Por entre a multidão sentada nas mesas do refeitório, o aroma de comida não escapa de nenhuma narina.
Ótimo, agora meu estômago começou a reclamar de fome…
Caminhando ao lado de Miya e Nikko, Akemi observa cinco cozinheiros trabalhando freneticamente atrás de um balcão de vidro que ocupa toda a parede direita do refeitório. Cada um deles, trajando toucas brancas e aventais impecáveis, parece mais uma máquina culinária do que um ser humano de roupas imaculadas e movimentos precisos.
Os pratos servidos acima do balcão são uma verdadeira vitrine de receitas asahinanas pré-preparadas, dispostas para o deleite dos estudantes que se aglomeram para escolher suas favoritas.
Sinto que o único trabalho que esperam de nós aqui é mastigar e conversar… E esses cozinheiros, sinceramente, parecem comer mais que a boca!
— Arunizinha! Voltei! — exclama Nikko, acenando com entusiasmo.
Seguindo o som do chamado, é avistada Aruni, sentada sozinha em uma das mesas cilíndricas. Tímida, ela levanta a mão num gesto receptivo que mais lembra um aceno para espantar moscas.
Será que ela é sempre tão… introvertida?
— Sentem-se com ela, pessoal!
— Tudo bem, vem, Akemi.
Enquanto se encaminha para se sentar, o rapaz aproveita a oportunidade para dar uma boa olhada ao redor, procurando rostos familiares.
Tem mais gente da turma por aqui.
À sua extrema esquerda, ele avista Hikaru, Kinyoku e Aya, todos sentados juntos em uma mesa, mas de um jeito tão discreto e silencioso que causa calafrios em quem olha.
06, 09 e 11… O clima deles combina tanto, mas nem devem se conhecer… Sinistro.
Mais adiante, em outra mesa ligeiramente mais distante, Kentaro e Minoru se engajam em uma conversa aparentemente cheia de autoconfiança. Porém, entre eles, uma presença chama a atenção.
03 e 10… Parecem bem amigos… Mas pera aí! Aquele é o…
Nihara, cujo também participa do diálogo egocêntrico, mostra ser a cabeça do trio.
Mas apesar da distância maior, os olhos do garoto ígneo encontram Akemi novamente, e como resposta, outro olhar raivoso e desdenhoso é jogado.
Caramba, que desconforto! Vamos ficar nessa até quanto?! Ele vai me encarar assim toda vez…?! Bem, motivos ele tem…
Finalmente, Akemi se senta entre Aruni e Miya, tentando ignorar o olhar fulminante.
— Olha gente — chama Nikko — aquelas instruções na sala já me deixaram bastante tempo sentada, então ficarei atrás de vocês, em pé!
O ambiente fica um pouco mais acolhedor, mas algo ainda incomoda Akemi.
Hmmm, Sho não deveria estar aqui? Não imaginava que ele deixaria a irmã sozinha.
Ele espia à direita e vê Aruni de olhos fixos na mesa, praticamente segurando o coração, claramente preocupada.
— … Puxa! Fico contente de conseguir reunir mais gente — comenta Nikko, sorrindo; seguidamente, ela vai atrás da garota tímida para apoiar as mãos em seus ombros. — Arunizinha, onde está o seu irmãozão? Ele estava aqui há poucos minutos antes de eu sair.
Sem levantar o olhar, Aruni enrola as pontas de seu castanho-claro cabelo chanel enquanto responde: — Ele foi ao banheiro. E sabe… não acho que tenha um muito perto do refeitório, então pode demorar um pouco. Espero que ele não tenha se perdido.
— Relaxe, ficará tudo bem — Nikko acaricia a cabeça da aflita — ele só tem que tomar cuidado com o fato dos banheiros serem unisse-
De repente, uma garota baixa com um karê-pan1 numa bandeja preta se senta ao lado de Miya, chamando a atenção de todos.
A nova presença, completamente albina, permanece em silêncio, mas embora tenha só a cabeça à mostra pela mesa, seu olhar afeta a acomodação de Aruni e Akemi. — Perderam alguma coisa na minha cara?! Estão olhando o quê?! — indaga ela, sua voz é tão fina que torna difícil acreditar que pretende intimidar alguém.
Os grandes olhos verdes de Nikko brilham. — Aawwnnn! — Ela corre para a garota baixinha e a abraça com a força de um urso.
— Oe! Que intimidade é essa?! Me solta! Tá querendo ir dessa pra pior, é?!
Resistir é inútil. Estão na presença da personificação de insistência.
— É tão pequenininha, que gracinha! Dá vontade de apertar pra seempreeee! — Nikko se afasta para passar a mão nos longos fios brancos de Kyoko. — Han! Olha esse cabelo! É tão clarinho e chega até no chão! Como não suja?!
De fato, esse cabelo é surreal.
— Ni, dê um tempo a ela — pede Miya, preocupada com a garotinha que se debate para afugentar Nikko, que mesmo soltando-a, continua encantada.
— Awn, eu queria levá-la pra mim. Mal conseguia vê-la do outro lado da sala por causa da altura. Tão bonitinha!
— E-e-EU NÃO SOU BONITINHA!
— He hiii! Mas você parece uma criancinha, eu amei!
— Ãhn?! — Mais palavras dolorosas afetam.
— Nikko! Seja menos! — exclama Miya, levemente irritada antes de suavizar o tom e tentar retomar a conversa. — Oi, seu nome é Kyoko, né? Que nome lindo.
— É Shimizu pra você! Não te conheço! Só me sentei aqui porque esta mesa parecia a com menos estranhos da turma, ou pelo menos era o que eu pensava…
O comentário faz uma veia saltar na testa de Miya. A garotinha também é fogo.
Não é possível que ela tenha a nossa idade. Preciso descobrir de algum jeito!
— É… — Akemi tenta intervir — desculpe perguntar, mas seria legal saber a idade de todos aqui. Começa por você, Aruni.
— E-eu?! — A envergonhada encara o rapaz nos olhos.
— Akemi! Perguntar a idade das garotas não é algo que se faça! — adverte Miya.
— A-ah… Perdão! Eu só…
— Dezoito…
Oh! Ela tem a minha idade.
— E você, Hiromi? — Com um sorriso travesso, Nikko envolve seus braços na clavícula de Miya, olhando-a pelas costas — vai nos esconder a sua idade?
— Não é segredo que nós duas temos dezoito.
— Ah! Já revelou a minha! Pilantra!
— E você, Akemi, quantos anos tem?
— Eu… também tenho dezoito.
— Legal! — exclama Nikko, cheia de energia — todos temos a mesma idade, correto…?! Ah, espera! Falta uma!
Kyoko, que até então estava concentrada no seu lanche, percebe que agora é alvo de olhares curiosos e ansiosos.
— … Ah, sério mesmo que preciso dizer?
Todos acenam com a cabeça, como se a resposta dela fosse o momento mais esperado do século.
— Aff… — Kyoko dá uma mordida no karê-pan, saboreando o queijo derretido como uma iguaria dos deuses. Em seguida, fecha os olhos e assume um ar de superioridade. — … Vinte…
— VINTE?!
— Ei! Não precisam gritar assim!
— Pera, pera, pera, pera! — Akemi está tão chocado que sofre para articular frases — como você tem vinte anos?
— … Vivendo por vinte anos?
— Eh… Mas dá pra entrar na ASA com vinte? Você nem parece ter… Caramba, eu tenho tantas perguntas.
— Calma, Akemi — Miya tenta apaziguar a situação — pode-se entrar na ASA até o sexto mês dos vinte anos, provavelmente ela passou depois de algumas tentativas.
— Ei! Eu passei de primeira…! Bem… — Kyoko desvia o olhar, claramente incomodada — tecnicamente foi de primeira…
— Tá, tá, tá! — interrompe Nikko — mas antes de tudo! Me diga o segredo para ter um rostinho tão jovem.
— Toda vez é isso… Enfim, tudo culpa da minha linhagem.
— Você disse que é Shimizu, certo?
Nunca ouvi falar.
— Sim, meu sobrenome faz parte do clã remanescente da fonte da juventude.
— Vo… v-você é do Clã Mizu?! — Nikko está tão perplexa quanto os outros.
— Óbvio! Se meu sobrenome termina com mizu, faz parte do clã Mizu, ora!
— Ah… desculpe… — lamenta Miya — não ouvimos falar desse clã há séculos, achávamos que era extinto. Até suspeitei quando escutei seu nome na chamada, mas não levei a sério.
— Este clã está mais abundante do que você imagina, mas por causa das guerras, decidiram se esconder para omitir informações da fonte.
— Mas essa tal fonte não era um mito? — Akemi está surpreso, sua mente dá voltas.
— Eu sou a prova viva de que ela existe.
— Você a viu? — Aruni está mais interessada do que nunca.
— Claro que não, mas meus ancestrais já. Como eles se banharam nas águas cristalinas da vida eterna, as gerações seguintes herdaram parte dessa bênção. Desde então, temos uma aparência dez anos mais jovem comparada com a idade.
— He hiii, então você tem cara de garotinha de dez aninhos? Awn.
— … É… tipo isso aí.
— E como você entrou na ASA? — pergunta Akemi.
— Combate.
Combate?!
— Eita! Você participou do teste físico?! Eu também, foi muito divertido!
Até a Ichikawa?!
— Tentei entrar nos últimos dois anos, mas meus parentes queriam que eu passasse pelo exame escrito. Maldido papel e caneta, eu abomino tudo o que passei naquele infernal Instituto Hoshizora.
Oh! Ela é de Hoshizora… De personalidade, não combina nada.
— Você nunca tentou pedir transferência?
— Hoshizora só existe graças à ligação do meu clã com a fonte. Não me deixariam fazer parte de outra instituição, por mais que eu quisesse.
O relato contado deixa Miya pensativa. — Mas… se a fonte da juventude existe, com certeza devem ter pessoas zelando-a. Onde será que algo assim poderia estar?
Sorrateiramente, alguém segurando uma tábua de forma graciosa passa atrás dos alunos sentados. — Essa pergunta nunca teve resposta… — Uma suave e séria voz feminina se faz ouvir.
Quem é?
Com toda graciosidade de uma nobre, Mayumi Sanada se aproxima do assento. Segurando uma tábua cheia de sashimi e acompanhamentos, ela fica ao lado de Aruni.
— Uuh! A ruiva bonita! — Nikko se anima ao ver mais gente se juntar à mesa.
— Não adianta tentarem extrair qualquer informação da Kyoko, a fonte da vida eterna se tornou ainda mais inacessível com o início das guerras asahianas. O ser humano é inteligente, mas a ganância o corrompe.
— Entendo, a localização da imortalidade nas mãos erradas poderia causar um desastre mundial.
Miya parece mais tranquila mesmo com essa gente nova… Ela está tendo mais confiança na nossa turma?
Entretanto, algo toma a atenção de Mayumi.
Com um olhar de cachorro abandonado, Aruni não consegue desviar os olhos da tábua de sashimi.
— Você quer me ajudar a comer?
— … Hm? A-ah! N-não! Não precisa… É…
— Não estou com fome, pode usar esses hashis se quiser — Mayumi arrasta a tábua para perto da garota claramente faminta.
— O-obrigada… — O sashimi é aceito.
— Sabe gente — A única em pé vira o centro das atenções novamente — estive pensando sobre o nosso próximo passo. Estão preparados para as instruções a seguir?
— Ouvi dizer que é um shihai altamente graduado. Espero que não tenhamos problemas.
— Ah! Relaxa, menina! — Usando o braço direito, Nikko abraça Miya pelo pescoço. — Com certeza não será melhor que o seu pai. Aliás, você precisa me passar o telefone dele depois.
— Ni!
— … Como eu queria um segundo de silêncio — resmunga Kyoko, dando outra mordida no seu karê-pan de queijo.
— Ah, eu também gosto muito de você, Shimizu! — Com a mão esquerda, Nikko aproxima a cabeça da irritada para sua barriga…
E assim, uma bela amizade vai se formando até o próximo estágio do dia, às uma hora da tarde.
Curiosidades descobertas durante a conversa:
Nikko Ichikawa:
– Usa uma maquiagem felina porque… bem, gatos são sua vida. “Eu literalmente seria um gatinho preto se pudesse!”
– Se diz uma ginasta incrível. “Não tentem me desafiar num jogo de equilíbrio, a menos que queiram ser humilhados! He hiii!”
– Teve tantos “crushes” que até perdeu a conta, mas o problema? Nenhum deles sabia que ela existia.
– Cuida de tantos híbridos de estimação nas montanhas ao leste de Asahi que já virou lenda entre os habitantes locais. Dizem que até os animais selvagens a reverenciam.
– É apaixonada pela cultura de Seorim.
– Seus sapatos valem mais que casas de luxo: 2.124.000,74 Ians. Tudo por conta das esmeraldas-topázio2 de oito quilates em cada pé.
– Se fosse possível, falaria até dormindo. “Sou a animadora oficial de qualquer conversa!”
Hiromi Miyazaki:
– Campeã de dominó pelo Instituto Taira. “Ei! Não zoa! Levo isso muito a sério.”
– Dona de uma gata híbrida. “O nome dela é Savanna, vocês têm que conhecê-la.”
– Tem uma guerra declarada contra insetos. Se pudesse, teria um exército só para erradicá-los. “Inclusive mosquitos! Odeio!”
– É uma mestre na arte de fazer chás, capaz de transformar qualquer folha em uma experiência transcendental. “Já provaram o meu chá de jasmim?”
– No primário, Miya, Nikko, e Hikaru Sasaki eram da mesma sala. Pelo jeito quieto de Hikaru, Miya teve uma quedinha por ele, mas perdeu o interesse tão rápido quanto jovens assistindo aula… Mesmo após tanto tempo, Nikko ainda a zoa por isso.
– Desde seu primeiro caso “romântico”, decidiu que o amor não é para ela. Chá é muito mais apreciável.
Kyoko Shimizu:
– Tem 1,44 de altura. Já é maior que qualquer pinguim, o que é de se parabenizar no mundo dos baixinhos… ou não. “É PRA PARABENIZAR, SIM!”
– Era da mesma turma de Mayumi no Instituto Hoshizora e já tinha um apelido que odiava com todas as forças… “Anã nevada.”
– Quase rompeu uma artéria de raiva ao ser derrotada em um jogo. “Eu fiquei bem… eu só… não gosto de perder…”
– Odeia animais de estimação, especialmente porque uma vez a compararam a um coelho. Nunca mais olhou para um coelho da mesma forma.
– É faixa preta em Karatê. “Mas fiquem tranquilos, pra sorte de vocês eu não costumo usar.”
– Seu cabelo é tão longo que se arrasta no chão, mas nunca suja. Como? Poderes áuricos.
– Já pisaram no seu cabelo uma vez… o que aconteceu depois não foi bonito de se ver.
Aruni Yamamoto:
– Vinte graus de miopia. Se perder os óculos fud#u.
– Estava com tanta vergonha de ir sozinha pegar comida no balcão que poderia jejuar por todo o sempre. Se não fosse por Mayumi, Aruni ainda estaria lá, esperando.
– Venceu um campeonato de conhecimentos científicos pelo Instituto Hoshizora. “Foi a primeira vez em que ganhei algo… fiquei tão feliz.”
– Não é segredo para ninguém que ela gosta de comer, mas… cozinha? Um desastre ambulante.
– Seu livro favorito é Hana Monogatari, por Yoshi. “A-mm, sobre o que é?! É-ééé… é melhor você mesmo pesquisar!”
Mayumi Sanada:
– Tem 18 anos, mas exala a sabedoria de quem viveu 100.
– Mora no Templo de Cerejeiras, que é tão bonito que qualquer um pensaria que saiu de um cartão-postal.
– Alérgica a pelos de animais. “Então… isso é meio desagradável.”
– Diz que sabe cozinhar “um pouquinho”, o que geralmente significa que ela faz o melhor prato que você já comeu ou algo completamente intragável. Não há meio-termo.
Akemi Aburaya:
– Intolerante à lactose, um drama para quem adora o queijo que está em seu Oyakodon3, o que escolheu para almoçar. “Relaxem, eu sobrevivo… eu acho.”
– Nunca teve um bicho de estimação. “Na verdade eu já tive um peixe, mas no mesmo dia eu o achei morto fora do aquário… Nunca mais.”
– Apesar de ser um desastre ambulante, nunca quebrou uma parte do corpo, um milagre digno de nota.
– Usa um remédio estranho no cabelo, por orientação do avô. “Nunca soube o que é, mas ele me falou que é bom contra calvície.”
– Contou que seu corte no rosto foi causado por uma “briga com facas”. Claramente, ninguém acreditou só de olhar pra ele.
– Nunca conheceu o sentimento de ter um amor verdadeiro. Uma condição causada pela timidez ou falta de interesse?
- Um pão de massa empanada e frita, criando uma crosta crocante que guarda um recheio misterioso.[↩]
- Pedra mais valiosa do mundo, em formato de diamante polido, com cores verdes e reflexos amarelos, raramente encontrada nas montanhas do leste asahiano[↩]
- Mais parece nome de dinossauro, mas é um prato tradicional de arroz coberto com frango, ovo e cebola, que pode ser enriquecido com uma camada de queijo derretido.[↩]