“Aqueles que controlam o tempo não temem o futuro, mas o peso das escolhas que retornam como ecos do passado. A liberdade é um ciclo, e todo ciclo exige um sacrifício.”
— Misteriosos inscritos no templo da Adaga Arcana. Sem autor identificável.
A nova localização do Local Proibido vibrava intensamente, como se tudo ao redor, desde o solo até o ar, estivesse pulsando com vida, carregado por uma energia constante que fluía por canais invisíveis, interligando cada elemento daquele lugar.
Todos estavam em um momento de recuperação, respirando pesadamente após o perigo que haviam acabado de enfrentar. O alívio por terem escapado era evidente, mas o ambiente ao redor agora parecia ainda mais ameaçador.
Agora, tudo ao redor, desde o menor grão de terra até o próprio ar, vibrava com uma intensidade perigosa. Não era mais apenas um inimigo implacável a ser temido; todo o ambiente despertava um sinal de alerta.
O perigo parecia estar à espreita, latente, aguardando o instante exato para atacar, como se toda aquela energia vibrante do lugar estivesse apenas esperando para se manifestar de forma devastadora.
Embora não conseguissem compreender totalmente, todos sentiam que estavam imersos em um mar de fragmentos de realidades que colidiam e se sobrepunham, criando um espetáculo caótico e imprevisível ao seu redor.
Os rasgos na realidade, que todos reconheciam como portais para outras dimensões, estavam agora mais nítidos, talvez realçados pelas cores intensas desta nova localização do Local Proibido.
Cada bolha de coloração vibrante flutuava como uma cicatriz viva, conectando-se tanto ao ar quanto aos objetos sólidos daquela paisagem. Essas portas de entrada flutuantes para outras realidades pareciam ter vontade própria, surgindo e desaparecendo de maneira caótica e se ligando de forma imprevisível.
Os que haviam sobrevivido até aquele ponto sabiam que esses fragmentos não eram meras ilusões, mas portais para experiências essenciais, cujas consequências eram imediatas.
A cada realidade acessada, as vivências e suas repercussões moldavam o futuro, enquanto as realidades rejeitadas se desintegravam em explosões de energia destrutiva, deixando cicatrizes permanentes nas mentes de todos. Eram como sonhos ou pesadelos nunca realizados, que assombram nossas vidas e permanecem inacabados.
A pressão imposta por aquele novo local era esmagadora. Após os primeiros momentos de calma, portais começaram a surgir de forma incessante, transitando e se multiplicando ao redor. As bolhas de acesso a outras realidades pareciam preparar um ataque em massa, como se estivessem cercando o grupo.
Agora, eles precisavam escolher rapidamente quais caminhos seguir, ou seriam engolidos pelo próprio ambiente, que parecia impor suas escolhas. Os portais se fechavam sobre eles como uma rede. À frente, Harley liderava com cautela, contando com as linhas do destino para guiá-lo.
Ele sabia que o tempo estava se esgotando e que as esperanças de todos dependiam de suas decisões, a única chance de escapar daquele perigo iminente. O jovem olhou para os inúmeros rasgos de realidade que se aproximavam, e para as linhas negras, invisíveis aos outros, mas que guiavam suas escolhas.
As próximas decisões teriam que ser tomadas em frações de segundo, com cada novo passo exigindo uma escolha rápida, enquanto ele aguardava pelas realidades alternativas que surgiam diante dele. Sabia que cada portal perdido representava uma oportunidade descartada, mas uma dúvida persistente assombrava sua mente:
“Essas realidades estão realmente desaparecendo? Ou seriam apenas reflexos, aguardando o momento certo para retornar?”
O medo, silencioso mas constante para ele, era de que essas realidades perdidas se tornassem como desejos inalcançáveis, para sempre fora de seu alcance.
A Primeira Encruzilhada
Como bocas famintas prestes a devorá-los, os rasgos que davam acesso a novas localidades se aproximavam, expandindo suas aberturas. A cada nova fissura, era possível vislumbrar fragmentos do que se escondia do outro lado de cada portal.
Duas realidades se abriram como opções divergentes, e cada uma trazia promessas e ameaças. De um lado, um céu azul-claro, cortado por uma nave metálica que descia graciosamente. Sobre a rampa de desembarque, Solarium, a esposa do Cônsul, estendia a mão em direção ao grupo.
A nave, inconfundível, era o seu transporte particular, e a tentação era imediata. Ali estava a chance de resgatar sua esposa, algo que o Líder da Escola de Exploradores Interdimensionais não podia ignorar.
Do outro lado, uma tempestade se erguia no horizonte, suas nuvens negras rodopiando em um furioso vendaval. Relâmpagos cortavam a escuridão, e o vento, carregado com o cheiro de enxofre, arrancava árvores do chão como se fossem brinquedos. A ameaça era clara, e o confronto com aquela tempestade parecia quase suicida.
O Cônsul hesitou, seus olhos fixos na figura distante de sua esposa. A possibilidade de salvá-la era real. Ele podia simplesmente subir naquela nave, escapar e salvar a todos. O desejo de fazê-lo o consumia, mas também sabia que as realidades naquele lugar não eram confiáveis.
“E se essas experiências fossem reais? E se, ao escolher aquele caminho, ele arriscasse perder tudo? Poderia perder sua esposa para sempre?” — esse pensamento fazia o Cônsul hesitar, tomado pela dúvida.
— Eu não posso arriscar — murmurou ele, sua voz pesada com o fardo das responsabilidades — Se essa não for realmente minha esposa… Se algo der errado, eu a perderia para sempre. É melhor enfrentar a tempestade do que arriscar sua vida.
Harley assentiu em silêncio, respeitando a decisão do Líder da Escola de Exploradores Interdimensionais, embora fosse contra sua intuição e contra as linhas do destino, que não apontavam para aquele portal. Como esperado, ao tocar no portal, todos foram sugados para uma nova realidade junto com ele.
Mas, antes que desaparecessem, tiveram um último vislumbre do outro portal: a nave começou a desvanecer, enquanto a figura de Solarium explodia em uma luz branca cegante, dissolvendo-se junto com a própria realidade que a sustentava.
Quando a nave desapareceu por completo, eles já se encontravam na nova localidade, onde uma tempestade feroz tomou o cenário, engolfando o grupo em um turbilhão de ventos implacáveis e frio cortante. Em questão de instantes, suas roupas ficaram cobertas de gelo, enquanto o caos ao redor ameaçava consumi-los.
O Cônsul, mesmo mantendo-se firme em sua decisão, não conseguia esconder em suas expressões faciais a dor que o consumia. Ele havia rejeitado a única chance de estar com sua esposa.
“E se ficasse preso para sempre? E se jamais a visse novamente?” — o peso daquela escolha começava a assombrar sua mente.
A tempestade avançava com uma fúria incontrolável. As rajadas de vento uivavam, levantando detritos gelados, forçando o grupo a se proteger. Cada passo era uma batalha contra o vento, que parecia querer engolir a todos.
O gelo acumulava-se rapidamente, pesando suas roupas e congelando seus movimentos. A temperatura despencava a cada segundo, e Harley lutava para manter o foco.
— Sigam-me! — gritou ele, mas sua voz foi quase perdida no vendaval.
O Cônsul manteve-se erguido, o peso de sua escolha refletido em seu semblante. Ele havia aceitado a tempestade como sua nova realidade, e agora todos estavam presos nas consequências de sua decisão. Mas o perigo não vinha apenas da tempestade.
Enquanto lutavam contra o clima brutal, acabou percebendo que algo se movia nas sombras da tempestade. Criaturas deformadas, feitas de gelo, começaram a tomar forma, avançando lentamente em direção ao grupo. O Local Proibido estava reagindo à presença deles, criando novos obstáculos a cada passo.
— Atenção! — gritou Harley — Não estamos sozinhos!
As criaturas eram rápidas, suas formas mutantes se moldando ao ambiente de maneira inquietante. Lanças de gelo cortavam o ar em direção ao grupo, forçando-os a desviar constantemente enquanto lutavam contra o vendaval implacável.
Uma chuva de tiros ecoou dos rifles dos soldados, mas as balas eram engolidas pela tempestade, como se a própria natureza estivesse protegendo as criaturas.
— Não podemos enfrentá-las diretamente — gritou Milenium — Precisamos continuar avançando!
Eles seguiram adiante, enfrentando não apenas os elementos cruéis, mas também as criaturas implacáveis que surgiam das sombras da tempestade. O frio aumentava a cada minuto, mordendo suas peles e entorpecendo seus sentidos.
O cansaço começava a pesar sobre os ombros de todos, e Harley sabia que, se não encontrassem um novo portal logo, estariam condenados a sucumbir àquele inferno gelado.
As criaturas, à distância, pareciam quase intocáveis se confundido com o ambiente hostil. O gelo formava uma barreira natural, escudos translúcidos que bloqueavam os tiros dos soldados, enquanto os ventos ferozes desviavam qualquer projétil que se aproximasse.
“Só podemos combatê-las de perto!” — pensou Harley, vendo que a única chance de vitória era aproximar-se o suficiente para atacar diretamente.
— Preparem-se para o combate corpo a corpo!” — gritou o Cônsul, sua voz cortando o uivo da tempestade — Usem armas curtas! Pistolas e lâminas, nada mais!
O líder da Escola de Exploradores Interdimensionais sacou suas duas pistolas, uma em cada mão, seus olhos fixos nas criaturas que avançavam. Milenium, ao seu lado, fez o mesmo, suas pistolas brilhando sob a luz difusa do gelo ao redor.
As criaturas, sentindo que a batalha estava prestes a se intensificar, rugiram em uníssono. Elas aguardavam o momento perfeito para o golpe final, suas garras afiadas cintilando à medida que se preparavam para o ataque. Um dos monstros saltou sobre um soldado.
— Xiu!
A criatura decapitou o guerreiro em um único golpe, sangue e gelo misturando-se no ar enquanto o corpo sem vida caía ao chão. A brutalidade da cena fez o grupo hesitar por um segundo, mas apenas por um segundo.
“Não parem! Lutem!” — bradou o Cônsul, abrindo fogo com suas pistolas.
Ele derrubou uma criatura com um tiro preciso na cabeça, enquanto Milenium, ao seu lado, disparava sem piedade, perfurando o peito de outro monstro que se aproximava. Eles se moviam implacavelmente. Cada tiro contava, e as criaturas, ao verem seus irmãos caindo, avançavam com mais ferocidade.
Harley, por sua vez, empunhava suas duas adagas. Uma criatura saltou em sua direção, garras estendidas para dilacerá-lo, mas ele girou rapidamente, desferindo um golpe com uma das lâminas.
— Shhh!
O corte foi profundo, e a criatura soltou um grito agudo antes de cair no chão, onde finalizou o seu ataque com um golpe certeiro no pescoço. Ele não parava. Outro monstro se aproximou pelas costas, mas Harley, com reflexos rápidos, defendeu-se, bloqueando o ataque com uma adaga enquanto a outra atravessava o abdômen da criatura, destruindo-a.
O caos da batalha se intensificava. As criaturas, percebendo que o grupo havia se adaptado à sua tática, recuavam momentaneamente para depois atacar com mais furor.
Soldados caíam, mas os que permaneciam lutavam com tudo que tinham, pela sobrevivência. A tempestade rugia ao redor deles, tornando cada movimento mais difícil, mas a adrenalina pulsava nas veias de cada combatente.
Harley, após eliminar mais duas criaturas com uma série de golpes rápidos, sentiu um tremor no chão. Ele parou por um instante, ofegante, e olhou ao redor. As linhas do destino que ele seguia estavam quase desaparecendo, mas uma delas brilhava mais intensamente agora, levando-o adiante. Ele sabia que estava perto.
— Estou chegando… — murmurou Harley, mas para si do que para qualquer pessoa em particular.
Ele não precisou dar ordens nem olhar para trás; todos sabiam instintivamente que deviam segui-lo. Até aquele momento, o jovem havia se provado essencial para a sobrevivência do grupo, guiando-os por vários locais hostis.
Ninguém questionava sua liderança, nem sua inegável conexão com aquele lugar misterioso. Eles confiavam cegamente nele, pois sabiam que ele era a chave para escapar daquele pesadelo.
Harley se lançou à frente, suas adagas brilhando ao refletir o gelo das criaturas que haviam caído sob sua lâmina. Ele desviava com agilidade dos últimos ataques das feras que ainda resistiam, seus olhos fixos em um único propósito.
Cada passo o aproximava mais do destino que o aguardava, e, naquele momento, o frio cortante que congelava o ar e o cansaço esmagador que pesava sobre seus músculos já não faziam diferença. Nada mais importava.
Harley sabia que o fim estava próximo.
Subitamente, ele tinha chegado ao final da trilha que vinha percorrendo. As linhas negras transpassaram vários portais. Umas eram grossas, outras linhas pulsavam, mas o importante era que no meio da tempestade furiosa, finalmente os portais começaram a surgir, fragmentando a realidade à sua frente em fissuras luminosas.
Cada portal pulsava, como se estivesse vivo, convidando-o para uma escolha inevitável. Com as criaturas em seu encalço e com o aprofundamento da tempestade, ele não tinha tempo para refletir, pois uma coisa era certa: parar não era uma opção.