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Capítulo 23: Pesadelo (2)

“Onde eu estou?” Pensou Jihan. O Cenário que emergia diante de seus olhos era um de completa destruição, o céu vermelho carregava a fuligem e a faísca do fogo que circundava toda a floresta. Os estalos da madeira escaldante carregavam consigo uma sinistra voz que entoava um dialeto que Li nada entendia.

            — AMUM, QUI DISCEM IN TUDUS NUS, GRINDAR VEI RITURNER

            De forma hipnótica, o garoto era atraído pelo canto e  inconscientemente ia ao seu encontro. O ser, no topo de uma pedra pontuda, se dirigia a uma gigantesca multidão, milhões de goblins que esperneavam e gritavam um único nome.

            “Grindar?” se questionou. Após alguns minutos, Jihan já reconhecia um pouco do lugar onde estava. Na realidade, ele não tinha se movido, apenas o cenário que tinha se alterado. Dando alguns passos a frente para enxergar melhor a cerimônia, foi instantaneamente surpreendido, o encapuzado que realizava o encantamento se virou rapidamente na direção do garoto.

            — ONVESUR! CEPTARIM E VOVA!

            “Ele consegue me ver!?” Apesar de parecer uma ilusão, o brilho do olhar ameaçador que escapava pela escuridão do rosto coberto do feiticeiro fazia uma onda de calafrios escalar a espinha de Jihan. O monstro esticou a mão como se tentasse agarrar o pescoço do garoto, mas subitamente, seus dedos se desfizeram em uma espécie de fumaça preta, que voou em direção a Li.

            — Li!

            “Akemi?”

            — Li!

            No momento em que a fumaça iria alcançá-lo, Jihan abriu os olhos, tossindo fortemente. Seu rosto estava pálido, a boca seca e, como se tivesse febre, suava bastante.

            — Você está bem? — perguntou Akemi.

            — O que aconteceu?

            — O que quer dizer? Não aconteceu nada. É o seu turno da vigia, eu vim te acordar, mas parecia que você estava tendo um pesadelo.

            — Um pesadelo… sim… eu estava tendo um pesadelo — colocando a mão na cabeça, Li afirmou, mais para si mesmo do que para a mulher.

            — Enfim, você não me parece estar bem, quer que eu tome a próxima ronda?

            — Não… não, eu estou bem, descanse um pouco.

            — Tem certeza?

            — Não se preocupe, eu já estive em situações piores do que um pesadelo — disse Jihan, se levantando e sorrindo para disfarçar o cansaço.

            Akemi, ainda um pouco preocupada, viu Li se levantar, limpar a poeira de sua roupa e partir para realizar a ronda.

            — Fique de olho nele, do jeito que as coisas estão indo, o moleque vai se tornar um problema — Wang, que estava descansando ao lado da menina, sem abrir os olhos, avisou. — Ele parece ser um cara duro na queda, mas não podemos arriscar.

            — O Li vai ficar bem, você deveria se preocupar mais consigo mesmo — retrucou a Meio-Elfa. — Ainda está com a sensação ruim que disse mais cedo?

            — Não é uma simples sensação, é instinto! Algo não me cheira bem nessa história.

            — Vamos nos manter alertas.

            Em outro lugar, Jihan abria a mata fechada para revelar uma grande pedra pontuda no meio da floresta.

            — É aqui? Parece tão… normal?

            Além da grande pedra, nada ao redor parecia similar ao pesadelo que Jihan teve. Uma simples floresta, recheada de árvores altas e mata rasteira.

            SUISH*

            O som de algo se mexendo nos arbustos cortou o ar.

            — Quem está ai!? — gritou Li.

            Nenhuma resposta foi ouvida.

            “Foi impressão minha?” limpando o suor da testa, Jihan respirou fundo. “Tem alguma coisa errada comigo, como estou cansado depois dessa caminhada tão curta? Passei praticamente um dia inteiro andando da última vez e mal senti a fadiga”.

            Não tendo achado nada de mais, Li achou melhor voltar para o grupo, e assim o fez. Do chão, um pequeno par de olhos redondos observava o garoto ir embora.

            Quando a noite chegou, Jihan acordou os outros integrantes, na intenção de prepararem para a batalha.

            — Os animais estão agitados. O exército já deve ter começado a se mover — observou Akemi.

            — Já podemos começar então — anunciou Xu. Esticando ambos os braços para frente, partículas de energia começaram a se materializar no ar, o brilho rapidamente tomou forma de dois machados de uma mão.

            — O que você fez? — perguntou Jihan.

            A pergunta foi recebida com um olhar de surpresa.

            — Você realmente não sabe? Não te ensinaram nada antes de vir para cá?

            Lembrando-se da personalidade de sua treinadora, Li pensou que talvez ela poderia ter esquecido de alguns detalhes sobre o sistema de missões.

            — Você consegue invocar os equipamentos que possui nas instalações do centro de testes. Claro, existem limites, mas armas e consumíveis básicos são padrões — explicou Wang. — Tente, é só visualizar mentalmente.

            Acenando com a cabeça, Li estendeu as mãos e visualizou as Manoplas de Járngreipr, entretanto, assim que a luz começou a se formar, ela cessou.

            — Não conseguiu? — perguntou Akemi.

            — Não, eu consigo, mas estou bem no momento, caso seja realmente necessário, não vou ter problemas em manifestá-las.

            Akemi e Wang se olharam, mas não perseguiram o assunto.

            — Tudo bem, vamos começar, primeiro revisemos a estratégia — Xu pegou um galho no chão e começou a desenhar na terra. — Bator nos disse que o ninho do Rei Goblin possui 5 saídas, túneis retos que levam ao mesmo lugar. O que pode ser um problema, mas também uma vantagem.

            — Discorra.

            — Não vamos ser cercados facilmente, mas estaremos lutando num lugar fechado, em pleno território inimigo. Não podemos tomar esse risco — explicou o Albino.

            — Se não podemos ir até eles, vamos trazê-los até nós — comentou Akemi.

            — Correto, existe uma maneira moderna de lidar com ninhos de goblins — marcando um X em 4 das 5 entradas, Wang continuou. — Vamos selar parte das saídas e queimá-las, a fumaça deve entupir cada centímetro das passagens, e, como ratos, os monstros vão procurar a saída mais fácil — circulando a saída que restou, Xu concluiu — e é aqui que nós estaremos.

            — Parece um bom plano, entretanto como vamos criar uma queimada tão forte a ponto de fazê-los abandonar o próprio lar? — perguntou Li.

            Levantando e cerrando os punhos, Wang fez a temperatura do ambiente rapidamente subir. A mana de fogo acumulou ao redor do homem.

            — Material para combustível temos aos montes, estamos em uma floresta, afinal. E sobre o fogo… — Xu apertou o galho que estava em suas mãos, a madeira seca instantaneamente entrou em combustão — deixe isso comigo.

            A escuridão da noite rapidamente dominou os céus. Pequenos raios de luz conseguiam com dificuldade ultrapassar a copa fechada de árvores e, em meio as plantas rasteiras, três sombras se moviam em direções distintas, carregando troncos de madeira seca

            “Eu só preciso tapar as duas entradas daqui com essas madeiras velhas? Parece fácil…, mas…” Li levou uma das mãos ao rosto. “Por que parece tão difícil?”

            Fora alguns goblins que realizavam patrulhas em pequenos grupos de três, nenhum grande problema fora encontrado, o ninho parecia deserto, entretanto…

            “Que energia sinistra…” Pensou Akemi. “Que tipo de monstro é esse Rei Goblin para exalar um poder tão sombrio?”

            Após um curto tempo, as saídas laterais estavam finalmente tapadas, o trio se juntou na única que ainda estava aberta e tanto a Meio-Elfa quanto Jihan arrancaram um trapo de roupa e amarraram na ponta de um galho grosso. Wang então, estendeu ambas as mãos na direção das tochas improvisadas e, circulando a ponta dos seus dedos no ar, uma auréola de fogo começou a se formar. Assim que tomou o tamanho de um punho, o albino atirou-as nos tecidos amarrados, acendendo ambos simultaneamente.

            — HÁ! Não poderia ser diferente, esse elemento é perfeito para mim — comemorou Wang. — Agora vão! Não temos tempo a perder, queimem primeiro as entradas mais distantes e logo em seguida as mais próximas. Não demorem muito, ou teremos problemas.

            Ambos concordaram e rapidamente correram em direção aos respectivos alvos. Xu Wang encarou a entrada.

            — Esses desgraçados… são bastante inteligentes, já perceberam que tem alguma coisa errada — Xu empunhou os dois machados de uma mão, as lâminas rapidamente esquentaram, um brilho incandescente surgiu do metal. — Consigo sentir o cheiro desse lixo de longe.

            Uma dúzia de olhos surgiram na escuridão.

            — Podem vir vermes.

            A temperatura do ar explodiu subitamente.

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