrando os punhos, Wiben se preparou para socar Colin no rosto, mas Kurth segurou o seu braço.

— Não é hora para isso, senhor Wiben, os dois lutaram por nós, não é culpa de ninguém! Se não fizermos nada, senhorita Samantha não resistirá.

Wiben mordeu os lábios e soltou Colin.

— Wiben… — disse Samantha baixinho. Wiben se abaixou, segurando as mãos dela — Não brigue com ele… Colin estava disposto a morrer por nós… eu só pensei em fazer o mesmo…

Limpando as lágrimas com as costas das mãos, Wiben entrou em desespero. Samantha era seu mundo, havia muito tempo que eram somente os dois contra tudo. Loafe, império, universidade, nada disso para ele faria sentido sem que Samantha estivesse junto.

Com o que restava de sua força, Samantha tocou o rosto de Wiben e abriu um sorriso gentil.

— Diz pro meu pai que sinto muito… não vou conseguir me formar como ele queria… diga para as minhas irmãs serem fortes… papai precisará delas…

Wiben não conseguiu segurar e desabou em lágrimas.

Colin sentiu como se já tivesse vivido aquilo, lembrou-se da morte de sua mãe definhando em uma cama de hospital, da morte de seu pai em um acidente de carro e sentiu aquele mesmo vazio de antes. O vazio da solidão, o vazio que uma perda traz.

Ele se sentia responsável por Samantha, afinal, foi ele quem decidiu que ela lutaria ao seu lado. Antes, ele não tinha poder nem força suficiente para salvar seus pais, mas agora ele tinha. Ele só não queria sentir aquele sentimento horrível de luto novamente.

Desvencilhando de Kurth, Colin tocou o ombro de Wiben.

— Ei! Samantha, é melhor você lembrar dessas coisas para dizer você mesma a sua família. — A voz de Colin estava rouca.

— Do que está falando? — perguntou Wiben com os olhos lacrimejando.

— Não tenho muita mana sobrando… Mas consigo correr com ela para algum vilarejo próximo. Um usuário da árvore do reparo pode tirá-la do risco de morte.

— Mas… usuários do reparo costumam estar em vilarejos grandes…

— Não importa, não vou deixá-la morrer. — Colin olhou para o vazio — Não quero sentir aquilo… nunca mais…

Ele se agachou e pegou Samantha no colo enquanto ela gemia baixinho devido à dor.

— Fiquem por perto — disse Colin — devo retornar e avisar vocês o mais rápido possível.

Faíscas celestes começaram a rodear o corpo de Colin.

— Colin! — chamou Wiben — Obrigado…

— Me agradeça depois que ela estiver a salvo.

Como um raio, Colin desapareceu floresta adentro.

Picture of Olá, eu sou Stuart Graciano!

Olá, eu sou Stuart Graciano!

Comentem e avaliem o capítulo! Se quiser me apoiar de alguma forma, entre em nosso Discord para conversarmos!

Clique aqui para entrar em nosso Discord ➥