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Quando a tarde desceu sobre a pacata vizinhança, Philip Gordon sentiu uma inquietação incomum que o levou à casa de Ethan. 

Já haviam se passado horas desde o encontro anterior, todavia o vizinho jamais esqueceria a expressão perturbada nos olhos do homem.

À medida que o crepúsculo se aproximava, o céu adquiria tons de laranja e rosa, mas parecia haver uma estranha sombra sobre a casa dos Moore. 

Cada passo que Philip dava era acompanhado por uma sensação crescente de dúvida, um desvio incômodo da agitação normal pela qual a existência dessa família era conhecida. 

Ao aproximar-se, o ar murmurava avisos, ansioso para resolver os problemas que estavam além da porta. 

Esta, que estava parcialmente entreaberta, parecia convidá-lo a entrar, e ele não hesitou em fazê-lo. 

O sangue penetrou em suas narinas, com um odor forte e metálico que se misturava perfeitamente com o ar ao redor. Era um aviso silencioso, um indício ameaçador do que estava esperando por Philip dentro da residência dos Moore.

Os cômodos eram iluminados por sombras longas e retorcidas criadas pela meia-luz da tarde, o que dava ao ambiente um toque de melancolia.

Ele entrou na cozinha com hesitação a ponto de sentir uma pontada no estômago ao ver os corpos sem vida de Ethan e Emma estendidos ali. 

A cena ganhou um brilho macabro com a luz difusa, enfatizando cada detalhe grotesco. 

O silêncio do lugar assumiu uma qualidade de pesadelo à medida que a poça escarlate crescia ao redor deles.

Seus rostos, outrora vivos, foram substituídos por máscaras de angústia e estranheza. 

As mãos de Emma, antes gentis e carinhosas, haviam se tornado gélidas e imóveis. 

Os sonhos e as esperanças que antes estavam no rosto de Ethan estavam presos em uma angústia muda.

As paredes da casa murmuravam segredos que nenhuma quantidade de choro poderia revelar, enquanto a paisagem manchada de sangue era um testemunho da ira do destino.

— Tsc…

A reação de Philip foi de um nível surpreendente de sobriedade, como se ele já tivesse visto situações macabras como essa antes, ou talvez sua única linha de defesa contra o horror que estava testemunhando fosse o estoicismo. 

Seus olhos tinham uma mistura de resignação e desespero, e seu rosto pálido permaneceu sem expressão.

Ele observou a cena diante de si com uma calma que, de alguma forma, a tornava ainda mais perturbadora, e não disse nada. 

Seus olhos se moviam sobre os corpos sem vida e o sangue que gradualmente pingava no chão da cozinha. 

Seu semblante era de tranquila constatação de que algo irreversível havia acontecido, não de terror.

No entanto, faltava algo crucial: Benjamin.

— Certo, isso não é um caso natural. Tem quem cuide disso.

Arrancando o celular do bolso, discou o número da agência de intervenção com mãos trêmulas. 

Seu raciocínio subjacente era que essa unidade estaria pronta para lidar com situações envolvendo qualquer pessoa que tivesse algum tipo de conexão com algo paranormal.

Sem tardar, uma voz respondeu prontamente do outro lado.

[Unidade Expedicionária de Caça, por favor, forneça informações sobre a situação em questão.]

A vice-líder era quem atendia a ligação.

— Os pais de uma criança foram assassinados em sua própria residência.

[Lamento informá-lo, mas nossa agência lida exclusivamente com casos sobrenaturais. Assuntos de natureza criminal, especialmente aqueles sob a jurisdição do Departamento de Defesa, estão fora do escopo de nossa competência.]

Philip suspirou fundo, absorvendo os critérios impositivos, mas insistiu:

— Deixe-me explicar, este caso tem elementos que indicam uma origem não natural. A forma como os assassinatos ocorreram é incomum. Pode haver uma explicação além do convencional.

[Isso não é suficiente. Há protocolos específicos para casos criminais. Não podemos nos desviar de nosso foco principal. Não temos nem os recursos nem a autorização para nos envolvermos em questões de natureza criminal.]

— Se não investigarem, podem perder pistas cruciais. Na maioria das vezes, o sobrenatural e o comum interligam-se. Talvez tenhamos algo fora do normal acontecendo aqui.

[Nossa decisão é clara. Não podemos desviar nossa atenção para casos isolados. Encerre a chamada, por favor.]

Philip ponderou por um momento. Em seguida, ele escolheu suas palavras com cuidado.

— Entendo sua função, mas, se ignorar esse caso, a segurança pública pode ficar em risco. Na verdade, não se pode ignorar a possibilidade de uma ameaça maior, uma força que ainda não entendemos.

A vice-líder fez uma pausa por um momento, considerando as palavras de Philip. 

— Com o adiamento da investigação — continuou —, há o risco de permitir que algo mais sinistro se solte. Não estou sugerindo que abdique de sua experiência, mas que expanda sua compreensão do que é possível.

Houve um silêncio momentâneo antes da vice respondê-lo.

[Está certo. Analisaremos o caso, mas somente até termos um entendimento claro. Se não encontrarmos nenhuma evidência de influência sobrenatural, encaminharemos o caso para as autoridades competentes. Por favor, me passe a localização exata.]

— Hill City, uma pequena cidade no estado de Dakota do Sul, localizada no condado de Pennington.

[Entendido, estaremos no local amanhã para prosseguir com a resolução do caso.]

— Hã!?

Um lampejo de raiva pulsou em suas veias quando ele absorveu a notícia de que a ação começaria no dia seguinte.

— Amanhã?! A solução deste problema requer uma resposta mais imediata!

A urgência vibrava em sua voz, impregnada de exigência e severidade. Às vezes, a negligência nesse campo podia evocar sua ira.

Apesar disso, apesar do estresse fervilhante e pulsante, a vice não podia permitir que sua postura se abalasse. 

Qualquer falha nesse sentido poderia comprometer seriamente sua posição.

[A execução começará em breve. Por favor, aguarde.]

— Deixe que outra pessoa assuma essa tarefa. Você não entende o perigo que esse jovem, capaz de matar seus próprios pais, representa?

[Eu o avisei.]

— Estamos enfrentando uma situação urgente!

Cada fibra de seu ser parecia ficar tensa, uma chama de frustração e impaciência queimando por dentro.

[Senhor, a execução será feita rapidamente.]

— Não aceito isso! Esta agência precisa rever urgentemente sua abordagem. Acelere a tarefa e traga Mikael e Raven.

Talvez ele tenha sido excessivamente incisivo. 

O estresse ressoava com a feroz intensidade de suas palavras. 

Porém, a vice-líder conseguia direcionar essas emoções para situações mais significativas ou controlá-las de forma que se tornassem um aperto em sua garganta. 

Mesmo assim, ela não conseguia suprimi-las por completo.

[Gostaria de frisar que sua arrogância está atingindo níveis intoleráveis. Se você persistir nesse comportamento detestável, serei obrigada a fazer com que você enfrente esse problema sem nossa intervenção. Portanto, ofereço-lhe duas alternativas: paciência ou a inevitabilidade de seu próprio destino.]

Às vezes, apenas o impossível pode evocar algum nível de formalidade. A menos que eles fizessem um esforço supremo ou enfrentassem a possibilidade de jamais se recuperar. 

— Uh…

Ele percebeu que suas palavras soavam como ameaças terríveis, também carregando a declaração de uma conclusão prematura para uma situação que era totalmente desastrosa. 

O corpo do homem arrepiou em resposta.

— Peço desculpas…

Esse momento deixou uma marca indelével nele da pior maneira possível.

A mulher soltou um suspiro aliviado quando finalmente conseguiu persuadir seu interlocutor. 

Contudo, uma sensação ardente permanecia como uma presença no seu peito, mas ela desligou abruptamente o telefone sem oferecer qualquer despedida.

— Que mulher louca…

Subitamente, um ruído reverberou pela sala, ecoando como o tombo de um objeto. 

O som preencheu o ambiente com uma tensão palpável. Com cautela, o homem voltou para o local de onde o ruído provinha, seus olhos se fixando no objeto que estava no chão. 

Uma faca de churrasco, de lâmina robusta e aspecto artesanal, repousava ali.

— Uma faca feita à mão… — murmurou, aproximando-se para observá-la mais de perto. — O peso dela seria considerável para uma criança. Impossível que ele tenha usado isso.

A presença disso lançou uma luz sobre um aspecto desconhecido e significativo do que se desenrolava ali. Mas, à medida que o homem examinava o objeto e suas características físicas controversas, uma compreensão maior começou a se insinuar:

— Um sequestro? Mas o estado em que o pai foi encontrado sugere algo mais. Ele não teria força para manejar essa faca com tanta destreza, apenas um adulto.

As conjecturas se amontoavam, um enigma cujas respostas pareciam evasivas e elusivas. A mente dele era um turbilhão de interrogações sem resposta, cada pergunta gerando mais incerteza.

— Alguém invadiu esta casa? Não, isso não faz sentido. Mas o que diabos está acontecendo?

Frustração e confusão o dominaram, resultando em um golpe impotente na parede. 

A natureza do mistério invocava curiosidade, e a curiosidade, por sua vez, era o alicerce da busca humana pela compreensão. 

Às vezes, tudo se resumia a desvendar o véu do mistério, ou o vazio resultante quando esse véu permanecia intacto. 

Perguntas sem resposta permeavam o ar, um mar de incertezas inexploradas.

— Que situação, né, Major?

Uma presença arrepiante materializou-se atrás dele, e quando ele se virou, encontrou duas figuras sentadas no sofá, observando-o. 

Uma delas, porém, era familiar.

— Hm?!

Medindo 1.80, sua pele era branca, com olhos azuis penetrantes. Seus cabelos loiros, como fios dourados, emolduravam seu rosto austero. Vestido com o impecável uniforme militar dos Einsatzgruppen, emanava uma aura de disciplina e propósito. Cada detalhe de seu uniforme, desde os emblemas reluzentes até os vincos precisos, testemunhava sua dedicação incansável ao serviço. Era como se a própria essência da ordem e da firmeza estivesse incorporada na figura dele.

— Ah, se não fosse pelo Major Walter Müller, eu jamais teria voltado aos Estados Unidos. — disse, erguendo-se para ficar de frente para ele. — Deve ter sido um incômodo para você e os outros do Schutzstaffel, certo? Como você está? Parece que o Sr. Schneider não tem mais tanto apreço por você depois que migrou pra esse lugar.

Poucas pessoas se dirigiriam a um amigo à beira da morte, especialmente se aquele amigo poderia ter escolhido essa morte por conta própria.

— Os tempos mudaram, não é mesmo? As escolhas que fizemos nos trouxeram para caminhos diferentes. Acredito que todos nós fomos moldados pelas circunstâncias da época. Mas agora, aqui estamos, em lados opostos de um novo capítulo.

O recém-conhecido que havia enfrentado horrores de batalha não possuía a sensibilidade ou a empatia típicas, acostumado a não reagir às privações sofridas por seus companheiros, como o frio, a fome e a dor. 

Nesse tempo, anos atrás, um sorriso tanto inocente quanto maquiavélico adornava seu rosto, e este era sem dúvida a face que ele associava a esses tempos.

— Nosso Senhor sempre nos guia.

A suástica nazista, símbolo inconfundível, estava estampada em sua braçadeira, como se ele fosse um camarada leal do mesmo partido. 

Walter não sentia apenas tremores de reconhecimento, mas também a ressurreição de lembranças que preferiria esquecer.

— Wolfgang…

Um soldado, mas um pessimista que só se preocupa em chegar ao abrigo via aos danos causados porque acredita que o mundo era uma forma de inferno.

— Você se lembrou! Hahahah, que bom ver você também!

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Olá, eu sou Nyck!

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