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1

            Ayasaka observou Tuphi se afastar enquanto bebia de sua caneca ainda cheia.

            — Muita gente aqui… — ela disse enquanto olhava em volta o mar de pessoas estranhas a seus olhos com conversas paralelas.

            Aos olhos de Ayasaka, a mulher encarava Tuphi de maneira amedrontadora. Seus olhos vermelhos levemente caídos junto de uma expressão ligeiramente suspeita deixava claro para Ayasaka que ela não era flor que se cheire.

            — Ela dá medo. Espero que a conversa de frutos.

            A mulher que sorria enquanto conversava com Tuphi olhou levemente para Ayasaka com os cantos dos olhos como se soubesse que ela estava a encarando mesmo que a distância entre as duas mesas fosse grande.

            Ayasaka desviou o olhar no mesmo instante com uma expressão assustada.

             Ela percebeu? Bom, talvez eu tenha sido burra demais de encarar a pessoa que minha parceira de crime foi interrogar.

            Ayasaka fingiu chamar a garçonete por alguns instantes, como se estivesse focada em fazer algum pedido em específico, mas logo desistiu de deixar sua mão levantada, já que era apenas para disfarçar.

            Espero que Tuphi esteja bem.

            — Esse lugar está livre? — Uma voz ecoa do lado esquerdo de Ayasaka repentinamente enquanto ela observava Tuphi conversar com a Xodik misteriosa com a mão apoiando seu queixo. Era uma voz profunda e máscula.

            Arrepios percorreram o corpo de Ayasaka a medida em que ela se virou na direção da voz nova que se dirigia a ela de maneira educada.

            Diante dela estava o homem que Tuphi observava mais cedo que acompanhava a mulher de olhos carmesins. Com olhos trêmulos, Ayasaka tentava manter a compostura e não demonstrar seu claro desespero diante do homem que apareceu sem fazer barulho algum diante de sua presença.

            — Vou assumir que esteja livre, com vossa licença… — O homem respondeu a si mesmo sua pergunta já que Ayasaka não esboçou uma reação, um pequeno descuido que ela mesma percebeu instantes após a interação.

            — É falta de educação tomar o assento próximo a uma dama sem sua permissão se não me falha a memória… não é mesmo? — Ayasaka em uma explosão de adrenalina retrucou o homem que dava facilmente duas vezes seu tamanho com a caneca em seu rosto na intenção de esconder o nervosismo.

            Isso Ayasaka! Assim você até parece uma protagonista! Continua assim! Pensou Ayasaka enquanto tentava não demonstrar seu nervosismo.      — …

            O homem observou Ayasaka de perto com olhos semi-abertos encarando-a como se estivesse diante de uma grande farsante.

            — Suas mãos de baixo da mesa.

            — O que tem? — Ayasaka olhou para baixo na direção das mãos, sem entender.

            — Estão suando, não estão? Você não para de esfregar elas para cima e para baixo.

            Ayasaka ficou assustada pois suas mãos não estavam no campo de visão do homem de barba grisalha, pelo contrário, suas mãos estavam de baixo da mesa enquanto ela esfregava ambas as palmas em uma tentativa de acalmar seu nervosismo.

            Ele… sentiu isso?

            — Isso é uma virtude.

            Ayasaka desviou o olhar por alguns segundos com um longo suspiro.

            — Não entra na minha cabeça como covardia pode ser considerado uma virtude.          

            — Talvez não isso, mas sim o fato de você mesmo tremendo, ser corajosa de tomar atitudes. Essa braveza não é fácil de encontrar por aqui. 

            — Uma burrice sem precedentes bater boca com um indivíduo mal-encarado como você e ainda debochar da sua cara, realmente compreendo.

            — Antes fosse, mas quem liga? Você tem garras garota. Gosto assim.

            Ayasaka continuava com seus olhos focados em Tuphi enquanto conversava com o cavalheiro com cicatrizes em seu rosto. Era uma expressão um tanto fria vindo de Ayasaka, algo que ela tinha noção e tentava manter ao longo do diálogo para disfarçar seu nervosismo.

— Não se preocupe, acredito que sua amiga não corra riscos no momento. — O homem olhou na direção de Tuphi e da mulher misteriosa também. — Ela não é de atacar assim, não quando tem um de seus objetivos em jogo.

Ayasaka ficou em silencio escutando o que o homem tinha a dizer em relação a sua parceira mal-encarada.

Objetivos em jogo…?

— Sim. Não é sempre que um Cavaleiro de Dragão aparece na cidade… entende?

            Ayasaka olhou para o homem com os cantos dos olhos enquanto uma sensação de arrepios percorria sua espinha junto de um frio na barriga enquanto o homem falava a palavra “Cavaleiro de Dragão”.

             — Cavaleiro de Dragão por aqui…? — com um blefe bem dirigido, Ayasaka desvia da acusação indireta.

            — Cavaleiros de Dragão não são vistos a séculos junto da existência da Ordem e a queda dos últimos Maiores. É realmente uma raridade alguém entrar em uma Taverna com o fedor forte de um dragão.

            Fedor de dragão? Ayasaka pensou em uma resposta a medida em que as acusações se tornavam mais pessoais.

            Eu estou fedendo a dragão? Como?! Nem Tuphi sente cheiro algum… e esses dois conseguem sentir…?!

            — Não sei se consigo compreender seu tom, por acaso seria algum tipo de acusação, senhor?

            O homem riu com a resposta curta de Ayasaka, na visão dele a garota era ousada e mesmo com todos os medos e inferioridades que estava claro que ela achava que sentia, ainda sim tinha uma personalidade forte.

            — Hahahaha! Gostei de você. — O homem disse com um forte soco que fez mesa e suas bebidas pularem.

            O som repentino do impacto assustou Ayasaka que recolheu levemente os ombros por uns segundos.

            — Que bom — ela respondeu sem dar muita importância.

            — Quer que eu te conte sobre Yuna?

            — Então o nome daquele monstro é Yuna?

            — Sim, e ela é como você.

            Ayasaka olhou de canto para o homem, e cruzou os braços sem uma resposta.

            — E você, quem seria?

            — Ravalut, um dos Dez Caçadores das Terras ao Norte.

            — Dez Caçadores das Terras ao Norte…?

            Esse nome não me é estranho.

            …eu conheço…?

            —————————–

2

            — Ravalut! Eu peço que recuem. Eu não quero matar vocês.

            Uma garota com longos cabelos manchados de branco de pé com uma grande lâmina branca que arrastava no chão olhava para cima, cercada por dez indivíduos a observando de copas de arvores.

            Ela vestia um longo manto azul que balançava no vento da planície azulada. Um de seus braços parecia desigual, era envolvido por completo por faixas brancas com selos do que pareciam escrituras envolvidas em algum tipo de selamento.

            Seus olhos estavam tampado por uma venda que possuía o símbolo de uma flor e uma lua em branco no meio.

            — Você está cercada por todos os Dez Caçadores da nova geração, desista. Viemos pela recompensa de sua cabeça, garota!

            — Essa recompensa existe a quanto tempo já? Um ano? Desistam, pouparei a vida de vocês…

            O braço enfaixado da garota parecia se contorcer a medida em que ela se recusava a atacar. Era nítido que ela o segurava enquanto sua mão enfaixada tremia involuntariamente.

            — O braço demoníaco então não é lenda, chefe.

            — Os Dez Caçadores estão com três novos integrantes, ao total, já foram seis substituídos por novos mercenários se contar com os três que Emiko matou e os três que eu matei — Uma flor de raxy reluzia sobre a cabeça da garota que falava em um tom calmo — Neste momento, minha força é superior a dos quatro Cavaleiros Originais juntos, não tenho interesse em ceifar vida de pessoas fracas. Minha intenção é trazer um mundo melhor a todos, e isso inclui malfeitores como vocês.

            Uma esfera preta flutuante se materializou ao lado do ombro da garota. Não era certo o propósito da esfera misteriosa, mas ela continua ali, flutuando em sua própria orbita.

            —  Quem você está chamando de fraco?! —  um dos dez avançou na direção da garota, quebrando a tensão do momento apontando seu enorme machado para baixo.

            Em instantes, o rosto da garota estava manchado de sangue e sua espada de lâmina branca pingando a medida em que o homem mal-encarado caia antes de tocar no chão.

            — Alguém viu algo?

            — Eu não vi nada!

            — Essa garota é uma divindade…?

            Ravalut levantou a mão esquerda e pôs ordem no bando que engoliu seco ao ver a garota com a espada ceifar a vida de um de seus companheiros em um piscar de olhos.

            — A batalha será nossa. Acredito que essas terras amaldiçoadas das pessoas das Terras Sulestes não se importarão de ter um sangue ruim como o nosso derramado por suas entranhas.

            — Pois bem.

            A aureola por cima da cabeça da garota vendada sumiu junto da esfera que flutuava ao seu lado que também desapareceu a medida em que ela suspirou.

            O homem voou em sua direção com um grito de guerra junto do resto de seus capachos que também aproveitaram a oportunidade para atacar a Cavaleira em um golpe surpresa enquanto ela calmamente abaixava sua venda que cobria seus olhos.

            —————————————-

3

            — Acredito que eu não te conheça, nem você nem a sua trupe, sinto muito.

            — Não são todos que nos conhecem. Mas não se preocupe, isto facilita nosso trabalho.

            — Imagino o tipo de trabalho que vocês possuem.

            — Muitos trabalhos diversificados, se é que me entende.

            — Na minha época chamamos isso de ladrão.

            — …na sua época é?

            — Ué, você não acabou de me chamar de Cavaleira de Dragão? Segundo você, aparentemente eu estou com cheiro de dragão, não estou? Vou esconder o quê? Se você veio para me matar, fique à vontade, não sou forte.

            Ayasaka seguiu dando um grande gole em sua caneca, sem parecer se importar.

            Ela não estava errada em seu julgamento sobre si mesma, não era uma frase na intenção de se autodepreciar ou coisa similar, na verdade, a realidade de Ayasaka naquele momento atual, era que ela facilmente perderia para qualquer um no recinto em uma simples briga de bar.

            — Então você realmente é uma Cavaleira de Dragão…?

            — Hum? Você já sabia, não? — Ayasaka olhou sem entender para o homem que balançava a cabeça negativamente e dava risada.

            — Linda garçonete, por favor! Mais duas! Hahaha!

            — Eu não bebo — Ayasaka comentou.

                Algum tempo depois, a garçonete chegou com duas belas canecas de madeira, cobertas por uma espécie de cerveja de sevada.

            — Agora bebe! — O homem empurrou uma caneca na frente de Ayasaka, que a segurou com uma cara feia.

            Ayasaka com uma cara feia, molhou a ponta de seus lábios com a caneca que transbordava a espuma característica de uma boa cerveja artesanal.

            — No fim das contas você é diferente do que eu esperava.

            Ayasaka olhou desentendida para o homem que a analisava.

            — Decepcionado?

            — Talvez seja isso. Não esperava que a única Cavaleira de Dragão da atualidade além daquele moleque esquisito fosse uma criança. Apesar de que se parar para pensar, vocês não tem uma diferença tão grande em idade física. Ele deve ter em torno da sua idade. Pelo menos eu digo o corpo físico daquele maldito.

            — Não sei de quem você está falando e tenho raiva de quem sabe

            O homem riu da resposta curta sem olhar para frente de Ayasaka.

            — Respondendo a sua pergunta, observe a mão de Yuna, aproveite que ela não está olhando para cá, vá, vá.

            Ayasaka olhou imediatamente para a mesa que estava as costas do homem largo, onde Yuna estava sentada com Tuphi conversando. A conversa não parecia estar sendo muito confortável aos olhos de Tuphi.

            — O que tem?

            — Vê algo de incomum?

            Ayasaka olhou a mulher de cabo a rabo em silêncio, mas não viu nada que merecesse ser comentado de diferente em sua aparência. A mulher, no mais era uma mulher esquisita aos seus olhos. Esquisita e elegante.

            — É um caso à parte, mas… vê a marca em sua mão esquerda?

            Ayasaka olhou com atenção a mão da mulher após o comentário de Ravalut. Era uma mão esbranquiçada e esguia, de unhas pintadas, era notável uma certa vaidade em Yuna, uma mulher certamente de classe que destoava com o ambiente a sua volta.

            — Ah, aquilo? — Ayasaka notou um símbolo do que pareciam duas asas por cima da mão direita de Yuna. O símbolo parecia apagado, fraco.

            — Aquilo é um Pacto de Dragão, O de Yuna é uma exceção maldita, porém resumidamente: É o voto de sangue que é feito entre um dragão e seu cavaleiro quando eles se encontram. É como se fosse duas almas destinadas a um propósito juntas. É assim que se identifica um Cavaleiro de Dragão, logo, eu não conseguia afirmar que você é uma Cavaleira, garota ­— O homem mais uma vez, riu das reações de Ayasaka a suas falas.

            Eu e Fos não temos isso…

            — Por que o dela está apagado…?

            O homem depois de se arrumar na cadeira, continuou:

            — Eu disse, Yuna é uma exceção, pois a marca de um Pacto de Dragão desaparece por completo após a morte do mesmo, já que um Cavaleiro e um Dragão com um pacto formado, compartilham a mesma alma… então, no caso… ambos morrem.

            Ayasaka engoliu seco por alguns instantes antes de responder.

            — Entendo.

            — A marca de Yuna não desapareceu por completo quando ela brutalmente assassinou seu dragão a sangue frio.

            Ayasaka mudou sua expressão sem querer para algo aterrorizado quando ouviu o homem dizer que Yuna assassinou o próprio dragão. Por mais que Ayasaka não possuísse muitos momentos com seu dragão naquela altura ainda, ela sabia o peso que ele tinha em sua vida, e aos poucos os laços entre ambos cresciam como se fosse de companheiros que se conheciam a anos.

            — Assa…ssinou?

            — Sim. Yuna é o trunfo obscuro dos Xodiks. Uma arma criada para matar em uma época que não sabiam as consequências de destruir a mente de uma criança para transformar ela na arma de guerra perfeita.

            Ayasaka observou Yuna enquanto o homem falava e um sentimento repugnante lentamente tomava conta de sua consciência. O homem observou os punhos de Ayasaka fechar a medida em que seu olhar fitava a mulher.

            — A especialidade de Yuna é cortes. Cortes de todos os tipos, laterais, horizontais, transversais. Pouco se importa a direção que vem o corte, são indefensáveis.

            — Cortes… indefensáveis? Que medo. Ela usa uma espada? Adaga? Não vejo nenhuma arma a acompanhando.

            — Yuna é uma Mestre de Feitiço Xodik. Ela foi abençoada com uma dadiva sobrenatural até mesmo para os Xodiks… uma dádiva chamada de Corte Celeste, um Destino Sagrado.

            Yuna não parecia se importar com o bate papo sobre suas dádivas e segredos, pelo contrário. Yuna estava focada em tirar o máximo de informações da Lobian a sua frente que conseguisse, informações sobre Ayasaka.

            — O Corte Celeste é uma dádiva hereditária que banha um membro da família real Xodik a cada geração. Yuna é o único registro de moderno de um Xodik com essa dádiva. Todos os outros foram em épocas esquecidas pelos mortais e castigadas pelas Divindades.

            O homem olhou para o lado na direção do vazio entre duas mesas próximas onde duas pessoas bêbadas repousavam apoiadas.

            — O Corte Celeste por si só é uma das magias mais letais que já existiram em Ataraxia, e algo que nunca pôde ser replicado sem um Destino Sagrado que o corresponda, caso tenhas tentado, a morte era a única certeza.

            Ravalut colocou quatro pães mal-acabados sobre a mesa em silêncio, Ayasaka o acompanhou com seu olhar desconfiado.

            — Um Usuário de Corte Celeste é um oponente bem temido e conhecido pelos ventos que rodeiam todas as terras conhecidas pelo homem, isso é um fato.

            O homem colocou dois dos quatro pães de pé, e continuou segurando-os com a mão.

            O Corte Celeste é um ataque considerado de Nível Calamidade. Os ataques de Nível Calamidade derivam do raxy em seu estado natural, mas são também considerados forças naturais. Em outras palavras, é como se a própria natureza e suas leis primordiais se voltassem contra você.

            Com uma faca em mãos, o homem cortou os dois pães que segurava com a outra mão ao meio.

            — Por mais que o corte seja quase um ato divino, com o passar do tempo em épocas de guerras e necessidades variadas, as outras nações opostas aos Xodiks apresentaram seus únicos métodos de como lidar com o Corte Celeste, desde esquivos, teleportes, e até mesmo magias de bloqueio não tão eficazes. Um bom exemplo foi Hiyamari, a Princesa da Lua, uma das campeãs dos Sens e sua capacidade de se teletransportar no campo de batalha.

            Com os pães traçados ao meio, o homem continuou:

            — O Corte Celeste se consistia em um único golpe indefensável na horizontal por vez, se acertasse o inimigo, era morte certa, porém se errasse, o usuário de Corte Celeste não poderia reutilizar o feitiço tão cedo, sendo obrigado a compensar o curto espaço de tempo em combate sem poder utilizar de seu golpe com outra habilidade a altura.

            A faca que representava o usuário de Corte Celestial na mão do homem se dobrou em seu próprio eixo sozinha, deixando Ayasaka surpresa com tamanha força.

            — Yuna com pouco tempo de treino de magia com os melhores Mestres de Magia Xodiks conseguiu dominar plenamente o Corte Celeste. Aos treze anos, os feitos da Cavaleira de Dragão Xodik que dividia montanhas com seu Corte Celeste que ressoava de sua flauta se espalhou diante das quatro terras. E logo seu nome foi adicionado a cantos de bardos por tavernas memoráveis e quentes por toda Ataraxia.

            — Me parece uma história bonita e normal de uma heroína até o momento — Ayasaka comentou dando de ombros.

            — Até Yuna usufruir do Corte Celeste pela primeira vez para ceifar uma vida de um companheiro Cavaleiro de Dragão também. Existia uma equipe composta de Yuna e seu aprendiz Cavaleiro de Dragão na época de seu auge, onde ela defendia terras Xodiks de invasores, e malfeitores que desejavam eliminar a usuária do Corte Celeste.         

            Ravalut olhou nos olhos de Ayasaka e continuou:

            — Antes disso, curiosamente Yuna nunca havia utilizado do Corte Celeste para ceifar a vida de alguém, pelo contrário, ela utilizava o Corte Celeste de distração, para conseguir realizar golpes surpresas com sucesso em seguida…, mas, por algum motivo, não foi o caso do que aconteceu naquele dia em questão. A história sobre o assassinato de um Cavaleiro de Dragão da ordem por um dos Quatro Maiores se espalhou na velocidade de orvalhos diante de gramas molhadas na manhã mais fria no pico dos vales montanhosos nas Terras ao Sul, uma série de assassinatos de Cavaleiros de Dragões começou, e todos os assassinatos aconteciam da mesma maneira, todos com resquícios da magia de Yuna, o Corte Celeste. Logo a Ordem dos Cavaleiros tomou ciência dos até então recentes acontecidos e imediatamente exilou Yuna da ordem, junto de uma execução eminente dela pelas mãos da Cavaleira de Dragão mais forte que já existiu, Emiko.

            — Emiko…?!

            ­­— Estudos nos cadáveres da trilha sangrenta de Yuna em seu caminho pela Ordem dos Cavaleiros mostraram que o seu Corte Celeste, aos poucos, estava se modificando.

            — Ué… o Corte Celeste não era sempre o mesmo?

            — Um Destino Sagrado é imodificável. Yuna não conseguiria o alterar. Principalmente algo hereditário como o Corte Celeste.

            O homem suspirou e deu de ombros, como se nada pudesse ser feito em relação ao que ele iria falar naquele momento atual.

            — Aí que entramos em sua especialidade, Yuna é uma mestre em Contratos de Sacrifício. Yuna, se apaixonou por cortar pessoas ao meio, mais em especifico, Cavaleiros de Dragões.

            Para Yuna, os cortes determinam quem é capaz.

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             Yuna, temos cinco Cavaleiros da Ordem nos seguindo.

            — Eu sei…

            Uma garota de longos cabelos negros estava montada em um dragão igualmente negro cortando as nuvens clareadas pelo luar Turquesa dos campos antigos de Ataraxia.

            A medida em que o dragão subia em uma espiral para os ares rarefeitos da noite, o olhar de concentração de Yuna focava-se cada vez mais apenas na sua frente. Os dragões menores que perseguiam a dupla tinham dificuldades de fazer os mesmos movimentos que o grande dragão negro de Yuna, cuja sombra cobria casas nas regiões populadas abaixo de onde acontecia a batalha de Cavaleiro de Dragões.

            Com um balançar de mãos, um dos dragões que perseguiam Yuna e seu dragão foi reduzido a uma nuvem vermelha de carne fatiada que não havia tido nem tempo de memorizar uma forma que arremetesse o seu corpo antes de cair no meio das árvores em esquecimento no meio da floresta.

            Yuna limpou o sangue que escorreu de seu nariz no momento que lançou o feitiço contra o dragão, e continuou ofegante:

            — Menos um…!

            Yuna, isso foi um contrato?

            —…

            — Eu não tenho o que fazer no momento, Asael! O Corte Celeste não será suficiente para matar todos eles. Eles já conhecem o Corte!

            Yuna esperou Asael ganhar uma certa atitude novamente, dessa vez, de pé sobre sua cela. Ela aguardou, equilibrando-se em suas costas enquanto a marca do Pacto entre os dois brilhava na escuridão em sua mão em um brilho carmesim forte.

            Com as mãos juntas, Yuna pulou de Asael na escuridão abaixo, no meio dos quatro dragões restantes.

            — Transversais…

            Os dragões cuspiam fogo e tentavam acertar Yuna, que caía de olhos fechados no meio deles.

            — Diagonais…

            Feitiços iluminavam nas nuvens escuras carregadas de água à medida que Yuna se defendia e continuava a recitar seu Contrato de Sacrifício.       

            — A direção dos cortes não me importa mais. Os campos de batalha apreciam essa violência.

            Yuna abriu seus olhos vermelhos e a vista da parte de baixo dos dragões encheu seus olhos no momento.

            — Com um corte, é dó.

            O barulho de lâmina cortando o ar foi estrondoso no meio das nuvens.

            — Com dois cortes, eu mato assim.

            A marca em sua mão brilhava intensamente, refletindo o fogo dos dragões. A energia acumulada ao seu redor era palpável, e a atmosfera parecia vibrar com o poder do sacrifício iminente. Yuna respirou fundo, sentindo o peso do próximo movimento.

            — Pelo sangue derramado e pela dor suportada, eu ofereço uma memória querida em troca do poder necessário para trazer o caôs e os cortes malditos que acabarão com este mundo a vida.

            Com um movimento rápido e preciso, Yuna tocou sua própria têmpora, sentindo uma dor aguda atravessar sua mente. Uma névoa negra emergiu de sua cabeça, carregando consigo uma memória preciosa, apagando-a completamente de sua mente. A magia antiga aceitou o sacrifício, e um vazio momentâneo a preencheu.

            — Que minha luz interna ilumine os caminhos da destruição! — gritou Yuna, enquanto a energia do sacrifício a envolvia completamente.

            Num golpe final, Yuna lançou uma série de cortes precisos e devastadores com o Destino Sagrado do Corte Celeste, o Destino parecia emitia um som tenebroso a medida em que continuava atingindo os dragões em pontos vitais. A magia potenciada pelo seu sacrifício rasgou os corpos dos dragões, extinguindo suas vidas em um instante. O céu, antes iluminado pelo fogo e relâmpagos, ficou em silêncio, com as nuvens se dissipando lentamente.

            Yuna pousou nas costas de Asael que a pegou no ar em sua queda, sentindo a falta daquela memória que agora a acompanhava. Mesmo com o mundo ao seu redor em silêncio, um sorriso satisfeito apareceu em seu rosto. Ela havia vencido, mas a um custo terrível.

            — Asael, a batalha está ganha! — disse Yuna com sua mente, transmitindo o pensamento para Asael.

            Asael assentiu, sentindo a mudança na presença de sua mestra.

            — Você pagou um preço alto, Yuna. Espero que tenha valido a pena. — disse Asael, sua voz carregada de preocupação.

            — Foi um preço necessário. A vitória exige sacrifícios, e eu estou disposta a pagá-los. — respondeu Yuna, determinada, enquanto sentia o calor de Asael ao seu lado.

            O que será que foi a memória de sacrifício…?

            O último dos cinco dragões tentou emboscar Yuna alguns quilômetros abaixo, perto de uma floresta montanhosa. Sons de explosões e rugidos ferozes ecoaram pelas copas das árvores, fazendo pássaros voarem assustados de seus ninhos. A vegetação ao redor tremia com cada impacto, as folhas caíam como chuva.

            — Vamos, morra!

            O barulho de uma grande lâmina rasgando o ar tingiu o ambiente, seguido de um rugido agonizante de uma fera grande. Instantes depois, Yuna estava sendo segurada pelo pescoço por um cavaleiro com um símbolo branco em sua túnica. Seus olhos, dilatados e febris, misturavam ódio e desespero.

            — Você…! O que você fez?!

            — Eu ven…ci. — Yuna respondeu sem ar enquanto era segurada pelo pescoço com punhos firmes pelo cavaleiro, que tinha olhos trêmulos, como se estivesse à beira de um colapso.

            — Você… você cortou meu dragão ao meio…?!

            À medida que o cavaleiro se dava conta do que aconteceu, jogou Yuna no chão e correu em direção ao seu dragão, que estava caído não muito longe de onde eles se encontravam. O sangue da criatura encharcava o solo, suas escamas brilhantes agora opacas e sem vida.

            — Você morrerá em instantes também — Yuna comentou, passando a mão em sua garganta, sentindo a dor latejante do aperto. — Por que seu esquadrão aceitou a missão de matar um dos Quatro Maiores…? Que patético! Hahahaha!

            A risada de Yuna ecoou pelos galhos e árvores quebradas, resultados da batalha que aconteceu ali. O Cavaleiro de Dragão, ajoelhado ao lado dos restos mortais de seu companheiro, chorava incrédulo, não se importando com a aproximação de Yuna.

            — Ei, que chato. Você não tem um Pacto de Dragão? Eu fiquei sabendo que era possível, mas não sabia que existia Cavaleiros da própria Ordem que não possuíam… Por isso você não morreu, né? — Yuna comentou, ostentando a marca em sua mão. A marca carmesim brilhava sinistramente contra sua pele pálida. — Isso é um insulto diante de um dos Quatro Maiores.

            Em uma explosão de adrenalina momentânea, o cavaleiro levou sua espada em um movimento surpresa ao pescoço de Yuna, que bloqueou com um pequeno Corte Celeste, ricocheteando a espada para o lado oposto. Faíscas voaram, iluminando brevemente a expressão aterrorizada do cavaleiro.

            — Você é uma maga. Eu sei que combate corpo a corpo não é o seu auge!

            O cavaleiro começou a avançar na direção de Yuna com golpes precisos de sua longa lâmina brilhante. Sua espada parecia mover-se com uma destreza que Yuna não havia visto antes, algo que fez ela levantar as sobrancelhas em uma expressão surpresa. Ela acompanhou os movimentos desesperados da espada do jovem cavaleiro que gritava com sua alma, apenas com as mãos juntas atrás do corpo, sorrindo.

            — Ei, escuta, você quer morrer de que maneira…?

            — De uma maneira que você não sabe o significado, seu demônio!

            — Pois me diga… talvez eu entenda — Yuna comentou com uma voz compreensiva.

            O cavaleiro continuava na ofensiva, na intenção de tirar a vida de Yuna, que desviava da maioria dos golpes com facilidade. Os golpes que ela não conseguia desviar, ela refletia com uma pequena instância do Corte Celeste evocada no momento do impacto da lâmina contra sua pele, rindo.

            — Poxa, não seja sem educação! Você está tendo a honra de conversar e ser morto por um dos Quatro Maiores, Yuna do Corte Celeste! Isso é legal, nã…

            Yuna foi interrompida pelo som metálico de uma espada cortando por fibras de armadura de metal. O cavaleiro, que a atacava segundos atrás, enfiou a própria espada em seu coração, com lágrimas no rosto e uma expressão fantasmagórica.

            —… Isso me deixa tão triste…

            Uma aura negra surgiu em volta de Yuna enquanto ela observava o corpo do Cavaleiro de Dragão cair diante de seus pés. A escuridão parecia engolir tudo ao seu redor, intensificando a sensação de desespero.

            — Por que não mandam um dos Quatro Maiores de uma vez?! Eu não sou forte o suficiente…?!

            Numerosos cortes começaram a dilacerar e extinguir toda a área em sua frente enquanto Yuna chorava com as mãos no rosto. Os cortes, que possuíam direções aleatórias, aos poucos transformaram os cadáveres do dragão e seu cavaleiro em partículas minúsculas. Apenas uma gosma de sangue sobrou diante de Yuna. Árvores, chão, grama, fauna, tudo foi extinto pelos cortes negros extremamente rápidos e violentos que destruíram tudo ao redor. O ar ficou pesado, carregado com o cheiro de sangue e destruição.

            — E como ela matou o próprio dragão…?

            — Já lhe ofereci informações demais, mocinha. — Ravalut deu risada e afagou a cabeça de Ayasaka, desprevenida.

            — Para de me tratar como uma criança. — Ayasaka jogou a grande mão de Ravalut para o lado, que riu da situação.

            — Vou parar quando você ficar mais forte que ela e nos enfrentar.

            — Torça para que esse dia não chegue. — Ayasaka retrucou.

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Olá, eu sou Flugelu!

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