Selecione o tipo de erro abaixo

Capítulo 78: Já é a segunda vez

“Ele” acordou sentindo dor em seus pulsos e nas panturrilhas. Seu corpo curvado de forma que suas costas estavam viradas para baixo. O motivo da dor foi fácil de descobrir, tanto seus braços quanto suas duas pernas estavam amarradas a um galho longo que era carregado por dois homens lobos.

A madeira era apoiada no ombro deles, um andando na frente e outro o acompanhando com a distância de alguns passos para trás. Esse modo de transportar a caça também explicava a dor em sua coluna e em seu pescoço.

Fora esses, haviam apenas mais três membros daquela espécie junto deles, menos do que na caçada. Todos muito parecidos, embora com pequenas diferenças perceptíveis como as pulseiras ou cheiro distinto entre cada que só um olfato apurado poderia notar.

Possivelmente, carregavam o Hobgoblin para sua toca onde o dividiriam com o resto da tribo em um abastado banquete, embora abastado seja um exagero, o monstro era musculoso, no entanto muito magro.

“É uma percepção curiosa o fato de que, se eu viesse a ganhar algum objeto de valor para cada vez que algum povo hostil a mim, me amarrasse a um pedaço de pau e me carregasse a sua terra, eu teria duas coisas valiosas.” Não se preocupou em manter uma falsa ilusão de que ainda dormia, seria inútil e preferia aprender sobre a racionalidade dos lupinos. “Não é uma quantidade impressionante, reconheço, entretanto é incomum que tenha acontecido duas vezes.”

Um dos Homens Lobos apenas rosnou para o prisioneiro uma série de latidos irritados, mas não altos. Outro o respondeu, parecia se divertir mais com a situação, seu rosnado notavelmente mais alto e espalhafatoso. Esses dois iniciaram uma troca de rugidos, mas não pareciam estar brigando, não era uma disputa.

Não, eles estavam conversando. Os olhos amarelos do Hobgoblin se arregalaram, aquele era um tipo de idioma, o dialeto pelo qual os lupinos se comunicavam. “Ele” identificou alguns padrões de som, tons que se repetiam.

Estava perto de chegar a uma conclusão sobre o ordenamento de frases quando a conversa cessou, antes que entendesse qualquer coisa. No fim, questionou até se não foram apenas conjecturas de sua mente desesperada por encontrar uma saída daquela situação. 

Sua atenção vagou para o ambiente, seus olhos se espalhando pela paisagem do território desconhecido a “ele”. Tentou memorizar o caminho, algum ponto de referência que pudesse usar para se localizar quando fugisse.

Se conseguisse fugir.

Como o próprio mencionou antes, não seria sua primeira vez em uma situação do tipo, entretanto havia uma evidente diferença entre os costumes dos pseudo-centauros e os dos Homens Lobos, colocar fé em um estilo de vida baseado na paz e respeito seria insensato naquela situação.

Um bom plano só poderia ser improvisado quando chegasse a toca de seus captores.

O Hobgoblin já podia sentir um sentimento que foi frequente em seu passado como Goblin e ficara menos incômodo com o tempo, apesar de jamais ter desaparecido. Um frio intenso que surgia na boca do estômago e fazia sua barriga se sentir vazia, uma ardência incomoda na superfície dos olhos e fraqueza em toda a extensão dos braços.

Medo, colossal pavor com a ideia de morrer.

Os que o conheciam podiam ter a impressão errônea de que o monstro verde era corajoso, sempre enfrentando perigos maiores a fim de se tornar cada vez melhor. Tão ingênuos, tão falhos em suas interpretações.

“Ele” era verdadeiramente covarde, o tempo todo desesperadamente buscando formas de prolongar sua vida por ao menos um dia a mais. Incapaz de aceitar o fato de que seu tempo era finito e se esgotava com o passar dos segundos como areia escorrendo por seus dedos.

O Hobgoblin apenas era bom em esconder seu temor, principalmente de si mesmo. Pensar e planejar o tempo todo, divagar sobre os temas mais estranhos, ocupar sua mente afastava a covardia até um recanto escuro onde ela era desconhecida.

Infelizmente o silêncio sempre a fazia voltar e naquele momento era impossível se esconder do fato inegável, estava morrendo de medo.

Um dos Homens Lobos uivou, seu som alto cruzou os céus ainda claros como um lamento. Foi respondido com outros uivos não muito distantes, a cada passo ficavam mais perto de se reunir com seus semelhantes.

O que aconteceria com ele então? Se apenas quisessem o matar imediatamente, sem esperar ou realizar qualquer ritual. Quantos seriam? Era impossível lidar com uma dezena, imagine com mais.

O pensamento de ter sua barriga aberta e seus órgãos devorados o fez tremer. Apenas a possibilidade fazia algo subir pela sua garganta. E o tolo achou que não teria como se sentir ainda mais fraco depois de tanta fome, seu corpo quase não o respondia mais após sua mente imprudente pensar em tantos cenários terríveis.

Para seu azar (talvez até mesmo sorte), tais antecipações horríveis do que viriam teriam que ser encerradas. Eles chegaram aonde pretendiam

Não era um acampamento bem organizado como os que os Orcs ou Trolls tentavam manter, tampouco uma área de convivência comum a céu aberto tal qual os pseudo-centauros, nem mesmo uma caverna do tipo em que o Hobgoblin estava acostumado a ocupar.

Era uma clareira aberta em meio a Floresta de Dante, claramente aberta por eles próprios através da derrubada de árvores, madeira que foi usada para construir. Isso foi o que o impressionou.

Claro que o povo de Lauany mostrava habilidade para a confecção de objetos pequenos e úteis como cestas, até mesmo os grandes Orcs não eram estranhos à arte de produzir armas ou costurar as tendas onde viviam.

Ainda assim, era a primeira vez que via uma estrutura feita por monstros. Não era complexa, lembrava mais um grande retângulo do que uma construção bem planejada. As paredes eram de madeira, intercaladas com uma mistura de terra sólida para sustentar e manter os materiais unidos.

Não podia negar que era uma visão um tanto quanto imponente, a extensão das paredes maiores parecia ser de ao menos oito a quinze metros, a altura variando entre três a sete. Só pôde ver suas aberturas quando chegou à clareira, uma entrada larga sem porta e também uma janela ao lado dela.

 Foi por essa abertura que o levaram direto para a barriga de fera.

Figurativamente falando, é claro.

Por enquanto. 

Picture of Olá, eu sou MK Hungria!

Olá, eu sou MK Hungria!

Comentem e avaliem o capítulo! Se quiser me apoiar de alguma forma, entre em nosso Discord para conversarmos!

Clique aqui para entrar em nosso Discord ➥