A sobrevivência era a desculpa definitiva que eu tinha à disposição. Eu precisava sobreviver neste maldito mundo, então qualquer ação que eu tomasse em busca desse objetivo poderia ser justificada como necessária.
— …Entendo.
Lua Crescente era apenas uma vítima dessa ‘ação necessária’.
— Precisa haver um corpo…
Quando cheguei à Távola Redonda pela primeira vez, eu era um ninguém, sem nada a oferecer. A morte espreitava em cada esquina deste mundo perigoso, e eu passava longas noites em bares tentando obter as informações necessárias para continuar vivo.
Foi por isso que coloquei a máscara de leão.
Para obter as informações de que precisava, eu colocava o maior desejo de alguém bem diante dos seus olhos e o usava para manipulá-lo. Afinal, sinceridade era um pecado neste mundo. No momento em que você baixasse a guarda, seria despedaçado. E quanto mais poder eu conseguisse, mais seguros estariam meus camaradas e eu. Era nisso que eu realmente acreditava naquela época.
— Essa parte definitivamente é diferente das lendas…
Mas e agora?
Embora eu ainda me preocupasse constantemente com minha sobrevivência, agora eu era muito mais forte. Eu me tornei o chefe de uma tribo e um nobre. Na verdade, a Casa Yandel fazia parte de uma aliança de aristocratas não-humanos, Melbeth. Graças a tudo isso, eu não precisava mais depender tanto das informações da Távola Redonda.
E, ainda assim, eu continuava usando essa máscara de leão e enganando-os. Por que isso?
A resposta logo veio a mim.
Rainha. Palhaço. Lobo, que parecia ter algum tipo de ligação com Auril Gavis, a misteriosa Preta e Borboleta. Eu queria me beneficiar das informações que eles traziam aqui. Sim, essa parte era genuína. Mas…
— …Graças a você, posso agora abandonar esse meu sonho tolo.
Foi nesse momento que percebi.
Eu não podia mais usar a sobrevivência como desculpa. Assim como um pedaço de papel branco não podia ficar ao lado de uma poça de tinta preta para sempre e permanecer imaculado…
— No entanto, não consigo sentir nenhuma gratidão por você.
Este era quem eu me tornara. Alguém que mentia, que fazia ameaças, desde que isso me fosse vantajoso. Após anos de labuta1, com minha única prioridade sendo sobreviver até o próximo dia, acabei me tornando o tipo de pessoa que eu costumava odiar.
Um silêncio pesado se seguiu. Até mesmo o Palhaço, que normalmente zombaria do Lua Crescente e diria que a culpa era dele por ser enganado, não disse uma palavra, apenas observando.
— Eu… — Lua Crescente quebrou finalmente o longo silêncio e se levantou de sua cadeira. — Eu… vou embora agora. Não há mais nada para mim aqui.
E com isso, o Lua Crescente realmente foi embora, sem nos dar a chance de responder.
— Hã…? E-Ele realmente se foi…?
Este era um grupo anônimo onde ninguém sabia o nome de ninguém. Uma vez que saíssemos daqui hoje, não havia garantia de que nos encontraríamos novamente no futuro. Mas, apesar de saber disso, no fim, eu não consegui dizer.
Eu não consegui pedir desculpas.
Se eu o fizesse, isso poderia voltar para me morder. Esse era o pensamento que pairava na minha mente.
Mesmo depois que o Lua Crescente deixou a Távola Redonda, nossa última reunião continuou. Embora isso possa parecer cruel, era algo esperado, dado a natureza deste lugar. Os relacionamentos que tínhamos com as pessoas aqui eram puramente profissionais.
— Pshehe, ele realmente se foi. Que sem graça.
Todos rangeram os dentes e ignoraram as bobagens do Palhaço enquanto a segunda rodada começava. o Veado foi, mais uma vez, o primeiro a falar.
— Me diga…
No entanto, em vez de compartilhar informações, o Veado olhou diretamente nos meus olhos e perguntou — Você acha que isso é um jogo? Acha?
A sensação que tive dele era que ele não era muito amigável com ninguém em geral, mas ver o Lua Crescente sair daquele jeito deve ter sido um choque para ele, pois ele me encarou com uma hostilidade aberta.
— Sr. Veado… P-Por favor, acalme-se…
O Goblin tentou impedir o Veado, e os outros membros também olharam preocupados. No entanto, o Veado não recuou.
— Isso tudo é apenas uma forma pervertida de entretenimento para você…? Encontrar alguém desesperado, dar-lhe esperança, só para tirá-la depois? É por isso que você só mencionou isso agora? Porque hoje será o último dia?
Se eu fosse me defender, não foi por isso que fiz. O verdadeiro motivo de eu ter finalmente falado hoje foi por um senso de dever… Não, eu supunha que estava mais perto de um senso de culpa.
E a razão pela qual eu colocava tanta ênfase na necessidade de ser ‘entretido’ na Távola Redonda? Era simplesmente uma maneira de dar corpo ao personagem do Leão. Ou melhor, para manipular os outros membros e controlar o fluxo da conversa como eu quisesse.
— Leão, não há dúvida de que você é alguém muito mais poderoso do que eu. No entanto, ainda preciso dizer o que deve ser dito: Você é apenas um homem quebrado.
Eu já havia ouvido essas mesmas palavras várias vezes no passado. Quando Baekho Lee disse isso, eu simplesmente deixei passar. Mas naquele momento, estava ficando claro que havia algum tipo de falha em mim que essas pessoas estavam percebendo.
Eu estava quebrado. Mesmo pelos padrões deste mundo selvagem, eu já havia cruzado uma linha.
E, como para confirmar isso…
“Deveria usar a intenção assassina?”
O primeiro pensamento que veio à mente depois que o Veado disse tudo isso foi: O que o Leão faria? Na minha cabeça, eu me via dizendo ‘interessante’ e empregando um pouco de intenção assassina. Porque esse era o caminho mais fácil, e o que seria mais benéfico para mim.
— Pshehe, que tal parar por aí? É difícil ouvir suas lamúrias. Saiba o seu lugar, Veado.
Na mesma linha, quando o Palhaço começou a latir para o Veado como um cão de guarda, fiquei em silêncio, esperando para ver como isso se desenrolaria.
— …Engraçado. Palhaço, você acha que ele vai se importar com você se você o bajular o suficiente?
— Eu já sei a resposta para isso, então cuide da sua vida. Pshehe, que tal parar de choramingar e seguir com sua vez? Todo mundo está esperando por você.
O Veado respondeu às instruções arrogantes de Palhaço levantando-se silenciosamente de sua cadeira.
— O quê? Oh — Palhaço bufou — você também vai embora?
— Não vou ficar aqui e deixar que esse homem me use para seu próprio divertimento na esperança de que ele me jogue as migalhas da mesa no final…
— Então, apenas vá embora de uma vez — o Palhaço disse friamente. — Não perca mais nosso tempo.
O Veado encarou o Palhaço por um longo momento. Então, respirou fundo e falou. — Isso não era assim antes. — E com essa declaração enigmática, ele se foi.
Todos prenderam a respiração enquanto outro silêncio caía sobre a sala.
— Ahaha… as coisas ficaram estranhas de novo! — o Lobo disse, tentando quebrar o gelo, soltando uma risada constrangida. — Todo mundo se dava muito bem quando o Mestre estava aqui! Mas o que podemos fazer? Ele não está mais aqui.
Lá estava ele, trazendo o Mestre à tona como sempre.
— Estamos de alguma forma com dois membros a menos, mas vamos continuar. Não seria decepcionante terminar as coisas assim? Não poderemos mais nos encontrar assim no futuro…
— Em vez disso… que tal tentarmos a ideia que o Lua Crescente mencionou mais cedo?
A sugestão veio da Borboleta, que estava assistindo ao meu confronto com o Lua Crescente e o Veado como se fosse o melhor drama do mundo.
— Mas, nesta versão, não há pulos, precisamos ser honestos, não importa o que aconteça — ela continuou. — Ah, com exceção de qualquer coisa que possa revelar nossas identidades. O que acham? Acho que será uma boa maneira de aliviar o clima de novo.
— …Estou de acordo, mas ‘pode revelar nossas identidades’ não é um critério muito subjetivo?
— Quero dizer, temos a gema aqui, então qual é o problema? Se você se recusar a responder, tudo o que precisa fazer é colocar a mão nela e dizer algo. Então saberemos se você está tentando escapar de sua vez ou se realmente não pode.
— Você não deveria garantir que todos estejam a bordo primeiro? — A Rainha foi rápida em cortá-la e tentar colocar as coisas nos eixos novamente.
Os olhos brilhando através da máscara de Borboleta se estreitaram. — Heh, você está fazendo isso de novo, velha.
— …Velha?
— Se nada mais, posso dizer que você é mais velha do que eu, pelo menos.
Infelizmente, a Rainha não conseguiu argumentar com isso.
Ainda encarando a Rainha, a Borboleta tomou a iniciativa e direcionou todos a votar.
— Seis a favor e dois contra.
Surpreendentemente, a maioria das pessoas foi a favor do plano dela. Os únicos que votaram contra foram a Rainha e a Preta.
— Leão, você votou a favor…? Por quê?
— Pshehe, Rainha, você ainda não o conhece? É porque isso vai ser mais divertido!
Diversão não tinha nada a ver com isso. Eu simplesmente tinha algo que queria confirmar antes de deixar a Távola Redonda pela última vez.
Rainha suspirou. — Em qualquer caso, já que chegou a isso, aceitarei a decisão do grupo. Mas antes de começarmos, vamos esclarecer as regras.
A pedido da Rainha, tivemos uma breve discussão para acertar os procedimentos.
— Em resumo, na vez de cada pessoa, ela receberá uma pergunta de cada outra pessoa na mesa. Em seguida, ela decide qual pergunta deseja responder. Isso deve cobrir tudo.
— Quanto mais tempo vamos ficar enrolando? Vamos logo, vovó — provocou Borboleta.
— …Srta. Raposa, poderia começar?
— Sim. Claro.
Raposa assumiu o papel de responder com um aceno, e todos foram fazendo suas perguntas a ela.
— Lembro que você costumava ter muita fé no Mestre um tempo atrás… você ainda sente o mesmo? — O Lobo, como de costume, trouxe o Mestre à tona assim que teve a chance.
— Eu… vou pular. — o Goblin passou. Como alguém proficiente em todo tipo de truque, achei essa jogada dele muito decepcionante. Se ele realmente quisesse ajudar a Raposa, teria sido muito melhor transformar uma pergunta sem importância em algo relevante, para que ela pudesse respondê-la em vez das outras.
De qualquer forma, a maioria de nós, incluindo eu, passou, e no final, a Raposa recebeu apenas duas perguntas.
— Você parece saber em grande detalhe o que está acontecendo no Primeiro Andar do Porão. Você está lá agora?
— …Isso não revelaria minha identidade?
— Heh, mas como eu conseguiria descobrir quem você é quando há tantas pessoas?
— …Vou responder a uma pergunta agora. — Quando todos terminaram, Raposa escolheu uma das duas perguntas que recebeu. — Você perguntou se eu ainda penso no Mestre como uma boa pessoa.
— Oh, então você escolheu minha pergunta — Lobo resmungou, satisfeito.
— Minha resposta para você é ‘não’. Eu não sabia que o Mestre era Auril Gavis naquela época.
— Hmm… A única razão pela qual ele tem má reputação é devido à maldade da corte, mas entendo. Isso é decepcionante.
Com isso, a vez da Raposa terminou.
O Lobo recebeu um total de quatro perguntas.
— Vou responder à pergunta da Rainha. Sua teoria está correta. Sir Auril Gavis tem, sim, o poder de impedir o fechamento dos Caça-Fantasmas.
Meus ouvidos se aguçaram no momento em que ouvi isso.
“Isso não implica que Auril Gavis teve algo a ver com o fechamento do servidor…?”
Se esse fosse o caso, o que aquele velho estava tramando agora? Esse pensamento me incomodava, mas não havia nada que eu pudesse fazer a respeito no meu estado atual.
— Então, o próximo é o Goblin.
O Goblin recebeu mais perguntas do que a Raposa, mas menos do que o Lobo, e das três perguntas…
— E-Eu vou responder à pergunta da Srta. Raposa. O Grande Arcebispo da Igreja de Reatlas não tem muito mais tempo de vida. O próximo grande arcebispo será escolhido entre o grupo de jovens santos…
Embora isso pudesse ser considerado informação privilegiada, nenhum de nós estava realmente interessado. Era óbvio para todos que ele havia usado a pergunta da Raposa como uma saída para passar pela sua vez.
— Agora é a vez da Rainha, pshehe.
A Rainha foi depois do Goblin e recebeu o maior número de perguntas, cinco. Ela respondeu à pergunta que todos nós estávamos nos fazendo.
— Esse conhecimento provavelmente chegará aos seus ouvidos em breve, então direi aqui. Um certo item é necessário para manter esta dimensão espiritual, e esse item começou a perder poder lentamente.
— …É por isso que a comunidade está fechando?
— Sim. Procuramos uma maneira de consertá-lo, mas não conseguimos encontrar uma solução viável.
— Auril Gavis… Então, o que você está dizendo é que, se ele ajudar, seria possível reviver este lugar…
— Sim. No entanto, isso não parece provável.
Com isso, a vez da Rainha terminou. Pulamos a cadeira vazia do Lua Crescente e fomos para a Borboleta.
— Heh… mas alguém tem alguma pergunta para mim?
Esse era o verdadeiro motivo pelo qual votei a favor deste jogo de Verdade. Eu precisava de informações da Borboleta. No entanto, em vez de perguntar diretamente, fiquei de fora e esperei.
— Sim, tenho uma.
Como esperado, a Raposa levantou a mão imediatamente para fazer a pergunta em meu lugar.
— Você nos disse que Missha Karlstein é uma traidora… Quero ouvir mais detalhes sobre isso.
- Trabalho árduo e penoso, lida, canseira.[↩]