Você não pode conquistar um homem livre, o máximo que pode fazer é matá-lo.
Teoria da Intenção ~ Sócrates
— Já se arrependeu pelos seus erros?
— Desde o primeiro dia, pai.
— Eu sei quando está mentindo, Xu Wang, não recomendo fazê-lo.
— Peço seu perdão, eu falhei.
— Pare com essa baboseira! — retrucou o homem. — Não peça perdão, não peça desculpas! Não consegue entender que essa sua fraqueza é o maior de seus problemas!?
Xu se calou com a gritaria do homem ecoando em todo o calabouço.
— Não investi tanto tempo em um fraco que choraminga suas decepções, quero a verdade, nada mais do que isso.
— O que o senhor quer que eu diga?
— Pare de pensar no que eu quero! Não é desse jeito que te criei, você tem o sangue dessa família, não me desonre dessa forma! — respondeu. — Vou te perguntar novamente, você se arrepende dos seus erros?
— Não…
— Mais alto!
— Não! Não me arrependi, nem por um segundo, eu precisava dele vivo!
— E por que? O que você viu naquele garoto que os meus olhos falharam em enxergar? Me diga!
— Ele é… interessante, vai me ajudar a ser mais forte, ele tem o que é necessário para que eu possa chegar ao ápice — respondeu Xu.
— Aquele moleque? — debochou. — Sua mente deve estar tão vendada quanto sua visão, qual logica te levaria a essa conclusão?
— Acreditaria em mim se eu dissesse que ele nunca havia sentido mana ate aquele momento? O senhor viu o que ele é capaz de fazer, derrotou todos os mercenários que o senhor colocou atrás dele, que preço deve ter sido pago para manipular aquele exame?
— Bem menos do que pensa.
— O que? — perguntou, surpreso.
— Teus olhos não falharam contigo… nós, deuses não interferimos nos testes, o preço a ser pago por tal interferência normalmente é muito mais pesado do que foi, a força do mundo em si nos cobra, mas nesse caso em especifico, é como se o moleque fosse uma anomalia… só não consigo saber o porquê.
— Então, por que me pediu para matá-lo?
— Foi um teste, não somente seu, mas também do moleque.
— Um teste?
— Caso ele morresse ali, a situação seria resolvida por si só, a constante aleatória iria ser eliminada, no entanto, se ele sobrevivesse, confirmaria minhas suspeitas sobre sua anormalidade.
— Pai, eu não entendo…
— Significa que você está certo, garoto — elucidou. — Uma anormalidade pode ter potencial 0, assim como potencial infinito. Ele irá crescer e se tornara uma fonte, uma que alimentara o seu crescimento, até que um dia você consiga engoli-lo por completo.
— Engoli-lo?
— Xu, grave isso na sua cabeça, nós somos uma família de imperadores, quando gostamos de algo, pegamos, quando lutamos por algo, ganhamos e quando queremos algo, nós temos! — disse o homem. — Jamais se arrependa de uma decisão! Jamais peça perdão! Jamais se ajoelhe!
— Sim, pai.
— Você é meu filho, um filho da fênix, levante-se e honre o brasão que carrega em seu corpo.
Wang ficou de pé, ainda amarrado pelas grossas correntes que o prendiam a parede.
— Ex Favilla Nos Resurgemus — disse o homem.
— Das cinzas nós ressuscitamos — respondeu Xu.
— Perfeito, venha, temos muito o que fazer — falou, passando pela porta da cela.
— Senhor, quer que o soltemos? — perguntou um dos guardas.
— Não há necessidade, ele nunca esteve preso.
BOOM
Do fundo da cela, pedregulhos e poeira voaram para fora e o barulho das correntes caindo no chão foi ouvido. Os guardas imediatamente olharam para dentro, enxergando apenas um par de olhos vermelhos brilhando na escuridão, o corpo do albino em si emanava luz flamejante para iluminar o caminho. Em seu peito, um brasão incandescente brilhava.
— Tomou um tempo para pensar em minha oferta?
Parado em frente ao homem com o mesmo rosto que ele, mas que possuía um longo cabelo branco, Li novamente era questionado.
— Ainda não tenho motivos para confiar em você.
“Urgh que moleque irritante!” pensou. “De uma forma ou de outra, é melhor que ele foque na conjuração, afinal, uma vez que eu tomar esse corpo vou precisar que ele já esteja acostumado à minha magia.”
— Por que não considera que sou apenas sua mente tentando te levar para o melhor caminho? — disse o homem. — Afinal, você já viu que eu não consigo te ferir fisicamente, não tenho como lhe fazer mal.
— Mas você tentou…
— Pelos deuses, o que posso fazer para lhe convencer de que quero ajudá-lo?
— Me diga o que quer em troca? — disse Li, após pensar um pouco. — Talvez eu sinta alguma verdade se você for sincero.
“Ele não vai acreditar em mim se eu continuar inventando desculpas… uma coisa que eu quero em troca…” pensou calmamente.
— Zilá.
Jihan arregalou os olhos ao ouvir o nome demoníaco de seu pai biológico.
— Como… sabe esse nome?
— Eu quero que você o destrua, queime suas partes e faça-o sofrer — disse o homem, cada uma de suas palavras carregavam genuína sinceridade, afinal, ele odiava aquele nome ainda mais do que Li. — Eu juro sob minha alma.
— Perguntei como sabe esse nome!?
— Ele era meu amigo, mas me traiu e se tornou um demônio — respondeu, juntando uma mentira no meio das verdades.
Dentro de sua mente, Jihan sentiu que aquela pessoa não estava mentindo, se imergindo nos próprios pensamentos, tentou entender a situação.
— Eu fui sincero, era o que você queria, foi o suficiente? — perguntou, depois de algum tempo.
— Qual o seu nome?
— Já te disse, eu sou você.
— Só me diga logo algo que posso te chamar — retrucou. — Se vamos passar por isso mais vezes, você tem que ter um nome…
— Um nome… Nasháh, me chame de Nasháh.
“Er… um nome difícil, combina com alguém tão excêntrico” Pensou Li.
— Se está dizendo isso, quer dizer que aceitou minha oferta?
— Eu vou tentar, se vir que não está funcionando, ou se perceber que você está mentindo para mim, ou qualquer coisa desse tipo, encerrarei tudo!
— Muito bem…
— Comecemos logo?
— Não, você voltara aqui mais tarde.
— Que? Achei que quisesse fazer isso o mais rápido possível.
— Não é escolha minha, já está na hora de acordar…
— Li! Acorda logo, você tá atrasado!
Abrindo os olhos, Jihan se deparou com a mão de Matheus estapeando sua cara.
— Já acordei, já acordei!
— Por Kali, como alguém pode ter um sono tão pesado… ahn? Que cara é essa? Não dormiu direito?
— Não… não, na verdade me sinto melhor do que nunca — respondeu.
— Então vá tomar um café, temos que nos apressar para o treino, já passou da hora.
Levantando-se rapidamente, Li lavou o rosto e se preparou para mais um dia de treinamento árduo nas mãos de Matheus e Prado. Andando pelos corredores de Arcadia, Li percebeu pela janela que a cidade de Anpýrgio estava cada vez mais movimentada, devido ao Torneio de Erebus estar cada vez mais próximo.
— É uma pena que o seu primeiro torneio vai ser aqui mesmo na cidade, seria incrível conhecer outros reinos, eu soube que a capital do Império Élfico é extremamente linda — disse Matheus.
— Pensei que todos os torneios fossem aqui.
— Acho que não te expliquei exatamente o que é esse torneio… — O homem levou a mão ao queixo pensativo. — Bem, acho que é bom começar com o início. O torneio é feito anualmente em diferentes reinos para celebrar a paz após a guerra secular há muito tempo atrás.
“Paz?” pensou Li.
— Acho que não tem sentido em explicar isso agora, não vem ao caso. O ponto é, esse ano completam 500 anos do fim e o nosso Rei propôs que o torneio desse ano fosse feito no Bastião Humano, Anpýrgio — explicou. — Dito isso… ouvi em um bar esses dias conversas sobre isso ser uma jogada política na intenção de dispensar o pensamento que existe uma animosidade entre a humanidade e as outras raças.
— Eu percebi, sinto que desde que cheguei aqui só me encontrei com humanos e nada mais.
— Outras raças não gostam de se misturar com humanos e é compreensível. Quando eu era mais novo passei meses estudando sobre as abominações que a humanidade fez com Elfos, Anões, Homens besta e todo o resto.
— Estou ficando mais curioso a cada vez que você fala sobre isso…
— Talvez não seja uma má ideia para você dar uma lida de vez em quando… por precaução.
— Vou manter isso em mente.
— Enfim, minha esperança é que depois desse torneio as coisas comecem a ficar mais tranquilas… além disso… espero que as outras raças comecem a se sentir mais a vontade por aqui — desejou Matheus. — Eu pessoalmente sempre me dei bem com os Homens Besta.
— Vai ser incrível! — Li animou-se ainda mais. — Não estava esperando que fosse algo tão grande, quer dizer que vou ter a chance de lutar contra e conhecer muita gente.
— São oponentes ainda mais difíceis que humanos, digo, cada um tem suas especialidades e fraquezas, mas se formos considerar apenas mana, os elfos tem bastante vantagem…
— Elfos…
“Me pergunto se ela vai estar aqui… talvez seja um desejo vão.” Pensou Li.
— Ei, que cara é essa? — Matheus percebeu que Jihan ficou repentinamente cabisbaixo — Perdeu o ânimo?
— Claro que não! Eu só… estava pensando em uma coisa…
— Esse é o espirito, vamos apressar o passo, Prado deve estar ficando aflito.
BUM
Em meio a uma planície deserta de terra e areia, sons de estouros podiam ser ouvidos a longa distância. Para quem estava mais perto, até mesmo o chão tremia, barulho esse que podia ser facilmente confundido com a explosão de bombas, quando na verdade, eram apenas passos. Passos de pessoas que carregavam pedregulhos de uma tonelada em suas costas.
— Quer dar um descanso? — perguntou o homem mais velho a outra pessoa.
— Consigo continuar mais um pouco… — respondeu a mulher.
Ter uma noção de espaço e tamanho é difícil quando não se tem um referencial. De longe, a impressão é que era um pai e uma filha adolescente carregando uma montanha de carga. De perto, a mulher de quase dois metros parecia uma criança perto do homem de mais de três.