Selecione o tipo de erro abaixo

Capítulo 55 – Errante

Avançando contra Morgana, Colin tentou acertá-la no flanco direito com um chute, mas ela defendeu sem muita dificuldade. Aquele foi um chute forte o bastante para partir um pedregulho ao meio, mas Morgana nem se mexeu.

Bam!

Colin se afastou em um longo salto, sentindo uma fisgada na canela. Morgana abaixou o braço que usou para defender o golpe e abriu um sorriso.

— Usuários do céu são sempre apressadinhos demais — disse ela — Por que a gente não vai com mais calma e aproveita o momento?

Colin franziu a testa.

— Está brincando comigo, não está?

Morgana deu de ombros.

— Como eu disse, quero fazer isso durar — Ela apontou para as pernas de Colin — Você tem a vantagem de ser da árvore dos céus, e mesmo assim se move dessa maneira desesperada. Vi você concentrando mana nas pernas para me atacar, mas você concentra mana nas pernas para correr também, e esse é o seu erro. Seu movimento fica mais pesado se você se move com mana. Claro que para quem não pertence a uma árvore de velocidade natural como a sua, é importante concentrar mana nas pernas para se movimentar, mas você não precisa.

— Não preciso das suas dicas. — disse Colin preparando-se para avançar.

— Claro que não.

Como Morgana instruiu, Colin avançou sem concentrar mana nas pernas, e assim que se aproximou de Morgana, concentrou mana nas pernas e a chutou no abdômen.

[Pancada!]

Ela derrapou alguns centímetros e Colin novamente se desvencilhou indo para longe. Mesmo atacando daquela forma, não pareceu ter feito dano algum.

— Ótimo! — disse Morgana empolgada — Mas ainda está fraco para um usuário da pujança de nível 5. Que seja, agora é a minha vez de atacar!

Morgana apoiou as duas mãos no chão como se fosse um corredor se preparando para a largada. Colin ficou atento, já que a vampira parecia não concentrar mana alguma. Ele se lembrou do treinamento com Eilika, mas ouviu uma explosão como se um poderoso canhão tivesse sido disparado.

 Boom!

Quando se deu conta, viu Morgana bem na sua frente preparando para socá-lo. Os olhos dela estavam brancos e seu sorriso caricato se destacava naquele rosto pálido. Por um momento, Colin viu Morgana bem maior do que ela realmente era. Seu tempo de resposta foi lento demais, e ele só conseguiu fechar os olhos esperando um golpe avassalador, e ele veio.

[Pancada!]

Morgana conseguiu o tirar do chão com aquele soco que atingiu seu abdômen. Colin sentiu aquele golpe, mas ele ainda estava consciente. Morgana saltou, girou e atingiu o rosto de Colin com o calcanhar.

[Pancada!]

Colin foi lançado longe, mas antes de se chocar contra a parede de rocha, ele se recompôs e apoiou os pês na parede. A parede rachou e um círculo mágico surgiu bem abaixo de seus pés, e como um raio, ele avançou, socando Morgana no rosto antes que ela pudesse se defender.

Para surpresa de Colin, Morgana não havia sequer se movido. Ela forçou o rosto com o punho de Colin ainda ali. Mesmo que Colin fosse forte, não tinha como competir força contra Morgana.

A vampira juntou as duas mãos e bateu com tudo nas costas de Colin.

Boom!

Receber aquele golpe foi como ser atingido por uma bala de canhão a queima-roupa direto nas costas. Por um instante ele perdeu a consciência, mas quando ia ao encontro do chão, foi acordado com uma bela joelhada no estômago e por fim foi recebido com um poderoso soco no meio do rosto.

Crash!

Colin capotou enquanto tentava se recuperar, ele notou que não foi um soco tão forte. Se Morgana quisesse, ela teria o matado com aquele soco, mas ela se segurou.

Erguendo-se, ele limpou o sangue que escorria do nariz com as costas das mãos e encarou Morgana mais uma vez. Por mais que fossem intensos e poderosos, os socos de Colin pareciam não surtir dano algum.

“Mesmo se eu usar minha velocidade para aumentar o poder destrutivo de meus golpes, isso parece que não vai funcionar da maneira que eu gostaria. O corpo dela é mais rígido que o meu… e para piorar ela ainda está pegando leve…”

Colin olhou ao redor e fixou seus olhos no teto metros acima.

— Pensando em fugir? — Indagou Morgana exibindo um sorriso diabólico — Achei que estava gostando do nosso encontro, mas pelo visto você é só outro homem frouxo que sai correndo após levar um ou dois socos.

Erguendo-se, Colin suspirou.

— Eu não vou fugir, não precisa se preocupar com isso.

— Será que não? Acho que estou começando a voltar a velha forma, que tal se a gente der um passo adiante nesse encontro? O que me diz?

Colin assumiu sua postura de luta enquanto faíscas percorriam seu corpo.

— Faça o que quiser. — respondeu ele.

Ah! Eu farei!

Morgana flexionou os joelhos e saltou em direção a Colin tentando acertá-lo com um pontapé.

Woosh!

Colin se abaixou e ela passou direto. Vendo a oponente de costas, ele tentou acertar um soco no rosto de Morgana, mas ela defendeu com o braço sem muito esforço.

Mesmo para uma mulher musculosa, seu corpo era bastante flexível. Ela girou tentando acertar o rosto de Colin com o calcanhar e, por sorte, ele defendeu aquele golpe sendo jogado para o lado.

Bam!

Colin se recompôs, mas Morgana não deu tempo para ele respirar.

Sem usar um pingo de mana, Morgana tentou acertar um gancho em Colin, mas ele defendeu apoiando a palma da mão debaixo do queixo, suavizando em muito o impacto do golpe.

Bam!

Isso não impediu que ele fosse arremessado para cima.

Morgana flexionou os joelhos e saltou deixando uma nuvem de poeira. Como um torpedo, ela avançou até Colin, mas ele conseguiu girar para o lado em pleno ar, deixando Morgana passar direto.

Enquanto ia em direção ao teto, Morgana girou o corpo e apoiou os dois pés no mesmo de maneira sutil. Por um momento, ela pareceu estar parada lá em cima como uma aranha. Um círculo mágico enorme surgiu debaixo de seus pés, e se expandiu até cobrir uma parte do teto que ainda restava naquele espaço.

Era a primeira vez que ela usava mana.

O braço direito dela estava com veias saltando.

“Isso é o suficiente para matá-lo” Pensou Morgana “Caso ele sobreviva, então o garoto pode ser lapidado até se tornar um forte que valha a pena matar!”

— Aqui vou eu!

Crack! Boom!    

Ela avançou em direção a Colin, quebrando parte do teto. Colin somente viu Morgana de cabeça para baixo no teto e, instantes depois, não viu mais nada.

Bam!

Morgana atingiu o abdômen de Colin com seu braço direito ainda no ar, o lançando contra o solo rochoso, levantando poeira até o teto. Outro tremor se iniciou e o teto trincado começou a quebrar de pouco em pouco, iniciando um desabamento de grande parte dele. Pedregulhos enormes caiam em volta de Morgana, mas ela estava parada, estampando um sorriso em seu rosto. Ela encarava Colin nocauteado, afundado no solo rochoso.

O grande cabelo preto dela estava solto, então, ela se abaixou rasgando parte da manga da camisa de Colin e usou para prender o cabelo.

— Terminou? — sibilou Nagini.

Morgana pegou Colin pelo colarinho e o colocou em seu ombro. Ela flexionou os joelhos e saltou para cima da cabeça da serpente.

— Me empolguei no final. — disse ela — Pelo menos ele ainda está vivo.

— O que achou do errante?

— É de nível especial com certeza. Venceria sem muito esforço o exército de Alistar, mas ainda é fraco. Vamos voltar, a rebelião humana já deve estar perto do fim.

— Não vai ajudar a pará-la?

— Deixe para os peões. Preciso de um banho, esse ratinho me fez suar.

A serpente rastejou pela parede até sair pelo buraco no teto que se estendia por metros a fio.



Após lutar contra Morgana, Colin acordou em uma cama sentindo fortes dores abdominais. Apoiou a mão na barriga e sentiu estar enfaixada. Olhou em volta e viu um quarto bem iluminado por um orbe. Seus lençóis assim como sua coberta eram pretos, mas o quarto tinha vívidas paredes brancas e não era tão cheio. Havia apenas uma cama e um criado mudo em um espaço bastante amplo.

Ele jogou as cobertas de lado e apoiou os pés no chão. O mais surpreendente era que não haviam o prendido, sequer o amarrado.

A porta se abriu e um vampiro que se parecia com uma criança entrou no quarto. O garoto de cabelo preto parecia estar com os olhos brilhando assim que avistou Colin.

— Olha, irmã, o errante acordou! Ele acordou!

Atrás do garoto surgiu uma mulher de cabelo preto que ia até os ombros. Ela usava túnicas escuras e ambos eram tão pálidos que se pareciam com cadáveres. A vampira era somente um pouco mais baixa que Colin, mas carregava a mesma expressão de indiferença.

— Achei que estivesse morto. — disse a mulher — E se eu fosse você não me esforçaria demais. Morgana não pegou leve com você. O surpreendente mesmo é você ter sobrevivido.

Colin a encarou bem, e depois encarou o garoto que parecia inofensivo. Lentamente começou a se concentrar em sua mana elétrica que começou a percorrer seu corpo, até que ele sentiu algo gelado em sua garganta.

O garoto inofensivo de antes o encarava com um sorriso enquanto estava em cima da cama com as unhas afiadas no pescoço de Colin.

— Se eu fosse você, não tentaria nada estúpido. — Ele soou como se fosse outra pessoa — Morgana já está a caminho. Ela conseguiu convencer o pirralho do Nostradamus a manter você aqui. — Ele pulou da cama para o chão e colocou as duas mãos no bolso daquele pequeno terno que ele trajava, mas ao invés de calça, ele usava um short e meias pretas que cobriam toda sua canela. — É isso que me irrita. Porque temos que responder a vampiros mais jovens que nós, isso não faz sentido algum.

— Esse foi o nosso combinado, então pare de chorar feito uma criança e retorne a sua postura de chefe do clã, é vergonhoso ver você se comportando assim na frente das visitas.

Tsc… — O garoto, de cabelo preto, penteado de lado e com olhos de gato, apenas virou a cabeça para o lado e apoiou as costas na parede.

Colin prestou atenção a toda conversa e prestou mais atenção no garoto. Se ele ouviu direito, então o garoto era o líder do clã, e a maneira como fala demonstra que ele é mais velho que Nostradamus. Isso implicaria que possivelmente ele fosse um vampiro de grande status, mas seu palpite certamente seria que eles eram vampiros da terceira geração, assim como Morgana.

— Vocês são da terceira geração? — perguntou Colin.

O garoto abriu seu sorriso diabólico e fez que sim com a cabeça.

— Parece que o errante percebe rápido as coisas, não é?

— Parece que sim. — respondeu a mulher.

Então estava confirmado, aqueles eram vampiros de terceira geração, mas as aparências deles não eram intimidadoras. O líder do clã parecia inofensivo, e aquela mulher só tinha um semblante mal-humorado. Porém, Colin havia aprendido a não julgar as pessoas pela aparência, já que as pessoas mais fortes que conhecia pareciam pessoas fracas.

— Se não me mataram ainda, significa que sou valioso para vocês, não é? — perguntou Colin.

O garoto fez que sim com a cabeça.

— Infelizmente, sim. — respondeu o garoto — Então coopere se não quiser ser nocauteado novamente.

— Posso fazer uma pergunta? — indagou Colin.

O garoto deu de ombros.

— Faça! Temos tempo mesmo.

— Ouvi que vocês da terceira geração são os vampiros mais poderosos, então, por que se submetem a Nostradamus?

— Você é alguém bem atrevido, não é? Não nos submetemos a Nostradamus. O que tem aqui é apenas uma questão hierárquica clássica. O restante dos vampiros acha que nós da terceira geração não devemos assumir o poder. Eles nos acham… brutais demais, então nós nos mantemos neutros em relação aos assuntos do conselhinho deles, mas nossa palavra é respeitada de norte a sul nesta cidade que fede a mofo.

Colin fez que sim com a cabeça.

— Não é o que parece…

O garoto franziu a testa.

— O que disse?

— Alguns vampiros não parecem respeitar vocês de forma genuína, parecem apenas os temer, e medo não é respeito.

— Claro que é. Medo é a forma mais genuína de respeito.

A porta abriu novamente e Morgana entrou. Diferente de antes, ela parecia mais serena, até mesmo seu rosto assustador parecia mais calmo.

— Colin! — disse ela empolgada — Pelos doze, ainda bem que você está vivo, não machuquei você para valer, machuquei?

Colin coçou a nuca e fez que não enquanto olhava para o lado.

“A terceira geração inteira é assim? Parecem um bando de loucos.”

— Meu abdômen ainda dói um pouco, mas tô bem…

— Sério?! Que alívio ouvir você dizer isso — Ela foi até o garoto encostado na parede e o levantou apoiando as mãos debaixo da axila dele, mostrando-o para Colin. — Vejo que já conheceu o Graff, olha como ele é fofo!

— Me põe no chão!

Ela soltou Graff e foi até a vampira, encostando seu rosto no dela e a envolvendo em um abraço afetuoso.

— Essa é Carmilla, parece uma vampirinha má por esse semblante sempre fechado, mas acredite em mim, é um amor!

Era estranho encarar Morgana após ter sido derrotado por ela. Diferente da vampira impiedosa que encontrou lá atrás, essa Morgana parecia ser gentil e bastante extrovertida. Não só ela, mas a terceira geração que ele conheceu parecia ter uma vibe bem diferente da dos outros vampiros. Colin ouviu que eles eram tão ruins, tão impiedosos e brutais que vendo de perto o deixou confuso.

— Morgana… — disse Colin — Por que me trouxe até aqui?

— Espera um pouco, vou te apresentar os outros — Ela foi até a porta — Lestat! Orlok! Venham logo conhecer o garoto que falei!

Lestat foi o primeiro a entrar. Ele era do mesmo tamanho de Morgana, tinha as orelhas pontudas e seu cabelo era preto como o de todos ali dentro.

— Que barulheira. — Reclamou Lestat apoiando um dos indicadores no ouvido — Já sabíamos que o errante estava aqui, não precisa ser tão escandalosa.

Morgana abraçou Lestat pelo pescoço.

— Esse é Lestat! Tem essa cara de tonto, mas é o vampiro mais forte depois do Graff!

“Então existem vampiros mais fortes que essa gorila?”

Colin encarou Lestat de cima a baixo e ele não parecia grande coisa. Ele tinha um jeito bastante desleixado, seu cabelo era bagunçado e suas olheiras eram tão grandes quanto as de Colin, mas Morgana não parecia do tipo orgulhosa, e de uma forma estranha, ele acreditou no que ela dizia.

E por último, entrou Orlok. Ele tinha a pele acinzentada, era do mesmo tamanho que Carmilla e exibia um sorriso não tão característico dos vampiros. Ele foi até Colin e apertou as mãos dele, enquanto as sacudia rapidamente.

— Você deve ser o Colin, né? Muito prazer, Morgana falou muito bem de você!

Sem jeito, Colin apenas deu um sorriso sem graça. Morgana pulou nas costas de Orlok, o abraçou por trás e o ergueu enquanto os pés dele pedalavam no ar.

Háháhá Esse danadinho é Orlok, esse filho da mãe parece um franguinho de tão magro, mas é tão forte quanto eu! — Ela colocou Orlok no chão e abriu os braços — Acho que você já conheceu todo mundo, essa é a terceira geração! Tem mais uma integrante… mas ela fugiu da gente, então somos só nós cinco mesmo.

Colin prestou atenção em cada um deles. Não pareciam tão assustadores, tirando Morgana, que era a que mais se destacava ali não só pelo seu tamanho, mas por seus músculos e sua personalidade quase única. Isso a deixava bem intimidadora perto de outros vampiros, mas próxima ao restante da terceira geração ficava bem à vontade.

O pequeno Graff se aproximou de Colin com as mãos nos bolsos.

— Trouxemos você aqui por uma razão — disse Graff — Você é um errante, e tem alguém que quero que você traga de volta, mas parece que sua chave ainda está incompleta.

Apesar de tudo, Colin não fazia noção do que era ser um errante, muito menos trazer alguém de volta. Isso implicaria trazer de volta dos mortos ou de outro lugar?

— Vocês têm me chamado de errante, mas eu nem mesmo sei o que é isso…

— …

Os vampiros se entreolharam e Graff coçou a nuca.

— Que merda, o errante que não sabe de nada sobre ele mesmo… que saco… — Graff saltou até a cama de Colin e se sentou ao seu lado — Você não é daqui, né?

Colin ergueu uma das sobrancelhas.

— Como assim?

— Desse mundo. Você deve ter vindo de outro buraco, outra dimensão decadente na vastidão do universo. Errante é o nome dado àqueles que conseguem “transitar” entre os planos materiais. Em suma, você consegue vagar pelos mundos.

Aquela informação pegou Colin de surpresa. Então foi por isso que ele conseguiu chegar até esse mundo?

— Desculpa interromper, mas quer dizer que existem realmente outros mundos além deste e do meu mundo de origem? Isso é um pouco demais para digerir… já estive em outras dimensões… mas em outros mundos é algo difícil de acreditar.

— Dimensões são projeções de fragmentos de outros mundos ou fragmentos de um pedaço do tempo que algumas pessoas habilidosas conseguem materializar. Já você consegue realmente acessar outro plano se realmente quiser.

Colin ficou pensativo e engoliu o seco. Ele estava tentando digerir o que estava ouvindo.

— Imagine o seguinte — disse Graff gesticulando com as mãos — Existe toda imensidão do universo, estrelas e toda essa merda. Ninguém sabe ao certo, mas é como se fosse uma imensa árvore com galhos que se estendem por todo infinito. Nesses galhos existem os frutos, que são os mundos espalhados por aí. Você provavelmente deve ter vindo de um desses frutos.

— Mas porque vim parar aqui neste mundo se existem tantos outros? — perguntou Colin.

— Porque foi aqui onde a magia começou, aqui é o ponto de partida, e para pessoas como você, também é o ponto de chegada. Esse mundo, dimensão ou plano, é a “raiz” da enorme árvore que conecta ao universo. Quando os elfos negros derrubaram o véu, eles desencadearam o grande cataclisma, diversas raças começaram a chegar a este mundo por certas “passagens”, porém isso difere de ser um errante. Não houve tantos relatos de seres novos que chegaram depois da queda do véu, por isso todos os que chegaram depois são chamados de errantes. A magia em vocês é mais latente. É como se uma peça de roupa seca fosse mergulhada em um balde d’água. Vocês conseguem absorver magia mais rápido, o corpo de vocês é como se fosse uma esponja.

“Então é por isso.”

— Pelo que o senhor está dizendo, tudo se resume a queda do véu, correto?

Graff fez que sim com a cabeça.

— Quando o véu caiu, teve uma transição em massa de várias pessoas, várias raças como elfos, gnomos, duendes, Orcs, fadas, sereias, dragões e um monte de outras raças que vagam por aí. Isso desencadeou uma guerra que teve alguns protagonistas, os vampiros foram um deles.

Pouco a pouco, Colin entendia tudo. Ele continuava concentrado na explicação didática de Graff, mas algumas coisas eram difíceis de digerir num primeiro momento.

Graff continuou.

— Nós não viemos de outro mundo, esse plano sempre foi o nosso lar, mas quando o véu caiu, várias civilizações começaram a nascer. Demorou décadas para que elas se consolidassem, mas se consolidaram. Os humanos que chegaram de outros planos começaram a sobrepujar raças menores, e essas raças não gostaram nada disso. Foi então que a primeira grande guerra teve início. Então, nós vampiros, decidimos recuperar o nosso mundo e por alguns anos nós conseguimos. Mas não prevíamos que outras duas grandes forças surgiriam, uma eram os caídos e a outra era os errantes.

Todos os vampiros estavam quietos prestando atenção na história de Graff. Mesmo que já tivessem ouvido dezenas de vezes, a história não perdia o encanto.

— Os errantes surgiram décadas depois da queda do véu. Se pareciam com nativos do continente, corpo atlético repleto de tatuagens brancas. Homens e mulheres com corpos esculturais, eram belas criaturas, sem dúvidas.

Graff entrelaçou os dedos atrás da cabeça e continuou.

— O fato curioso era que eles eram todos humanos, mas suas etnias eram mistas, por isso os grandes nobres da época os consideravam impuros, mandando matar todo e qualquer errante que encontrassem. Os nobres só não imaginavam que eles seriam oponentes tão formidáveis. O único, porém, era que eles não eram um grupo muito grande. Isso também se aplicava perfeitamente aos caídos que eram um grupo pequeno apoiado por muitas pessoas abastardas, apoiados pelos enormes principados e ducados que décadas mais tarde viriam a se tornar impérios. Tendo pessoal e recurso, os caídos caçaram os errantes incessantemente, não por os acharem uma raça inferior, mas por saberem que se eles continuassem procriando, poderiam derrotar os nobres facilmente.

 Graff abaixou a cabeça e começou a encarar o chão.

— Os errantes foram massacrados sem piedade alguma. Nem as crianças foram poupadas e isso quase os extinguiu — Ele ergueu a cabeça — Ninguém sabe o porquê dos caídos serem tão poderosos, nem como eles surgiram e se aliaram aos nobres, mas é inegável que todos eles são uma grande ameaça. Depois que os errantes foram tirados de cena, sobrou somente os vampiros e os caídos. Travamos a maior batalha da história desse mundo!

O líder dos vampiros apontou com o queixo para o 3.º terceira geração.

— Morgana e os vampiros na sua frente eram apenas crianças na época, mas eles sentiram a derrota como adultos. Nosso líder foi banido para um lugarzinho remoto em algum lugar desse enorme universo, mas o líder deles também se feriu gravemente e se retirou para a ilha das fadas para se recuperar. Soube que mesmo depois de quase dois milênios, o miserável ainda não se recuperou por completo. Com os errantes, vampiros e caídos fora da jogada, os humanos continuaram com suas guerras frívolas, guerras centenárias que perduram até hoje, com algumas famílias nobres de casas tão velhas quanto eu lucrando com a miséria e a morte dos mais fracos.

Graff ficou em silêncio por um instante, e logo depois encarou Colin, bem no branco de seus olhos.

— Não se engane garoto, a guerra é lucrativa para os nobres, e isso nunca irá ter fim. Em outras palavras, a guerra é um lugar onde pessoas que não se conhecem e não se odeiam se matam entre si, por decisão de velhos que se conhecem e se odeiam, mas não se matam.

— Então acho que a guerra é igual em todo lugar, até mesmo no meu mundo…

Graff fez que sim com a cabeça.

— Você é um errante com a chave, por isso pensei que você podia trazer Alucard de volta, mas vendo agora, parece que sua chave está mesmo incompleta.

Colin entendeu um pouco do contexto histórico daquele mundo. Uma coisa interessante que descobriu, foi que provavelmente existiam outros errantes vivos por aí, errantes que provavelmente conseguiam esse poder de transitar pelos mundos da forma que quisessem.

Foi aí que a ficha de Colin caiu.

— Espera! — disse Colin — Então quer dizer que consigo voltar para casa?

Graff deu de ombros.

— Se conseguir completar sua chave, então talvez você consiga — Graff saltou da cama e virou-se de costas — O garoto sem dúvida é um errante de classe especial, deve ter aflorado o poder adormecido ao fazer contrato com outro errante de nível inferior, mas a chave dele está incompleta. Sua intenção foi boa Morgana, mas receio que ele não consiga trazer Alucard de volta, não agora.

“Contrato com outro errante? Quer dizer que o velho do vilarejo…”

Morgana abaixou a cabeça e seu semblante se entristeceu.

— Não consegue mesmo fazer isso, Colin? — ela perguntou.

Colin fez que não.

— Descobri o que um errante consegue fazer só agora. Desculpa Morgana, mas acho que não consigo te ajudar a trazer o seu amigo de volta.

Morgana encarou Colin com os olhos cheios d’água, como se fosse uma criança prestes a chorar por tomarem seu brinquedo.

— Pelos doze. — disse Graff — Se controle, garota, não é o fim do mundo.

— Eu sei, mas…

— Não tinha uma surpresa pro garoto? — disse Graff — Por que não mostra a ele?

Como se seu humor mudasse da água pro vinho, Morgana abriu um sorriso e correu até a porta.

— Não sai daí, Colin, já volto!

Morgana saiu correndo.

— Ela não muda nunca. — Murmurou Graff — De qualquer modo, sinta-se à vontade. Morgana gostou de você, então não faça nada de idiota para deixá-la irritada. O resto de vocês, vamos embora. Temos trabalho a fazer.

Orlok se aproximou de Colin e sacudiu suas mãos mais uma vez.

— Foi um prazer, senhor Colin!

— Digo o mesmo…

Carmilla deu um tchau de costas, Lestat acenou com a cabeça e Orlok continuou sorrindo até sair do quarto, deixando Colin sozinho naquele recinto. Caminhando pelo corredor mal iluminado com as mãos nos bolsos, Graff continuava com uma expressão bem séria.

— Qual o plano agora, velhote? — perguntou Lestat.

Graff tirou uma das mãos do bolso e coçou a nuca.

— Lestat, você e Carmilla entrem em contato com aquela mulher. Diga que estamos abertos a um acordo.

— Tem certeza? — perguntou Carmilla — Quer mesmo se meter com os caídos?

— Que escolha nós temos? — Graff perguntou — Eles têm um errante de classe especial também, mas ela tem a chave completa. Tentamos buscar outras alternativas, mas não obtivemos sucesso, e sinceramente, estou cansado de esperar.

— Não acha estranho? — perguntou Lestat — Uma errante andando com os caídos depois de tudo?

— Acho, mas acho que perceberam que é melhor ter um deles a seu serviço do que ficar contra eles.

— Por isso pretende manter o errante Colin por perto? — perguntou Carmilla.

Graff fez que sim com a cabeça e abriu um sorriso.

— É melhor manter um errante como nosso aliado do que como inimigo. Errantes podem ser úteis de diversas formas, basta saber explorar bem quais essas formas.

— O eclipse começa amanhã à noite — disse Orlok com as mãos atrás da cabeça — Iremos agir?

Graff fez que não com a cabeça.

— Não tenho interesse nisso. Nostradamus já tem um exército, ele não precisa de nós.

— Eu soube que eles ainda não acabaram com toda rebelião humana. — disse Orlok — O ataque de Nostradamus pode acabar falhando caso a gente fique de braços cruzados.

— Então que falhe. Temos coisas mais urgentes para resolver.

— Não vamos contar para Morgana? — perguntou Carmilla.

— Morgana está entretida com aquele garoto. Ela achou um novo “animal de estimação”. Não é todo dia que encontramos um errante de classe especial, e ele ainda pertence a mesma tríade que ela.

Lestat entrelaçou os dedos atrás da cabeça e bocejou.

— Tem certeza que dá para deixar Morgana sozinha com o errante? Você sabe que ela costuma “quebrar” os brinquedos dela.

Graff deu de ombros.

— Morgana não é tola, ela sabe que é melhor manter o errante por perto do que afastá-lo. Não acho que tenha melhor pessoa para ficar de olha no errante do que ela. Deixe que ela se divirta com o garoto. Enfim, chega de papo furado e vamos indo.



Sozinho no quarto, Colin continuou calmo, ainda tentando digerir o que acabou de acontecer. Ele conheceu a elite vampírica e de uma forma estranha se sentiu muito bem recebido. Até mesmo os achou boas pessoas, se é que ele poderia os chamar assim.

A porta se abriu e Morgana apareceu sorridente.

— Olha o que eu trouxe!

Brey e Melyssa entraram lentamente, e assim que botaram os olhos em Colin, nenhuma das duas conseguiu segurar o choro. Colin esperava qualquer coisa, menos isso. Deixando as lágrimas escorrem por seus olhos, elas correram até Colin com os braços erguidos.

O sentimento que Colin sentiu foi algo extremamente novo. Ele se sentia responsável pelas crianças, e vê-las vivas tirou um peso enorme de seus ombros. Ele ficou sem palavras e ficou até um pouco emocionado, mas não chorou, apenas sentiu uma súbita felicidade.

Colin fechou os olhos e as abraçou, sentindo aqueles bracinhos frágeis passarem por seu pescoço. Elas não conseguiam ferir Colin, mas ele com toda certeza sentiu o peso enorme daquele abraço. Por alguns segundos não se ouviu nada além do choro e fungadas de nariz que vinha das pequenas.

— Eu sabia que o senhor viria! — disse Melyssa em meio as lágrimas que escorriam do seu olho direito e ao catarro que escorria por seu nariz.
Colin apoiou gentilmente as mãos no rosto dela, e logo depois tocou na atadura que ficava por cima de sua mão decepada.

— Sua mão…

— Tá tudo bem! — Melyssa esfregou o olho direito e abriu um sorriso — Senhorita Morgana disse que se eu aprender magia, posso ter minha mão de volta.

Colin olhou para Morgana encostada na parede com os braços cruzados e ela fez que sim com a cabeça enquanto sorria gentilmente.

— Papai, foi tudo culpa daquele moço. — disse Brey esfregando os olhos cheios d’água com as costas das mãos — Foi ele que machucou Melyssa… não consegui ajudar ela, desculpa, papai…

Colin afagou os cabelos de Brey e abriu um sorriso.

— Tá tudo bem, o papai já deu um jeito nele.

Foi, nesse momento, que Colin havia se dado conta que ele mesmo havia se intitulado de pai. Ele queria pensar mais sobre isso, porém, deixou para lá. Não havia porque tentar ser lógico em um momento como esse. Ele teria bastante tempo para digerir tudo que aconteceu em breve.

Picture of Olá, eu sou Stuart Graciano!

Olá, eu sou Stuart Graciano!

Comentem e avaliem o capítulo! Se quiser me apoiar de alguma forma, entre em nosso Discord para conversarmos!

Clique aqui para entrar em nosso Discord ➥