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Já era noite quando os reforços chegaram. Algumas dezenas de soldados, acompanhados pelo senhor do vilarejo, Eduardo não lembrava seu nome, devia ser Dony ou algo do tipo. Eles se dirigiram até a grande tenda, armada no centro do acampamento improvisado. Muitos homens haviam sido feridos durante o ataque, e estavam sendo cuidados lá. Paul estava entre eles, tendo tido metade de um dos braços arrancada pelo primeiro urso. Era dito entre os homens, no entanto que ele devolvera o favor a criatura, arrancando-lhe uma parte do focinho. A uma certa distância, foram reunidos os corpos dos que morreram. Guardas e lenhadores, todos estavam reunidos ali. Raoul devia estar lá também. 

— Ah, enfim o prefeito resolveu aparecer para enterrar os corpos — Ouviu Manon resmungar ao longe. 

Eduardo franziu o cenho ao escutá-lo, sentindo o rosto queimar. Manon fora um dos primeiros a se refugiar no moinho, e um dos que mais insistiram para que fechassem a porta, deixando os que ficaram do lado de fora para morrerem. 

— Edu, olha só — Caio apontou para um homem caminhando na direção deles, carregando uma bolsa. Era Piercy. 

— Senhor Edwardo, Senhor Caio, aqui — Piercy tirou alguns pedaços de pão duro de dentro da bolsa e os entregou —, não é muito, mas é o que consegui. 

— Valeu cara — Caio agradeceu arrancando metade do pão. 

— Obrigado, mas não precisa me chamar de senhor — pediu Eduardo. 

— Não, de agora em diante, sempre os chamarei assim, uma vez que só poderei ver meu filho por causa de ambos — explicou Piercy se recostando ao lado deles. 

— Você também me salvou, não lembra? Deveria te chamar de senhor também, “senhor Piercy”? — Eduardo retorquiu. 

— Se assim desejar, mas queria que meu filho fosse o primeiro a me chamar de tal forma. 

Eduardo suspirou. “Mesmo agora ele sempre volta ao filho”, pensou. 

— Caras, mas que merda foi isso, de verdade — Caio murmurou em voz alta. — Por que ninguém disse que tinha esses bichos por aqui? 

Eduardo concordou. 

— Verdade, isso é normal de acontecer? — perguntou a Piercy, olhando para os corpos empilhados. 

— É… não, era, quero dizer… quando eu era criança, vivíamos em um vilarejo a algumas léguas de distância por conta dos monstros. Mas a alguns anos, quando sir Alóis veio para essas terras, ele erradicou todas as criaturas desse lado do rio e assim essa aldeia foi reocupada — respondeu o rapaz. 

— Sir Alóis? — Caio disse em tom pensativo. 

— Ele é o lorde daqui, se não me engano, certo? — Eduardo procurou confirmação em Piercy, que assentiu, voltando a falar. 

— É dito que ele é um veterano das guerras contra Bhehemut no passado, tendo lutado em inúmeras batalhas — contou ele. 

— Bhehemut? — Eduardo repetiu. 

— Sim, nunca ouviram as histórias? Meu pai sempre me contava elas de tempos em tempos. 

— Pode nos contar? — Caio pediu. 

Piercy começou a lhes contar, de forma confusa, as histórias que ouviu quando era criança, sobre como o reino de Andriás, junto de outras nações vizinhas lutaram contra o império Bhehemut, a mais de cem anos. Segundo ele, seu avô materno morreu em uma dessas guerras, e seu tio em outra. A última ocorreu a doze anos. O que era curioso para Eduardo, pois, se já fazia tanto tempo desde a última, quantos anos teria esse sir Alóis? 

Ele foi retirado de seus pensamentos quando uma figura familiar surgiu em seu campo de visão. Era Thierry, acompanhado de Theo, que disparou na direção deles. 

— Edu, Caio, vocês tão bem? — perguntou ele, ansioso. 

— Sim, vamos ficar — Eduardo respondeu. 

— Cara você perdeu, a gente tomou o maior “cagaço” — Caio riu, coçando a nuca. 

— Jovens Edwardo, Caio, é bom ver que estão em segurança — Thierry os saldou, caminhando até eles como costumeiramente, exceto pelo que carregava nas mãos. 

Um grande martelo, com a cabeça maior que a de um homem e um cabo que se estendia por mais de um metro era carregado por ele. 

— Senhor Thierry, o que faz aqui? — perguntou Eduardo, sem tirar os olhos da extravagante arma. 

Thierry pôs o cabo no chão, se apoiando no martelo, que em pé chegava até a altura de sua barriga, antes de responder. 

— Chamaram-me aqui, mas parece que a situação já foi resolvida — disse. 

Eduardo olhou para a arma, se sentindo estranhamente atraído por ela. 

— Sir Thierry — Piercy se pôs em pé e curvou a cabeça. 

— Sir? — Caio franziu o cenho. 

Eduardo já ouvira Thierry ser chamado assim antes, mas o homem sempre respondia da mesma forma. 

— Não há necessidade de me chamar de “sir” rapaz. Sente-se, e descanse por agora. 

Piercy obedeceu, sentando-se de forma tímida, e Thierry olhou para Eduardo e Caio. 

— Ouvi algo valoroso a vosso respeito, fizeram bem — O homem esboçou um sorriso gentil. — Devem estar cansados, mas peço que aguardem até que eu termine — disse, pondo o machado nos ombros e se virando. 

— Espera, aonde vai senhor Thierry? — Theo questionou. 

— Aos feridos — respondeu Thierry. — Mesmo com os ursos mortos, ainda sou necessário — deu algumas palmadas na bolsa em sua cintura e continuou seu caminho. 

— O que aconteceu? — Theo os interrogou apôs o homem ir. 

Apôs as explicações, Theo encheu-lhes de mais perguntas. Eduardo, cansado da conversa, deixou que Caio o saciasse, e esticou as pernas pelo acampamento. O movimento aumentara por conta da chegada do prefeito, com os soldados da guarnição assumindo suas posições. Pareciam esperar por algo, ordens talvez. Tinham vindo matar os ursos, mas como Thierry dissera, isso não era mais necessário. O próprio Thierry dizer que viera para isso era na verdade uma surpresa, assim como machado que trouxera a tiracolo. 

Sem perceber, caminhou até o monstro que matara, permanecendo a certa distância pela. O monstro estava cercado de guardas, o que era estranho. Por que se importar em vigiar um animal morto? 

Viu o cadáver no chão. O sangue negro tinha secado a essa altura, causando um cheiro terrível em volta dele. Mesmo sendo menor que o primeiro, sendo apenas um pouco maior que Eduardo em pé, ainda era um monstro, e ele o tinha matado. Mesmo agora não acreditava nisso. Tinha ficado a centímetros de suas enormes garras que destroçaram vários homens minutos antes. Quase se viu dentro de sua mandíbula até Caio acertar o pescoço da criatura com um dardo. E depois no peito e no olho. Cada uma em um ponto vital. 

Como ele o havia acertado? Na verdade, como sabia usar uma besta? Eduardo perguntara isso a Caio, que respondeu da forma mais simples possível. 

“Apenas vi isso no chão, peguei e atirei”, respondeu ele. 

Eduardo pôde apenas revirar os olhos ao ouvir aquilo, mas só podia agradecer. Se não fosse por ele, tanto Eduardo como Piercy estariam mortos. 

— É um pouco assustador, não? 

— Hum? — Eduardo olhou para o lado, onde um jovem de cabelos claros, vestido como um soldado, permanecia em pé. 

— Nunca vi um urso carmim antes, mas sempre ouvi sobre sua força feroz. Tê-la visto, e enfrentado, seria magnífico, como nas histórias de cavaleiros. Mas alguém me tirou essa oportunidade — disse ele, olhando para Eduardo, um sorriso se formou em seus lábios. 

Eduardo franziu o cenho. 

— Não vi nada de magnífico nisso! — Acenou com a cabeça para o urso. 

— Então ele não lhe foi um oponente a altura, Edwardo? 

— Foi mal, mas quem é você? — Eduardo coçou a cabeça, sentindo-a latejar. 

— Não tenho necessidade de me apresentar, sou alguém de quem vai ouvir falar — respondeu o soldado, sorrindo. 

— Tá bom, então já estou indo, se não se importa — Eduardo falou, se virando para ir embora. 

— Antes, me responda uma coisa. 

Eduardo olhou para ele, esperando a pergunta. 

— Qual foi a sensação? 

— Como assim? — Eduardo ergueu uma sobrancelha. 

— De matá-lo. 

As lembranças, apôs o último suspiro do monstro, vieram novamente à mente de Eduardo. O sangue negro em seus braços doloridos, sua respiração pesada, a satisfação ao ver aquele corpo imóvel. 

— Não sei, foi tudo muito rápido — respondeu. 

O soldado suspirou, desapontado. 

— Lorde Lohan — Um grito soou ao longe —, o senhor Paul requer sua presença. 

O homem então respondeu, acenando com a cabeça, dispensando o mensageiro com um gesto de mão.  

— Nos veremos de novo, matador de ursos — disse, se virando. 

— Matador de ursos? — Eduardo repetiu sozinho. 

Sacudiu a cabeça, tentando esquecer que aquela conversa tinha acontecido, se é que pudesse ser chamada assim.

“Como ele sabia o meu nome? Já o vi antes?”, perguntou-se. Os cabelos loiros… Ele estava na casa do Paul pela manhã, se lembrou. Mas então, quem era? 

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Olá, eu sou Dellos, o panda!

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