❖ ❖ ❖
Após ouvir aquela pergunta absurda do estudante novamente, a vidente lembrou-se de um passado remoto em que não tinha nada mais do que esperanças.
Felicidade era uma palavra que vinha como complemento, nunca foi seu objetivo de vida. Ela buscava apenas a liberdade, o que vinha disto era lucro.
Ela virou-se para o lado, olhou diretamente em seus olhos e o respondeu da forma mais simples e sincera que conseguiu encontrar em palavras.
— O que esperam que eu responda? Vocês sabem o que eu passei! Então por que se importam com o fato de eu ser feliz ou não? Eu não entendo.
Ela comentou com as mãos no rosto, deixando a cesta de ervas próximas de um armário por perto.
— Eu estava bem animada antes, então por que vocês tiveram que mencionar esse assunto? Certamente eu não sou feliz, era isso que vocês queriam que eu respondesse? Não é? — Tyrant complementou, deixando a tristeza de sua voz transbordar naquele pequeno espaço.
Enquanto olhava-a de longe, o estudante apenas suspirou. Ele ficou triste pela realidade que a vidente tivera que passar até aquele momento.
Depois que escapou de sua perseguição, ela teve que se ocupar de trabalho, hobbie e religião para viver sua vida tranquilamente… Ao menos, era o que ela esperava.
No entanto, qual era o propósito disto?
Por meio de sua crença e trabalhos, ela conseguia diminuir seu ressentimento e decepções do passado. Então ocupava sua mente com esse fato, para não lembrar de acontecimentos antigos.
Na realidade, no fundo de seu coração, enterrado em suas emoções mortas, ela sentia que a sua vida era como uma droga — droga essa que deveria consumir todos os dias para permanecer firme e, no momento em que parasse de tomá-la, iria colapsar.
A pergunta “Você é feliz?” não era nada mais do que tacar sal em um ferida aberta. Um ponto fraco em sua vida, levando em conta sua mentalidade debilitada.
Ela tivera que aguentar a experiência dolorosa de desastres e fatos trágicos em toda a sua existência, e o único resquício de esperança que tinha era através da religião de seu mestre, que morreu tentando salvá-la.
O estudante já havia se questionado sobre isso antes. Contudo, a forma que Tyrant vivia atualmente, não remetia ao seu passado. Ela parecia uma pessoa distinta.
Antes do relato da vidente, o garoto constantemente sentia que a vidente escondia algo, pois seu comportamento era estranho. Da mesma forma que tentava ser simpática, havia uma enorme desconfiança em seu olhar.
Depois que a vidente contou o seu relato, o estudante concluiu que ela apenas tentava esconder o seu sentimento de infelicidade, sempre demonstrando simpatia e amor em seu comportamento e suas ações.
Na visão de Tyrant, tudo estava bem; “Se você está bem, eu estou bem”.
E, caso algo acontecesse, o universo iria ajudar.
Era este o seu pensamento distorcido que obteve após conseguir sua habilidade de previsão futura.
A esse ponto, ela não se diferenciava de uma budista. Escondendo seus verdadeiros sentimentos, enterrando-os em um lugar que não pudesse encontrar.
“Como uma pessoa que antes queria se suicidar, perdeu todo o apoio e a razão de sua vida, consegue demonstrar tanta positividade?”
Rei pensou, vendo-a agindo dessa forma todos os momentos.
Depois de alguns segundos de reflexão, Tyrant ainda magoada com todo aquele questionamento que mais pareceu um interrogatório, respondeu brevemente — Não.
— Eu não sou feliz — acrescentou novamente, dando ênfase em sua frase.
Assim que escutou, o estudante levantou-se do sofá e caminhou até próximo da vidente.
Quando estava em sua frente, ele fez outra pergunta para aquela senhora: — Se você pudesse voltar no passado, ou ao menos conseguisse mudar a sua vida, você faria isso?
Tyrant prendeu a respiração de repente, seu coração batendo como tambores. Ela suavemente acenou com a cabeça: — Claro, isso é algo que todos iriam querer, não acha?
Após receber a resposta, Rei dirigiu seu olhar para o rosto de Tyrant, sorrindo para ela.
— Sim, eu acho.
Ele respondeu brevemente, pegando a mão da vidente e fechando os olhos por um momento. Em seguida, pronunciou a conjuração de sua habilidade com o tom de voz baixinho:
— Tato Divino.
❖ ❖ ❖
[30 minutos antes da conversa]
Kazuki cobriu o rosto com a mão enquanto olhava para o estudante à sua frente com descrença.
— Como isso é possível? Essa habilidade, como pode existir algo assim? — ele indagou sem conseguir acreditar nas palavras que saíram da boca do estudante, mudando sua expressão de descrença para surpresa.
Assim que percebeu a apreensão do homem-fera, Rei o respondeu: — No começo eu também fiquei assustado, mas é uma habilidade realmente quebra, não acha?
Ele disse acompanhado de uma pequena risada, deixando seu sorriso ladino tomar conta do rosto.
— Porém, não sei se irá funcionar. Nunca testei. Se não fosse a ajuda de Elfina, eu não teria conseguido fundir as minhas habilidades.
— …
Kazuki ficou em silêncio nesse momento, ele apenas conseguia ouvir as palavras de Rei, pois não sabia o que responder naquela hora.
— Voltando ao assunto principal, vou usar esse poder em Tyrant. Eu espero que isso ajude ela. Você tem alguma objeção?
— Não — respondeu ele.
— Mas, você tem certeza que vai funcionar? Não tem nenhum risco, certo? — acrescentou.
— Relaxa pô, vamos testar na hora… hehe. Qualquer coisa, ainda tenho a minha habilidade de cura, não acredito que dê alguma complicação.
Após ouvi-lo, o homem-fera apenas acenou com a cabeça em concordância. Em seu ponto de vista, ainda que houvesse alguma consequência, ela poderia ser reversível com a habilidade de cura do garoto.
…
