Quinta-feira – 28 de fevereiro de 1957 – Tempo atual
João encarava Sarah contando sobre seu passado enquanto chorava. Era perceptível que lembrar de tudo aquilo fazia mal, e em busca de confortá-la, o rapaz a abraçou.
— Não… não sabia que você havia passado por tudo isso… Me desculpa por te fazer lembrar…
— T-tudo bem… O-obrigada, João…
Se soltando do abraço, João continuou o seu “interrogatório”:
— Depois de tudo isso… o que aconteceu?
— Eu vaguei sozinha por um tempo, até um casal de velhinhos cuidar de mim por alguns dias, mas logo depois eu fugi novamente. Sem perceber, cheguei aqui em São Paulo e Ana me encontrou.
— …
— Logo, passou a cuidar de mim. Até que um dia me persuadiu a fazer um pacto com os outros membros. Desde então, sou assim.
— Entendo, então Ana não é tão boazinha quanto eu achei que fosse.
— N-não pense coisas más sobre ela!
— O quê?
— No dia, dava para notar que Ana estava diferente… Era como se estivesse sendo obrigada a me manipular. Sabe como os outros membros são, não sabe?
— Sim…
— Então… isso foi tudo o que aconteceu comigo.
— É…
— …
— Sarah, isso pode ser meio inesperado, mas…
— Pode dizer.
— Precisa me ajudar a derrotar eles.
— O-o quê?
— Nós precisamos nos unir para acabar com os demônios da emissora.
— M-mas, significa que eu estaria traindo eles!
— Não importa, Sarah! Agora que me permitiu viver, se tornou uma cúmplice minha, querendo ou não.
— E-eles são fortes, João. Não temos nada que possamos fazer sozinhos!
— Nós acharemos um jeito! Precisamos derrotar eles e proteger a cidade!
— Mas… e a Ana?!
— …
— Eu… — Sarah iniciava um choro novamente — N-não quero machucá-la…. D-devo tanto a ela…
— Não faremos nada de mal para Ana. Percebi que ela é muito mais amena do que os outros membros. Sarah, estou te implorando, você precisa me ajudar com isso.
— J-João…
— Quando os membros descobrirem que tentou me matar para acabar com os planos deles, irão te matar… Farei o máximo para te proteger deles, Sarah.
— …
— Estou te implorando… Faça pelos seus pais, sua irmã… pelo amor que um dia sentiu por mim… e que senti por você…
Sarah interrompeu sua caminhada, preocupando João. Ele se aproximou da jovem querendo saber se algo havia acontecido, e rapidamente notou uma expressão pensativa e agônica vinda da jovem.
— …
— Sarah?
— Isso foi um golpe baixo, João…
— Como assim?
— Eu… aceito, então… te ajudarei com o seu plano.
— Ótimo. A partir de agora, será uma agente dupla.
— Ok. Acho que consigo fazer isso.
— Sim, confio em você.
— O-obrigada…
— No momento, tudo o que precisa fazer é reunir informações sobre os demônios, alguma maneira de derrotá-los…
— Já tenho uma ideia do que pode ser, mas vou averiguar outras pistas.
— Se possível, gostaria que comparecesse na minha casa amanhã depois do trabalho.
— J-já?
— Se quiser, sim. Precisamos ir o mais rápido possível com isso.
— Tudo bem, vamos nos encontrar amanhã, então.
— Ok… Sarah, conto contigo, vamos impedir eles de dominarem o mundo!
— Não sei como pode ser tão otimista, mas vamos.
Sexta-feira – 01 de março de 1957
João se arrumou e foi para a emissora. Chegando lá, todos os membros estavam tomando café da manhã. Em seguida da refeição, foram se arrumar para a transmissão do dia.
De noite, se via algo que não acontecia a um bom tempo: os funcionários da Essência de Chocolate conversando amistosamente envoltos da mesa.
— Caramba, hoje foi um dia complicado — João exclamou.
— Todos os dias são iguais — Willian respondeu.
— Os últimos não foram, hehe — Gabriel murmurou levando em seguida um tapa da loira ao seu lado.
— É que hoje eu peguei um pouco mais no pé do João — Ana disse enchendo seu copo com whisky.
— Tem certeza de que você me desculpou sobre os últimos dias?
— Ei, não há necessidade de tocarmos nesse assunto de novo! — Sarah afirmou dando um leve soco no ombro de João, que se virou e passou a fazer cócegas na garota. — P-PARA JOÃO, HAHAHA!!! AQUI NÃO!!
— Começou essa palhaçada de romancezinho mequetrefe. — Gabriel fez uma careta.
— Você tem inveja de não poder viver um relacionamento com ninguém – Ana retrucou.
— Não é que não posso, e sim que ninguém merece.
— Você é pior do que o João, Gabriel. — Willian passou a página de seu livro.
— O-O QUÊ?!
— Hahahaha, pegou pesado agora, Willian — Caio completou tomando um gole de whisky.
— ANA, OLHE PARA MIM, EU SOU PIOR DO QUE O JOÃO?!
— Por que está tratando como se isso fosse ruim? — João perguntou chateado.
— Ele é muito melhor sim, Gabriel! — Sarah disse abraçando o braço de João.
— A sua opinião não vale de nada, Sarah! Você é parcial! Vamos Ana, responda!
— Depende do sentido… mas que você fala mais que qualquer um daqui, é um fato, hahaha!
— Sua… sua… Você é a maior bebum de todo o centro de São Paulo!
— Não sabia que ficava alterado com esse tipo de piada, Gabriel… — Willian falou.
— Não estou alterado. Você falou um absurdo e só quero saber se os outros não são desmiolados igual a ti!
— Gabriel, fica quieto e toma logo esse whisky – Caio exclamou entregando um copo para o loiro que prontamente recusou.
—Não tomarei mais bebidas alcoólicas, senão, me tornarei a Ana.
— Eeeeiii, paara de falar assiiim de mim!
— Eu disse, haha!
— Puxa vida, a garrafa de whisky está toda vazia! Ana, é melhor irmos para o banhei…
— Por quêêê? Nãããõ tem necessiii… — A loira sentiu uma ânsia de vomito e logo se levantou.
— E-ei, não vomita na gente! — João gritou tentando virar Ana para o outro lado.
— Em mim não, João! — Caio berrou se levantando o mais rápido possível.
— Willian, leva logo ela! — Gabriel esbravejou se escondendo debaixo da mesa.
— A-acho que… — Ana dizia em meio a soluços. — Acho queee não to beeem…
— Venha comigo, venha. — Willian segurou fortemente na mão da loira e a puxou.
— Eeei, meu príncipeee encantadooo, hehehe…
Willian e Ana entraram juntos no banheiro. Passaram-se alguns segundos até os membros ouvirem um som nojento vindo de lá, seguido de um grito do afro.
— Willian se deu mal, hahaha!
— CALA A BOCA, GABRIEL!!! — Willian gritou do banheiro.
— Ok…
— Agora que o clima “pesou”, acho melhor irmos para casa, João.
— “Irmos”? — Caio questionou.
— Sim! Hoje vou dormir na casa dele!
— Eeeeita!
— Você é muito idiota, Gabriel… — João disse pegando seu sobretudo do balcão.
— Está certa disso, Sarah? Os últimos dias não foram muito…
— Está tudo bem, Caio. Vamos nos divertir bastante lá, não se preocupe!
— Boa sorte na hora do se… — Gabriel teve a boca tampada pelo chefe.
— Entendi. Tenham uma boa noite, então. Resolveremos as coisas aqui com Ana.
— Certo. Vamos, João!
— Vamos. Até semana que vem, pessoal!
O casal acenou para os membros restantes na mesa e foram até o apartamento de João. Chegando lá, foram recebidos por Dona Maria que varria o chão da recepção.
— Boa noite, Dona Maria.
— Boa noite, João, como foi o trabalho… Oh, se não é aquela garota de antes!
— Boa noite!
— Nem tivemos chance de nos apresentarmos, não é? Sou Dona Maria!
— Prazer, sou Sarah Cambra!
— Pelo jeito, vocês estão num relacionamento. Ai, ai, parece que foi ontem que achei esse garoto dormindo na rua…
— Você dormia na rua?
— Ela está exagerando…
— Se me lembro bem, você não tinha um lar para ficar, então passava o dia todo na biblioteca estudando e na rua dormindo.
— Dona Maria, não precisa dar detalhes.
— Ora, João, a jovem precisa saber mais do seu passado. Quando se casarem, é bom não manter segredos um do outro.
— C-casar?!
— Sarah, vamos subir logo, senão a velha vai caducar mais ainda…
— Tenha modos, garoto! Suba já para o seu apartamento! — Dona Maria gritou ameaçando bater no rapaz com a vassoura.
— N-não me trate como se fosse minha mãe!
— Vou te tratar assim para que a madame tenha uma sogra para desabafar, hehe! Agora, vai logo que está me atrapalhando na limpeza!
— V-vamos, Sarah!
— Até mais, Dona Maria! — Sarah acenou para a velha que retribuiu.
Chegando no apartamento, João se sentou cansado no sofá.
— Ela é tão alegre, nem parece que é idosa.
— Dona Maria viveu os períodos da guerra como se fossem os últimos dias da vida dela. Bem, agora, ela realmente está nos seus últimos dias, então…
— Ai, João, não precisa ser tão grosseiro!
— D-desculpa, Sarah…
— Hehe…
— Pode não parecer, mas devo muito a ela.
— Deu para perceber que ela se preocupa contigo.
— Sim… Ela é como uma mãe para mim.
— É fofo ouvir isso vindo de você, João!
— Haha…
Sarah se sentou ao lado do rapaz.
— Vamos para o que interessa agora, Sarah…
— Sim…
— O que você descobriu sobre eles?