João ficou paralisado com a pergunta, que o despertou. Ele encarou Sarah que já estava à sua frente novamente enquanto desviava o olhar. Por um segundo, o jovem havia pensado que tinha sido descoberto, mas pela reação da garota, não corria perigo.
Lentamente se levantou enquanto via Sarah recuando dando-lhe espaço, era notório que a de cabelo tingido estava constrangida. João suspirou de alívio e perguntou em seguida:
— Sair com você?
— E-eu sei que foi meio do nada, mas… Queria passar um tempo a sós contigo…
— É que já está tarde e…
— Ah, tudo bem, então, me desculpe! Pode ir para casa se quiser, eu arrumo as coi… – A jovem foi interrompida.
— Não, não é isso… Foi uma pergunta inesperada, sabe?
— S-sinto muito! — Sarah se virou demonstrando muita vergonha.
— Não precisa se preocupar, está tudo bem! — falou o rapaz pegando o seu sobretudo do balcão. Enquanto isso, notava uma certa tristeza vinda da jovem que pareceu ter se esforçado para dizer aquilo. Toda essa situação o deixou com um pouco de pena, mesmo que soubesse quem ela era.
— Pelo visto, isso é um não, né?
— …
— S-sabia! Sou uma idiota! Não sei por que fiz isso!
— Calma, Sarah. — João se aproximou e colocou suas mãos no ombro dela. — Eu não disse isso.
— O-o quê?
— Acho que não tem problema darmos uma volta, mas alguém precisa cuidar deles. — João exclamou apontando para os membros dormindo.
De repente, Sarah olhou para João com um grande sorriso no rosto que até lembrava um pouco o de Rosa, e isso acabou deixando o de sobretudo um pouco comovido.
— Não se preocupe, vou trancar a porta, e em breve eles irão acordar, eu espero, haha!
— Confio em você, então tudo bem.
A jovem corou inesperadamente com a frase de João.
— A-acho melhor irmos, senão vai fechar!
— Fechar o que?
— É uma surpresa!
Sarah pegou na mão de João e puxou-o até o lado de fora da emissora. Ela o soltou e foi caminhando rapidamente na sua frente, demonstrando estar muito animada. O rapaz andava logo atrás, e apenas uma coisa passava em sua cabeça:
“Ela está mentindo. Isso é só uma atuação. Não vou cair na dela.”
João caminhou até o lado da moça que ainda estava bem alegre, e notando toda essa felicidade, perguntou:
— Por que você está tão feliz assim?
— O que acha? Estou saindo com você! — Sarah se aproximou de João pegando no braço direito dele, deixando-o um pouco incomodado.
— Não acho que sou uma pessoa que se deva comemorar por sair com você.
— Você é muito pessimista, hein?
— Na verdade, me acho bem realista, haha!
— Falando assim… Tenho certeza de que nunca saiu com uma mulher!
— Bem, estou saindo agora.
Sarah corou novamente.
— Estou falando de uma mulher interessante!
— Para mim, você parece uma mulher intere… — João sentiu uma leve cabeçada em seu braço.
— Entendeu errado, bobão!
— Como assim? — indagou o jovem que logo notou a garota com uma expressão cabisbaixa enquanto olhava para o chão.
— Não sou uma mulher que serve para sair, sabe?
— Não estou te entendendo, Sarah.
— É que… é meio difícil de explicar.
Eles caminharam por um tempo em silêncio, até João decidir quebrá-lo:
— Sarah, posso te perguntar uma coisa?
— O quê?
— Você é bem insegura, né?
— E-ei!
— Eu estou falando sério.
— …
— Você parece ser bem desconexa dos outros membros, exceto pela Ana.
— Bem….
— Percebi também que sempre está carregando várias coisas sozinhas até a emissora, sem pedir ajuda para os outros.
— …
— Tem algo que te impede de pedir ajuda?
— Eu… — Sarah parou de andar. — Acho que você não vai entender…
— Sou todo ouvidos.
— Desde que me conheço por gente, nunca aprendi a me comunicar direito com as outras pessoas, no máximo falava com os meus pais e minha irmã, só que…
— Desculpa, acho que não deveria ter te perguntado.
— Não, tudo bem… precisava mesmo desabafar…
— Ok, então…
— Acabei vindo para o centro muito cedo, e por isso, deixei minha família ainda criança. É muito difícil interagir com as pessoas daqui, já que elas são muito diferentes das que eu conhecia, então nunca tive coragem….
— Entendo…
— Desde que Ana me encontrou, ela vem me ajudando a quebrar esse medo de falar com os outros, mas ainda é muito complicado…
— E nem com os outros membros consegue, não é?
— Sim… Acho que você percebeu como eles são… Se eu pedir ajuda, é capaz deles me xingarem…
— Não acho que fariam isso.
— É, haha….
João percebeu Sarah bastante descontente com o assunto, e logo tentou mudar o clima da situação:
— Se você precisar de ajuda para essas coisas, pode contar comigo!
— O quê?
— Não é porque sou novato que você não pode pedir ajuda para mim! Até porque eu sou bem forte. — João levantou o braço esquerdo “mostrando” o seu muque, que se escondia debaixo de várias camadas de roupas. Sarah, vendo toda essa situação, começou a rir.
— Ai, João, com esses braços finos, acho que não vai ajudar muito, hahaha!
— E-ei, não foi você que disse que eu era forte?
— Disse? Não estou me lembrando disso, hein? Hahaha!
— Foi hoje mesmo que falou isso!
De repente, ambos ouviram a janela do segundo andar de uma casa ao lado abrindo e a luz ligando:
— Quero dormir, calem a boca!
Eles se encararam e saíram correndo o mais rápido possível de lá. Após alguns segundos, os dois pararam para recuperar o fôlego. Sarah olhou para João e soltou mais uma risada.
— O que tem de tão engraçado? Nós acabamos de tomar uma dura de um desconhecido!
— João, você é tão divertido!
— Não estamos no momento para falar disso, eu acho… Aliás, não íamos para um lugar “surpresa”?
— É mesmo! Vamos! — Sarah correu na frente do homem de sobretudo que continuou a segui-la.
Após mais um tempo correndo, chegaram num parque de diversões que ainda estava aberto. Entraram rapidamente e se sentaram no primeiro banco que viram pela frente.
— Esse era o lugar especial?
— Sim, o que achou?
— É a primeira vez que venho num parque de diversões.
— A minha também, hehe… Que horas são?
— São quase onze horas — disse o jovem enquanto olhava no seu relógio. — Se vamos nos divertir, devemos começar rápido.
— Eles fecham meia-noite, dá para irmos em alguns brinquedos!
— Então, vamos!
Ambos aproveitaram o pouco tempo que lhes restavam no parque indo em diversos brinquedos e barracas. Alguns brinquedos eram bem assustadores, fazendo Sarah grudar no rapaz que inconscientemente aproveitava tudo aquilo. Parecia que mesmo sendo um demônio, a moça ainda era capaz de demonstrar sentimentos genuínos, e isso o deixou bem aliviado.
Às vezes, paravam em alguma barraca de comida para comprar algo, João gastava todo o dinheiro de suas passagens com os brinquedos e comidas do parque, mas ele pensava que tudo aquilo estava sendo divertido demais para economizar.
Faltando poucos minutos para fecharem o parque, Sarah levou João para uma barraca de “tiro ao alvo”, onde o vencedor poderia escolher uma pelúcia.
— João, pega aquela pelúcia para mim, por favor! — Sarah apontou para um gato laranja de pelúcia bem grande.
— Você não quer ir no meu lugar? Não sou tão bom com esse tipo de jo…
— O que é isso, meu jovem? Vai passar essa vergonha na frente da sua namorada? — o dono da barraca, um homem idoso, disse enquanto arrumava as latas numa bancada.
— N-n-namorados?! — Sarah se virou completamente constrangida.
— Está duvidando de mim? — João encarou o dono da barraca com uma expressão nervosa.
— Tem vergonha de fazer feio na frente da moça? Se fosse eu…
— Vergonha? Você que vai passar vergonha agora!
— T-tudo bem, João, não precisa jogar se não quiser! — Sarah pegou no braço dele.
— Agora é que vou mesmo! — o jovem exclamou enquanto jogava o resto dos cruzeiros na mesa. O velho pegou as moedas e deu três bolas de tênis para João.
— Você já deve conhecer o jogo, mas irei te explicar. O objetivo é derrubar todas as latas com essas três bolinhas, se conseguir, vai poder levar o prêmio que quiser.
— Já sei disso!
— Se é assim. Está pro… — Antes que terminasse de falar, o dono da barraca viu todas as latas serem derrubadas no chão com apenas uma bola.
— Vou querer o gato! — João disse apontando para a pelúcia enquanto segurava as bolas restantes com a outra mão.
— Ah… — O dono da barraca entregou a pelúcia para o rapaz.
— Obrigada, João! Obrigada, obrigada, obrigada, obrigada! — Sarah comemorava pulando de alegria ao redor do homem de sobretudo.
— Vamos, Sarah, eles estão fechando o parque.
Após essa cena, os dois se encaminharam para a saída do parque. O dono da barraca, vendo tudo isso, pensou:
“Ai, ai, esses jovens… Sempre tão animados…”
Depois de saírem, João e Sarah voltavam até a emissora, a garota de cabelo rosa abraçava a pelúcia com toda a força do mundo, enquanto João falava:
— Não acredito que aquele velho me desafiou, que audácia.
— Não se preocupe, João, você ganhou com uma jogada só!
— Sim, humilhei o velhote, haha! Pelo visto, você gostou da pelúcia.
— Eu amei! Eu amo gatos!
— Fico feliz de ter pegado para você.
Sarah se sentiu envergonhada novamente.
— Deveríamos dar um nome para ele.
— Deveríamos? A pelúcia é sua, pode dar o nome que quiser! — João disse com um pequeno sorriso no rosto.
— João…
— O que foi? Não sabe o nome que vai dar para… — O jovem foi interrompido.
— Muito obrigada…
— Ah? — João olhou para Sarah e inesperadamente se sentiu diferente. Era como se estivesse vendo uma criança feliz… como se estivesse vendo a Rosa feliz. Isso acabou deixando-o inquieto.
— Esse foi o meu primeiro encontro, e fico muito feliz de ter sido com você…
— Ah… Obrigado… Foi o meu primeiro, também…
— Então parece que eu acertei mais cedo, né?
— Ei, até agora vai caçoar de mim?
— Hahaha!
Eles ficaram em silêncio por um tempo.
— Você é incrível…
João desviou o olhar para o lado com uma expressão chateada.
“No final, ainda é a mesma coisa…”
Sem perceber, os dois já estavam na frente da emissora. Entraram e não encontraram nenhum membro lá.
— Parece que eles já foram.
— É.
— Então é isso, hoje foi um dia cansativo.
— Mas foi divertido também!
— Sim… Estou indo para casa, Sarah, boa noi… — João foi cortado.
— Espera, João! — exclamou a moça que foi para a parte de trás do balcão e começou a procurar algo. Em alguns segundos, saiu de lá e entregou algo para João. — Essa é a chave da emissora, Caio disse para te dar.
— Obrigado, Sarah. Até amanhã.
— Tchau, João. Vá em segurança!
O rapaz acenou e saiu da emissora, mas antes que voltasse para casa, foi chamado pela moça:
— João!
— Aconteceu algo? — perguntou se virando.
— O nome da pelúcia será João, assim como você! — Sarah gritou acenando para o jovem. — A-ah… Obrigado, Sarah! — João deu um leve sorriso e acenou de volta, logo depois se virando para seguir o caminho até seu destino.