Após o seu longo descanso, o grupo de Kurone voltou a locomover-se, ainda liderado pela professora Ruderalis. Pela demora, era certo que a equipe guiada por Paltraint chegou na parte superior da floresta há muito tempo.
“Já consigo até ver as piadinhas.”
A densidade das trevas só aumentavam a cada hora. Chegaria um momento que não conseguiriam ver mais nada? Isso seria terrível, pois estavam no coração da floresta, no centro da escuridão, ficar perdido ali era o mesmo que ser alcançado pela morte.
Os monstros também tornaram-se mais fortes. Limitado, Kurone passava sufoco em suas lutas, começou a pensar no quão útil era o auxílio de Cynthia.
“Hmm? Eu não lembro mais do caminho que a gente devia seguir.”
O senso de localização de ninguém ali estava muito bom, e isso poderia se aplicar também À mulher que os liderava.
De repente, a figura meio desvanecida de Sprout parou, ela parecia fazer um sinal com a mão para o grupo.
— Eu avisei a vocês, meninos, que não tinha com o quê se preocupar.
O garoto loiro avançou e ficou ao lado da professora, encarando o cenário apontado por ela.
Fabuloso… não havia outra palavra para descrever o que seus olhos captavam. À frente de Kurone, estavam as estrelas, brilhantes de uma maneira que nunca viu antes.
O local que se encontravam era o topo de uma colina da floresta, bem distante do interior do lugar. Abaixo deles, e nos flancos, ainda persistiam as trevas, porém a frente estava limpa, podiam ver todo o cenário escurecido pela noite.
A professora Ruderalis riscou o chão com a ponta da sua bota, desenhando uma linha, e começou:
— Parece que aqui é o ponto que as trevas começam. É como uma nuvem de chuva bem macabra que está passando.
— Mas se aqui é o lugar que começa a escuridão, então quer dizer que a gente tá no lugar errado, o Paltraint mandou a gente ir pra…
Antes de terminar a sua fala, Kurone foi surpreendido por um chute violento da professora. A velocidade anormal o impediu de reagir, seu corpo foi empurrado para frente com o impacto, e logo caiu em direção às trevas abaixo da colina.
Escutou uma comoção e protestos dos outros estudantes, mas ignorou isso e focou em aterrissar em segurança primeiro. Sem perder mais tempo, materializou sua faca de combate curvada e a cravou na grama, passando rapidamente ao seu lado enquanto caía. Pensou que poderia deslizar com a lâmina cravada, porém enganou-se.
O garoto foi recebido por um impulso forte, estava certo que foi magia do Tipo Elemental Vento. O golpe veio de cima e antecipou brutalmente o seu encontro com o chão.
Cambaleando, levantou-se e trocou a faca de combate curvada pela sua fiel escopeta de canos cerrados.
— Parece que eu me preocupei tanto com a Sprout pra no fim ela ser só o capacho de alguém — murmurou o garoto ao sentir a presença de inimigos nos arredores. — Eu devia me sentir lisonjeado por terem tanto trabalho pra lidar comigo?
Passos se aproximaram, e logo a figura de uma pessoa grande, com quase dois metros, estava à sua frente, totalmente escondida por baixo de um manto.
— Ello…
Novamente, sua fala não foi concluída. Um som cortante surgiu no céu e caiu com toda força no local que o ser estranho estava — se a pessoa com o manto não tivesse se movido, seria aberta em duas bandas pela lâmina da espada.
Kurone arregalou os olhos. Ele não escapou ileso da queda do alto da colina, mas a figura adiante, a Inquisidora, aproveitou da altura para tentar aplicar um golpe mortal no inimigo, e, mesmo errando, ela levantou-se como se nada tivesse acontecido.
— Fique atrás de mim, essa pessoa será punida pela lâmina da justiça divina.
O oponente continuou sem pronunciar uma palavra. O menino atrás da Heroína Ádvena sabia que essa pessoa não deveria ser subestimada, porém também precisava se preocupar com as outras presenças espalhadas pelo local.
— Então foca em acabar com ele, eu vou cuidar desse lado aqui — disse o garoto, direcionando sua escopeta para duas outras figuras surgindo das trevas.
Os recém-chegados eram magros e, como o grandalhão, usavam mantos para ocultar sua identidade. Mantos eram roupas perfeitas para ganhar vantagem em todo esse breu da floresta.
Sem hesitar, Kurone disparou no primeiro e chutou o chão com força para reduzir sua distância com o segundo, materializando sua faca curvada na metade do caminho.
O plano era cravar a pequena lâmina no pescoço do alvo, mas sua velocidade não foi o suficiente para realizar o ato. O inimigo saltou e, parando por um instante no ar, atirou diversos retângulos finos, que lembravam cartas de baralho, na direção do garoto.
Foi a vez de Kurone esquivar e defender os chutes desferidos pelo segundo atacante.
Sua mente tentou trabalhar a todo vapor enquanto defendia os golpes de dois inimigos ao mesmo tempo, contudo sua linha de raciocínio foi interrompida por uma explosão em cadeia causada pelos retângulos fincados no chão.
Booooooom!
Houve uma explosão e Kurone Nakano foi jogado contra uma árvore.
Limpou o sangue escorrendo pelo canto da boca, não sangrava assim fazia algum tempo. Sentir a textura do líquido vermelho na sua mão esquerda só fez a sua vontade de lutar ficar ainda mais forte.
As mãos giraram algumas vezes e as pernas, alternativamente, foram para frente e para trás. Ele girou o quadril e materializou novamente a Boito .20. Os dois oponentes olharam um pouco confusos o seu oponente se alongando.
— Não liguem pra isso não, é que eu quero evitar qualquer tipo de lesão. Espero que vocês tenham se aquecido também, porque a coisa vai ficar séria! — vociferou, avançando já com o Olho Sagrado ativado.
Outra chuva de retângulos pontiagudos e explosivos veio na direção do garoto. Dessa vez, o Olho foi capaz de captar cada ponto de mana no interior das cartas e Kurone esquivou sem problemas dodos ataques.
Ele aumentou a concentração de mana nos pés e, mais uma vez, reduziu sua distância, já ocupando ambas as mãos com os seus revólveres de tambores giratórios.
Bang! Bang!
Bang! Bang!
Obrigou os inimigos a recuarem enquanto atirava na direção de suas cabeças.
Aproveitando da chance para respirar, olhou na direção da Heroína Ádvena. A garota continuava a encaixar golpes consecutivos, com o intuito de cortar o seu oponente.
Quanto ao grandalhão, ele precisou revelar seu trunfo: dois pares de braços. O inimigo da Inquisidora era uma pessoa de pessoa com quatro braços, contudo o que parecia ser uma vantagem não estava o ajudando.
Kurone decidiu deixar a sua busca por respostas para mais tarde e voltou a mirar os seus atacantes. A dupla parecia mais hesitante agora, e mais cansada, a respiração de ambos deixava isso óbvio.
— Não me digam que já tão cansados? Eu ainda nem comecei a lutar a sério — disse, levantando a mão direita. Chamas surgiram no membro erguido.
[Ela sentiu algo vindo pelas suas costas.]
Entretanto, o aviso de Ellohim foi tarde demais. O pulso levantado de Kurone, envolvo por fogo, foi laçado por algo firme e puxado para trás — o garoto sentiu o seu ombro estalando de maneira doentia.
Em instantes, o revólver na mão esquerda foi substituído pela faca de curvatura estranha, seu objetivo era tentar cortar o que quer que tivesse prendendo o seu pulso com a lâmina.
Voosh!
Outro dos laços surgiu, e dessa vez agarrou a perna esquerda do menino, fazendo ele ir ao chão. Logo, mais dessas coisas semelhantes a cipós com espinhos vieram e cravaram no garoto, perfurando a sua pele.
Uma leve queimação fez Kurone entender que havia veneno na ponta dos espinhos.
Enquanto lutava contra a nova ameaça, seus dois atacantes ignoraram a sua presença e seguiram na direção da Inquisidora, prestes a “purificar” a alma do grandalhão ajoelhado à sua frente.
Vendo a aproximação de novos inimigos, Hime saltou e tentou, de alguma maneira, mudar seu curso em direção ao menino sendo coberto por cipós venenosos — foi uma tentativa inútil, pois um dos oponentes colocou-se em seu caminho em um instante.
Kurone debateu-se e tentou diversos dos seus truques para fugir, mas nada adiantou. Todo o seu corpo foi coberto e, em uma puxada violenta que fez vários dos seus ossos estalarem, ele foi arrastado para o interior da floresta mais uma vez.
Os cipós não cobriam cem por cento da sua pele, por isso sentia algumas partes do seu corpo entrando em contato com o chão irregular do local. Pelo menos, ele pensou, deixaria um rastro de sangue para que a Inquisidora pudesse seguir.
Foi apenas após cinco minutos que ele foi jogado com força em uma clareira, apesar da palavra “clareira” não ser a melhor para descrever o local tomado pela escuridão.
Sentiu a presença de mais pessoas poderosas: dessa vez todos estavam à sua frente, cada um em uma posição peculiar. A pessoa no centro devia ser o líder, pois todos se afastaram um pouco quando ela se levantou e seguiu na direção do menino deitado e sangrando.
Kurone não se encontrava mais preso por cipós, mas o veneno ainda permanecia em sua corrente sanguínea, ele mal conseguia manter os olhos abertos, tentava ao máximo usar a mana para se recuperar.
— Ainda não cheguei nessa parte da disciplina. Os cipós selvagens usam seu veneno para imobilizar os animais que tentam lhes devorar, mas o efeito é temporário. É fabuloso, eles usam isso como um aviso para os animais — disse a pessoa sentada em um tronco seco, ao lado de uma fogueira.
Kurone reconheceu o tom de voz relaxado, era ninguém menos que a professora Sprout Ruderalis, a responsável por o chutar do alto da colina.
Como a mulher explicou, o efeito do veneno era realmente temporário, pois já sentia sua força voltando aos poucos.
— Como imaginei, para resistir a tanto veneno sem perder a consciência, você não é mesmo alguém comum, garoto — falou outra pessoa de voz familiar e máscula, escondida por baixo de um manto. — É um prazer revê-lo — o homem disse, baixando o seu capuz. — E obrigado pela ajuda na capital.
— O elfo do tribunal… — murmurou o menino.
Aos poucos, todas pessoas do lugar começaram a baixar o seu capuz. Kurone não conhecia nenhum deles além de Sprout e do homem do homem de orelhas pontudas, porém seu coração disparou ao fazer contato visual com a pessoa que devia liderar o grupo.
O rosto estava diferente, mas aura era a da sua amada deusa.
“Nie…”
[Deusa Annie…]