Passando o dia lendo artigos e documentos, Colin não havia encontrado nada de novo, e isso estava o deixando entediado. Ele não aguentava mais ver tantos números e datas, então deixou aquela papelada de lado e decidiu dar uma volta para espairecer.
A cidade parecia ainda mais escura do que no dia anterior, já que o sol se escondia atrás de nuvens carregadas. O céu estava escuro e o vento era rigoroso entorno do pequeno ducado.
As ruas estavam vazias, somente alguns transeuntes iam e vinham segurando guarda-chuvas pretos.
Colin por um momento se esqueceu que ele temia tempestades. Após passar por tanta coisa, ele não tinha noção do que mais o assustava. Olhando com o canto de olho, percebeu alguém a sua espreita.
Mesmo não usando magia, Colin se garantia em força física, além de ter um bom reflexo. Dando de ombros, Colin continuou a caminhar despretensiosamente pela rua.
O vento atrapalhava a percepção dos sons, então resolveu atrair a pessoa que o seguia para uma viela nada convidativa, mas para isso ele deu mais algumas voltas, se afastando de qualquer resquício de civilização.
Chegou até um lugar deserto com casas de madeira rangendo a cada açoitar de vento. Moveu-se para um beco estreito e a pessoa que o seguia adentrou o beco sem preocupação alguma.
Ao chegar, não encontrou nenhum sinal do homem que o perseguia.
— Oi! — disse Colin atrás de seu perseguidor.
Rapidamente, o perseguidor tirou um canivete do bolso e tentou enfiar no abdômen de Colin, mas o que conseguiu foi quebrar o canivete.
Tropeçando, o perseguidor caiu de bunda no chão, deixando sua máscara cair.
Aquele era só um garoto assustado segurando um canivete quebrado. Ele estava vestindo trapos e estava tão magro que dava para se ver as maçãs em seu rosto.
— Por que estava me seguindo? — perguntou Colin se aproximando com as mãos no bolso.
O garoto, tremendo feito um cão assustado, engatinhou até encostar na parede. Um pânico anormal tomou conta dele.
Ouvindo passos atrás, Colin se virou rapidamente com um chute, mas parou o pé antes que atingisse uma garotinha tão magra quanto o garoto, segurando um pedaço de pau.
O garoto parecia ter por volta dos nove anos, já a menina parecia ter entre sete e nove.
Uma gota de suor seco desceu pela têmpora dela ao perceber o pé enorme de Colin parado frente a seu rosto. Ela olhou para trás de Colin, vendo o menino apavorado sentado no chão frio, então, atacou de novo.
— Deixa o meu irmão em paz! — ela quebrou o pedaço de pau na canela de Colin, mas ele não sentiu nada.
Vendo que o homem enorme a sua frente ficou imóvel, a menina caiu para trás e mordeu os lábios para segurar o choro.
Colin olhou para baixo e se agachou, encarando a menina no fundo dos olhos. O olhar de Colin não tinha o mesmo brilho das pessoas normais, eram olhos bem frios.
— Por que me atacou? — perguntou Colin de maneira serena.
Ouvindo bater ligeiro de pés atrás, Colin se virou e segurou a cabeça do garoto antes que ele pudesse fazer algo. A mão de Colin era enorme se comparado ao garoto. Ele levantou, erguendo o garoto junto.
— Solta ele, solta ele, solta ele! — berrava a garota dando socos na perna de Colin.
Ele pegou a garota pelo colarinho do vestido aos farrapos e a ergueu. As duas crianças choravam baixinho, temendo o pior.
— Pode fazer o que quiser comigo, mas deixa ela em paz! — disse o pirralho enquanto tentava conter o choro.
A garota chorava como um recém-nascido, e Colin suspirou, soltando os dois em seguida. Os irmãos caíram de bunda no chão.
A garota foi para perto do irmão o mais rápido que conseguiu e o abraçou. Ele a abraçou apertado, protegendo-a, enquanto encarava Colin com um olhar furioso, mas, ao mesmo tempo, assustado.
Agachando, Colin encarou o garoto nos olhos.
— Irei perguntar de novo, mas essa é a última vez. Por que me atacaram?
Fungando, o garoto limpou a lágrima dos olhos.
— Você é um estrangeiro… achei que você pudesse ter dinheiro…
Colin coçou a nuca.
— Entendi… Não devia sair por aí atacando as pessoas desse jeito, eu quase matei sua irmã hoje.
O garoto abraçou ainda mais forte sua irmã que havia parado de chorar.
— Meg estava reclamando da dor de barriga, então eu… eu não sabia o que fazer… As pessoas nos espantam se fuçamos o lixo delas, às vezes até soltam cachorros… Tobi, Bill, Melyssa e a Brey estão sempre reclamando também, se eu não fizer nada, eles…
— Quem é esse pessoal todo, são seus irmãos?
Ele fez que não com a cabeça.
— Só Meg é minha irmã… O resto das crianças vive conosco no distrito abandonado…
— Onde estão os pais de vocês?
O garoto olhou para o vazio e engoliu o seco.
— Morreram… Os pais de todos se foram…
Aquilo pegou Colin de surpresa.
O que mais o assustava era que um bando de crianças estava tentando matar os outros para sobreviver. O que diabos o duque estava fazendo afinal?
Colin se ergueu.
“Os pais deles podem ser vítimas de vampiros. Olha como estão magros. Devem dizer qualquer coisa por um prato quente de comida.”
— Pode me levar até seus amigos?
O garoto ficou em silêncio.
— Eu não vou machucar vocês. — disse Colin — Vou ajudar. Perdi meus pais também, e sei o quanto uma ajuda é bem-vinda. Confie em mim.
Os irmãos se entreolharam.
O garoto estava assustado pela aparência intimidadora de Colin, mas se ele quisesse fazer algo, certamente já teria feito. E ele era bem forte, tão forte que nem seu canivete conseguiu feri-lo. Talvez alguém forte como ele pudesse os ajudar, os proteger de alguma forma. Cuidar de um bando de crianças sozinho era uma tarefa bastante difícil para outra criança fazer.
O garoto se sentiu um pouco aliviado quando um adulto ofereceu ajuda, já que o próprio se sentia sobrecarregado com essa função.
— Tá… levo você…
— Mas antes, vamos comprar alguma coisa pro seu pessoal. Devem estar famintos, não é?
Os irmãos se entreolharam mais uma vez e não conseguiram esconder a felicidade. Pareciam até mesmo viver um sonho. A garota de cabelo castanho com alguns dentes faltando não aguentou e começou a chorar novamente, mas um choro de felicidade.
— O senhor tem certeza? — perguntou o garoto segurando o choro.
— Claro, vamos lá. Deve ter algum mercado por perto.
Colin começou a sair do beco a passos lentos, mas os dois não se moveram.
— O que foi? — perguntou Colin os olhando por cima dos ombros.
— Bem… — murmurou o garoto — Algumas pessoas podem não ficar felizes de nos ver…
— Ah, isso?! Não esquenta, garoto, vocês não vão roubar nada, irão comprar. E ninguém tocará em vocês na minha presença, eu prometo.
Aquelas palavras confortaram o coração dos irmãos. Talvez fosse por inocência ou por se preocuparem demais com as outras crianças do abrigo, aqueles dois confiaram inteiramente em Colin, um rapaz que eles acabaram de conhecer com uma expressão bem assustadora.
— Senhor… — disse o garoto — Pode nos dizer o seu nome?
— Colin. Essa é a Meg, certo? E você, qual seu nome?
— Potter!
Alguns moradores encaravam as crianças e principalmente Colin com uma expressão nada agradável, mas não diziam nada, só cochichavam.
Foi aí que os garotos sentiram ainda mais liberdade para agir como queriam. Eles compraram frutas, legumes e um frango já depenado. Aquela foi uma compra bem generosa, daria para uma família comer por uma semana inteira, e ainda sobraria.
Após comprar tudo que precisavam, partiram do mercado com as sacolas cheias de comidas.
Colin também viu o estado da roupa dos garotos e sugeriu em comprar roupas novas. As crianças ficaram ainda mais animadas com tudo aquilo, pensaram estar em um sonho.
Meg sabia o número de todas as crianças, então escolheu as roupas. A atendente os encarava com repulsa, mas aqueles olhares não os assustavam, eles se sentiam seguros perto de Colin.
Após tudo comprado, Colin carregava as sacolas mais pesadas. Meg carregava uma sacola com algumas maças e Potter carregava uma sacola cheia de laranjas. Colin conseguiria carregar tudo sozinho, mas os dois insistiram em ajudar.
Eles foram até o distrito abandonado.
Era um lugar que fazia jus ao nome. Não tinha uma única alma viva naquele local. Parecia mais um grande lixão cheio de destroços e entulho.
Indo até uma porta de madeira de uma casa grande caindo aos pedaços, Potter bateu nela de várias formas diferentes. Aquele era o código secreto.
Ouviu-se a porta se destrancando e uma garotinha ainda menor do que Meg abriu a porta. Ela segurava um coelhinho de pelúcia avermelhado sem orelha. O vestido que ela usava estava todo encardido, sua pele rosada estava suja de fuligem e seu cabelo louro tinha tons marrons de tão sujo.
Ela empurrou o banquinho que usou para subir e destrancar as portas e, assim que botou os olhos em Colin, a garota se assustou. Colin estava na direção do sol que estava se pondo, e seus olhos levemente amarelados se destacaram bastante naquele instante.
— Melyssa! — disse Meg indo até à amiga — Você não vai acreditar, tem comida para todo mundo e também tem roupa novas! — A felicidade de Meg era contagiante.
Melyssa continuou encarando Colin. Ela estava curiosa, era a primeira vez que ela via alguém como ele, um estrangeiro.
— Vem! — Meg pegou na mão de Melyssa a arrastando pro fundo — Vamos avisar para todo mundo!
As duas saíram correndo e Colin entrou, fechando a porta atrás dele com os pés. A cozinha ficava um pouco na frente, onde havia uma mesa grande de madeira podre. Havia uma estante mais ao fundo com pratos de barro dentro. Mais ao fundo, havia um fogão a lenha e um pequeno caldeirão.
Saindo da cozinha havia alguns quartos vazios. Devido ao frio que se fazia a noite, as crianças dormiam juntas na sala, aquecidas pela velha lareira.
As camas ficavam no chão e eram feitas de palha. O cobertor que usavam haviam inúmeros buracos e cheirava a mofo.
Colin colocou as sacolas com cuidado na mesa e Potter já correu para o fogão a lenha. Começou a arrumar as madeiras cuidadosamente e pegou um pano para limpar o caldeirão que não usavam a meses.
Meg retornou correndo e trouxe consigo o resto das crianças junto. Todas pararam de se mover assim que viram Colin os encarando. Elas ficaram com medo e, ao mesmo tempo, curiosas.
Tobi era alguns meses mais velho que Melyssa.
Bill era um ano mais novo que Meg e Brey era a criança mais nova daquele lugar, sendo alguns meses mais nova que Melyssa.
— Pessoal, esse é o Senhor Colin! — disse Meg empolgada — Foi ele quem comprou esse monte de comida!
Os garotos babavam nas frutas em cima da mesa, mas não ousaram se mexer por medo de Colin os repreender de alguma forma.
— A gente pode… comer? — perguntou Tobi baixinho.
Colin olhou para as crianças e fez que sim com a cabeça.
— Claro, é de vocês. Só não comam tudo, guardem um espaço pro jantar.
As crianças arrastaram cadeiras e se sentaram a mesa enquanto começavam a comer com uma felicidade ímpar em sues semblantes. Assim que deu a primeira mordida, Melyssa começou a chorar. Ela havia se esquecido qual foi a última vez que comeu algo tão suculento.
Colin pegou uma das facas da bancada mofada e começou a picar o frango.
Todas elas comeram apenas uma única fruta. Quando terminaram ficaram olhando Colin picar o frango em pequenos pedaços, ferver água e misturar tudo isso junto aos legumes no caldeirão lavado com ímpeto por Potter.
Colin sentiu haver se desviado um pouco do seu caminho. Ponderou se deveria estar fazendo outra coisa mais importante, mas logo mudou de ideia.
Ele estava contente em ajudar.
Aguardando a sopa ferver, Colin sentou-se à mesa com todas as crianças os encarando.
Ele se sentiu um pouco desconfortável com aqueles olhares, até que Brey quebrou o silêncio. A pequena de cabelo escuro e olhos castanhos encarava Colin sem parar. Ela usava um vestido marrom por baixo e um macacão acinzentado por cima. Suas roupas estavam tão sujas quanto as de Melyssa.
— Moço… — disse envergonhada — Você é o meu papai?
Colin ergueu uma das sobrancelhas.
— Eu… o quê?
— Brey! — chamou Potter — Já disse para não ficar falando disso com os adultos. Senhor Colin não é o seu pai, ele nem é daqui.
Cabisbaixa, Brey abaixou a cabeça enquanto segurava as bordas do vestido, contendo-se ao máximo para não chorar.
— Desculpa, senhor Colin… — disse Potter — O pai de Brey foi embora quando ela ainda era um bebê, e a mãe dela faleceu há alguns meses… acho que não só ela, mas todo mundo aqui sente saudade dos pais…
— Não tentaram falar com o duque sobre seus pais? — indagou Colin.
— Ele não vê ninguém… Melyssa tentou falar com o duque uma vez, mas os homens dele a afastaram, quase a agrediram.
Melyssa abaixou a cabeça.
— Sinto muito em ouvir isso… Como fazem para conseguir comida? Sempre roubam ou pegam dos lixos?
— Bem… Eu e Meg somos os mais velhos, então a gente vai sozinho e deixa tudo aqui trancado. Levar os outros é perigoso, já ouvi falar que um velho queria a Melyssa para ele, não sei para que. Então decidi que era melhor eu e Meg irmos, mas ainda prefiro ir sozinho. Se o senhor fosse malvado, acho que eu ia ficar muito magoado se tivesse machucado Meg…
Era um momento agradável, principalmente para as crianças, mas Colin estava ali para cumprir uma missão.
— Sei que é ruim lembrar — disse Colin — mas preciso saber, como pai de vocês morreu?
As crianças ficaram em silêncio.
— Os adultos não disseram nada… mas ouvi dizer que foram mordidos por alguma coisa…
— Entendi… — Colin abriu um sorriso gentil — Acho que a sopa está pronta. Vamos comer!
Com uma colher côncava, Colin colocou sopa nos pratos de barro um por um, movendo-os para perto dos garotos. Eles não começaram a comer até que Colin retornasse para a mesa.
Assim que ele se sentou, as crianças continuaram esperando ele dizer algo.
— Podem comer, mas assoprem antes, está quente.
Ouviu-se o som de talheres batendo nos pratos e o som de assopros e sorrisos das crianças. Colin comeria tudo sozinho se pudesse, mas se segurou devido às crianças que não comiam decentemente a meses.
Tobi era a típica criança que adorava aventuras, sempre sonhou com isso, em ser um cavaleiro poderoso ou algo assim.
— Senhor Colin! — disse ele com brilho no olhar — O senhor tem alguma história? Algumas de combate ou algo assim?
Todas as crianças o encararam esperando uma resposta.
— Tenho algumas, querem ouvir?
— Sim! — disseram em uníssono.
Colin contou suas aventuras iniciais, mas moderou os detalhes sórdidos pela idade dos ouvintes. Ficou contando histórias por quase duas horas inteiras.
Os mais novinhos começaram a ficar com sono logo e adormeceram em suas cadeiras. Colin pegou Bill e Tobi primeiro, deitando-os na cama de palha com cuidado. Depois foi a vez de Melyssa e Brey. Colocou Melyssa com cuidado primeiro, mas assim que foi colocar Brey, ela abraçou seu pescoço.
— Boa noite, papai… — disse baixinho em seu ouvido com uma voz sonolenta.
Colin parou de se mover por alguns segundos e deu dois tapinhas nas costas de Brey, deitando-a na cama e a cobrindo com cuidado.
Potter ajudou a irmã a deitar e depois ele mesmo se deitou.
Colin ponderou ir embora. Dirigiu-se até a porta, apoiou a mão na maçaneta e ficou ali parado por alguns instantes. Olhou para trás e viu as crianças dormindo de maneira serena. Pela primeira vez em meses deitaram-se de barriga cheia e pregaram os olhos sem se preocupar com o perigo que vinha de fora daquela casa velha. Com Colin ali, as crianças se sentiram seguras para dormirem como nunca dormiram desde que se tornaram órfãs.
“Que saco, quando foi que fiquei tão mole?”
Colin foi até um dos quartos vazios, afastou a poeira de maneira preguiçosa e se deitou entrelaçando as mãos atrás da cabeça. Amanhã seria o dia de procurar novas pistas e confrontar o duque sobre como ele trata os moradores de seu pequeno ducado.
Uma parte dele estava bastante satisfeita em ter feito o que fez. A outra parte estava preocupada, pois, não teria como ele continuar as investigações e ficar de olho nas crianças. De qualquer modo, ele deixaria isso para o dia seguinte.
A lua saia de trás das nuvens no meio de uma floresta densa. Os lobos uivavam ao longe e o vento soprava gélido. Um bando de vampiros estava parado no meio da floresta. Seus olhos vermelhos sangue brilhavam na escuridão de maneira apavorante.
No topo de um penhasco com os cabelos negros esvoaçantes, Nostradamus exibia aquele sorriso agressivo de dentes pontiagudos. Seus olhos vermelhos eram ainda mais vermelhos e, a pressão que ele transmitia, era assustadora.
Aquele não era um inimigo a ser ignorado.
— Reunimos todos aqui, todos os clãs do continente, desde os Ayuitor até os Mazunis. — disse um vampiro de cabelo prateado ao seu lado.
— Ótimo, quantos somos ao todo?
— Mais de duzentos mil, senhor.
— Hum, nossa força foi bastante reduzida desde aquela guerra onde Lord Alucard foi banido. Mas é o suficiente, não é mulher?
Uma mulher que usava capuz no qual lhe tapavam os olhos apenas sorriu.
— Você planeja o que com isso? Varrer o continente? Pode esquecer. Não conseguirá nem passar pelos portões da capital.
— Isso que você pensa, mulher. Ainda temos dias até o grande eclipse que durará três dias. Varreremos todas as vilas nas redondezas na próxima semana, transformaremos mais humanos em vampiros e teremos a maior legião desde a antiga era.
A mulher deu as costas e começou a se afastar devagar.
— Não foi fácil convencer todos os líderes de clãs a se juntarem a um vampiro egocêntrico como você, mas esse crédito é meu. Melhor não me decepcionar, você deve estar ciente do porquê estou te ajudando, não se esqueça disso.
Nostradamus franziu os caninos enormes.
— Você cogita achar o sétimo e último caído que despertou, não é? Não prometo nada, posso acabar o matando sem querer se ele cruzar o meu caminho.
— Acha que os caídos, são tão fáceis de matar? Não se esqueça que bastou um de nós para massacrar o antigo conselho de lótus, e bastou também um de nós para dar fim à noite eterna de Alucard. Não nos subestime, morceguinho, ou vai se arrepender.
Antes que pudesse dizer algo, a mulher desapareceu na escuridão. Nostradamus não confiava nela. Aquela mulher era ardilosa e cheirava a podridão, uma podridão pior do que aquela que vinha dos corpos em putrefação.
Deixando esse assunto para resolver mais tarde, Nostradamus foi até a ponta do penhasco e deu uma boa olhada para baixo, observando um mar de olhos vermelhos que parecia não ter fim.
Ele encheu os pulmões e disse em um tom ribombante capaz de alcançar a todos.
— Irmãos! Está chegando o aclamado dia de varrer esse continente inteiro para debaixo do tapete da história! Um novo mundo nos espera, um mundo, tirado de nós e que nos pertence por direito! Os países vizinhos temem Ultan como força militar, mas eles ainda não viram o quão destrutivo um vampiro pode ser! Mostraremos a todos os desgraçados e espalharemos nosso império pelo mundo, um império com uma sombra infindável, que cobrirá o planeta! Estão comigo, irmãos?
Um urro ensurdecedor estava sendo ouvido ao longe junto a clamores e gritos de euforia. A mulher de antes estava afastada, vendo toda a chama de ódio dos vampiros se ascender como brasa no feno seco.
Havia outro homem de capuz e sobretudo sentado em uma pedra observando o mar de olhos vermelhos ao longe.
— Acho que é péssimo fazer negócio com esse imbecil do Nostradamus.
Ela deu de ombros.
— Acha mesmo que esse imbecil tem chance de vencer o império de Ultan? — indagou a mulher — Nem em um milhão de anos! Ele só servirá de distração pro meu objetivo principal.
— Qual? Achar o último de nós?
— Não exatamente. Preciso que Ultan se enfraqueça, mas tudo irá depender de como a terceira geração agirá.
— Conhecendo a terceira geração, é provável deles estragarem seu plano, principalmente com aquele velho do Graff no comando deles.
O homem se ergueu e começou a caminhar para longe quando uma ventania forte se iniciou.
— Hum, planejo ficar o mais longe possível disso. — disse ele — É trabalho demais para mim.
— Está fugindo? Nem parece o homem que massacrou o antigo conselho de lótus.
— Isso foi há muito tempo, o novo conselho nem se compara ao antigo. Não quero me meter com eles por enquanto.
— Não achei que o grande Var’on fosse um covarde.
— Não viaja. O novo conselho de lótus não teria chance contra mim, mas eu não sou idiota. Eles são bastante fortes, são fortes até mesmo para você.
Var’on desapareceu lentamente na escuridão.
— Fique de olho em Nostradamus — disse ele — Se ele falhar, mate-o.
Depois de uma rajada mais forte, Var’on desapareceu completamente e a mulher fez o mesmo. Um mau presságio parecia se arrastar lentamente para a superfície, emergindo do antro de toda maldade que o mundo tinha a oferecer.
O vento forte soprava uma brisa gelada, trazendo um amanhã tão frio quanto o inverno, tão frio quanto o abraço da morte.