Os dois jovens da emissora caminharam juntos pela estrada enquanto conversavam. Aparentemente, ambos estavam em mais um encontro, porém, esse era totalmente diferente do primeiro, que havia sido planejado às pressas.
Sarah estava muito melosa, abraçando fortemente o braço de João como se não quisesse deixá-lo escapar, além de dar diversos beijos no rapaz demonstrando todo o carinho do mundo.
João recebia todo esse afeto sem hesitar, e às vezes até retribuía com cafunés e carícias no cabelo tingido da garota. Parecia um casal que estavam vários anos juntos.
— Então, Sarah, está tão tarde, o que poderíamos fazer nesse encontro? — perguntou o jovem de sobretudo segurando as mãos da moça.
— O encontro não precisa de um lugar definitivo, podemos ser só eu e você, hehe!
— Bem, concordo, mas nós poderíamos ir para algum restaurante ou aquela cafeteria que fomos algumas semanas atrás.
— Aquela cafeteria não fica aberta nessas horas… Mesmo assim, não me preocupo de ficarmos andando a noite toda, o que importa é que estou contigo! — exclamou Sarah apoiando sua cabeça no ombro do rapaz.
— Não sei o que dizer quando recebo todo esse carinho, hehe!
— Apenas aceite, ué! Ou você também pode retribuir, hihi!
— E como poderia retribuir?
— Talvez… com beijos? — Sarah respondeu jogando seu cabelo para trás e encarando o jovem com um sorriso malicioso.
— Sou meio tímido, sabe?
— Não precisa ter vergonha, nós já estamos namorando, né?
O rapaz parou de andar imediatamente, deixando Sarah curiosa.
— O que foi?
— Namorando?
— Olha, desde que te perguntei, você não me deu uma resposta, mas está saindo comigo hoje, não? Já aceitei como um “sim”, haha!
— Ah… Que tal se fôssemos numa praça que tem aqui perto? Costumava passar por ela a pé e lá tem um clima muito agradável!
— Hum… Acho uma boa ideia, se bem que ficar sozinha numa praça à noite pode ser perigoso…
— Pensando assim, qualquer lugar de noite é perigoso…
— Bem, pode até ser… — respondeu Sarah e logo avançou em João dando-lhe um rápido beijo na bochecha. – Mas com você, me sinto bastante protegida, hehe!
—É… Então, vamos para a praça?
— Vamos!
Eles seguraram a mão um do outro e caminharam até à praça. No meio do caminho, decidiram parar em uma barraquinha de comida para comprar dois cachorros-quentes, já que não haviam comido nada desde que saíram da emissora.
Quando finalmente chegaram lá, viram o leve balançar das árvores em meio ao céu escuro, com algumas lâmpadas incandescentes iluminando o local como se fossem vaga-lumes. Obviamente, não havia ninguém além deles, então puderam descansar no primeiro banco que viram pela frente.
— Realmente não tem problema ter pagado os dois cachorros-quentes? — João perguntou se sentindo culpado pelo ato da jovem.
— Relaxa, só estou retribuindo o favor que fez no dia do parque de diversões, lembra? — disse Sarah dando uma mordida no seu hot-dog depois.
— Ah, claro que lembro! Aquele foi um dos melhores dias que tive desde que entrei na emissora.
— Me pergunto o porquê foi o melhor dia… — murmurou a garota desviando o olhar.
— Óbvio que foi por sua causa, bobinha! — João avançou na jovem com um forte abraço e logo começou a fazer cócegas nela.
— Hahaha! Para, João, você está sujo!
— Estou? — o rapaz perguntou tocando em seu rosto e sobretudo procurando por alguma sujeira.
— Te peguei! — esbravejou Sarah após avançar no homem para retribuir as cócegas.
— Hahahaha! Por favor, para! Sou fraco para cosquinhas, hahahaha!
De repente, a jovem parou e começou a encarar João por alguns segundos, deixando o jovem preocupado. Era como se estivesse o analisando parte por parte. Sem perceber, estava por cima do de sobretudo, em seu colo.
— S-Sarah, p-poderia sair de cima de mim? – o rapaz perguntou constrangido com a situação. Logo, a garota se deu conta e saiu mostrando uma feição deverasmente envergonhada.
— M-m-me d-desculpa, J-João! — disse ela se levantando.
— E-está tudo bem, não foi nada…
Os dois jovens se mantiveram calados em um silêncio constrangedor. Silêncio esse que, mesmo durando segundos, pareceu horas. Para quebrar isso, a jovem de cabelo tingido decidiu mudar o clima do local apontando para um brinquedo enquanto perguntava:
— E-e se fossemos naquele balanço?
— É-é uma boa ideia, vamos!
Eles terminaram de comer seus hot-dogs e caminharam até o balanço. Sarah imediatamente se sentou em um dos assentos e fez um gesto de empurrar para João, como um pedido.
O rapaz não a questionou, e com um sorriso no rosto, foi para trás do balanço e começou a empurrá-la.
— Hahaha! Fazia muito tempo que não brincava disso! Isso me traz lembranças boas!
— Sério? Quais lembranças?
— Tem várias! Na minha cidade natal tinha um desses por lá, e eu costumava brincar com a minha irmã e meus pais!
— Nossa, deve ter sido legal!
— Sim, era muito! Fingia que estava em uma corrida de cavalos onde quem ia mais alto ficava na frente, era muito divertido.
— Você tinha uma imaginação fértil, hein?
— Ah, era o que tinha pra fazer naquele lugar, sabe? Não tínhamos muitas coisas interessantes como temos aqui, além de que…
— Aconteceu algo lá?
— Ah… nada de mais, haha…
— Bem… Pelo menos você tinha sua irmã, certo? Sempre quis ter um para brincar.
— Na verdade, minha irmã era muito ocupada, não tinha tempo para ficar comigo… Mas, pelo menos fez de tudo para dar o que era de melhor para mim…
— Fez… O que aconteceu com ela?
— É… É que não vejo mais ela, né? Então não tem como cuidar de mim, hahaha!
— Faz sentido…
— Além de que, já sou uma adulta e posso cuidar de mim mesma.
— Deve se pensar assim mesmo, Sarah…
O silêncio voltou a contaminar o lugar, não se ouvia nada além dos grilos cantando e o som do balanço indo para cima e para baixo, para frente e para trás.
— Mesmo sendo adulta, você ainda vai precisar de pessoas que possam te ajudar.
— É…
— Mas é o que sempre lhe digo, Sarah…
— O quê?
— Estou aqui para te ajudar! Afinal, sou o seu cavalheiro, né?
Sarah se virou para João enquanto ele ainda empurrava o balanço e viu um grande sorriso em seu rosto. Até que, inconscientemente, seus olhos começaram a lacrimejar.
— O-obrigada, João…
— Não tem por onde!
— …
— …
— Mas se vai cuidar mesmo de mim, terá que superar minha irmã!
— Ei! Isso deve ser complicado.
— Com certeza será, mas esse é o fardo de viver ao meu lado!
— Haha, é uma honra carregar este fardo comigo!
—E-ei!
—Haha! Aliás, se é para competir com sua irmã, será que ela fazia isso? – João empurrou fortemente Sarah a levando para o alto, quase passando da barra superior que segurava o brinquedo.
— E-EI JOÃO, O-O QUE É ISSO??!!!
— Hora de levar o seu cavalo para o primeiro lugar! — Sarah voltou para trás com tudo e João empurrou-a novamente.
— J-J-JOÃO, TENHO MEDO DE ALTURA!!! PARA, POR FAVOR!!! — Sarah gritou fechando os olhos e segurando nas correntes do balanço o mais forte que podia.
— Não tenha medo, Sarah! Olhe a praça daí de cima!
Ao ouvir isso, Sarah lentamente abriu os olhos e observou toda a praça lá do alto. A leve brisa do inverno batendo em seu rosto, as ruas iluminadas com as lâmpadas da cor laranja que passavam um ar confortável para quem passasse por lá, tudo isso era, de certa forma, aconchegante. E mesmo voltando para baixo em segundos, aquela experiência ficaria guardada em sua mente para sempre.
— Hahahaha! J-João!
— O que foi?! Quer parar?!
— Me empurra mais alto!
— Sério? Seu pedido é uma ordem!
O rapaz de sobretudo empurrou novamente, levando-a mais alto ainda. Sarah, que antes estava com medo da altura, agora apreciava tudo que acontecia naquele momento com um grande sorriso no rosto e leves gargalhadas que contagiaram João.
Alguns minutos se passaram, quando ambos já estavam sentados no banco da praça novamente, Sarah se recuperava da adrenalina que um simples balanço te trouxe, e sua respiração ofegante era a única coisa que se podia ouvir lá.
— Então, Sarah, o que achou?
— Eu… definitivamente… — Sarah respondeu em meio a respirações fortes. — Definitivamente ganhei a corrida de cavalos, haha!
— É isso aí! — João estendeu a mão para dar um high five, que foi respondido pela jovem. — Quando quiser, nós voltaremos para a emissora.
Eram 23h quando os dois jovens estavam na frente da rádio, João entregava a bolsa de sua acompanhante para ela enquanto a outra arrumava o sobretudo do rapaz.
— Como sempre, você conseguiu me dar o melhor dia da minha vida. Obrigada, João…
— Foi divertido mesmo… Preciso ir Sarah, está tarde e se depender da proprietária do meu prédio, vou dormir na rua, haha!
— Ok. Boa noite, João…
— Boa noite, Sarah.
— Espera! Tem algo que preciso fazer!
— O quê? Aconteceu alguma coi.. — Sarah se aproximou rapidamente de João e deu-lhe um beijo, mas não igual aqueles selinhos de horas atrás, e sim um beijo longo, molhado e caloroso. Mesmo nas pontas dos pés, ainda se manteve por alguns segundos antes de se separar do rapaz.
— Muito obrigada, meu cavalheiro! — Sarah saiu correndo de lá deixando João sozinho e completamente envergonhado. Ele acenou para a garota ainda incrédulo com toda a situação e foi embora para seu apartamento.
Quando chegou no edifício, João viu um bilhete no portão. Nele havia uma pequena mensagem escrita:
“Favor, deixe aberto para o inquilino duvidoso entrar. De: Dona Maria”.
O jovem deu um pequeno sorriso e entrou no local após tirar o bilhete e trancar o portão. Na área da recepcionista, não se via ninguém, já que era quase meia-noite.
João andou um pouco até chegar em um bebedouro, onde pegou um copo de plástico e tomou um gole de água.
Pouco tempo depois, o homem já estava dentro de seu apartamento. Se encontrava dentro de seu simples banheiro que continha nada além de um espelho, uma privada e uma banheira com um chuveiro.
O rapaz se limpou das marcas do batom escuro que Sarah havia deixado em sua boca e em seu rosto, fechou a torneira e encaminhou para o quarto, onde havia uma cama, uma escrivaninha velha de madeira e o seu armário.
Após se deitar na cama, o jovem com um sorriso no rosto, pensou:
“Ela não desconfia de nada ainda!”