Ponto de Vista de Akira:
Caminhando pelas cápsulas, procurei por rostos familiares em meio a tantos desconhecidos. A maioria deles tinha em sua nuca o símbolo do Clã Hiken gravado, vendo todos aqueles corpos, respirei fundo e avancei pelas partes mais escuras do local. O brilho azul ficava cada vez mais apagado e aos poucos deixei de enxergar a minha frente. Ainda havia cápsulas ao redor, sem mana sendo extraído delas, imaginei que estivessem ali como reservas, mas meu mundo mudou quando me aproximei de uma delas. O vidro que comportava a mana estava gelado e parecia vazio, prontamente, estalei os dedos, gerando uma pequena chama sobre meu dedo indicador.
A chama iluminava poucos centímetros a frente, então, curioso, cheguei ainda mais perto da cápsula. Eu não queria acreditar no que vi, senti meu espírito e vontade sumirem do meu corpo em instantes, minhas pernas fraquejaram, levando a me inclinar para frente e me forçando a olhar para o interior da cápsula. Dentro dela, um corpo esquelético, coberto por uma pele murcha e sem músculos, com olhos mortos fazendo uma expressão de desespero e dor.
Por mais que eu quisesse vomitar e desviar o olhar, não fui capaz, e meus olhos continuaram a ver aquela cena aterrorizante. A pele flácida na região da mão possuía uma cicatriz em “x” que me trouxe um estranho sentimento de nostalgia.
Uma memória antiga me veio naquele momento. A cena do meu pai, juntamente com minha mãe e resto dos pesquisadores do nosso clã, partindo em uma viagem. Eu não conseguia nem mesmo lembrar de seu rosto, apenas da sua mão recém curada acenando para mim.
Era como se meu coração tivesse se quebrado e incinerado. Lágrimas escorriam em meu rosto, mas eu mal conseguia esboçar uma única reação. O choque e a dor me paralisaram, enquanto a fúria fazia com que minhas lágrimas evaporassem.
Ponto de Vista de Kaiser:
— SUA REVOLUÇÃO PATÉTICA TERMINA AGORA! — Welt, com sua armadura de aço, disparou seu punho em cima de mim.
Deitado no chão, girei agilmente me esquivando do seu golpe, com um rápido contra ataque em sua perna. Deixando nada além de faíscas, me levantei, olhando profundamente em seus olhos.
— Você não me dá medo moleque…
Eu olhei para o painel de vidro ao meu lado, vendo Akira perto de todos aqueles corpos, ele estava ajoelhado no chão, deslizando melancolicamente sua mão por uma das cápsulas no fim da sala.
— Não é comigo que você tem que se preocupar — erguendo minha lâmina próxima ao seu pescoço.
— Vamos ver! — respondeu com um sorriso ameaçador.
Nós trocamos golpes freneticamente, dançando por cada canto daquela não tão espaçosa sala. Sua força bruta e resistência eram uma grande dificuldade, tendo em vista que riscos e faíscas não lhe causavam dano algum. Pelo breve segundo que cessamos, Welt adicionou espinhos aos seus punhos, porém, sua armadura se tornou um pouco mais fina. Sabendo disso, aproveitei-me desta vantagem.
Minhas costas estavam viradas para a parede, bloquear seus golpes seria arriscado demais, eu tinha que me posicionar melhor e assim o fiz. Quando seu soco mais uma vez se aproximou, esperei até o último segundo para saltar rapidamente para sua retaguarda. Meu braço, em formato de uma espada curta, estava pronto para perfurá-lo, mas de forma inesperada, Welt concentrou todo o metal de sua armadura em suas costas e com um formato de um punho, me acertou em cheio. Sua habilidades mostravam um alto conhecimento sobre sua própria magia, infelizmente, o tornando um oponente difícil.
O painel de vidro quebrou com o impacto e eu voei até o outro lado da área de extração de mana. Meu corpo mal se movia, mesmo que tentasse me levantar, meus braços e pernas fraquejavam. De repente, escutei passos correndo em minha direção.
— Kaiser! — Akira gritou.
— Iai… — por mais que tentasse esconder as feridas, o sangue que eu tossia não me deixava mentir.
— Você tá bem cara? Tá todo machucado! O que aconteceu?
— Nada demais… — o chão se cobria com uma poça de sangue — Foi só um soco, devo ter machucado alguns órgãos.
— Não me diga que… — Akira cobria meu torso com suas chamas — que o Rei Welt tá aqui.
— É… isso mesmo — as dores em volta do estômago diminuíram, minha força aos poucos retornava — Mas agora… isso não importa. Temos que libertar essas pessoas — disse enquanto me levantava.
Akira, de joelhos, apertava sua calça com angústia, em seguida, um tom melancólico em sua voz.
— É inútil… — fiquei chocado com o que disse, Akira era quem mais estava aguardando o dia de hoje, ansioso para este momento — Todos eles… estão mortos…
— O que tá dizendo? — eu não podia acreditar.
— Não tem vida nenhuma nesses corpos… e alguns deles já perderam toda a sua magia.
— Então… nosso plano…
— Kaiser! — me interrompeu.
— O quê?
— Eu vou matá-lo — disse convicto.
— Akira, isso não estava combinado.
— Eu tô pouco me fudendo pra isso — sua voz estava calma, porém cheia de dor e raiva.
— Tsc, sinto que não posso te impedir, não é?
— Não.
Prontamente, peguei o bastão amarrado em suas costas enquanto ainda estava de joelhos e estendi para ele, fazendo-o levantar o rosto.
Eu deixei Akira para trás por um breve momento e voltei correndo para sala de controle, onde Welt tentava reparar a central de comando na mesa. Silenciosamente, tentei atacá-lo enquanto estava distraído e então avancei com uma lâmina mirada em seu pescoço.
Welt rapidamente bloqueou meu ataque com sua armadura e jogou-me para baixo com o braço.
— Praga! Sabia que não morreria com aquele golpe.
— Sou mais resistente do que imaginei que seria.
— Não importa mais, vou sumir com toda essa base e ninguém saberá o que havia aqui!
— Não tem como fazer isso, mesmo que exploda esse lugar, ainda tenho como provar seus crimes.
— Nesse caso, tenho uma maneira melhor de resolver a situação — ele esmagava meu peito com ódio.
O Rei andou tranquilamente até a mesa de operação parcialmente quebrada, ele estava confiante, como se tudo estivesse em seus planos. Eu me levantei rapidamente, preocupado com seus próximos passos.
Em um simples toque, o chão estremeceu. Welt ria loucamente, com seu rosto completamente insano.
— O que é isso? — gritei — O que você fez?
Impaciente, saltei em suas costas e me prendi seu pescoço, porém, mais uma vez, fui arremessado para baixo.
— Seu verme insignificante… Já cansei dos seus esforços inúteis! — retornou enfurecido para mim — Não vai me parar, não vai conseguir fazer nada! Desista!
— Não parece que sou tão insignificante assim — o respondi sem medo.
— Fale o quanto quiser — transformando sua mão em uma lâmina afiada, atravessou minha perna sem hesitar.
Contive meu grito, por mais que a ferida profunda incomodasse. De repente, Welt é atacado de surpresa, um golpe forte em sua cabeça, fazendo com que o mesmo cambaleasse para o lado.
Ainda com dor, aproveitei a oportunidade para dar um belo chute em suas pernas e o derrubasse.
— Essa foi boa, Akira — virei-me para o outro lado, vendo o rosto determinado do meu amigo.
Ele se aproximou calmamente, pondo as mãos sobre a ferida em minha perna e parando o sangramento.
— Esse cara tá te dando tanto trabalho assim?
— Sinceramente, eu não queria ter que depender disso, mas vejo que não me resta escolha…
— Filhos da puta… Mesmo com dois, não vai adiantar — o desgraçado enfim se levantou — Já está ligada, é questão de tempo para que tudo isso vire cinzas.
Akira, com seus olhos em chamas, disse com raiva.
— O único que vai virar cinzas aqui vai ser você!
— Com esse símbolo em sua capa… posso presumir que queira vingança, não é?
Os punhos de Akira entraram em chamas, o fogo se estendia pelo bastão que segurava. Ele mordia seus lábios com o mais puro ódio, enquanto suas pupilas refletiam a sede de sangue que o fortalecia. Eu me juntei ao seu lado, trazendo para minha mão o presente que Frost havia me dado, formando uma espada, onde o fio da lâmina era revestido pelo tungstênio.
— Akira…
— Quê.
— Ainda pretende matar ele?
— Pra caralho.
— Tsc — suspirei desapontado — vamos acabar logo com isso.
Ambos avançamos contra o maldito rei, os cortes da minha espada estavam em sincronia com os golpes de Akira, cada pancada que ele acertava liberava uma intensa labareda de fogo que ficava cada vez mais quente. A armadura de aço do rei começava a derreter bem lentamente, era quase que imperceptível, o poder de Akira estava chegando a níveis que ele jamais havia demonstrado, era incrível como ele usava seu ódio para aumentar o seu poder sem perder a compostura.
A troca de golpes frenética perdurou por bastante tempo e enquanto estávamos imersos na luta, não tínhamos percebido que a sala em que estávamos teria sido completamente destruída.
— Ha! Mesmo com dois, ainda não conseguem me derrotar — gritou ofegante.
— Tem certeza? — respondi pouco tempo antes de sua armadura cair aos pedaços.
— Isso não é nada! — pegando o metal em suas mãos nuas — Eu sempre posso reconstrui-la!
Graças aos fragmentos mágicos fundidos com o tungstênio, fui capaz de tomar para mim a posse de todo o metal que ele usava. Sua manipulação de metal não surtiria efeito em metais que fiz contato com a lâmina, assim, os juntei em meu corpo, formando uma sofisticada e elegante armadura.
Akira respirava intensamente, como se suportasse toda sua raiva naquele momento. Ele rapidamente correu em sua direção, erguendo seu bastão pronto para dar o golpe final.
— Desgraçado! HAHAHAHAHAAHAHAHA — acreditei que aquela cabeça careca enfim havia enlouquecido
— Akira! NÃO! — tentei alertá-lo do perigo iminente.
Antes mesmo que percebesse, o ressoar de uma afiada e ágil lâmina perfurou o ombro do meu amigo, trazendo ao chão um pequeno rio de sangue. O rei ria loucamente, sabendo que havia uma vida em suas mãos.
— Alguém como eu não deve se dar ao luxo de depender só de magia, não pense que sou idiota! — gargalhou enquanto girava a espada dentro do ombro do Akira
Dei meu primeiro passo para impedir seja lá o que ele fosse fazer, mas antes mesmo de firmar meu pé ao chão, gritou.
— Calminha aí! — parei instantaneamente — Não tá ouvindo? — perguntou com um sorriso diabólico.
O silêncio corria solto pelo ambiente, eu tentava escutar os mínimos sons ao redor.
— Bip! Bip! Bip! — no intervalo de um segundo soava um sinal desconhecido.
— Você só pode estar brincando — o tremor de antes veio a minha mente.
— Disse que não tinha uma bomba grande o suficiente para destruir toda a Zona Leste, não é? HAHAHAHAHAHAHA!
— Você é doente! Não tem como sair vivo disso!
— Não devo explicações a um criminoso — seu sorriso maléfico me tirava do sério.
Akira, ainda com seu ombro perfurado, segurou a lâmina que o pendurava e um cheiro de queimado surgia junto a fumaça. A lâmina enfim derreteu e Akira agilmente a arrancou do ombro, em um rápido raciocínio, chutei o bastão direto para sua mão e ele logo o agarrou e acertou um golpe em seu peito, fazendo com que o rei ficasse afundado na parede.
— Vocês vão ter que escolher… — ele ria em meio a poeira — me matam agora… ou dão um jeito de fugir da explosão… de um jeito ou de outro, acabou pra vocês.
— Onde ela tá? — perguntei.
— Se o feitiço de espaço tiver ativado, pode estar em qualquer lugar do quarteirão.
— Tá no terraço — Layla apareceu de repente.
— Layla? Por quê está aqui? Volta pro TTGL agora!
— Tenho certeza que lá é um péssimo lugar para estar.
— O que tá acontecendo?
— Um cara esquisitão chegou cortando e corroendo tudo ao redor! O TTGL já era! (Obs:Como ela pronunciou – Titil)
— Merda…
— Não temos tempo pra isso! Temos que ir embora daqui! — ela alertou.
— Layla, me leve até a bomba — disse Akira.
— O que pensa que vai fazer? — confesso que minhas esperanças já estavam acabando.
— Não se preocupa — ele respirou fundo, trazendo um tom mais calmo para sua voz — eu tenho um plano.
— Como você tem um plano? Você nunca tem um plano! — ela confrontou.
— Tem uma coisa que quero tentar, pode ficar tranquila.
— Akira, você ainda não tá pronto pra isso…
— É… mas sabe como é, não posso deixar aquele espadachim emo parecer mais foda do que eu! — me respondeu com um sorriso no rosto.
Seu corpo exalava uma leve fumaça, curando superficialmente sua ferida no ombro. Ele pôs o bastão novamente em suas costas, então, andou rapidamente para perto de Layla que estava na porta e ambos foram em direção ao terraço.
— HAHAHAHAHA! Ele enlouqueceu de vez! — o rei riu.
— É melhor calar a boca antes que eu corte suas cordas vocais.
— Não importa mais! No momento que escolheram ficar, também escolheram a derrota.
— Hunf! Ainda tenho fé neles.
— HA! O QUE LIXOS COMO ELES PODERIAM FAZER?
— O que quer dizer com “como eles” — senti que sua personalidade ficaria ainda pior do que já era.
— Você sabe… como eles…
— Não. Diga. Mais. Uma. Palavra — apontei minha espada a centímetros de seu pescoço.