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A festa continuava fervorosa, com alunos e membros de guilda interagindo assiduamente durante o evento. Colin se afastou de Brighid para que ela conversasse tranquilamente com outros alunos sem que se sentissem intimidados por ele. E para sua sorte, estava indo melhor que o esperado. Eilella, a princesa Elfa estava de risadinha com Brighid em um canto cercadas por outras garotas de raças diferentes. Já Colin, estava sozinho desta vez.

Sentado em um canto apenas observando as pessoas conversarem amigavelmente enquanto os mesmos olhares de repulsa de nobres pairavam sobre seus ombros.

— Irmão?!

Colin ergueu a cabeça vendo Kodogog vestindo uma roupa de gala bastante apertada. Ao seu lado estava outro Orc tão grande quanto ele. Aquele Orc estava com uma argola no septo, tinha cabelo longo, e seus caninos inferiores eram enormes.

— Kodogog…

Abrindo um sorriso, Kodogog o abraçou, ainda mais apertado que da última vez.

— Kodogog soube da sua guilda, meus parabéns, irmão! Esse é Urag, o senhor prateado!

Urag ofereceu a mão enorme para um aperto que cobriu todo o ante braço de Colin.

— Grande Colin! Kodogog falou muito bem de você, é um prazer conhecê-lo! — disse Urag em um tom grave estridente.

Um garçom passava ao lado deles levando uma grande jarra de vinho e Urag simplesmente pegou a jarra e passou a mão enorme sobre o ombro de Colin o arrastando para uma mesa afastada.

Caminharam até uma mesa com Orcs, homens e mulheres disputando quedas de braço em uma grossa mesa de madeira. Ele achou que só poderia dois convidados por guilda, mas esse não era o caso dos orcs.

Por toda extensão daquela mesa, havia mais vinho e cerveja do que Colin viu em toda sua vida. Eles não só bebiam em jarras, mas também em barris e tonéis. O corpo das mulheres orcs era tão musculoso quanto o corpo de Morgana, mas essa não era a regra. Havia outras mulheres Orcs tão magras e femininas quanto qualquer mulher comum. Seus caninos inferiores eram bem menores em comparação aos caninos dos homens orc, e a cor de suas peles variava entre verde maduro e um vermelho claro.

O mais surpreendente era as ver de vestido. Aí estava uma cena que Colin nunca imaginou presenciar.

— Ei, Nurbag, olha só com quem Kodogog fez amizade!

Urag sentou Colin de frente para Nurbag que era enorme, tanto em altura quanto em músculos. Ele pegou outra jarra de vinho, a virou e depois a bateu na mesa com tudo, dando um alto arroto em seguida.

— Esse rapaz é bem robusto para um elfo negro — Ele apoiou o cotovelo na mesa e abriu a mão — Vamos ver se você é forte mesmo ou tudo isso é de enfeite!

— Mostra para ele, irmão Colin! — urrou Kodogog erguendo uma garrafa de vinho.

Colin olhou para os dois lados completamente perdido com aqueles orcs que tinham uma energia bastante vibrante e calorosa. Eles de fato estavam aproveitando a festa.

Os orcs começaram a bater as mãos e os pés esperando que Colin correspondesse ao desafio de Nurbag. Então, Colin abriu um sorriso, deixando seu lado bárbaro vir à tona.

— Uma queda de braço? — Ele perguntou.

Nurbag abriu um sorriso.

— Tá com medo, fadinha da floresta?

Colin retribuiu o sorriso. Esticou o braço e pegou a jarra com vinho. Ele a bebeu lentamente enquanto os Orcs observavam o vinho da jarra de vidro diminuir lentamente. Assim que ele acabou de beber tudo, bateu a jarra na mesa e ofereceu o braço para Nurbag.

— Vamos lá!

Eles deram as mãos e começaram a queda de braço. Os orcs estavam em festa, afinal, para os orcs, até uma brincadeira simples se tornava extremamente competitiva.

A mão de Nurbag pegava todo ante braço de Colin, mas aquele não era um empecilho. O duelo estava bem equilibrado no começo, mas logo Nurbag começou a ganhar vantagem. Ao lado deles, os orcs começaram a apostar dezenas de moedas enquanto sacudiam seus canecos de bebidas e batiam os pés cadenciadamente, como se fosse um tipo de ritual.

Colin estava sentindo que Nurbag era realmente muito forte. Ele pretendia usar uma técnica que viu em um filme, mas não ia funcionar, já que a mão de Nurbag estava tapando todo seu ante braço. Então ele ajeitou seu corpo, deixando o ombro posicionado bem na direção que ele pretendia empurrar seu braço.

Ele enrijeceu seu ombro como cimento, e Nurbag pareceu perder vantagem por algum tempo. Mesmo fazendo bastante força, Nurbag não saía mais do lugar, então os orcs começaram a aumentar o ritmo da batida de pés.

Depois de alguns segundos pressionando Colin com toda sua força, Nurbag já começava a sentir a fadiga e Colin percebeu isso na pegada dele. Com a força conservada, Colin começou a virar o jogo de maneira lenta e o ritmo da batida de pés dos orcs aumentou, ficando cada vez mais alto a cada segundo que Colin estava próximo de finalizar Nurbag.

Nurbag não queria ceder de jeito nenhum, e Colin começou a soar sentindo que seu oponente estava bem próximo de virar o jogo novamente.

Cerrando os dentes e urrando, Colin colocou toda sua força no braço direito e Nurbag começou a sentir estar próximo de ser derrotado, mas ele não recuou, continuou segurando Colin o máximo que conseguiu, até que perdeu forças.

[Baque!]

Nurbag estava derrotado.

Os orcs urraram bem alto e Nurbag ergueu a mão de Colin para sinalizar que ele era o vencedor. Toda aquela festa entre eles atraiu olhares, principalmente os de repulsa.

— Aquele é o seu namorado? — perguntou Eilella olhando por cima dos ombros de Brighid.

Brighid coçou a nuca sem jeito.

— Bem… hehe sim…

— Ele é bem energético.

— Um pouco hehe.

Eilella bebeu o vinho de sua taça.

— Você parece ser uma boa moça, é uma monarca de duas árvores e está junto do cara dos boatos. Por que quer se aliar a mim?

— Sua guilda é a segunda melhor ranqueada da universidade, correto? — Brighid olhou para os dois lados — E bem, não tem muitas pessoas amigáveis com quem eu possa contar no momento.

Eilella bebeu do vinho mais uma vez e fez que sim com a cabeça.

— Sabe que as alianças daqui, vão além de uma aliança universitária comum, não sabe?

— Está falando sobre a guerra que acontece fora dos portões?

Eilella fez que sim e colocou sua taça vazia em cima da bandeja de um garçom que passava no momento.

— Sou uma princesa de um reino que já foi bastante respeitado, mas nós nos reduzimos drasticamente a quase nada. Soube o que aconteceu com meu povo, não soube?

— Sim…

— Nosso orgulho está na lama. O tio de Loafe usa as Elfas como vacas reprodutoras e os elfos são escravos. Ninguém quer se aliar a nós porque não veem benefício em ajudar uma nação que acabará desaparecendo. Para eles é só questão de tempo, e é isso mesmo que acabará acontecendo daqui a alguns anos ou quem sabe meses.

Outro garçom passou por ela e Eilella pegou outra taça de vinho.

— Só minha mãe administra nosso reino minúsculo no momento, e forçar as pessoas a lutar é o mesmo que dizer que elas vão acabar como vacas reprodutoras ou como escravos. — Ela bebeu o vinho — Odeio esse lugar, odeio esse império, odeio Loafe e todos os nobres. É humilhante ficar aqui parada assistindo meu povo ser humilhado de todas as formas possíveis, e pior ainda, sou obrigada a estar sob o mesmo teto do sobrinho daquele homem.

— Sinto muito…

Eilella abanou uma das mãos e deu outra bicada no vinho.

— Não sinta, isso não é um problema seu. É meio irônico, não é?

— O quê?

— Todos os príncipes e princesas aqui terão suas terras engolidas pelo grandioso império de Ultan e seus cães. Prefiro a morte do que me aliar com qualquer nobre desse buraco.

Brighid entendia o sentimento das pessoas. Sua condição empática de fada ainda continuava e ela foi açoitada pelo ódio de Eilella.

— Acho que Colin e eu poderíamos ajudar você.

— Como? Vai lutar contra o grande império de Ultan? Nem mesmo seu namoradinho deve ser tão louco assim.

— Então você não o conhece.

Eilella abriu um sorriso.

— Ouvi os boatos, mas não acredito neles tanto assim.

— Pois confirmo, são todos verdadeiros.

Eilella bebeu do vinho mais uma vez.

— Se a gente se aliar a vocês, o que eu ganho com isso?

— Você terá a guilda mais forte da universidade como aliada. Já não é alguma coisa?

Eilella abriu um sorriso.

— Guilda mais forte? Quanta presunção…

— Não estou sendo presunçosa, estou falando a verdade. Vi que você estava reparando em nós quando aqueles caras do lótus conversavam conosco. Acha que Colin fez amizade com todos eles por seu carisma? Você é uma princesa, sabe melhor do que ninguém que gente forte atrai gente forte.

— É… você tem um ponto. Mas pergunto uma coisa a você, faria o império mais poderoso do continente ser seu inimigo por uma dezena de pessoas e um pedaço minúsculo de terra?

— Não sou eu quem toma esse tipo de decisão, é o líder, mas conhecendo Colin, ele faria um julgamento moral da situação, e eu tenho certeza que ele chegaria a mesma conclusão que eu. Então a resposta é sim, ele faria.

Eilella abriu um sorriso e fez que sim com a cabeça.

— Conseguiu fisgar um homem interessante. — Ela deu de ombros e ofereceu a mão para um aperto — Tudo bem, aceito me aliar a vocês! Seus inimigos serão os meus inimigos, seus amigos serão os meus amigos e toda minha dor e alegria será partilhada junto a vocês.

Elas sacudiram as mãos em um aperto.

— Digo o mesmo.

— Aproveite a festa, monarca. Comerei esses petiscos horríveis até a hora de ir embora. Depois a gente acerta tudo formalmente, pode ser?

— Por mim tudo bem.

Eilella deu um tchau de costas acompanhada de outras Elfas e foi em direção a uma mesa farta de petiscos marinhos. Colin se aproximou de Brighid enquanto coçava a nuca. O cabelo dele estava bagunçado e a sua roupa estava amarrotada.

— Caramba, aqueles amigos do Kodogog são intensos.

Brighid começou a ajeitar o cabelo de Colin e as roupas dele.

— Você parece ter se divertido.

— Deve ter sido a bebida. Mas e então, conseguiu algo com a princesa Elfa?

Eles caminharam até uma mesa vazia e se sentaram do lado do outro.

— Acho que meti a gente no meio de uma guerra…

— Então acho que estamos quites, acabei de fazer o mesmo com os orcs…

— Como assim? — ela perguntou.

— Conta você primeiro…

— Tá… Lembra que Eilella tem uma rixa enorme com a família do Loafe?

— Lembro.

— Então, a gente meio que tá do lado dela nessa briga, e eu acho que ela cogita enfrentar o império algum dia desses… e para piorar, você tem muitos amigos no império, né? Tem aquela mulher Lina, os membros do lótus e até os gêmeos… acha que fiz besteira?

Colin fez que não com a cabeça. Vendo o império de Ultan por fora, Colin não o considerava uma força imbatível. Sua viagem o fez ver as fraquezas de Ultan e ele considerava apenas questão de tempo até Ultan ruir.

— Você entendeu errado, Lumur, Melin, eles não são meus amigos. Somente a Lina devo alguma coisa, mas isso pode ser resolvido. Já os gêmeos não nutrem um amor pelo império tanto quanto seu pai. Ainda tenho que conversar com Loaus sobre a posição concreta dele.

Brighid se sentiu mais aliviada ao ouvir aquilo. Tratar sobre política não era o seu forte, mas ela estava fazendo o que achou ser correto.

— E você — disse ela — Em que tipo de guerra meteu a gente dessa vez?

Colin coçou a nuca.

— Em uma bem grande…

— Diz logo! — Ela estava ficando ansiosa.

— É o seguinte… a guilda de kodogog habita em uma aldeia que faz fronteira com o império Glacial do Norte. Os orcs disseram que gostariam da minha ajuda para lutar contra os nortenhos, que segundo eles, são guerreiros extremamente habilidosos. Muitos orcs morreram em várias investidas dos nortenhos, e isso coloca o reino dos orcs em constante perigo, não só de morte, mas de saques frequentes de bandidos do norte. O inverno está chegando e eles acreditam que será um inverno longo, então os ataques vão se intensificar.

— Já sei, você ouviu a palavra “guerreiros extremamente habilidosos” e já aceitou o acordo, acertei?

Colin coçou a nuca e fez que sim.

— É isso aí…

— Francamente, Colin…

— Então vocês acabaram juntos… — disse o diretor Hodrixey se aproximando com um sorriso amigável.

Colin e Brighid se ergueram rapidamente.

— Diretor… não achei que você fosse vir já que está sempre fora.

— Tive que vir há há. Você parece ter crescido bastante. Sua mana também aumentou exponencialmente.

— Eu estive treinando…

— Ouvi sobre seus feitos, meus parabéns! Me diga, como é a lendária terceira geração de vampiros? Esteve com eles, não esteve?

Colin assentiu.

— Estive… Bem, como posso dizer… eles são bem fortes, principalmente o líder deles. Acho que ele é o ser mais poderoso que já vi em combate.

Hodrixey fez que sim duas vezes. Ele estava bem interessado naquela conversa.

— O quão poderoso ele é?

— Muito… eu o vi sobreviver ao canhão galick disparado por um monarca. Observei o corpo dele ser perfurado várias vezes e vi ele sobreviver mesmo sem cabeça.

Aquilo pegou tanto Hodrixey quanto Brighid de surpresa. Eles não souberam daqueles detalhes.

— Isso é possível? — Hodrixey perguntou olhando para Brighid.

— Bem, eu nunca ouvi falar de um vampiro que sobrevivesse sem cabeça.

— Se a senhorita não ouviu, então deve ser mesmo uma novidade. Devia ter aceitado minha proposta para lecionar, seria ótimo ter alguém com seu conhecimento na universidade ensinando outros alunos.

— Me desculpe senhor, mas não sou tão boa professora assim. Minha didática é horrível e meus métodos para ensinar são bem arcaicos…

Hodrixey fez que sim.

— Entendo, mas enfim, fico feliz que estejam juntos. Vocês formam um belo casal.

Ambos riram sem jeito.

— Diretor! — chamou Colin — Por que reuniu tantas guildas aqui hoje? Tem até alguns membros de guildas do império… não faria isso sem um bom motivo, certo?

— Correto! Você é um jovem esperto. Já ouviu falar dos caídos, certo?

Colin engoliu o seco e fez que sim. Ele e Brighid tinham a ciência que se expusessem o segredo de Safira, provavelmente Hodrixey poderia fazer algo contra ela. Não só ele, mas até mesmo os outros membros do lótus poderiam tentar algo. Antes de serem cercados por vários amigos, os três tiveram que se virar. Tanto Colin quanto Brighid se viam responsáveis por Safira de uma maneira tão intensa que chegava a ser paternal.

— Já ouvimos…

— Pois bem, tem muitas nações preocupadas com disputas de poder e intrigas internas, mas nosso problema é outro, um problema bem maior.

— Os caídos? — Perguntou Colin.

— Isso mesmo. Estive viajando colhendo informações cruciais, e acredito que eles tentarão algo em breve. Essa confraternização é para juntarmos forças, apesar de que quase ninguém deste salão se dá bem de fato. Mas quando a hora chegar, precisaremos trabalhar juntos, e alianças são importantes não só para uma guerra, mas para a vida na totalidade. — Ele deu um tapinha nos ombros de Colin — Preciso conversar com os outros garotos, é bom ter vocês do nosso lado. E mais uma coisa, Colin, preciso me preocupar com a terceira geração?

— Acho que não, senhor…

— Que bom, vejo vocês depois. Se divirtam!

Colin e Brighid cruzaram olhares, mas não disseram nada. Eles deixariam para tratar qualquer assunto relacionado aos caídos em casa.

— Olha só quem está aqui, meus sacos de pancada favoritos!

Colin se virou, vendo Anton se aproximar junto a pandoriana coelho.

— Anton…

— Eu sabia que você viria e traria o meu saco de pancadas junto hehe brincadeirinha!

— Com licença, Colin — disse Brighid em um tom sério — Preciso ir ao banheiro.

— Acho que ela me odeia há há.

— Quem não te odeia? — zombou a pandoriana coelho.

— Acho que você precisa ir ao banheiro também, por que não deixa os rapazes conversando, hein?!

Ela deu de ombros e se afastou a passos lentos.

— Eu soube que você anda de papinho com algumas pessoas importantes. Tá crescendo na vida, hein, menino Colin!

Era um pouco difícil de engolir que Colin havia perdido para ele. Anton tinha uma postura bem soberba em relação as outras pessoas. Mesmo Colin tendo tantos feitos em sua curta passagem naquele mundo, ele ainda continuava com o estigma de que foi um cara que acabou perdendo para Anton, mesmo depois de tudo, e isso o irritava.

— Estava precisando mesmo conversar com você. — disse Colin.

— Decidiu repensar minha proposta de amizade?

— Melhor que isso, eu quero uma aliança, mas tenho algumas exigências.

Uuuu — zombou Anton — Que tipo de exigências o grande Colin tem?

— Se você se aliar a mim, estará se aliando junto dos orcs e da princesa Eilella. Estamos de acordo?

Anton tamborilou o indicador no queixo enquanto pensava na proposta e franziu as sobrancelhas.

— Por que eu me aliaria a um bando de orcs selvagens e a uma princesa que logo não terá nada para governar?

— É uma resposta simples, é porque eles são meus aliados.

Háháhá e isso é motivo? Se eu me recordo bem, você, sua namoradinha e a pirralha chifruda foram surrados por mim. Acha que não sei da briga dos orcs no Norte e do ódio da princesa em relação ao império? Você se aliou com perdedores, e eu não me alio com perdedores, sinto muito.

— Você ainda se gaba por algo que aconteceu há muito tempo. Não sou o mesmo do torneio.

Anton fez que sim com a cabeça.

— Olha, Colin, eu sou herdeiro de terras vastas, centenas de escravos e de uma rota de comércio que me rende milhares de moedas todo santo dia, e tudo isso graças ao império. Quer que eu troque tudo isso por alianças fracas? Pensa que sou idiota? Quer que eu cometa esse suicídio financeiro somente porque essa é sua vontade? A vontade de alguém que não consegue sequer me vencer?

Colin deu de ombros.

— O império vai acabar ruindo em breve, e você e seu comércio vão junto. Achei que fosse um investidor, não um apostador que escolhe apostar em pangarés velhos do que em garanhões novos.

Anton franziu o cenho.

— O que quer dizer com isso?

— A quanto tempo não sai dos muros da capital? Tirando esse lugar, o império inteiro de Ultan é decadente. Pessoas morrem de fome aos montes, sem falar que Ultan usa a tática idiota de lutar em várias frentes de uma única vez, reduzindo em muito seu exército e gastando muito recurso. A cada semana o imperador aumenta mais os impostos de um império que mal tem o que comer para simplesmente sustentar o luxo da capital. É só questão de tempo até tudo ruir.

Anton fez muxoxo e cerrou os dentes.

— O imperador tem planos. Não soube que ele pretender casar a filha com o rei de Rontes?

— Soube… — Colin abriu um sorriso de canto — Parece que você esqueceu em qual guilda a “futura pretendente do rei de Rontes” está agora. Sem falar no possível futuro imperador de Ultan.

Anton não queria admitir, mas Colin havia o colocado na parede com aquelas duas questões. Colin tinha o poder de moldar o senso crítico dos gêmeos, assim como ele tinha o poder de os manipular como quisesse. Liena poderia, sim, ser herdeira do grande exército de Rontes, mas, ao mesmo tempo, poderia ser leal a Colin. Bastava uma ordem dela e o exército sucateado de Ultan seria varrido para debaixo do tapete, e Anton perderia suas terras, seus negócios e sua fortuna.

Se Colin pensava tantos passos à frente, qual era o seu objetivo afinal?

— O que você quer fazer? Outro império em que você dite as regras? Quer se tornar um déspota como o imperador?

Colin sorriu e fez que não com a cabeça.

— Não penso tão grande assim. Só estou querendo aliados confiáveis. Particularmente, eu o vejo com bons olhos, apesar de ser um merdinha arrogante. Vai aceitar minha proposta ou não?

Anton ficou pensativo, ele estava coagido a aceitar, mas havia um grande, porém, ele ainda achava Colin e sua guilda mais fracos do que ele.

— Aceitarei sob uma condição. Você terá que me vencer no torneio de guildas daqui a alguns meses. Se me derrotar, então serei seu aliado pelo resto da vida.

— Fechado.

— Te vejo no torneio, elfo de merda.

Anton se afastou e Brighid retornou.

— Conseguiu alguma coisa com ele? — Ela indagou.

— Ele só aceita se aliar a mim se eu o derrotar.

— Posso fazer uma pergunta? — Colin fez que sim com a cabeça — Por que ele?

— Melhor conversarmos sobre isso em casa.

— Tá…

— Por hora vamos aproveitar o resto da festa.

Brighid apontou com o queixo para Loafe, que não havia tirado os olhos de Colin desde o começo das festividades.

— Você parece ter o deixado zangado. Ele não tirou os olhos de você um minuto sequer.

— Deixe-o para lá, vamos só aproveitar o resto da festa e ir para casa.

E foi isso que ambos fizeram. Passaram o resto da festa juntos, indo de mesa em mesa comendo tudo que tinham direito. Aproveitaram ser tudo de graça e praticamente causaram desfalque em algumas mesas. Colin já havia bebido bastante vinho. Aproveitou que não tinha ninguém olhando e enfiou alguns doces no bolso para comer em casa. Um costume que tinha na terra quando ia nas raras festas infantis da sua infância.

— O que é isso? — perguntou Brighid de boca cheia — Está roubando doces?

— Roubando? Claro que não, estou guardando para comer em casa.

Brighid olhou para os dois lados.

— Isso não é errado?

— Claro que não. Seus bolsos estão vazios?

— Meu vestido não tem bolsos.

Tsc… tá, deixa que guardo aqui.

Ele encheu as mãos de doces e colocou tudo na jaqueta. Brighid estava com medo de ser pega ao fazer algo assim. Já Colin estava totalmente despreocupado.

— Me ajuda aqui, Brighid, pega daquele ali também!

Ela olhou para os dois lados mais uma vez.

— Pelos Deuses, Colin, estou me sentindo envergonhada de fazer isso na frente de tanta gente…

— Ninguém tá olhando, vai me ajudar ou não?

— Você tá bêbado?

— Eu bêbado? Claro que não! Me ajuda logo!

— Tá, eu faço…

Ela pegou um punhado de doces e colocou na jaqueta de Colin enquanto olhava frequentemente para os dois lados. Lentamente a festa toda esvaziou e o casal aproveitou indo embora, mas não antes de Colin pegar de um garçom uma cara garrafa de vinho de uma rara safra e sair por aí bebendo dela, no bico.

Assim que chegaram no apartamento de Colin, esparramaram os doces em um longo lenço que estava em cima da cama e começaram a comer.

— Agora me explica, por que se aliar a Anton?

Colin terminou de engolir e bebeu do vinho mais uma vez.

— Estou me precavendo. Ultan pode acabar caindo sem que a gente faça absolutamente nada. E tem os caídos que até mesmo o diretor estava atento. Ultan tem problemas internos demais, uma força militar bastante sucateada. E se Ultan caísse amanhã? O que você faria?

Brighid apoiou o dedo indicador nos lábios.

— Você perguntou se tratando de geopolítica?

Colin fez que sim.

— Pense, Brighid. Suponhamos que as alianças que realizamos hoje serão uma força vital. Considere as habilidades comerciais de Anton. O império caiu, qual o nosso próximo passo?

— Acho que primeiro temos que nos estabelecer em algum lugar. Como o império caiu, creio que o reino de Eilella estará longe de ameaças… não, ela terá ainda mais ameaças do que antes, pois vão surgir outras facções independentes tentando preencher o vazio que Ultan deixou, certo?

Colin fez que sim e Brighid continuou.

— Em comparação aos orcs, Eilella é quem mais precisa da nossa ajuda, então nos restabeleceríamos lá, correto?

— Isso! A cidade dos elfos da floresta fica em um ótimo ponto estratégico. Com a força, a gente poderia conter as forças inimigas sem muito problema, e com as habilidades de Anton faríamos rotas de comércio com cidades que estarão seguras de se ter uma guerra civil. — Colin pegou a mão dela e a encarou nos olhos — Vou ser sincero com você, não podemos confiar em ninguém se tratando de Safira. Se contarmos ao diretor, ele pode acabar acionando o grupo de lótus e isso chegará nos ouvidos do imperador. Sem falar que os próprios caídos podem acabar vindo atrás dela, e Safira é nossa amiga, praticamente uma filha.

— Não acha que deveríamos contar aos outros membros da guilda? — Ela perguntou.

— Ainda não. Mesmo que eu confie neles, a informação de que Safira é um caído pode acabar causando efeitos imprevisíveis, e eu não quero isso. Eles podem acabar se virando contra nós.

Brighid assumiu um semblante cabisbaixo e assentiu.

— Colin… se eles se virassem contra a gente, você os mataria para proteger Safira?

— Eu não pensaria duas vezes caso precisasse proteger vocês duas. Mas não é isso que eu quero. A principal razão disso tudo, dessa questão hipotética da queda do império, as alianças… é tudo para enfrentar os caídos.

Brighid ergueu as sobrancelhas.

— Está falando sério?

— Nunca falei tão sério. É questão de tempo até termos que os enfrentar. Por isso não posso deixar que Safira se junte a eles. Isso só os tornaria ainda mais poderosos e eu não sei que tipo de lavagem cerebral usariam nela. E é importante a gente se cercar de aliados importantes e confiáveis.

Ela fez que sim com a cabeça.

— Bem… eu estive pensando em uma coisa, Safira mudou bastante nesses últimos meses… Se por acaso fosse o destino ela se virar contra nós?
Colin ergueu a sobrancelha.

— O que quer dizer com isso?

— Lembra daquela vez que ela tocou o Lithium? A visão dela… Ela disse ter visto destruição, sangue e…

— E minha morte?

Brighid franziu os lábios e fez que sim. Aquilo fez Colin ficar bem sério.

— Então as visões do Lithium são mesmo reais?

Ela fez que sim com uma expressão chorosa.

— Não te contei antes, mas há alguns anos, quando toquei a árvore, eu vi tudo que estou vivendo agora. Vi você, vi Safira, vi nos dois juntos… Na época não me toquei serem vocês dois, mas agora sei…

Ela estava tensa. Suas mãos e lábios tremiam.

— Por que está tão tensa? — perguntou Colin.

— Não foi só Safira que o viu morto, eu também vi…

Aquilo, sim, pegou Colin de surpresa. Em partes porque sempre achou esse papo de destino uma bobagem completa, mas agora era um rio lamacento em que ele estava atolado até o pescoço. Engolindo o seco, Colin manteve seu olhar no nada.

Brighid entrelaçou suas mãos as mãos dele e encostou a cabeça em seu ombro.

— Eu tentei lutar contra isso… tentei não gostar de você como gosto agora, mas não deu… não sei se é por culpa do destino ou se é por o coração ser uma coisa que está além do nosso controle.

— Se vou acabar morto de um jeito ou de outro, darei um jeito de pelo menos consertar as coisas por aqui. Tenho que resolver ao menos a questão da guerra no continente e toda confusão com os caídos antes de isso acontecer. Pelo menos acho que consigo deixar as coisas boas para você, pro pessoal da guilda e para as crianças viverem em paz.

Brighid estava impressionada que mesmo depois de tudo, Colin continuava calmo e inexpressivo, e ainda tinha o mesmo senso de sacrifício de antes.

— Por que não pensa mais em si? Afinal, é da sua vida que estamos falando aqui…

— Tá tudo bem, eu já devia estar morto. Estou somente fazendo hora extra nesse lugar. Caso eu morra, seria somente o mundo seguindo seu curso natural.

Ele afastou mechas do cabelo de Brighid e beijou sua testa.

Mesmo se mantendo forte por fora e se esforçando para parecer uma pessoa de atitudes nobres, por dentro, Colin estava desesperado. Ele havia dito aquelas coisas da boca para fora tentando parecer forte.

De forma nenhuma ele queria morrer, ainda mais morrer de verdade desta vez. Estava acontecendo tanta coisa boa em sua vida que ele se esqueceu daquela sensação angustiante do medo de tudo dar errado. Aquilo diferia de uma luta em que arriscava sua vida. Durante a luta havia incertezas, e ganhava quem se sobressaísse melhor sobre o oponente.

Em uma batalha, a certeza da morte era uma opção, mas nunca algo concreto. Mesmo ao lado de Brighid e sentindo calor dela, ele se sentiu sozinho e com um medo colossal do futuro que o espreitava.

Um nó estava em sua garganta. Ele se questionou por um momento do porquê teria tanto trabalho em ficar mais forte se o fim acabaria sendo o mesmo destino.

Se desvencilhando de Brighid, ele se ergueu caminhando até a porta.

— Preciso pensar um pouco.

Colin bateu a porta e Brighid nada disse, apenas continuou cabisbaixa. Ela não havia contado a ele tudo que avistou ao tocar a árvore do Lithium. Em sua visão, ela viu Safira cravar sua espada flamejante no coração de Colin em meio a um cenário decadente pós-guerra.

Provavelmente os dois tiveram uma batalha feroz e Colin sangrou até a morte em frente aos pés de Safira, que estava bastante ferida. A expressão no rosto de Safira era de raiva e, ao mesmo tempo, de satisfação.

Seu peito doía só de pensar naquela visão que era bastante recorrente em seus pensamentos. Colin e Safira se davam tão bem, ela não conseguia pensar em algo que os deixaria a ponto de travarem uma batalha mortal.

Brighid tinha o mesmo pensamento de Colin quando se tratava dos três. Ela os amava de uma maneira inexplicável, e esses pensamentos a deixavam em cima do muro. Ela não queria ficar contra o homem que amava, muito menos contra a garota que ela considerava uma filha.

De qualquer modo, ela não teria as respostas que tanto queria até o fatídico dia. Era um peso grande demais carregar aqueles pensamentos, mas ela os suportaria sozinha se precisasse. Ela ainda não entendia como essa coisa de destino funcionava de fato, mas tinha certeza que se talvez ela expusesse tal fato entre os dois, as coisas poderiam acontecer mais rapidamente.

Ela entendia ao menos uma coisa, cada escolha que faziam, seja de menor ou maior impacto, se aproximava cada vez mais do destino imutável que Brighid temia alcançar.

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