Após o fim do turno, Vastor e Thorman retornaram aos seus alojamentos. Vastor esperou até que estivessem sozinhos, antes de expressar sua hilaridade.
— Thorman, velho amigo, eu nunca imaginaria que você tivesse isso em você. Ajudar seu aluno desse jeito. Tecnicamente, isso é contra as regras. — O tom de falsa indignação de Vastor não enganaria nem um homem surdo.
— Eu não fiz nada disso. Eu só usei os feitiços que eu considerava melhores para a situação em questão. Se ela acabou me copiando, como isso é culpa minha? Você vai me denunciar? — Era uma pergunta retórica, Thorman já sabia a resposta.
— Você tá brincando comigo? Seu aluno acabou salvando o meu. O mínimo que eu poderia fazer é te dar de presente aquela garrafa de Blue Flame envelhecida de 50 anos que você fica de olho toda vez que entra no meu escritório. Fico feliz que você tenha afrouxado o pau no seu cu.
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Em um labirinto subterrâneo, a vários quilômetros de distância do castelo, outro tipo de conversa estava acontecendo. Depois de abrir caminho pelo ninho, Scarlett estava de frente para a Mãe da ninhada.
Era a criatura responsável pela taxa anormal de desova dos Clackers. Cada um deles era um de seus filhos. Seu abdômen era o de uma aranha gigante, com oito longas patas, mas no lugar da cabeça havia uma figura humana.
Era como se alguém tivesse anexado um humano, começando pelas coxas, ao corpo da aranha. Mas era um humano sem características distintivas, sua pele quitinosa era cinza, as mãos tinham dedos anormalmente longos terminando em garras afiadas como navalhas.
A cabeça tinha oito olhos e uma longa fenda onde supostamente ficava a boca, permitindo que falasse.
— Olha, estou cansado de brincar de esconde-esconde. Só vim aqui porque sei que você é inteligente o suficiente para me entender, e porque odeio destruição sem sentido. — Scarlett estava bastante irritado com os ataques repetidos que sofreu ao longo do caminho.
Eles não tiveram efeito algum, exceto desperdiçar o tempo de Scarlett.
— O que você quer, ó poderoso governante? — A voz da Mãe era baixa e rouca, cada palavra soava mais tossida do que falada. No entanto, ela conseguiu rir, zombando do título reivindicado pelo Núcleo de Escorpião.
— Pare de botar tantos ovos. Seus filhos são uma praga para a floresta, você já invadiu os territórios dos outros. Não vou me repetir uma segunda vez.
A Mãe da Ninhada riu novamente.
— É isso mesmo? Então eu te desafio, ó governante. A floresta precisa de uma nova mão guia…
Scarlett zombou, pois já tinha ouvido aquele discurso inúmeras vezes, tanto de humanos quanto de feras mágicas.
— Tudo bem. Desafio aceito. — A conversa foi interrompida, para grande aborrecimento da mãe.
Violando todas as regras do desafio, a Mãe da ninhada atacou sem aviso prévio, fazendo com que os Clackers totalmente desenvolvidos que guardavam a sala do trono, cada um do tamanho de um touro, coordenassem seu ataque.
O rugido do Núcleo de Escorpião atingiu em duas ondas. A primeira foi fria, transformando todo o ninho subterrâneo em um deserto congelado. A segunda foi ultrassônica, que transformou as esculturas de gelo recém-formadas em inúmeros pedaços quebrados.
— Oh! Eu ganhei. Grande surpresa! Vida longa para mim. — Triste por não ter testemunhado sua vitória esmagadora, Scarlett ligou para Linjos.
— O problema dos Clackers está resolvido. Com a Mãe da ninhada morta, os sobreviventes vão se esconder até que outro apareça. Vamos torcer para que o próximo tenha mais cérebro do que músculos.
— Obrigado por resolver o problema tão rápido. — Linjos respondeu.
— O que você quer em troca?
“Eu gosto desse humano.” Scarlett pensou. “Sempre dizendo por favor e obrigado, em vez de me tratar como uma ferramenta, como seus antecessores fizeram. Vou garantir que ele mantenha sua posição.”
— Digamos que você me deve uma. Qual é a taxa de sobrevivência dos seus filhotes?
— Melhor do que nos anos anteriores, cerca de 50% dos grupos passaram do primeiro dia. É hora de dar um gás.
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De volta à caverna, o grupo de Lith estava terminando o café da manhã e planejando o resto do dia. Todos tinham apreciado muito Visen criando um banheiro lateral na caverna.
Apesar de tudo ter sido supostamente um esforço de equipe, nem tudo pôde ser executado corretamente na frente dos outros.
Com tantas bocas para alimentar, o estoque de Lith não duraria mais do que mais três dias.
Usar magia queimava muitas calorias e esgotava tanto o corpo quanto a mente.
— Graças aos deuses você acabou no meu grupo. — Belia disse roendo o último pedaço de carne dos ossos. — Depois de jejuar por um dia inteiro, eu teria me rendido ou comido Visen.
Todos na mesa riram, menos Lith.
— Por que tão triste, companheiro? E falando sério, por que você guarda tanta comida para si mesmo? — Visen perguntou. — Não que eu esteja reclamando!
Lith olhou feio por um longo momento, antes de fechar os olhos e respirar fundo.
— Nós não somos ‘companheiros’, bastardo sortudo.
— Em ordem, não triste, invejoso. Porque claramente nenhum de vocês já passou fome. E a segunda resposta está ligada à primeira. Quando você sofre de fome por tanto tempo quanto eu sofri, você não se sente seguro a menos que tenha alguma comida com você o tempo todo.
Visen percebeu seu erro e tentou se desculpar, mas Lith descartou tudo como um acidente, prosseguindo para explicar o que eles poderiam esperar de bestas mágicas. Depois que ele deu a eles todos os pontos-chave de sua experiência, ainda havia algumas coisas a serem ditas.
— Nunca subestime uma besta mágica. Elas podem ficar presas a apenas dois elementos, mas podem usá-los de maneiras que só podemos imaginar. O tempo de conjuração delas é incrivelmente rápido, e para piorar as coisas, nossa destreza física não é nada comparada a elas.
— Eles precisam de apenas um golpe para nos incapacitar, ou pior. Meu conselho é sempre manter distância, e nunca jogar o jogo como eles esperam que façamos.
— Isso não significa que já estamos ferrados? Já perdemos nosso maior rebatedor. — Visen não estava muito otimista sobre a situação, e Belia também não.
— Perdemos apenas um membro. Nosso objetivo é sobreviver, não derrotar todos eles até a submissão. — Depois do dia anterior, Phloria havia se livrado da maioria de suas inseguranças, tornando-se mais decisiva.
— O principal problema é que, depois de refletir muito sobre isso, cheguei à conclusão de que nos separar foi um erro. Este é um exercício de grupo, ficar em uma caverna não vai nos levar a lugar nenhum. Vocês dois poderiam ter nos ajudado muito ontem.
— Não só Mirna poderia ter sido salva, mas vocês teriam ganhado experiência de batalha. Depois de lutar contra os Clackers, sinto que cresci muito como um Mago cavaleiro. Nenhum de nós entenderá verdadeiramente suas próprias habilidades sem colocá-las à prova.
— Concordo. — Lith entrou na conversa. — É por isso que eu te ensinei sobre como usar a primeira magia na natureza e sobre bestas mágicas.
— Isso, e porque senão você cairia sem me ensinar nada. As magias dos Magos Cavaleiros são algo que eu tenho que replicar o mais rápido possível. Mal posso esperar para ver do que esses dois são capazes.
— Além disso, descobri um buraco enorme no meu kit de ferramentas. Tenho que inventar algo contra um enxame de pequenos inimigos.
“E quanto a um enxame de grandes inimigos?” Solus perguntou.
“Nesse caso, minha única opção é fugir.”
— Além disso, gostaria de propor Phloria como líder de equipe. Para uma unidade inexperiente como a nossa, a defesa é mais importante que o ataque. O conjunto de habilidades dela nos fornece as melhores opções para parar e reagrupar. Sem mencionar que ontem ela provou seu valor.
— É uma maneira estranha de dizer: ‘obrigada por salvar minha bunda’. — Ela respondeu.
— Se estamos contando pontos, salvei o seu duas vezes. Primeiro do Cingy, depois do Ry. Você ainda está a um cu de ganhar o direito de se gabar. — Ele rebateu com um de seus poucos sorrisos charmosos.
A coabitação forçada, somada ao enfrentamento de tantos perigos juntos, ajudou o grupo a desenvolver camaradagem.
Apesar de todas as dificuldades, Phloria estava começando a gostar da situação.
Foi a primeira vez desde que chegou à academia que ela estava sendo admirada por sua habilidade, não por seu título nobre. Seus companheiros de equipe não esperavam que ela deixasse de se sentir melhor sobre si mesmos, eles estavam contando com ela.
Lith, em vez disso, não foi tocado nem um pouco. Para ele, foi apenas um contratempo temporário, algo com o qual ele teve que lidar, explorando esse tempo para recuperar suas habilidades sociais. Ele sabia que, com o tempo, seu comportamento de Senhor das trevas lhe faria mais mal do que bem.
O mundo era grande e desconhecido, ele precisava jogar pelas regras da sociedade e evitar conflitos inúteis. No grande esquema de seus planos, uma semana era apenas um ensaio.
Ninguém se opôs à proposta de Lith, ele já havia conquistado o respeito deles. Depois de ver Phloria carregando-o quase inconsciente, e ouvir a história deles, Visen e Belia não precisaram de mais provas do valor dela.
— Antes de sair daqui, aqui estão minhas ordens. Visen, você formará dupla com Lith, é melhor manter o ataque e a defesa de cada unidade equilibrados. Eu cuido de Belia. Segundo, troque o que você tiver em seus aneis de armazenamento de magia com suas melhores magias de último recurso.
— Até agora, nada mais funcionou, e as coisas pioraram muito rápido.
Tendo aprendido com seus erros do passado, Lith já estava preparado, então ele usou esse tempo para passar algo de sua dimensão de bolso para a de Phloria, deixando-a atordoada.
— Há algo definitivamente errado com sua cabeça. — Ela disse olhando para o sorriso frio dele, enquanto ele explicava sua ideia.
— Mas é tão errado ser bom.
A caçada matinal foi muito melhor do que no dia anterior. Indo na direção oposta do ninho dos Clackers, eles encontraram muito mais vida selvagem. Lith conseguiu disfarçar várias vezes a magia espiritual com magia do ar, reivindicando uma bela captura.
Phloria também ajudou, enquanto Belia e Visen se concentravam em encontrar plantas e frutas comestíveis, suas habilidades de caça eram zero, e os outros não podiam desperdiçar o precioso tempo de luz ensinando-os.
Movendo-se por tanto tempo na floresta, Sentar levou apenas algumas horas para encontrá-los e relatar sua posição.
— Tenho que me anunciar e agir sozinho como um idiota, de novo?
Cometer erros de propósito não incomodava o Cron, a menos que eles acabassem perdendo.
— Não. Novo dia, novas regras. Apenas um de vocês precisa ser localizado, os outros podem ficar quietos e coordenar seus ataques com vocês. — Scarlett respondeu.
— Uma luva está fora, vamos começar o segundo round!