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A claridade de um campo aberto iluminou meus olhos. Não era tão claro quanto as manhãs de sol que eu estava acostumada, mas não ter as árvores do pântano e da floresta tampando o céu cinzento fazia muita diferença.

— Sente isso, Amy? Esse ar puro do campo? — Greeta respirou fundo a minha frente.

Havíamos chegado ao lado de fora da floresta. Passamos por mais alguns animais no caminho, perguntei sobre todos eles, até sobre os que eu já conhecia, para juntar conhecimento.

Greeta fez questão de responder animadamente cada dúvida, dizendo quais animais eram os mais gostosos, o que sinceramente me incomodou.

— Ei, Amy, tô falando com você. Vamos lá, vai me dizer que não está com vontade de correr livre nesse lindo gramado? — Me olhou com ansiedade enquanto balançava a ponta da cauda no chão.

— Ah, sim, eu acho. — Correr nem me passou pela cabeça, mas de fato parecia uma boa ideia.

— Vamos então! — Pegou minha mão e começou a correr, me arrastando junto.

— Espera, não muito rápido! — Tentei acompanhar seus largos passos.

— Não vão muito longe! — gritou Cleiton, ficando pra trás com Ângela.

Olhei pra trás por cima do ombro por um instante, apenas para ver a dupla ficar cada vez mais distante.

Ao voltar a olhar pra frente, vi que estávamos para subir uma colina, com grama muito mais verde do que a dá floresta e algumas poucas rochas de diferentes tamanhos pelo caminho.

No alto da colina tinha uma árvore diferente das grandes árvores da floresta. Estava um pouco distante, talvez por isso surgiu em mim a vontade de chegar nela. Porém, não tinha certeza se conseguiria.

Enquanto subíamos a base da longa colina, passei a sentir minhas pernas doerem. Diferente da nossa primeira corrida, dessa vez não fiquei ofegante tão rápido, tinha certeza de que poderia chegar mais longe, mas o cansaço logo me alcançou.

Podia sentir o cansaço e as dores no corpo, assim como podia sentir também o ar entre mim e a árvore. O vento e a chuva contra meu rosto me lembravam vagamente a como era voar, embora diferente e, novamente, talvez até melhor que voar.

Era ótima a sensação da grama sendo amaçada sob meus pés, embora escorregadia, mas completava as boas sensações da corrida.

Os pés de Greeta amaçavam uma quantidade maior de grama, deixando pegadas para trás.

— Se prepara pra pular!

— O que? — Olhei pra frente, uma rocha não muito grande estava em nosso caminho.

— Um!

— Greeta, espera! Não sei se é uma boa ideia pular em uma subida.

— Dois! — Me olhou por cima do ombro, dando um sorrisinho. A rocha estava cada vez mais próxima.

— Greeta!

— Três! Pula! — Saltou por cima da rocha.

Sem ter o que fazer e sendo praticamente carregada pela mulher lagarto, pulei também, mas tarde demais.

Meu pé bateu na rocha e meu avanço foi interrompido. Minha mão escorregou da grande mão de Greeta e fiquei para trás.

— Amy!

O choque correu por todo meu corpo enquanto eu voava para frente e gritava, com os braços a balançar para direções aleatórias. No fim, dei de cara no chão.

— Você está bem? — disse sufocando uma risada.

— Estou. — Viro para ficar de barriga pra cima. — Mas você podia ter parado quando eu falei. Isso não teria acontecido.

— E que graça teria? — Riu.

“E que graça tem isso?” Respirei fundo e dei uma piscada longa. O céu continuava cinza quando abri os olhos e a chuva continuava a cair.

Era assim para onde quer que eu olhasse, exceto por um pequeno pedaço atrás de mim onde havia folhas em um galho no alto.

O rosto sorridente de Greeta foi aparecendo por trás de mim e tampou minha visão do galho. Sorri de volta antes de me sentar para ver onde estávamos. Ela se sentou na mesma hora.

Sem que eu percebesse, chegamos no topo da colina. A árvore estava logo atrás de nós marcando o final da corrida.

Olhando para onde viemos, Cleiton e Ângela vinham devagar, deixando a floresta atrás deles para trás. Era possível ver a extensão da floresta de onde estava, e era muito grande, indo até onde eu podia enxergar.

Era o mesmo com o campo que fazia divisa com ela. Eu podia ver até onde minha visão alcançava com a chuva tornando tudo cinza ao longe.

Havia alguns animais grandes que reconheci das fontes, vacas, animais de fazenda. Não os percebi enquanto corria.

Enquanto observava, um pequeno animal voador que lutava contra a chuva com suas asas laranjas chamou minha atenção ao passar por mim.

O segui com o olhar até a árvore, onde subiu para as folhas e se encontrou com outros iguais.

— Aquilo são borboletas. Não são tão gostosas.

— Até essas coisas fofas você já comeu?

— Experimentei… Oh!

Greeta parou de falar quando de repente uma… coisa surgiu do chão ao meu lado. Simplesmente surgiu, saltou para fora da terra e caiu em meu colo.

— O que é isso?! — Me assustei.

— Um slime selvagem apareceu!

— E o que eu faço?!

A criatura, se é que posso chamar assim, era uma bola azul translúcida um pouco maior que uma cabeça.

Ele tinha uma pedrinha bem pequena flutuando dentro e, fora isso, não tinha nenhuma característica além de ser gelatinosa.

— Fica tranquila, não morde. — Riu. — Tem um gosto ruim e ácido, não serve para comer. Mas são legais de esmagar.

— Que? Não vou deixar que esmague-o. — Abracei o bicho, slime, e o trouxe para o lado.

— Cuidado para você não esmagar então.

Estava apertando demais, mas só me dei conta quando meus braços o atravessaram.

— Greeta! O que eu faço?! — Meus braços estavam dentro do slime, quase tocando a pedrinha, senti um formigamento neles.

— É só tirar os braços.

— Mas não quero matá-lo.

— Então espera até ele sair.

— Está bem, vou esperar.

Então ficamos caladas esperando. Por quanto tempo? Quantos minutos? O slime mal se movia.

— Greeta.

— Sim? — Ela parecia estar aproveitando a situação. Um sorriso estava estampado em seu rosto e sua cauda se movia ritmicamente de um lado para o outro.

— Quanto tempo se passou?

— Alguns segundos.

— Essa tortura nunca vai acabar?

— Acabaria se me deixasse esmagar ele.

— De jeito nenhum.

— Então sofra. — Riu.

Revirei os olhos. Comecei a olhar para o céu. Meus braços já estavam cansados de continuar na mesma posição, e o formigamento só aumentava.

Era mais uma coisa diferente. Na verdade, várias coisas diferentes. O campo, as rochas, as vacas, borboletas, a vista em si, e o slime.

Ele foi a única criatura inferior que me tocou além de Greeta, Cleiton e Ângela. Cada toque foi diferente e todos muito diferentes do toque dos anjos.

Tudo era tão diferente. Não era como se eu não tivesse percebido antes, mas a cada nova experiência a minha situação ficava mais evidente para mim.

Eu estava num reino inferior. Estava e não havia previsão de volta para casa. Estava presa.

A conclusão veio junto a Cleiton que chegou em meu campo de visão.

— Vejo que fez um novo amigo.

— Fiz, mas já me cansei dele. Me ajuda, por favor.

— É, realmente não é bom deixar ele digerindo seus braços assim. — Se abaixou, pegou o slime com as duas mãos e o puxou, tirando-o de meu colo e de meus braços.

— Mas… era simples assim? — Olhei para Greeta que riu da situação.

Senti meu rosto corar. “Não acredito que ela não me ajudou, essa… essa bobona!”

Cleiton colocou o slime no chão. O bichinho rastejou um pouco, até começar a rolar, descendo colina abaixo.

— E lá vai ele. Slimes costumam aparecer muito em dias de chuva, alguns se alimentam de fluidos, então vamos ver uns bem grandes por aí. — Me ajudou a levantar.

Greeta, que estava acenando em despedida pro slime, também se levantou. Todos nós voltamos a andar num ritmo agradável.

No caminho, passamos por vários slimes de diferentes tamanhos, todos azuis, pulando, rastejando e rolando pelas colinas. Eram criaturinhas tão divertidas.

Não deixei Greeta matar nenhum deles. Ângela, por outro lado, chutou para longe alguns que entraram em seu caminho. Não ousei pedir a ela para parar.

A caminhada vendo a paisagem do campo com poucas árvores e rochas demorou um pouco. A chuva não deixava enxergar muito longe, mas era possível ver montanhas ao fundo.

Nosso destino, porém, não demorou muito para aparecer em minha visão. Casas surgiram na chuva ao longe, pequenas a essa distância, mas com certeza eram muito maiores de perto.

— Lá está, Antrus — anunciou Cleiton com uma pausa, mas imediatamente voltamos a caminhar após isso.

Antrus, segundo Cleiton, era uma vila humana, onde logicamente só viviam humanos. O que me decepcionava, pois eu queria ver um pouco da diversidade das grandes cidades que via nas fontes.

A vila recebeu esse nome em homenagem a um herói, Antrus, que no passado lutou para defendê-la da onda de demônios que invadiram o continente.

O que muitos não sabem é que Antrus não estava sozinho. Com ele estava um bardo que atende com o nome de “S”, e que esse bardo lutou como uma verdadeira fera ao lado do herói, mas deixou todo o crédito para ele, fazendo canções sobre ele que são cantadas até hoje pelo povo da vila.

Chegando na vila, era possível ver a destruição, mas Cleiton disse que a onda foi a muito tempo. Então por que as casas estavam parcialmente destruídas, sem telhas e com paredes caídas? E por que não havia quase ninguém nas ruas?

— Como não tem ninguém aqui para nos dar as boas vindas, sejam bem vindas as duas. Escutem, logo vai escurecer. Vou ajeitar um lugar para dormimos e amanhã cedo partiremos. Procurem algo pra fazer, Ângela vai com vocês. Certo?

— Certo. — Fui a única a responder.

Cleiton se afastou, indo mais a frente na vila. Ângela simplesmente saiu de perto de nós sem dizer nada logo depois.

— Espere, Ângela — chamei, mas não me deu ouvidos. Ela não falou uma palavra desde que voltamos a caminhar na floresta.

— Parece que somos só nós duas, Amy. — Greeta pegou em minha mão. — Mas não se preocupe, não precisamos daquela chata para nos divertir.

A ideia de diversão de Greeta me causava arrepios.

Eu devia ter deixado escapar uma expressão preocupada, pois Greeta fez beicinho e disse: — Eu não vou comer ninguém, tá legal?

— Eu não disse nada. Mas que bom.

— Vem. Vamos procurar alguns humanos que não fiquem assustados.

Começamos a andar devagar pela vila. Algumas pessoas nos olharam estranho. “Será que é por Greeta?”

As casas parcialmente destruídas continuavam a chamar minha atenção. Algumas pessoas estavam sentadas, outras deitadas no chão ao lado das moradias. Não me sentia bem vendo aquilo.

Chegamos à uma pequena aglomeração de pessoas em volta de uma única pessoa vestida de preto. Tanto eu quanto Greeta estávamos curiosas, então paramos para ouvir.

A pessoa de preto gesticulava e gritava: — É apenas o começo! Está escrito no calendário élfico! A Tempestade Eterna é a primeira das calamidades! Outras virão. Doenças; demônios; a Rachadura do Mundo; a Era dos Dragões; o Cometa do Destino. Está tudo escrito! E tudo por culpa do Anjo da Ruptura…

— Vamos, Amy. Não há nada para vermos aqui. — De repente, minha amiga me arrastou e começou a andar para longe. Eu não tive escolha além de segui-la.

— Espere, Greeta, o que ele estava dizendo? Todas aquelas coisas vão mesmo acontecer? E a culpa é minha?

— Esqueça isso. É apenas um daqueles loucos do culto dos vagantes. Eles falam um monte de mentiras para enganar as pessoas e fazerem elas cultuar as malditas criaturas. Nunca acaba bem.

— Criaturas? O que são esses vagantes? Isso não tem nada haver com o que eu fiz.

— Exato! Como eu falei, não se importe, são apenas loucos. Oh, vamos falar com aquela moça.

Ela foi rápida em mudar de assunto, mas aquilo não sairia tão facilmente de minha mente. Se tudo o que ele disse que vai acontecer for verdade, seja lá o que fosse, parecia ruim. Eu tinha que fazer algo a respeito.

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Olá, eu sou o TolrielMyr!

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