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A névoa trazida pelo inverno dava a Sophiette uma aparência etérea. 

Nessa época, o marquesado era menor que a versão do futuro conhecida por Kurone. A mansão, solitária construção em meio às vastas terras herdadas de Karllos Sophiette, tinha as paredes tingidas de um tom acinzentado, contrastando com o rosa-forte escolhido por Sophia.

O portão da entrada foi aberto, permitindo a entrada da carruagem luxuosa com o brasão de Sophiette entalhado na lateral. Dali até a mansão, eram pelo menos dez minutos.

Pequenos flocos de neve enfeitavam as folhas esverdeadas das plantas — um muro esbranquiçado surgiu no local que devia ser uma das paredes do labirinto de “bambus” do jardim.

Apreciou todo o cenário enquanto os cavalos trotavam rumo à grande construção adiante.

Havia uma garota de olhar sereno, longos fios dourados adornando sua cabeça e um vestido nobre aguardando perto das barracas espalhadas pelo pátio.

Ao avistar a figura dentro da carruagem, a menina deixou de lado toda a sua imponência e acenou, exibindo um sorriso condizente com a sua idade — e isso gerou censura de um homem de meia-idade ao seu lado.

As pessoas esperando a chegada do veículo eram ninguém menos que George e Cynthia Sophiette.

— Iolite! Que bom vê-lo novamente, senti muitas saudades!!! — Cynthia saudou Kurone com um salto e um abraço assim que ele desceu da carruagem luxuosa.

— Vejo que o tempo na capital foi perdido, continua o mesmo plebeu de sempre, hmpf — comentou George, com o seu mau-humor de praxe.

— E você continua o mesmo velho rabugento de sempre, coroa.

Grrr, que atrevido de sua parte, plebeu, e ainda ousa tocar na senhorita Cynthia com essas mãos imundas…

— George, eu já pedi para não implicar com o meu querido Iolite. — A menina loira lançou um olhar afiado para o seu mentor.

— Perdão, senhorita Cynthia, exaltei-me.

Kurone ignorou as repressões da garotinha ao seu lado, direcionada ao mentor, e varreu o cenário. Não havia muito muitas diferenças no pátio além da neve presente na grama. As barracas usadas pelos órfãos foram reforçadas por conta do frio e, pelo barulho, as crianças deviam estar tendo algumas aulas no outro lado da mansão.

Provavelmente Loright também devia estar ajudando na aula…

{A Celestial pensa que você está preocupado.}

“Já faz alguns meses e o Sylford disse nas últimas cartas que o Loright não tá evoluindo mais no treino, isso deve tá atormentando ele.”

{Ela acha que os humanos são seres patéticos e limitados.}

“Ei, isso por um acaso foi uma indireta, projeto de serafim?”

{A Celestial não compreende o significado de indireta, no entanto Ela está incomodada com a alcunha “projeto de serafim”. Segundo minhas pesquisas, isso é uma clara ofensa ao tamanho Dela.}

“Tá vasculhando minha cabeça sem permissão de novo?!”

{Ela prefere não responder a isso.}

Antes que pudesse reclamar com Ellohim da invasão de privacidade, sentiu uma presença familiar originada da entrada da mansão. 

Moveu a cabeça e mirou a pessoa vindo em sua direção: Sylford Sophiette. A última vez que o viu presencialmente foi na capital, desde então estiveram apenas trocando correspondências, principalmente para evitarem problemas com as pessoas envolvidas no acontecimento do tribunal.

Kurone fez uma mesura. No fim das contas, o líder do clã Sophiette era o seu mestre de lâminas, era senso comum nesse mundo demonstrar respeito à pessoa que investia o seu tempo no ato de guiar os discípulos no caminho da espada.

— Vejo que aprendeu algumas coisas, meus parabéns, Iolite.

Sylford parecia realmente não se importar com essas coisas, desde que fosse alguém próximo, entretanto era melhor para Kurone que se acostumasse a essas coisas.

Não foram poucas as vezes que teve problemas por conta da sua ignorância desde a reencarnação. Com a sua nova aparência, precisava se tornar um verdadeiro habitante de Niflheim, conhecendo todos os costumes e o senso comum desse mundo.

— Onde tá o Loright? 

Apesar de questionar, já tinha uma ideia aproximada da localização do jovem de cabelos negros. Sylford também olhou para a entrada que dava no outro lado da mansão e começou com um “lá mesmo, porém…”, colocando uma expressão de preocupação no rosto:

— Loright está com o espírito abatido devido à falta de resultados dos seus treinos, como eu expliquei antes, ele não consegue perceber que está quase tocando o ápice humano e o seu corpo não suporta chegar lá.

Esse era o motivo pelo qual Loright aceitaria o poder das trevas.

Mais do que nunca, Kurone sentiu a aproximação do evento que mudaria o destino desse mundo, precisaria usar todas as suas forças para impedir que o jovem de cabelos negros sucumbisse.

Se fosse necessário, o trancaria em um porão e enfrentaria Azazel van Elsie sozinho — com esse pensamento, seguiu as costas de Sylford, indo pelo corredor que levava ao outro lado da mansão.

George arrastou Cynthia — que relutou com todas as suas forças — para os estudos. De qualquer forma, eles teriam tempo para conversar no jantar.

Como dito posteriormente, Loright estava na parte mais remota da grande construção, ajudando as irmãs a acalmarem as crianças, contudo era nítido o desânimo em seu semblante.

Havia olheiras profundas abaixo de ambos os olhos do jovem. A presença de calos nas palmas das mãos e arranhões espalhados na pele demonstraram o quanto ele esteve se esforçando nos últimos tempos. 

A irmã Daisy sabia o básico de magia de cura, se ainda havia pequenas anormalidades na pele visíveis, era porque a ferida original fora muito profunda.

“Não faz isso contigo, cara.”

{A Celestial gostaria de lembrar…}

“Sim, sim, eu tô ligado que eu já fiz algo assim, mas no fim isso não dá resultado nenhum.”

Percebendo o olhar do menino direcionado para os seus ferimentos, Loright tentou disfarçar colocando as mãos atrás das costas e aproximando-se dos dois jovens com um sorriso amarelo.

— Iolite, finalmente você chegou, — Loright saudou o garoto com um aperto de mão forte — eu estava ansioso para te ver, agora finalmente podemos ter uma luta de verdade usando todo o nosso poder, como prometemos.

Kurone cerrou os olhos perante as palavras do companheiro, estava claro que o jovem não estava bem, e isso só iria piorar se eles lutassem. Ele se conhecia melhor que ninguém, seria bem pior se deixasse Loright ganhar, contudo vencer uma luta contra ele só pioraria a sua situação…

No momento, o melhor era evitar qualquer tipo de competição com o jovem de cabelos negros.

— Eu tô meio cansado, depois a gente vê isso aí.

Não houve muita relutância da outra parte.

Após a troca de palavras com o seu alter-ego, o menino cumprimentou os órfãos e as irmãs, todos começaram a respeitá-lo assim como respeitavam Loright. Sem a presença de Luminus, Kurone tornou-se o mais velho das crianças do orfanato.

Bem, ainda podia ser considerado um órfão? Em teoria, estava sob tutela de Paltraint Atrex, mas isso era só em teoria mesmo, o vice-capitão da guarda só tinha interesse no que podia ganhar — teria sido melhor se Sylford tivesse tomado a frente nesse assunto.

Como estava no meio da aula da irmã Daisy, resolveu não atrapalhar mais e seguir para o interior da mansão, no entanto recebeu um olhar suplicante da sacerdotisa antes de deixar o lugar.

A irmã Daisy nem precisava verbalizar nada, Kurone sabia que Loright passava por um momento difícil e precisava ajudá-lo de alguma maneira.

Para evitar mais problemas, decidiu seguir logo para o interior da construção, lá era mais difícil para o jovem de cabelos negros encontrá-lo e chamá-lo para um duelo.    

Ele ficou no cômodo de “Salas Sophiette” por garantia, queria pensar um pouco no que podia fazer para evitar o surgimento do Vassalo da Morte. Naturalmente, a moça que ficava nesse quarto não existia mais, então podia meditar em um local silencioso, pois Sylford ficaria ocupado com alguns documentos até o horário do jantar.

O lugar não teve muitas mudanças após os últimos acontecimentos, os livros que “Salas” lia e algumas das suas roupas continuaram lá. Sylford devia usar o quarto às vezes, pois as paredes e o chão estavam limpos e os livros, organizados.

Voltando aos pensamentos do garoto loiro sentado na extremidade da cama de “Salas”, ele tinha uma preocupação principal: Azrael. Não escutou mais a voz do Suserano da Morte em sua mente, a entidade parecia ter desaparecido de vez.

O Anjo Caído explicou antes que ele não era o Azrael original, mas sim apenas um fragmento. O fragmento poderia ter expirado? Kurone não entendia bem, mas sabia que a entidade em questão não era confiável.

Segurou a espada nas mãos. Essa arma foi a responsável por permitir que se comunicasse com o Suserano da Morte, no entanto ela foi preparada para Loright. Quando perguntou ao jovem sobre o vendedor do objeto, não obteve muitas informações.

Se fosse um membro qualquer da Seita de Érebos, não fazia sentido procurá-lo, apesar de não entender como o surgimento do Vassalo da Morte poderia ajudá-los a reviver a divindade que adoravam.

“É muito problema pra pouco Kurone, se a Nie tivesse aqui…”

Enquanto andavam para a entrada da mansão, Sylford comentou que não recebeu notícias do condenado, e nem mesmo tinha atualizações sobre os movimentos do grupo de “Nie”, eles deram uma pausa após seu companheiro ser preso, com o intuito de esperar a poeira baixar.

Mas ainda era muito cedo para perder as esperanças. Não deixaria de ficar preocupado, isso era fato, porém também sabia que se preocupar demais o jogaria em um estado semelhante ao de Loright.

Notícias sobre Cecily ou Luminus também eram inexistentes, como elas podiam ficar ocultas por tanto tempo? Fazia meses que viajavam pelo mundo, contudo os espiões de Sylford sequer tinham pistas sobre a localização aproximada delas.

Kurone deixou um longo suspiro escapar e passou as próximas horas pensando sobre o que devia fazer no momento. Quando cansava, tirava alguns minutos para interagir com Ellohim — achava interessante como ela reagia às suas tiradas.

Anoiteceu e um empregado veio chamá-lo para o jantar — agora todos tinham conhecimento do cômodo secreto da mansão. Seguiu as costas do empregado e chegou ao corredor conhecido, bastava ir reto para sair na cozinha.

Ao chegar no local, foi recebido por mais uma saudação calorosa de Cynthia, que o segurou pelo braço e fê-lo ocupar a cadeira ao lado dela.

— Espero que não tenha nenhuma garota da Universidade Mágica tentando se aproximar de você — ela comentou, com um olhar afiado.

— Pode ficar tranquila, tô tentando ser o mais discreto possível pra não chamar atenção de ninguém.

O tempo que ficou longe fez a menina ficar mais grudenta que antes, e possessiva também. Estava realmente falando a verdade, e também não tinha interesse em garotinhas na idade de Cynthia. 

Mesmo com o corpo de alguém mais jovem, a mente de Kurone era de um adulto com vinte  e um anos, o que sentia pela garotinha era um afeto compartilhado entre amigos, jamais chegaria aos pés do sentimento compartilhado com Annie.

Havia também o fato de Cynthia ser a pessoa que reencarnaria como Flugel no futuro. A garota alada foi um dos seus primeiros interesses românticos quando chegou a esse mundo, e a deixou morrer, por isso tentava tratar essa menina da melhor forma possível, sem negar ou aceitar suas declarações implícitas.

— É uma pena que essa discrição chegará ao fim no próximo ano — falou Sylford, chegando na cozinha com roupas casuais e uma expressão de cansaço.

— O que você quer dizer com isso? — Kurone olhou desentendido para o líder do clã Sophiette.

— Eu ia fazer uma surpresa para ele, irmão!! — protestou a menina, mostrando a língua ao líder do clã Sophiette. Vendo a confusão no rosto do garoto ao seu lado, ela continuou: — Eu ia revelar isso depois, mas por conta do meu irmão chato, não vai ter mais graça, então vou contar logo… Eu vou estudar na Universidade Mágica com você, Iolite♥~~

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Olá, eu sou NekoYasha!

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