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“Desabrochar em meio às adversidades é um ato de coragem. As perdas nos forçam a reinventar nosso caminho, e a verdadeira força está na capacidade de persistir e adaptar-se às novas circunstâncias.”

Fragmentos da Libertação, de Nostradamus.


Anastasia emergiu do portal. A escuridão era total, um negro profundo que a envolveu completamente. Esticando o braço e tocando ao redor, ela percebia a ausência de qualquer presença. Suas mãos tremiam, e a falta de Harley ou de qualquer outra pessoa próxima a mergulhava em desespero.

— Harley! — gritou ela, perdendo sua voz — Harley!! — chamou ela em vão — Não me deixe sozinha.

Tendo apenas o eco de sua voz repercutindo como resposta, um arrepio percorreu seu corpo ao perceber que estava verdadeiramente sozinha pela primeira vez em sua vida. 

Apesar do medo, a princesa parecia mais indignada do que assustada, pronta para culpar o mundo por sua aflição. Com um movimento dramático, apontou o dedo para o vazio ao seu redor, como se acusasse seu pai, Harley e todos os homens por sua solidão repentina. No cenário sem luz, suas palavras ressoavam com um tom petulante, expressando sua frustração diante da ausência de atenção que esperava:

— Absolutamente inaceitável! — exclamou ela, cruzando os braços de maneira petulante. — Os homens simplesmente não são confiáveis. Sempre desaparecem nos momentos cruciais. Meu pai, Harley, todos eles! Esperava mais consideração!

O ambiente imerso na escuridão representava um contraste completo para a princesa, acostumada com ambientes iluminados e acolhedores. O tempo passava, mas a escuridão e a solidão persistiam. 

A indignação e as queixas por mais atenção foram gradualmente cedendo diante do medo crescente do desconhecido. Cada som mínimo era amplificado em sua mente, alimentando sua imaginação com visões de perigo a cada novo momento.

Encolhida em um canto, abraçando os próprios joelhos, lágrimas escorriam por seu rosto enquanto repetia para si mesma, em um sussurro ininteligível:

— Meu pai é o rei. Os monstros vão respeitar.

Do desespero ecoou outro grito audível por milhas:

— Eu sou uma princesa e não mereço isso!

Inesperadamente uma mão tocou o ombro de Anastasia, fazendo-a dar um sobressalto:

— Não me mate. Pode possuir meu corpo — disse a temerosa princesa que um pouco mais calma e com uma voz mais suave continuou: 

— É a minha primeira vez. Não seja totalmente brusco. Pode me ter. Só me mate depois.

— Sou eu! Abra os olhos — disse uma voz que era bastante familiar para a garota. 

Anastasia, surpresa pela voz, percebeu que estava com os olhos fechados. Ao abri-los, descobriu que não estava tão escuro quanto pensava. Ao seu lado estava Lysandra e também uma ampla caverna revelava-se iluminada por uma miríade de velas e tochas, que destacavam o ambiente de maneira fascinante.

Bancadas de pedra polida, habilmente projetadas para exposição, exibiam uma variedade de artefatos em forma de panela cuidadosamente organizados. Eram inúmeros tipos de panelas antigas em seus mais variados formatos e tamanhos.  

A iluminação revelava detalhes intrincados esculpidos nas paredes da caverna, representando símbolos místicos e padrões decorativos. 

Ao olhar com mais atenção o espaço, a princesa notava que a caverna não era apenas um esconderijo, mas um santuário que contava a história de uma civilização antiga. Um refúgio com sabedoria preservada através dos tempos.

Com um olhar fascinado, Anastasia finalmente consegue parar de procurar por tesouros e se lembra de sua amiga e diz:

— Estava com tanto medo. Harley me abandonou, e os barulhos não tinham medo do meu pai. Bem que você poderia ter aproveitado a situação e me contado a verdade depois.

Lysandra parecia não compreender ou talvez optasse por ignorar as implicações das palavras da princesa. Recordava-se do susto inicial ao ver o rosto de Anastasia pela primeira vez, uma vez que a princesa havia perdido o véu que a privava do mundo, revelando sua inigualável beleza.

— Você nunca esteve em perigo. Mesmo que eu não estivesse aqui, as criaturas protetoras não estavam confortáveis e estavam verdadeiramente assustadas… — começou Lysandra, mas foi interrompida pela princesa, que não aguardou a conclusão da frase:

— Meu pai é, de fato, um homem a ser temido — interrompeu, não esperando a conclusão da frase de Lysandra, e continuou com um tom de superioridade:

— Não culpo os seus protetores por serem covardes. Afinal, não querem encarar as consequências de resistirem à minha beleza e arriscarem a morte nas mãos do meu pai.

A princesa experimentava uma calma incomum, mas, de maneira surpreendente, também sentia uma espécie de decepção com a presença de Lysandra. Talvez desejasse prolongar o momento, permitindo que o perigo e a ameaça tivessem a oportunidade de se apoderar de seu corpo.

Inesperadamente, um grito estridente rompeu o ar, subvertendo toda a tranquilidade e sinalizando um perigo iminente.

— Socorro! Pai. Preciso de seu exército!— exclamou Anastasia, sua voz carregada de desespero.

Lysandra, olhando para todas as partes da caverna, não conseguia identificar nenhum perigo ou grande inimigo a ser enfrentado e ainda em posição defensiva perguntou: 

— Há algum inimigo invisível aqui? Um demônio? — perguntou, pronta para enfrentar qualquer adversário que fosse apontado pela princesa.

Anastasia, ainda em estado de pânico e já em cima de uma bancada, apontou freneticamente para o chão, onde uma pequena barata passeava despreocupadamente.

— Essa coisa horrível! — disse a princesa, seus olhos arregalados de terror.

A mulher misteriosa, inicialmente confusa, não conseguiu conter o riso ao perceber que todo o alvoroço era por causa da presença inofensiva da barata que ela matou rapidamente. 

Anastasia, agora envergonhada, respondeu:

— Bem, eu não gosto delas, e elas são assustadoras!

— Muito obrigado novamente. Você salvou minha vida desse terrível inimigo. Espero que me peça algo que possa te oferecer de boa vontade. — a garota então abraçou Lysandra em um gesto de agradecimento e acrescentou com um sorriso travesso:

— Que bom que você está viva. Apenas perdeu uma grande oportunidade. Mas a maioria das pessoas não consegue enxergar a oportunidade mesmo que ela esteja abraçando-as fortemente.

Ela tossia desconfortavelmente diante da provocação de Anastasia. A princesa, por sua vez, persistia:

— Tem certeza de que não estamos em um lugar perigoso, com pessoas perversas que podem se aproveitar de garotas inocentes como eu, torturando seus corpos em todas as partes?

— Você está realmente segura aqui.

Visivelmente decepcionada, Anastasia mudou o foco do assunto:

— Estou realmente feliz em ver você bem. Quem morreu, então? Foi uma cópia sua? — questionou a princesa.

— Não! Eu sou a cópia. A entidade original morreu, e todas nós vamos desaparecer. Por isso, preciso que você aceite e assuma nosso artefato, ou ele também vai desaparecer.

Anastasia, mesmo compreendendo o contexto dos artefatos e suas propriedades mágicas, olhou para a mulher misteriosa com uma expressão pensativa.

— Entendo a situação, mas o que exatamente esse artefato faz? E por que é crucial para mim assumi-lo? — indagou a princesa.

Lysandra, ciente de que Anastasia já tinha alguma noção dos poderes do artefato, explicou com cautela:

— O artefato contém a essência da entidade original, suas memórias e conhecimento. Ao aceitá-lo, você se tornará a guardiã dessa parte de nossa existência. Além disso, o artefato tem poderes que podem ser úteis quando compreendidos e canalizados corretamente.

Ela assentiu, ponderando sobre a responsabilidade que estava prestes a assumir. A caverna iluminada pelas tochas ganhava contornos mágicos enquanto ela segurava o artefato nas mãos.

— Mas o que eu ganho levando essa panela velha comigo para todos os lugares? — questionou, desviando o olhar para a misteriosa mulher.

— Você poderá se tornar mais poderosa e influente, especialmente perante… como você chama… seu “marido.” O poder gera admiração e atração. Pense em quantos admiradores você poderá conquistar? — sugeriu Lysandra.

— Não que eu precise de algo além da minha beleza e origem para atrair todo o universo ao meu futuro harém. Mas, sendo uma pessoa caridosa, eu darei um lar temporário a essa “entidade original.” Afinal, quem sou eu para negar uma chance de existência? — disse Anastasia, aceitando o artefato com uma expressão entre curiosa e determinada.

A misteriosa mulher sorriu, sentindo alívio com a decisão da princesa. Enquanto Anastasia segurava o artefato, uma conexão mágica se firmou, promovendo uma sutil troca de energias entre elas. O artefato, agora protegido pela princesa, criou um vínculo peculiar naquela caverna iluminada, onde o tempo parecia seguir uma cadência única. 

Com esse elo, Lysandra transferiu suas experiências e conhecimentos para a garota, sabendo que suas cópias desapareceriam e que, com esse ato, ela também encontraria seu fim.

Apesar de entender que a morte é um fim definitivo, a mulher misteriosa percebeu a utilidade em seu próprio término. O legado de suas vivências e sabedorias seria preservado por meio de Anastasia, proporcionando um fim diferente, onde algo de seu ser continuaria a existir.

Em vez de uma perda total na morte, a colaboração com a princesa conferiria um propósito à sua despedida, transformando seu fim em algo significativo e útil.

E assim, Lysandra partiu definitivamente, sem deixar mensagem alguma, sem expressar desejos ou vontades. Consciente da inutilidade e dos potenciais problemas que tais palavras poderiam gerar após sua não-existência, ela escolheu o silêncio como sua última declaração.

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Olá, eu sou Val Ferri Sant. Ana!

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